O médium João Luna estava doente, cansado.
Lavador de carros, ganhando pouco, afligia-se ao ver a esposa e os quatro filhinhos, descalços e mal vestidos, no barraco suburbano, constituído por dois cômodos pequeninos, quase que totalmente remendados por fragmentos de zinco.
Preocupados, alguns amigos conduziram-no à residência de Dona Augusta de Lima, conhecida médium no centro da cidade.
Como fazia com todos, a bondosa senhora recebeu o grupo amavelmente, abrindo as portas da moradia.
Embora arrasado pelo desânimo, João admirava o interior doméstico.
A mobília inglesa emoldurava-se de telas custosas, de esculturas gregas, de copiosa alfaia italiana e de belos tapetes em que sobressaíam os gobelins na talagarça unida.
Enquanto conversavam, refrescos eram servidos em cristais da Boêmia.
Findo o repasto, a médium convidou os circunstantes à oração.
Bastava a prece para que João se recuperasse.
E Dona Augusta transmitiu o passe e orou.
E pediu a Deus se compadecesse dela, afirmando-se a mulher mais sofredora do mundo.
Dizia-se exausta de provações, fatigada, abatida, sem coragem de prosseguir. E chorava.
E rogava a compaixão divina para a sua existência, verdadeiro "vale de lágrimas", segundo a sua própria expressão.
Quando terminou, João parecia realmente melhor. Sorria.
Os visitantes apresentavam despedidas.
—Dona Augusta, Deus lhe pague o que a senhora fez por mim.
—Como assim, meu irmão? – disse a médium – eu nada fiz.
—Recebi muito em sua prece, pois, se a senhora no conforto que Deus lhe deu afirma que é a mulher mais sofredora da Terra, eu, na minha casa de zinco, devo ser feliz sem saber.