1 Naquela hora chegaram-se a Jesus os seus discípuLos, dizendo: Quem julgas tu que é maior no reino dos céus?
2 E chamando Jesus a um menino, o pôs no meio deles.
3 E disse: Na verdade vos digo que se não vos converterd es, e vos não fizerdes como meninos, não haveis de entrar no reino dos céus.
4 Todo aquele pois, que se fizer pequeno como este menino, esse será o maior no reino dos céus.
5 E o que receber em meu nome um menino, tal como este, a mim é que recebe.
A infância é o símbolo da pureza e da inocência. Para que sejamos grandes no reino dos céus, é preciso que nós nos tornemos puros e inocentes como as crianças.
Belíssima é a comparação que Jesus faz entre uma criança e uma alma que quer penetrar nas regiões felizes do Universo, e ser grande diante de Deus, o Pai Celestial. Para isso, antes de tudo, deve tornar-se inocente e pura. E Jesus, que era a inocência e a pureza suprema, toma o coração infantil como sua representação na terra.
6 O que escandalizar, porém, a um destes pequeninos que creem em mim, melhor lhe fora que se lhe pendurasse ao pescoço uma mó de atafona, e que o lançassem ao fundo do mar.
Os que desviam seu próximo da crença em Deus, e do bem que promana da fé viva, e das consolações que se originam da certeza da imortalidade da alma, cometem um grande crime, porque se fazem agentes das trevas, e trabalham para que o mal se perpetue na face da terra. São péssimas as consequências que um tal proceder acarreta para os infelizes, que se entregam à ingrata tarefa de apagarem a luz que clareia o caminho das criaturas para Deus; rudes sofrimentos os aguardam no caminho do porvír.
7 Ai do mundo por causa dos escândalos. Porque é necessário que sucedam escândalos; mas aí daquele homem por quem vem o escândalo.
Os escândalos do mundo se originam da ignorância espiritual em que vive a humanidade. Os crimes, os vícios, as paixões inferiores, as ambições desvairadas, as vinganças, os ódios, a desonestidade tudo são escândalos.
Enquanto os homens persistirem em alimentar estes escândalos, não se livrarão do cortejo de sofrimentos, que os acompanham.
Em virtude de estarem os homens vivendo em completo desacordo com as leis divinas, é natural que sejam necessários os escândalos para que o sofrimento lhes faça aborrecer o caminho errado que tomaram. Quando todos se compenetrarem da inutilidade de viverem desrespeitando as leis de Deus e se regenerarem, cessarão os escândalos.
8 Ora se a tua mão ou o teu pé te escandaliza, corta-o e lança-o fora de ti; melhor te é entrar na vida manco ou aleijado, do que tendo duas mãos ou dois pés, ser lançado no fogo eterno.
9 E se o teu olho te escandaliza, tira-o e lança-o fora de ti; melhor te é entrar na vida com um só olho, do que, tendo dois, ser lançado no fogo do inferno.
Temos aqui a lei das causas e dos efeitos. Cada um é punido naquilo por que pecou. Se os órgãos do corpo, ao invés de servirem para o bem, são utilizados para o mal, deverão ser suprimidos do futuro corpo, no qual o espírito se reencarnará. Assim o espírito se penitenciará do erro cometido e aprenderá a servir-se nobremente dos instrumentos que o Senhor lhe emprestou para seu progresso. Pela aplicação dessa lei, os que consagram sua inteligência ao mal, serão compelidos à idiotia; os que abusam do poder, serão rebaixados à subalternidade; os que menosprezam o dom da saúde, terão de viver em organismos enfermos; enfim, cada um sofrerá em si próprio o efeito do erro cometido.
Quanto à expressão fogo do inferno, não a devemos tomar no sentido de lugar de eternos suplícios; porém, como sendo a intranquilidade que agita a alma e a faz penar até que não corrija o mal praticado. Uma vez que, pelo esforço e boa vontade, a alma se livra das manchas que lhe queimam a consciência, cessará o fogo do inferno que a consumia.
10 Vede não desprezeis alguns destes pequeninos; porque eu vos declaro que os seus anjos nos céus incessantemente estão vendo a face de meu Pai, que está nos céus.
Por ínfima que seja a criatura, devemos tratá-la fraternalmente, pois é nossa irmã, filha de Deus nosso Pai comum, e a Providência Divina não a esquece. Esta ordem de Jesus é uma advertência para que jamais faltemos com o amor fraterno a quem quer que seja.
11 Porque o Filho do homem veio a salvar o que havia perecido.
12 Que vos parece? se tiver alguém cem ovelhas, e se se desgarrar uma delas, porventura não deixa as noventa e nove nos montes, e vai buscar aquela que se extraviou?
13 E se acontecer achá-la, digo-vos em verdade que maior contentamento recebe ele por esta, do que pelas noventa e nove que não se extraviaram.
