Aquele momento, já não há razões para dúvidas ou incertezas.
A Natureza fez-se esplêndida pauta musical onde se gravam as notas sublimes do seu Messianato.
Cada palavra é um acorde feito em luz.
Todo gesto, um alegríssimo de paz.
As onomatopeias da paisagem sucedem-se e logo se misturam às profundas mensagens do Seu amor.
Os amigos já O viram desatar homens das amarras que inibem, imobilizam ou dificultam o acesso à luta, ao bem operante.
Ao contato da Sua presença ímpar, modificam-se as situações, alteram-se os contornos dos problemas, diminuem os complicados óbices, quando colocados à frente. Ninguém O perturba ou confunde.
Uma expressão do Seu olhar, um movimento da Sua face e os astuciosos se revelam, rendidos.
Qualquer ardil se faz de fácil transposição. As ciladas não O alcançam.
A Sua sombra, em caindo sobre alguém enfermo, restitui-lhe a saúde, e através das Suas roupas se distendem as mercês.
Não O contraditam nem O atemorizam.
Suave, dulcifica a alma, ameniza a aspereza dos fatores externos violentos, e acalma os tumultos interiores persistentes.
Vigoroso, invectiva contra o erro, arrosta as consequências das atitudes, verbera contra o crime e a simonia diante dos acumpliciados com a usurpação e a hedionda hipocrisia.
São aqueles os dias da esperança, das festas da alma.
Refertam-se os Espíritos humildes com as fortunas do bem.
Os amigos já O conhecem, pelo menos dispõem de todo os dados para O identificarem.
Eram, porém, homens algo confusos, subitamente arrancados das pequenezas materiais para as excelsitudes do espírito.
Içados, de súbito, das covas sombrias e sem perspectivas para os altiplanos de perene claridade, sentiam-se aturdidos.
Amavam a luz e temiam-na.
Comiam o pão da verdade, mas o não digeriam.
Sorviam a linfa do conforto libertador e não se contentavam, fugindo para as torpes querelas, as mesquinhas disputas, os debates infantis.
O tempo, todavia, fortalecia-os, a pouco e pouco, para os cometimentos, e aqueles temores infundados se transformavam em força invencível, em estoicismos arrebatadores de fé.
Possuindo todas as seguras informações, careciam da revelação que Ele deveria dispensar-lhes.
Começariam as dores, as antífonas da amargura e os prólogos da ventura superior.
A manhã esplendente de sol é moldura para a intervenção do Alto, e o ar balsâmico do dia, o hálito da vida em música de fundo.
— Quem dizem os homens ser o Filho do Homem? —, inquire Jesus aos discípulos, num transporte sublime.
Não mais haverá silêncios a partir daquela hora, abafando as vozes do amanhecer para a vida nova.
— Uns, que tu és João Batista; outros, Elias; e outros, Jeremias, ou um dos profetas. — Redarguem em uníssono, na mesma voz.
É uma eloquência coral, harmônica, sincronizada.
Sim, eles criam na reencarnação e aguardavam, em febre de expectativa, que retornasse algum dos mortos queridos, a fim de este atestar a chegada do Rei.
Os embaixadores, no entanto, passaram, apresentaram-se e foram recusados.
Elias ali estava renascido em João, com as credenciais do reino, e, sem embargo, não o queriam compreender.
Fazia-se indispensável, portanto, desvelar-se-lhes de uma vez, a fim de que não mais se surpreendessem ante os sucessos futuros.
— E vós, quem dizeis que sou? —, interrogou diretamente a Simão.
A dúlcida voz embala.
A pergunta frontal, sem rebuços, não dá margem a opções nem a disfarces.
— Es o Cristo, Filho de Deus vivo — desata o venerando amigo, penetrado pela luz da verdade.
Há uma orquestração no ar e um súbito acalanto morrendo em planíssimo para que ocorra um profundo "staccato".
Ali está o Rei diante deles, atônitos e deslumbrados.
— Bem-aventurado és, Simão Barjonas, porque não foi carne e sangue, quem te revelou, mas meu Pai, que está nos Céus — arremata Jesus.
