O Evangelho dos Humildes

CAPÍTULO 20

A PARÁBOLA DOS TRABALHADORES E DAS



DIVERSAS HORAS DO TRABALHO

(Mt 20:1-34; Mc 10:32-34; Lc 18:31-34)

1 O reino dos céus é semelhante a um homem pai de família, que ao romper da manhã saiu e a assalariar trabalhadores para a sua vinha.

2 E feito com os trabalhadores o ajuste de um dinheiro por dia, mandouos para a sua vinha.

3 E tendo saido junto da terceira hora, viu estarem outros na praça ociosos.

4 E disse-lhes: Ide vós também para a minha vinha, e dar-vos-ei o que for justo.

5 E eles foram. Saiu, porém, outra vez junto da hora sexta, e junto da nona; e fez o mesmo.

6 E junto da undécima tornou a sair, e achou outros que lá estavam, e disse: Porque estais vós aqui todo o dia ociosos?

7 E responderam-lhe eles: Porque ninguém nos assalariou. Ele lhes disse: Ide vós também para a minha vinha.

8 Porém, lá no fim da tarde, disse o senhor da vinha ao seu mordomo: Chama os trabalhadores, e paga-lhes o jornal, começando pelos últimos, e acabando nos primeiros.

9 Tendo chegado pois os que foram juntos da hora undécima, recebeu cada um o seu dinheiro.

10 E chegando também os que tinham ido primeiro, julgaram que haviam de receber mais; porém também estes não receberam mais do que um dinheiro cada um.

11 E ao recebê-lo, murmuravam contra o pai de família.

12 Dizendo: Estes, que vieram últimos, não trabalharam senão uma hora, e tu os igualaste conosco, que aturamos o peso do dia e da calma.

13 Porém ele, respondendo a um deles, lhe disse: Amigo, eu não te faço agravo; não convieste tu comigo num dinheiro?

14 Toma o que te pertence, e vai-te; que eu de mim quero dar também a este último tanto como a ti.

15 Visto isso, não me é licito fazer o que quero? acaso o teu olho é mau, porque eu sou bom?

Incessantemente Deus convoca seus filhos para o cultivo das virtudes, que lhes garantirão o salário divino. Nossas almas são parcelas da vinha de Deus, e cada um de nós é um trabalhador convidado a tratar da parcela que lhe coube. Uns começam mais cedo a cuidar de seus espíritos para o bem; outros começam mais tarde. E no entanto, para os bons trabalhadores o salário é o mesmo, não importa a hora em que iniciarem o trabalho de se regenerarem.

Esta formosa parábola é um hino de esperança. Por meio dela, Jesus nos ensina que sempre é tempo de cuidarmos de nossas almas, e de colaborarmos com o Senhor na tarefa de evangelizar nossos irmãos menores. Quer estejamos no vigor da juventude, quer já tenhamos começado a sentir o cansaço da velhice, toda a hora é hora de trabalharmos para Deus, e de merecermos o salário divino.

16 Assim serão os últimos os primeiros, e primeiros os últimos, porque são muitos os chamados, e poucos os escolhidos.

Nem todos são escolhidos, porque nem todos estão preparados para arcarem com a responsabilidade, que o Evangelho acarreta a quem o abraça.

Os chamados são a humanidade, porque o Evangelho é pregado a todos os povos. Contudo, dentre os que ouvem a palavra divina, poucos têm forças suficientes para viverem de conformidade com ela. Por isso Jesus diz que poucos são os escolhidos. À medida, porém, que cada um for adquirindo forças, através das experiências que terá durante sucessivas encarnações, irá sendo escolhido para testemunhar particularmente o Evangelho, embora o chamado seja geral.


O PEDIDO DOS FILHOS DE ZEBEDEU

(Mc 10:32-34; Lc 18:31-34)
17 E subindo Jesus a Jerusalém, tomou de parte os seus doze discípulos e disse-lhes:
18 Eis aqui vamos para Jerusalém, e o Filho do homem será entregue aos príncipes dos sacerdotes, e aos escribas, que o condenarão à morte:

19 E entrega-lo-ão aos gentios para ser escarnecido e açoitado e crucificado, mas ao terceiro dia ressurgirá.

Jesus caminha ao encontro de seu glorioso suplicio. Deixa a Galileia para não mais tornar a ela em seu corpo carnal. O cenário risonho e florido das margens do lago, o povo bom que o escutava carinhosamente, os sítios tranquilos em que orava, as crianças que o seguiam brincando, tudo vai ser substituído por Jerusalém, a cidade das controvérsias, das discussões, dos sacerdotes orgulhosos e dos rituais religiosos. Em viagem para a cidade fatal, Jesus não se esquece de prevenir os discípulos do que se vai passar. Assim ele os fortificava na fé, para que não vacilassem nos instantes supremos.