14 Assim não é a vontade de vosso Pai, que está nos céus, que pereça um destes pequeninos.
Os espíritos são criados por Deus, nosso Pai, e devem progredir por seus próprios esforços. Durante sua evolução, écomum os espíritos fracassarem nas provas a que se submetem; desviam-se do caminho do bem e se perdem nas sendas da iniquidade. Deus não extermina os filhos extraviados; unicamente os envia aos mundos inferiores, onde aprenderão à custa de trabalhos e de sofrimentos, a não mais praticarem o mal.
A terra é, por enquanto, um mundo de exílio. Almas que fracassaram foram para cá enviadas. Como Deus não quer que nenhum de seus filhos pereça e quer que todos se tornem perfeitos, enviou Jesus para salvar os fracassados. E Jesus nos deu a lei moral, cuja observância nos redimirá. Essa lei é o Evangelho. Além de redimir os espíritos que faliram, o Evangelho converterá a terra num mundo mais adiantado. Então a terra deixará de ser um mundo de exílio, para se tornar um mundo de regeneração onde filhos regenerados subirão para o Pai, que os espera amorosamente.
15 Portanto, se teu irmão pecar contra ti, vai, e corrige-o entre ti e ele só; se te ouvir, ganhado terás a teu irmão.
16 Mas se te não ouvir, toma ainda contigo uma ou duas pessoas, para que por boca de duas ou três testemunhas fique tudo confirmado.
17 E se os não ouvir, dize-o à igreja; e se não ouvir a igreja, tem-no por um gentio ou um publicano.
Obedeçamos sempre à lei da harmonia. Sem harmonia não pode haver compreensão nem progresso. Sem compreensão mútua gera-se a desarmonia, e retarda-se o progresso. Onde há harmonia não pode haver desavenças; e mesmo que elas apareçam, a compreensão as resolverá satisfatoriamente.
Pode acontecer originar-se entre duas pessoas, ou mais, uma desavença qualquer. Importa que essa desavença seja sanada o mais rápido possível, porque, muitíssimas vezes, as pessoas que se desavieram, são irmãos que devem trilhar juntos o mesmo caminho nesta encarnação. E se uma desavença os separar, haverá retardamento do progresso espiritual dos dois.
É preciso que compreendamos ser preferível estarmos ligados a nossos irmãos pelos laços do amor fraterno, do que pelos laços do ódio. Os dois laços ligam; a diferença é que os laços do amor fraterno trazem felicidade, e os laços do ódio, sofrimento. E como Jesus visa a felicidade real de seus tutelados, ele aqui nos ensina a não pouparmos esforços para que não se estabeleçam laços de ódio entre nós e ninguém e, se porventura houverem, que sejam desfeitos imediatamente. E para isso usemos da compreensão, para que vivamos em harmonia.
18 Em verdade vos digo, que tudo o que vós ligardes sobre a terra será ligado também no céu; e tudo o que vós desatardes sobre a terra será desatado também no céu.
É a lei da repercussão de nossos atos na vida espiritual, que iremos viver quando desencarnarmos. No mundo espiritual esperará por nós o resultado do bem e do mal que houvermos praticado aqui na terra. E não só o resultado de nossos atos, como também estarão a aguardar-nos no limiar do mundo espiritual os nossos amigos e os inimigos.
O ódio e o amor são duas forças de atração e de ligação. Os que se amam, atraem-se e ligam-se pelo amor, donde lhes advirá a felicidade. Os que se odeiam, atraem-se e ligam-se pelo ódio, do qual se gerarão sofrimentos.
Eis porque Jesus, profundo conhecedor das leis que regem os destinos das almas, recomenda que perdoemos sempre, a fim de desatarmos os cruéis laços do ódio. E nos recomenda insistentemente que nos amemos uns aos outros, para que nos liguemos pela felicidade nos céus.
19 Ainda vos digo mais: que se dois de vós se unirem entre si sobre a terra, seja qual for a coisa que pedirem, meu Pai, que está nos ceus, lha fará.
20 Porque onde se acham dois ou trés congregados em meu nome, aí estou eu no meio deles.
Jesus aqui nos demonstra o valor da oração coletiva. Um pensamento para o bem, será sempre reforçado por outro pensamento que tenda para o bem.
Quando duas ou mais pessoas oram em conjunto, forma-se uma corrente espiritual de alto valor para as curas, pelo acúmulo de energias fluídico-magnéticas. Essas energias são aproveitadas pelos espíritos cura-dores, para levarem alívio aos que sofrem, consolo aos aflitos, auxílio aos necessitados, esperança aos desanimados, forças aos enfraquecidos, luz aos que estão em trevas e conforto aos desamparados.
