Na Seara do Mestre

CAPÍTULO 22

O cego de nascença



Jesus, passando, viu um homem cego de nascença. Perguntaram-lhe os discípulos: 'Mestre, quem pecou para que este homem nascesse cego, ele ou seus pais?'. Respondeu Jesus: 'Nem ele pecou nem seus pais, mas isto se deu para que as obras de Deus nele sejam manifestas. . . '. Tendo assim falado, misturou saliva com terra e, fazendo barro, aplicou-o nos olhos do cego, dizendo: Vai lavar-te no tanque de Siloé'. Ele foi, lavou-se e voltou vendo. "

(JOÃO 9:1-7.)

A pergunta dos discípulos sobre os motivos da cegueira daquele homem não foi descabida. No entanto, o caso não era de expiação para o padecente nem de provação para seus pais. Tratava-se de modesta, porém significativa missão. O Espírito encarnado no moço cego assumira, no Além, o compromisso de nascer privado da vista a fim de dar testemunho público de que Jesus é a luz do mundo, o Messias prometido.

Após haver respondido à interpelação que lhe foi dirigida, o Mestre aproximou-se do cego, e, untando-lhe os olhos com barro, composto de saliva e terra, disse-lhe: "Vai lavar-te no tanque de Siloé. Ele foi, lavou-se e voltou vendo".

Por que teria o Senhor usado aquela original terapêutica? Não poderia operar a cura independente do processo empregado? Ele agiu assim para completar o testemunho que o moço havia de dar, por isso que a denominação Siloé quer dizer Enviado.

Se os homens daquele tempo, e de todos os tempos, dispondo, embora, de vista física, tivessem "olhos de ver", por certo se convenceriam de que Jesus, de fato, é o Filho de Deus. Sendo, porém, cegos de espírito, nenhuma conclusão tiraram outrora, nem tiram na atualidade, dos prodígios e das maravilhas por Ele levadas a efeito.

Nada obstante, o milagre em apreço causou escândalo.

A testemunha do Enviado foi levada à presença dos fariseus, que a interrogaram minuciosamente. O caso foi narrado com simplicidade e firmeza. Não havia negá-lo. Era evidente. Mas alegaram os sofistas adversários do Senhor: "Esse que te curou não é de Deus, não guardou o sábado". E, obstinados em sua incredulidade, mandaram vir os pais do mancebo e os interpelaram: "É este o vosso filho, que dizeis haver nascido cego?


Como, pois, ele agora vê?" "Sim, este é nosso filho que nasceu cego; como, porém, agora vê, não sabemos; interrogai-o diretamente, já tem idade, falará por si. "

Assim disseram os pais, temendo serem expulsos da sinagoga, porque estava já estabelecida aquela pena para os que confessassem ser Jesus, o Cristo. De novo, pois, é chamado o ex-cego, a quem disseram: "Dá glória a Deus;

nós sabemos que aquele que te curou é pecador". Redarguiu o mancebo: "Se é pecador, não sei; de uma coisa estou bem certo: eu era cego, e agora vejo; desde que há mundo, nunca se soube que alguém abrisse os olhos a um cego de nascença". "Mas como foi isso?", objetaram os fariseus. "Já vo-lo disse", retrucou o humilde instrumento da Verdade;

"por que desejais ouvir de novo? Quereis, acaso, tornar-vos discípulos de Jesus?" "Discípulo dele és tu", revidaram os fariseus; "nasceste todo em pecados, e queres ensinar-nos?". E, injuriando-o, expulsaram-no. (João 9:24-34.) O Mestre, tendo ciência do sucedido, procurou-o e a ele revelou-se, dizendo:

— Crês tu no Filho do homem?

— Quem é Ele, Senhor, para que eu nele creia?

— Já o viste, e é Ele quem fala contigo.

— Creio, Senhor. E o adorou.

Concluiu, então, Jesus:

— Eu vim a este mundo para um juízo, a fim de que os que não vêem, vejam; e os que vêem, se tornem cegos.

Assim, realmente, tem acontecido. No desempenho de sua missão, o Divino Enviado vai iluminando os simples que intimamente se confessam inscientes, e confundindo os vaidosos e presumidos que se julgam sábios. Ele veio, de fato, abrir os olhos da alma aos que têm fome e sede de luz, pondo, ao mesmo tempo, a descoberto, a cegueira dos orgulhosos que dogmatizam de suas cátedras, blasfemando do que ignoram.

A história se repete. O que se passou com o Enviado, quando no desempenho das exemplificações que realizou no cenário terreno, passa-se, agora, com relação à fenomenologia e à ética espíritas.

O farisaísmo hodierno continua sofismando e negando. Um grande número, temendo excomunhão, não reflete em público a luz que bruxuleia em seu íntimo.

Todavia: Veritas vincit [A verdade vence].