Soa o instante em que os segredos cedem lugar às notícias alvissareiras, os mistérios desaparecem ante as claras enunciações, e as bases, os fundamentos da era nova são fixados em definitivo nos corações e nas mentes.
Nasce a Igreja da Revelação Espiritual. Estão autorizados os intercâmbios. Os dois mundos confraternizam em abundância.
Cesareia de Filipe fez-se o santuário para a comunhão com o Mundo Maior.
A cidade opulenta dos homens cede os seus arredores em flor para a convivência com os ministros imponderáveis do Senhor da Terra.
Desvelou-se Jesus aos companheiros, em definitivo.
A grande luz do Alto jorra em abundância, e a plenitude da vida estua.
A alvorada da verdade, no entanto, é também o amanhecer das dores.
No mundo não haverá lugar para ela, por enquanto.
O duelo das ilusões, na disputa do palco da dominação das consciências, recebe a adesão das forças ignóbeis da Treva que pretende permanência.
Afirma-se a chegada do amor, enquanto se juncam de expressões de ódios e dores os corações.
Jesus não esconde as aflições que desabarão sobre os pioneiros da renovação.
Ele próprio não escapará à sanha das tenebrosas artimanhas dos homens pigmeus, que tentarão defrontar o homem Filho de Deus.
Numa antevisão dos padecimentos futuros, adverte aqueles Espíritos em repentino crescimento e lhes informa sobre o pesado tributo de dor e abnegação que Ele deve dar, a fim de romper os turvos compromissos da Humanidade com a mentira e facilitar a sua religação com Deus.
Reporta-se às supremas doações que Lhe serão exigidas, para as quais veio.
Está decidido.
Ninguém se surpreenda.
Os amigos se atemorizam, e Pedro, receoso, em perfeita sintonia com as entidades irresponsáveis que teimam por sitiá-los e fazê-los recuar, chama o Senhor à parte e admoesta-O.
A batalha é sutil e perigosa.
Indispensável enfrentá-la com decisão, sob qualquer que seja o disfarce que se insinue.
— Para trás de mim, Satanás, que me serves de escândalo;
porque não compreendes as coisas que são de Deus, mas só as que são dos homens.
Não se compadece a verdade em relação à fantasia.
Nenhuma concessão se lhe faz.
Ele veio para o momento culminante, que um dia chega para todos, e de que ninguém consegue eximir-se.
Testificar pelo exemplo o conteúdo da palavra - eis a meta.
A entidade satânica que urde na alma de Pedro a debilidade e apresenta a visão da vida, conforme a tecedura da limitação humana, vai rechaçada.
A delicada mediunidade do Apóstolo que recebeu a inspiração do Céu, há pouco, num instante de invigilância sintoniza com a representação do mal de que se nutrem os Espíritos empedernidos na perversidade.
Pela ponte mediúnica transitam anjos e demônios, conforme a concessão mental e emocional do seu detentor, a cada momento.
Pedro dá-se conta do equívoco, desperta e se eleva outra vez.
Inunda-se de esperanças, liberta-se.
O Mestre, integérrimo, com os olhos postos na glória do sacrifício, exalta a dor por amor e culmina o ensino, definindo, perenemente, os rumos e as balizas do seu messianato.
— Se alguém quiser vir após mim, renuncie a si mesmo, tome sobre si a sua cruz, e siga-me.
Abrem-se de par em par as portas da Imortalidade, e a Igreja da Revelação Espiritual está construída nas almas.
O "Senhor dos Espíritos" decifra um dos enigmas do mundo além das sombras - a inspiração e projeta claridade nos abismos da sepultura ignorada.
A vida supera a morte; o Espírito triunfa.
E dia de perene amanhecer!
O ar começa a pesar, carreado pelo calor das horas.
A sinfonia atinge os acordes últimos.
O grande final se apaga em sons que se misturam às vozes da paisagem.
Jamais silenciarão.
O concerto melódico invadirá os ouvidos do mundo e das gerações.
Chega o Sol vitorioso.
A luz está no mundo. (Marcos