Na extensa gleba em que a Terra se converte, todos nos tornamos semeadores.
Há os que semeiam aflições e multiplicam dores, que se avolumam devastadoras; os que distendem os tófcicos da rebeldia, produzindo asfixia em massa; os que esparzem o pólen da ira, engendrando a maquinaria dos ódios fomentadores dos crimes vários, que culminam nas lamentáveis guerras do extermínio coletivo; os que difundem mentiras, conclamando ao desespero, que irrompe, devorando esperanças e alegrias; os que sulcam os espíritos e plantam paixões dissolventes, que proliferam contagiantes, convocando à anarquia e aos desajustes alucinantes a que se atiram; os que produzem clima de miséria nas paisagens das vidas... Esses são os semeadores da sombra e da morte.
Sobre o solo ubérrimo dos homens muitos semeiam a palavra de luz e vida, facultando que o sol da alegria aqueça e vivifique os que lhe recebem a claridade.
Muitos são os pomicultores que na seara da esperança estão deixando as valiosas espécies de que se fazem portadores, nas leiras gentis das criaturas com os olhos colocados no porvir.
Os semeadores do Cristo estão, desse modo, espalhando as divinas sementes do amor por toda parte, a fim de favorecerem os sofredores de qualquer procedência com as dádivas imensuráveis do Reino de Deus.
O Evangelho afirma "que o semeador saiu a semear... " A semente é a palavra de vida eterna.
Sementeira da fraternidade, estas páginas conduzem o princípio vital da palavra do Senhor, incomparável semente de luz para a fecundação no imo das vidas que sintam necessidade de libertação para seguirem o rumo da felicidade perene(1).
Reunidos para o ministério da própria iluminação interior, grafamos paulatinamente as páginas que compõem este livro, a tentar um fecundo intercâmbio de experiências, considerando as realidades que defrontamos após a desencarnação, desejosos de ajudar de alguma forma os companheiros da vilegiatura carnal, por onde já caminhamos, também, em nome da Fraternidade.
Álguns não fruímos a honra de conhecer o Espiritismo, quando da jornada no corpo somático, embora houvéssemos travado relações com o fúlgido Evangelho do Senhor, o que, todavia, não foi óbice para examinarmos e aprofundarmos estudos e observações na Revelação de que se fez Apóstolo o insigne Allan Kardec, discípulo fiel e servo de escol, após a nossa desencarnação. Forque reconhecemos na Doutrina Espírita o renascer do sol cristão nos horizontes do mundo moderno, mais nos afervoramos a participar do fecundo labor de preparar as mentes e os corações para a hora da chegada do Mestre Sempre Vivo.
"O semeador saiu a semear...
"Quando semeava, uma parte da semente caiu à beira do caminho, vieram as aves e comeram-na.
"Outra parte caiu nos lugares pedregosos...
"Outra caiu entre os espinhos...
"Outra caiu na boa terra e dava fruto, havendo grãos que rendiam cem, outros sessenta, outros trinta por um.
"Quem tem ouvidos, ouça. "
Semeadores da luz e da fraternidade, estamos a serviço de Jesus, embora servos imperfeitos que reconhecemos ser.
Joanna de Ângelis
Salvador, 15 de novembro de 1971.
Após o 18-Brumário (9 de novembro de 1199), instaura-se a era napoleônica mime França consumia pelas lutas cruentas, em dez anos de anarquia e de terror, Ainda não refeita da imensa hecatombe, tem os céus da esperança plúmbeos, carregados de cúmulos prenunciadores de mareações tumultuosas, que eclodirão, logo depois, em apaixonadas campanhas sanguinolentas, dividindo a Europa conturbada em dois campos de influência dominadora: francesa e russa, Sem que as chamas da desordem estejam de todo apagadas, Napoleão Bonaparte, primeiro cônsul do país, faz-se nomear cônsul vitalício, em 1802
depois das batalhas em que se fez vitorioso na 1tália... Indómito e apaixonado, de imediato restabelece a escravatura nas Colônias e inicia lamentáveis processos de intolerável despotismo.
Mediante conciliábulo nefando impõe a Pio VII a primeira Concordata por meio da qual submete oClero à sua dependência, colocando a Igreja Católica sob a direção do Estado e concedendo, ao mesmo tempo, regalias antes não outorgadas à Religião Romana.
Ambicioso e insaciável recebe dos poderes públicos, a 18 de maio de 1804, "a dignidade imperial*
" e se cerca de uma corte mais luxuosa que a dos Bourbons, anteriormente derrubada pela Revolução. Cingindo a coroa, faz-se sagrar pelo papa, a 2 de dezembro do mesmo ano, Napoleão I.
