…Até o Fim dos Tempos

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CAPÍTULO 11

O Mais Importante

O partido dos fariseus, desde o momento da helenização da cultura judaica insurgiu da forma violenta contra os inovadores. A intolerância acirrava os ódios e, várias vezes, levantaram-se os mais exaltados, que foram vencidos em guerras cruentas quão sanguinárias.

Judas de Sarifeu ou Mateus de Margalot, vencidos pelos adversários, foram queimados vivos, acabando-se as ambições do predomínio das suas ideias apaixonadas.

De pequena monta aconteceram sedições periódicas, tentando reconquistar os espaços perdidos, sendo que ficara célebre pela tragédia a encabeçada por Gamala que, às margens do Tiberíades, desfraldava a bandeira que tinha como lábaro: A liberdade vale mais que a vida.

O farisaísmo pretendia restabelecer a pureza e a prática exagerada da Lei, vivendo de forma subterrânea, que não fosse detestado pelos governantes, exigindo, porém, subserviência e entrega total ao prescrito, mesmo que de forma hipócrita, na qual a aparência se fazia mais importante do que a realidade.

Exigia o cumprimento dos mínimos comportamentos estabelecidos, desde o número de passos que se podia dar em um Sábado, até o tamanho e peso de qualquer volume a ser conduzido, a forma de preservar a água para as abluções, os alimentos e o vestuário, imprimindo a marca odienta da fiscalização contra os erros alheios, cerrando os olhos às próprias indignidades que se permitiam aos seus membros.

Implacável, encontrava-se por toda a parte, como praga destruidora em seara de esperanças, espalhando desde as mais remotas aldeias da Judeia até às longínquas paragens da Galileia.

A ambição da governança não lhe era desprezada, tudo fazendo para conseguir atemorizar aqueles que se lhes opunham, urdindo intrigas vis e espalhando mentiras ardilosas, quão infames.

Jesus não se pôde furtar à sua presença peçonhenta, e onde se anunciava, lá se encontravam os esbirros sofistas do partido infame.


* * *

Os céus resplandeceram ante as claridades abençoadas da Primavera e Jesus transitava pelas paisagens luminosas da Galileia, descendo pela estrada de Naim, mergulhando nos campos dourados de trigo em fogo.

Os discípulos seguem-no.

É um Sábado, e a marcha se fará extensa. Deverão chegar ao lago onde a multidão os aguarda.

O próprio Mestre exulta. Uma alegria domina-O e Ele sente que o reino se espraiará como os grãos daquela seara que somente após triturados alimentam e dão vida. Então será necessário que Ele também experimente o martírio, sejam triturados os Seus ossos, para que o Seu sangue prepare as carnes amassadas, o pão da luz que sustentará a humanidade por todos os dias do futuro.

A Natureza em festa prepara-se para se transformar na pauta musical em que Ele cantará a Sinfonia do eterno amor.

Ao cair da tarde chegam a Cafarnaum e seguem diretamente para a casa de Simão Pedro.

Os comentários antecederam-nos e alguns murmúrios chegaram aos ouvidos dos fariseus: Tanto Jesus como os Seus comeram alguns grãos de trigo na viagem, dominados pela fome, e isso era proibido no dia de Sábado - colher e alimentar-se.

Os covardes, porém, sem maiores argumentos silenciaram e aguardaram.

Uma semana depois, no próximo Sábado, ei-lo na sinagoga de Cafarnaum, onde deverá falar.

O Seu verbo se ergue e as interpretações das Escrituras passam a ter diferenciadas musicalidade - são os anúncios do reino de Deus.

Estimulados por algum malicioso, que desejava provocar um escândalo e surpreender o Rabi em desrespeito para com a Lei, alguém sugere a um enfermo que tem uma das mãos mirradas, para que lhe peça a bênção de cura, o que era proibido atender-se naquele dia.