(Mc 10:35-40)

20 Então se chegou a ele a mãe dos filhos de Zebedeu, com seus filhos, adorando-o e pedindo-lhe alguma coisa.

21 Ele lhe disse: Que queres? Respondeu ela: Dize que estes meus dois filhos se assentem no teu reino, um à tua esquerda e outro à tua direita.

22 E respondendo, Jesus disse: Não sabeis o que pedis. Podeis vós beber o cálice que hei de beber? Disseram-lhe eles: Podemos.

23 Ele lhes disse: É verdade que vós haveis de beber o meu cálice; mas pelo que toca a terdes assento à minha direita, ou à esquerda, não me pertence a mim o darvo-lo, mas isso é para aqueles para quem está preparado por meu Pai.

Todos aqueles que aspiram a um lugar para o qual ainda não estão preparados, demonstram orgulho, embora sintam-se com a coragem necessária para suportarem os riscos, que a conquista do posto que ambicionam, acarreta. Mesmo que os filhos de Zebedeu bebessem o cálice do Mestre, ainda assim não teriam assento ao lado dele, por não estarem à altura da evolução espiritual de Jesus. Ao responder-lhes Jesus, que os lugares à sua direita ou à sua esquerda dependiam da vontade de Deus, quis dizer-lhes que esses lugares não se davam a qualquer um, mas unicamente aos que se tinham tornado dignos de ocupá-los.

Este episódio simboliza também o grande número de pedidos inconsiderados que continuamente sobem aos pés do Altíssimo. Destes pedidos, uns não podem ser atendidos, por faltar-lhes merecimento; e outros, porque se fossem atendidos, perturbariam a evolução espiritual dos que os formulam. Por isso, é muito conveniente que analisemos muito bem os pedidos que fizermos a Deus em nossas orações; devemos primeiro ver se merecemos o que pedimos e depois, se uma vez atendidos, o que pedimos não nos irá trazer perturbações.


(Mc 10:41-45; Lc 22:24-27)

24 E quando os dez ouviram isto, se indignaram contra os dois irmãos.

25 Mas Jesus os chamou a si e lhes disse: Sabeis que os príncipes das gentes dominam os seus vassalos e que os que são maiores exercitam o poder sobre eles.

26 Não será assim entre vós outros; mas entre vós todo o que quiser ser o maior, esse seja o que vos sirva.

27 E o que entre vós quiser ser o primeiro, esse seja o vosso servo.

28 Assim como o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir, e para dar a sua vida em redenção por muitos.

Estes versículos explicam claramente a resposta que Jesus dá aos filhos de Zebedeu. Quanto mais elevada é a situação de um espírito na hierarquia espiritual, tanto maiores são seus deveres, e mais extensa sua responsabilidade. Os altos postos espirituais requisitam de quem os ocupa, extrema dedicação aos irmãos menores, os quais estão sob sua assistência direta. Os espíritos elevados renunciam a serem servidos, para servirem aos pequeninos, que a misericórdia do Pai colocou sob a proteção e a tutela deles.

Tal é o exemplo que Jesus nos lega. Sua vida é um contínuo devotamento ao próximo; chegou a renunciar à própria personalidade, e por fim deu a vida para remissão até dos mesmos que o levaram ao suplício da cruz.

Em nossos dias, os espíritas são os discípulos que vieram para servir. E no humilde labor evangélico, como médiuns abnegados, como doutrinadores amorosos e como instrutores carinhosos, passam desapercebidos das grandezas terrenas, mas edificando o reino de Deus no recesso dos corações sofredores, aos quais vieram servir.


OS DOIS CEGOS DE JERICÓ

(Mc 10:46-52; Lc 18:35-43)

29 E saindo eles de Jericó, seguiu a Jesus muita gente.

30 E eis que dois cegos, que estavam sentados juntos àestrada, ouviram que Jesus passava; e gritaram, dizendo: Senhor, Filho de David, tem com paixão de nós.

31 E repreendia-os a gente que se calassem. Porém, eles cada vez gritavam mais, dizendo: Senhor, Filho de David, tem compaixão de nós.

32 Então parou Jesus, e chamou-os, e disse: Que quereis que vos faça?

33 Responderam eles: Que se nos abram, Senhor, os nossos olhos.

34 E Jesus, compadecido deles, lhes tocou os olhos. E no mesmo instante viram, e o foram seguindo.

A cura destes dois cegos é um fenômeno material, perfeitamente enquadrado nas leis que regem as curas pelo fluido magnético curativo, que Jesus irradiava em alto grau, e sabia manejar. Todavia, além da parte puramente material deste fato, devemos ver nele também a parte moral.

Sentados à beira da estrada da vida, quantos cegos espirituais aguardam a passagem do Mestre para curá-los da cegueira espiritual, em que vivem O Espiritismo é o moderno enviado a percorrer os caminhos da terra, abrindo os olhos das almas para contemplarem os resplendores da imortalidade.