Entender Conversando

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Capítulo XIII

Questões íntimas

145 — ESTADO DE SAÚDE


— Não, e o problema não é este, a morte. Não temos medo dela, mas sim do ato de morrer. Por enquanto, vou me virando muito bem com a saúde e sinto-me muito alegre e feliz nestes 72 anos de idade, infelizmente, já não aguento trabalhar no mesmo ritmo. Minhas coronárias estão um pouco obstruídas, é verdade, mas isso é normal em pessoas de minha idade. Tenho ido uma vez por mês a São Paulo, para fazer acupuntura com o Dr. Frederico Spaeth, tentando me tonificar organicamente para melhorar sobretudo meu problema circulatório.


— Engordei porque disciplinei mais a minha vida. Mudei minha alimentação: agora como só 200 gramas de comida por dia, e sempre à base de legumes, frutas, ovos e leite. Não é difícil enfrentar a atividade, o negócio é ter mais equilíbrio.



— Recebo menos gente porque estou mais doente, mas não deixo de trabalhar e minha produção de livros não caiu. Pelo contrário, estou até psicografando mais, numa média de 8 a 11 livros por ano.



— Não, não tem. Seria como perguntar ao capim se ele tem sucessor. Capim é assim mesmo: morre um, nasce outro. Este é o meu caso. Considero-me abaixo do capim, pois este pelo menos serve ao boi, enquanto que eu ainda nem fui para o silo, onde então vou servir mais.



— Trabalhei 35 anos como funcionário público e hoje recebo 65 mil cruzeiros por mês como aposentado do Ministério da Agricultura. Esta outra aposentadoria, de que você fala, eu não quero.



— Há pouco tempo me disseram: “Você tem amigos em penúria, mas só vai a São Paulo em carrão de gente rica.” Eu respondi: “Só meus amigos ricos têm carro e como vou sempre da noite para o dia tomar minhas agulhadas em São Paulo, aproveito a oferta das amigos.” Vou sempre no carro de um fazendeiro aqui da região. Mas devo dizer que, além dos meus amigos ricos, sou também amigo dos doentes, dos abandonados e das mães solteiras.

(Aproveito para conversar com uma amiga de Chico que está ao lado: Marlene Rossi Severino Nobre, esposa do Deputado Freitas Nobre, que conhece Chico há 23 anos e vai, segundo ela, “aprender com o Mestre” de vez em quando, “Uma das coisas que mais prezamos, eu e meu marido — diz ela —, é a amizade do Chico e o amor que ele nos transmite.”)



— O Dr. Eurípedes Vieira, meu médico aqui de Uberaba, é de inteira confiança e eu faço tudo o que ele manda. Só não pude atendê-lo numa coisa: deixar o contato com o público, pois a luta dos irmãos que perdem parentes é muito importante. Se eu morrer numa reunião, morro bem. Depois dos 70, a tendência é mesmo caminharmos para o fim, mas é só um problema de tempo físico. Sou da vida e não espero a morte, mas é lógico que não posso querer ter um corpo de 20 anos na minha idade. É o meu corpo que vai fazer contagem regressiva.



— Eu pedi a eles que parassem com este projeto. Que negócio é esse, ainda não morri e nem sei quantos erros ainda vou cometer. Acho que cometo erros, e muitos. Um deles: eu deveria ter mais tempo para receber, estar e conversar com todos os que me procuram, mas não posso ficar a gosto com a vida comunitária. Tenho amigos espíritas e Espíritos. A esses últimos não posso enganar ou largar, como faço com os outros. Meus patrões (referindo-se aos Espíritos que por ele se comunicam) são muito exigentes.


— Vou contar uma visão que tive. Certa vez, tendo ficado de cama quatro dias com uma hemorragia no olho esquerdo, que quase não funciona, recebi a visita de Emmanuel. Ele chegou ao meu quarto e disse: “Que é isso, vamos trabalhar! Ter dois olhos é luxo, você tem o outro em boas condições.” Levantei-me depressa e fui trabalhar.



— Os que me criticam não vêm me ajudar. Por isso, a porta de minha casa tem de continuar fechada. Lá aparece todo tipo de exigência e eu não posso atender a todas, senão gasto o dia em conversa. Deixo para encontrar meus irmãos no Centro Espírita.

(Enquanto conversa, Chico vai dando uma palavra de consolo aos que passam na fila. Noto que há muitas mulheres com crianças.)



— São mães solteiras, que admiro muito, porque não fizeram aborto, apesar dos companheiros terem se mandado, neste mundo de Deus. Elas trabalham e vêm a nós, que as consideramos nossa família. Se quiserem, podem todas registrar seus filhos no meu nome. (E brinca.) Quando eu morrer, vou passar para a história como um verdadeiro marajá. As mães não abandonam nunca. Caso de mãe delinquente é doença. Temos que analisar os temas sociais com espírito mais humanitário.



— Eu defendo a mulher. Admito que, se o esposo precisar, e em cooperação para completar o orçamento da família, ela possa trabalhar fora. Acho que no futuro as leis sociais vão ter que amparar mais a mulher.



— Estou pedindo a Deus para que ele acabe no nascedouro.



— Sou brasileiro e gosto muito de futebol. Estou com esperanças na próxima Copa do Mundo. Sou Flamengo no Rio, Atlético em Minas e Coríntians em São Paulo. O Coríntians, como o próprio nome da torcida indica — a Fiel —, nos dá uma grande lição de persistência.



— Gosto de música que seja boa, e não ululante. Nem muito clássica nem muito brejeira.



Antes de encerrar a peregrinação, Chico Xavier convida os colaboradores mais próximos a que o acompanhem: “Fico na cama até às seis, mas vocês podem ficar lá em casa conversando.” E sai, ao som do Peixe Vivo, entoado em coro pelos habitantes da Vila Pássaro Preto.


Francisco Cândido Xavier
Emmanuel


Francisco Cândido Xavier


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