Um ano antes, iniciara, contra a Liga do Reno hediondo movimento que se alastrará no "bloqueio continental"
" imposto à Inglaterra, inaugurando o período das lutas extremistas que o levarão ao cativeiro ultriz, em Santa Helena, onde expiará dolorosamente os abusos, desencarnando em 1821.
No mesmo período, porém, daquele tumultuado 1804, João Henrique Pestalozzi, o insigne pedagogo suíço, após ter renunciado à posição de deputado da delegação que fora chamada a Paris pelo então cônsul vitalício Bonaparte, transfere residência para Yverdon, conduzido por Emissários divinos.
Medindo os dias entre a investidura imperial e a coroação, os Excelsos Promotores do progresso e da paz na Terra trazem ao torvelinho da reencarnação o Espírito missionário Allan Kardec. que empunhará, mais tarde, a flama da verdade encimada pelo lábaro da caridade, para restaurar na Terra o período do amor, em nome do vitorioso não vencido e príncipe perene da paz: Jesus!...
... E enquanto bruxuleiam as luzes dos incessantes triunfos do Imperador, que. parte para o exílio após o desastre de Waterloo, o jovem Rivail segue para Yverdon, a fim de iniciar-se no Instituto de Pestalozzi, conviver com o ilustre sábio e, finalmente, alçar o voo gigantesco sobre os alcantis de um mundo ensombrado, espalhando o sol da imortalidade de que se fará portador através da Doutrina Consoladora dos Espíritos.
Quando mais tarde, em 1852, Carlos Luís Napoleão Bonaparte inaugura em França o Segundo Império, os inusitados fenômenos das mesas girantes e falantes invadem a Europa e particularmente Paris, despertando curiosidade em todos os círculos, em preparação para o advento do Espírito Consolador.
Em 1854 o eminente mestre lionês Hippolyte- -Léon Denizard Rivail é convidado a tomar conhecimento dos fenômenos insólitos, vindo a interessar-se por eles no ano seguinte, após amadurecido em 50 anos de vida nobre e estudiosa, toda dedicada à Causa da educação e da cultura.
Participando de uma das experiências realizadas na residência da Sra. Plainemaison, na Rua Grange-Bateliere, 18, entrega-se, desde então, ao estudo sistemático e contínuo dos fenômenos, procurando penetrar nas causas ocultas por meio da lógica de ferro de que é portador, lógica que o leva às deduções da razão robusta a se alicerçar nos fatos incontestes que observa e constata seguramente.
O futuro missionário prepara-se ao calor das revelações que lhe chegam da Espiritualidade.
Convocado pelo seu Espírito Guia, no próprio lar, recebe a confirmação do fato, em memorável sessão realizada no domicilio do seu amigo Baudin, por intermédio da filha deste.
Logo depois, a 30 de abril do mesmo ano (1856), a jovem Japhet, na residência do sr. Roustan, é instrumento dos Espíritos Excelsos, que lhe escrevem, traçando as primeiras rotas: "... Deixará de haver religião e uma se fará necessária, mas verdadeira, grande, bela e digna do Criador... Seus primeiros alicerces já foram colocados... Quanto a ti, Rivail, a tua missão é ai... " E logo depois, acrescentam: "... Ele, Rivail, virá em segundo lugar: é o obreiro que reconstrói o que foi demolido. "
Repetem-se informes e elucidações do Alto, confirmados no dia 12 de junho, (quase três meses depois do primeiro aviso) por intermédio de Aline Carlotti, quando o Espírito Verdade traz vitorioso e definitivo esclarecimento no qual a missão é maior e mais grandiosa do que ele pensa e para a qual se tornará digno, honrando O" sacerdócio de que se encontra desde já investido pelo Senhor dos Mundos: "... Não esqueças que podes triunfar, como podes falir. Neste último caso, outro te substituiria, porquanto os desígnios de Deus não assentam na cabeça de um homem... " E com ênfase amorosa continua o Embaixador Celeste: "Se a cumprires, os homens saberão reconhecê-lo, cedo ou tarde, visto que pelos frutos é que se verifica a qualidade da árvore. "
O apóstolo medita, e, após interrogar quais as causas que poderiam levá-lo ao malogro da incumbência relevante, recebe luminosa resposta: "... Ora bem! não poucos recuam quando, em vez de uma estrada florida, só vêem sob os passos urzes, pedras agudas e serpentes. Para tais missões, não basta a inteligência. Faz-se mister, primeiramente, para agradar a Deus, humildade, modéstia e desinteresse, visto que Ele abate os orgulhosos, os presunçosos e os ambiciosos. "E o Espírito Verdade, após considerar outras razões indispensáveis, informa, conciso e incisivo: "... Exigem-se, por fim, devotamento, abnegação e disposição a todos os sacrifícios. Vês, assim, que a tua missão está subordinada a condições que dependem de ti. "
* Quando mais tarde, em 18 de abril de 1857, M0 Livro dos Espíritos" surge qual madrugada primaveril a iniciar a era do espírito triunfante da matéria, desponta com ele o missionário Allan Kardec, a quem os homens, aprenderão a amar e a respeitar. Por doze anos ininterruptos e exaustivos labores, superando a si mesmo nos embates contra as vilanias, labéus e paixões humanas de toda ordem, oferece por fim, através da Codificação do Espiritismo, os conceitos libertadores para o mundo feliz do futuro...