É verdade que nem sempre os doentes recebem as curas solicitadas; temos de levar em conta as provas e as expiações, que os doentes deverão suportar para o seu progresso espiritual e para a correção de faltas de existências passadas. Contudo, seja qual for o caso, o doente jamais deixará de ser beneficiado; se não o for pela cura, será contemplado com forças espirituais, que lhe suavizarão os padecimentos. Uma oração sincera feita em conjunto por diversas pessoas, ou por uma só pessoa isoladamente, nunca ficará sem a resposta dos planos superiores.
21 Então, chegando-se Pedro a ele, perguntou: Senhor, quantas vezes poderá pecar meu irmão contra mim, que eu lhe perdoe? será até sete vezes?
22 Respondeu-lhe Jesus: Não te digo que até sete vezes, mas que até setenta vezes sete.
Não há número definido de quantas vezes poderemos perdoar as ofensas, sejam elas quais forem, que nossos irmãos cometam contra nós. É preciso, para nossa felicidade aqui na terra presentemente, e no mundo espiritual futuramente, que estejamos sempre prontos a perdoar tudo a todos, e em quaisquer momentos e circunstâncias.
Realmente, o fato de os homens não perdoarem reciprocamente as faltas que cometem uns contra os outros, é a causa do maior número de sofrimentos, que há na face de nosso planeta. As prisões regurgitam de infelizes, que não souberam perdoar. Procurando na vingança a reparação de um erro, um contendor desencarnou em lamentáveis condições, e o outro foi recolhido ao cárcere. E a tragédia continuará no além-túmulo, onde os dois culpados terão de executar prolongado trabalho, para corrigirem a falta que praticaram. E depois terão de sofrer dolorosa reencarnação para expiarem o crime; porque diante de Deus não há vítimas nem agressores; há dois de seus filhos, dois irmãos, que preferiram usar da violência em lugar de usarem do perdão mútuo.
E por não quererem perdoar, quantas famílias não estão divididas, quantos irmãos não se desprezam? Eis porque Jesus não se cansou de pregar o perdão ilimitado, que todos nós nos devemos uns aos outros, sejam quais forem os motivos de que se originaram os ressentimentos.
23 Por isso o reino dos céus é comparado a um homem rei, que quis tomar contas aos seus servos.
24 E tendo começado a tomar as contas, apresentou-se-lhe um que lhe devia dez mil talentos.
25 E como não tivesse com que pagar, mandou o seu senhor que o vendessem a ele a sua mulher e a seus filhos, e tudo o que tinha, para ficar pago da dívida.
26 Porém, o tal servo, lançando-se-lhe aos pés, lhe fazia esta súplica, dizendo: Tem paciência comigo, que eu te pagarei tudo.
27 Então o Senhor, compadecido daquele servo, deixou-o ir livre, e perdoou-lhe a dívida.
28 E tendo saído este servo, encontrou um de seus companheiros, que lhe devia cem dinheiros e lançando-lhe a mão, o afogava, dizendo: Pagame o que me deves.
29 E o companheiro, lançando-se-lhe aos pés, o rogava, dizendo: Tem paciência comigo, que eu te satisfarei tudo.
30 Porém, ele não quis; mas retirou-se, e fez que o metessem na cadeia, até pagar a divida.
31 Porém, os outros servos seus companheiros, vendo o que se passava, sentiram-no fortemente, e foram dar parte a seu Senhor de tudo o que tinha acontecido.
32 Então o fez vir o seu servo, e lhe disse: Servo mau, eu te perdoei a dívida toda, porque me vieste rogar para isso.
33 Não devias tu logo compadecer-te igualmente de teu companheiro, assim como também eu me compadeci de ti?
34 E, cheio de cólera, mandou seu senhor que o entregassem aos algozes, até pagar toda a dívida.
35 Assim também vos há e fazer meu Pai celestial, se não perdoardes do íntimo de vossos corações, cada um a seu irmão.
Nosso desrespeito para com as leis divinas, tornou-nos grandes devedores de Deus. E no entanto, o Pai celestial está sempre pronto a perdoar-nos, por maiores que sejam nossos pecados para com ele. Deus, em sua misericórdia, não fulmina aquele que o nega; nem desampara o filho ingrato, que não lhe reconhece os benefícios. Tudo Deus perdoa e tolera, dando-nos, assim, o exemplo de como devemos proceder para com nossos irmãos.
A parábola acima ilustra muito bem o que se passa entre a humanidade: todos estamos sobrecarregados de imensos débitos para com a Providência Divina; todos, continuamente, lhe suplicamos o perdão. Todavia, somos incapazes de perdoar do fundo do coração a menor falta que alguém cometer contra nós. Queremos que Deus nos perdoe e nos tolere, mas não queremos perdoar, nem tolerar nossos semelhantes. Por meio desta tão singela e tão expressiva parábola o Mestre nos ensina que. devemos cobrir com o manto do perdão e do amor os erros, que são cometidos contra nós, porque se assim não o fizermos, compareceremos com nossos erros descobertos na presença de Deus, o qual nos tratará exatamente como tivermos tratado nossos irmãos.