Lucas é o e o último dos chamados sinóticos. É também o mais extenso texto do , com 1.151 versículos, o que se explica, dentre outros fatores, pelo estilo e primor de suas narrativas. Se a mensagem do Cristo é um poema imortal, a sensibilidade de Lucas registra-o em sua mais formosa expressão. Mesmo quando toma de empréstimo narrativas presentes em Marcos ou Mateus, não raro, as enfeixa numa forma literária mais elaborada e detalhada. Comparemos, por exemplo, o episódio do chamado de Simão Pedro registrado por Mateus (Mt
Embora haja um “eu” (Lc
Além de sua importância, a leitura cuidadosa do terceiro evangelho nos permite entrever outras características desse autor. Em primeiro lugar, é alguém de boa educação, possui conhecimento escolar superior e está familiarizado com as regras da exegese judaica. É, sem dúvida, um judeu que conhece as práticas da sinagoga, embora provavelmente não um judeu da Palestina, isso porque as suas citações do se baseiam em um conhecimento notável da Septuagínta, a versão grega da Bíblia Hebraica, o que não seria de se esperar de alguém que tivesse sido criado na Palestina. Se Lucas era um pagão convertido ao Judaísmo e, posteriormente, ao Cristianismo, ou se era nascido nas comunidades judaicas fora da Palestina e convertido ao Cristianismo, permanece ainda uma questão não consensuada.
Muitos têm afirmado que Lucas era médico, atribuindo essa afirmação às descrições de doenças que ele faz com riquezas de detalhes (ver Lc
O autor também deixa transparecer sua veia de historiador. A narrativa é a mais encadeada do ponto de vista temporal e, nitidamente, há a intenção de retratar a história de Jesus e dos seus seguidores no Cristianismo nascente. Há, portanto, um sentido de tempo no qual se processa uma história da salvação que segue um luxo incessante, iniciado no Gênesis com a figura simbólica de Adão e encontra no Cristo o seu ponto culminante, mas que não se encerra aí, pois continua através dos exemplos que suscita em seus seguidores, demonstrando que essa história prossegue aguardado que cada um a escreva no livro da vida com as tintas da experiência e a pena do esforço próprio.
Entre os evangelhos sinóticos, o de Lucas é o que possuiu a maior quantidade de material exclusivo. Esse material é tão extenso que é possível agrupá-lo em cinco tipos: parábolas, ensinos e fatos da vida de Jesus, narrativas da infância, encontros com pessoas e curas. São de particular interesse as narrativas da infância porque Lucas é um dos dois únicos Evangelhos canônicos que contêm informações sobre a infância de Jesus. Entretanto, enquanto a narrativa de Mateus possui nitidamente a intenção de relembrar a história do povo hebreu em alguns eventos transpostos para a vida do Messias, as passagens encontradas em Lucas possuem um cunho muito mais pessoal desse período.
Elencamos a seguir exemplos de cada um desses tipos que são encontrados somente em Lucas:
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Esse extenso material permite formular duas hipóteses não excludentes. A primeira é que o texto pressupõe um autor que empreendeu esforço significativo na pesquisa dos fatos da vida e dos ensinos de Jesus. A segunda é que esse autor se valeu de informações reunidas por outros.
Emmanuel, no livro , indica que essas duas possibilidades de fato se concretizaram na redação desse Evangelho. Nesta obra, narrando o período de dois anos em que Paulo permanece preso em Cesareia, ele registra as seguintes informações: “A esse tempo, o ex-doutor de Jerusalém chamou a atenção de Lucas para o velho projeto de escrever uma biografia de Jesus, valendo-se das informações de Maria; lamentou não poder ir a Éfeso, incumbindo-o desse trabalho, que reputava de capital importância para os adeptos do Cristianismo. O médico amigo satisfez-lhe integralmente o desejo, legando à posteridade o precioso relato da vida do Mestre, rico de luzes e esperanças divinas.” Talvez por, essa razão, as narrativas da infância, presentes no Evangelho de Lucas, possuam uma característica peculiar.
Segundo Emmanuel, o projeto de escrever um Evangelho consoante com as recordações de Maria era inicialmente de Paulo de Tarso e tinha tal importância para ele que o apóstolo dos gentios chegara a externalizar essa intenção para João Evangelista, em Éfeso. Não logrando, contudo, tempo e condições de empreendê-lo, ele repassa essa tarefa para Lucas. Após a conclusão desses registros, Paulo sugere que Lucas também faça um relato dos fatos a partir do , o que daria origem aos . Trataremos desses fatos no Volume 5 desta coleção, que trará os comentários aos Atos dos apóstolos.
Recolhendo as flores do Evangelho, que cresceram no solo dos corações daqueles que viveram e conviveram com o Mestre e suas lições, Lucas soube legar à posteridade esse eterno poema de luzes e consolações, cujas páginas trazem as sutis vibrações da ação transformadora do Evangelho e da presença do Cristo em nossas vidas.
Fac-símile do comentário mais antigo a integrar a coleção, referente a Jo
Se considerarmos que a crítica atual questiona a autoria de muitas cartas de Paulo, o que não ocorre em relação à autoria de Lucas, estamos diante do autor com a maior contribuição em termos de quantidade para o Novo Testamento.
Tradução para o grego do texto em hebraico do Antigo Testamento. Tecnicamente a tradução envolve um conjunto de textos que não estão na Bíblia Hebraica, razão pela qual as bíblias protestantes (que excluem esses textos adicionais) diferem das bíblias católicas, que os aceitam.
O de Muratori é o mais antigo registro que contém uma relação dos textos que deveriam ser admitidos pelos cristãos. E comumente datado por volta do ano 170.
É digno de nota que ao contrário de Mateus, que registra a genealogia de Jesus a partir de Abraão, Lucas volta até Adão, filho de Deus (Lc
Embora essa parábola seja comumente conhecida com esse título, é importante destacar que não existem títulos nos manuscritos gregos mais antigos. A tradição é que conferiu a cada passagem os títulos que hoje são encontrados nas diversas traduções da , nem sempre coincidentes. Isso, contudo, reflete o estado do conhecimento e consenso de certos grupos em certo tempo. À medida que avançam os estudos, novas luzes fazem ver as limitações desses títulos. Na atualidade esta parábola tem sido mais referenciada como “a parábola dos dois filhos”, pois a presença do filho mais velho e de seu papel era ignorada, talvez pelo viés estabelecido pelo título que se convencionou atribuir a essa passagem.
Embora não encontremos explicitamente a palavra parábola, indicando a natureza dessa narrativa, aqui a incluímos visto que comumente ela é assim considerada.
Paulo e Estêvão, - “O martírio em Jerusalém”.