Quando vigora em França o chamado Império Liberal, tomba o incomparável vexilário do Espiritismo, no dia 31 de março de 1869. O mundo perde um luminar na Terra, mas a humanidade ganha a Codificação Kardequiana que é uma constelação de fulgurantes ensinos a conduzir o pensamento dos povos na direção dos Cimos da Vida.
Num período em que estavam em voga a filosofia supra-ética otimista de Hegel, a do auto-aperfeiçoamento de Kant; em que o utilitarismo era patrocinado e defendido no seu desenvolvimento por Mill, por Darwin e Spencer que o apoiavam através das ciências naturais; em que o socialismo surgia paralelamente ao lado da Ética Social, desde os dias de Saint-Simon, Fournier, Proudhon, Marx e Engels; em que o pessimismo e a negação do mundo reapareciam com Schopenhauer; em que Nietzsche se apresentava anti-utilitarista, apregoando o gozo da vida "até a última gota"; em que Augusto Comte defendia os princípios da moral... o Espiritismo atualizou a Ética do Cristianismo primitivo, apresentando. uma filosofia consoladora e clara, que prossegue não ultrapassada até a atualidade, esta atualidade conturbada por princípios de ética anárquica a se apresentarem no existencialismo através das correntes de beatniks e hippieistas, conseguindo essa filosofia espírita estabelecer e manter linhas vigorosas de conduta ante as perspectivas momentaneamente sombrias do mundo novo de amanhã.
Recordamos, também, que os dias de Allan Kardec foram os de cientistas tais Berthelot (Marcelino e Daniel), Cláudio Bernard, Pasteur, Pavlov, Koch, Jenner... Nesse período grandioso da Humanidade o Espiritismo ofereceu a prova documental da imortalidade, seguindo "ao lado da ciência", pois, caminhando de par com o progresso — conforme acentuou Kardec — o Espiritismo jamais será ultrapassado, porque, se novas descobertas lhe demonstrassem estar em erro acerca de um ponto qualquer, ele se modificará nesse ponto. Se uma verdade nova se revelar, ele a aceitará. *
* esclarecendo, ainda, que "os Espíritos não ensinam senão justamente o que é mister para guiá-lo no caminho da verdade, mas abstém-se de revelar o que o homem pode descobrir por si mesmo, deixando-lhe o cuidado de discutir, verificar e submeter tudo ao cadinho da razão, deixando mesmo, muitas vezes, que adquira a experiência à sua custa. Fornecem-lhe o princípio, os materiais; cabe-lhe a ele aproveitá-los e pô-los em obra. "
0) Em todo o acervo doutrinário do Espiritismo, engrandece-se Allan Kardec, digno depositário da incumbência divina, correspondendo aos requisitos para o êxito da tarefa que galhardamente executou, como legítimo missionário, missionário dos mais valorosos que surgiram através dos tempos.
Vianna de Carvalho
* 1 Diversas destas mensagens apareceram em ocasião oportuna na 1mprensa Espirita. Todas foram, agora, refundidas e ampliadas pelos seus respectivos Autores, a fim de constituírem o presente volume.
O mesmo tema aparece tratado mais de uma ves. especialmente em se referindo a Allan Kardec e à Codificação, considerando a importância de que se reveste para nós, estudiosos que reconhecemos ser da Terceira Revelação.
Joanna de Ângelis
"Obras Póstumas" 11. Ediçio da FEB
"A Gênese", 14. Edição da FEB.
Notas do Autor espiritual.