Seria grave ofensa à Lei, em plena sinagoga, no dia da proibição, reservado ao repouso, atrever-se a operar, diante dos representantes sacerdotes e deles mesmos, dos funcionários, do povo e dos próprios réprobos, que eram os fariseus, o milagre solicitado, mesmo que sob a ajuda de Deus.


Percebendo toda a trama, que se exteriorizava dos escusos abismos do caráter venal dos Seus inimigos, o Mestre, sentindo-se desafiado, e já disposto a enfrentar a tempestade política, antegozando o sacrifício a que se iria submeter, propôs ao enfermo:

—Levanta-te, e fica de pé no meio da sala.


O enfermo, que não se dera conta da ocorrência maldosa, pôs-se em pé, aturdido, e o Mestre, sereno e nobre, voltou-se para a massa que acompanhava o desenrolar do acontecimento, e interrogou:

—Quero que me respondais a uma pergunta. É lícito, nos sábados, fazer bem ou fazer o mal?

Salvar uma vida ou matar?

Houve uma perturbação feral, em forma de perplexidade ou receio. Os inimigos compreenderam onde Ele desejava chegar. Pusilânimes, possuíam mente ágil e sabiam antecipar ocorrências, porquanto era essa a sua habilidade maior para confundir os opositores. Não tendo outra alternativa, porém silenciaram.


O Mestre prosseguiu, impertérrito:

—Estende a tua mão!

Os olhos tranquilos do Senhor irradiaram estranha claridade. Ele distendeu a mão generosa na direção do doente, e enquanto tremia, tinha-se a impressão de que a massa de carne, ossos, vasos e veias movimentavam-se dentro de um molde, de uma forma invisível e recuperava a normalidade.

O espanto tomou conta de todos e o deficiente pôs-se a gritar. Havia recuperado a mão enferma, que movimentava, saudável e ágil.


Ante o silêncio que se fez natural, espontâneo, surpreendente, o Rabi concluiu, impondo respeito aos inimigos:

—O Sábado foi feito por causa do homem, e não o homem por causa do Sábado.

Sem conceder-lhes qualquer outra oportunidade, deu-lhes as costas e saiu.

Será sempre assim que Ele agirá. A criatura é maior que as circunstâncias; o Bem prevalecerá sempre, e porque vem de Deus, é expressão do Pai. As aparências e superficialidade do pensamento humano, suas paixões e apetites desenfreados cedem lugar ao que é legítimo e transcendente, que é a vida em si mesma.

As leis terrenas foram elaboradas para coibir o abuso, desrespeito aos direitos dos outros, a exaltação dos instintos servis, a inferioridade, nunca para se transformarem em uma adaga ameaçadora, oscilante no alto, em débil fio, prestes a cair e decepara cabeça de qualquer criatura inadvertida.

Mesmo o Estado tem limites sobre a vida e toda vez que os extrapola perde o respeito por si mesmo e os seus administradores se transformam em títeres, em verdugos soberbos, aves de rapina que triunfam sobre os cadáveres nos quais se banqueteiam.

Jesus cresce como o Dia que avança saindo da Noite.

Os Seus inimigos se multiplicavam, dominados pela inveja, pela própria inferioridade, pela morbidez das suas mesquinharias.

Todos os homens e mulheres de bem, idealistas, voltados para as causas enobrecedoras da Humanidade os sofrerão. Eles permanecem na Terra como obstáculos ao progresso.

Incapazes de amar, de servir e de tornar-se modelos, odeiam a todos aqueles que o são.

Levantam-se sempre para anatematizar, discutir e apontar erros.

Jesus nunca lhes deu importância. O mesmo devem fazer aqueles que estejam iluminados pelos convites do Evangelho e da Vida.


Lucas 6:6-11




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Lucas 6:6

E aconteceu também noutro sábado que entrou na sinagoga, e estava ensinando; e havia ali um homem que tinha a mão direita mirrada.

lc 6:6
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