Caminhos do Amor, Os

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Capítulo II

Drama paterno


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Era um homem de bem, dono de um lar feliz;

Recebera da vida tudo quanto quis:

Uma esposa distinta, uma vultosa herança,

Um filho, — um filho só que lhe trouxera à vida

Uma nora querida

E um neto que lhe abria um mundo de esperança.


Tudo era céu azul, no entanto, um dia, a morte,

Sem o menor aviso,

Num tremendo improviso,

Arrebatou-lhe a esposa nobre e forte.

E, desde então,

Ele sentiu sangrar-lhe o coração.


Tangido pela dor,

Chamou o filho em confidência,

O filho em que encontrara o apoio da existência,

E entregou-lhe em confiança,

De modo comovente,


Tudo o que se lhe erguia em propriedade

Documentadamente:

As lojas da cidade,

A formosa vivenda

Na qual fizera o próprio lar,

A casa grande da fazenda,

Terras, benfeitorias,

As ações em diversas companhias

E os créditos em bancos…


Depois, falou ao filho em termos francos:

— Filho, sem tua mãe já não tenho mais vida…

Tudo o que é nosso é teu…

Sou alguém a morrer com tarefa cumprida.

Rogo que me reserves tão somente

Um quarto independente,

Em nossa própria casa

Onde eu possa viver

Na saudade terrível que me arrasa…


O moço agradeceu, sorriu e, após uma semana,

Deu ao pai, afinal,

Um estreito recanto, oculto no quintal,

Por nova moradia;

Um telheiro a cair que ele devia

Atingir através de porta lateral.

O pai não se queixou, mas um tanto humilhado,

Instalou-se no quarto, insalubre e isolado.

Em seguida notou, admirado e atento,

O filho transformado,

A demonstrar

Grave mudança de comportamento.


A mansão familiar perdera a paz antiga,

Noite a noite, era festa, entre jogos de azar,

Insultos e baldões, ostentação e briga,

Estranhas situações

Que o triste genitor não podia evitar.


Começou para ele, alma limpa e sincera,

Um modo de viver que não quisera.

Quando caía a noite, ei-lo em longas passadas…

Ia em busca de antigos companheiros,

Para escutar, de novo, histórias relembradas

De inesquecíveis parelheiros

Seguindo cães velozes nas caçadas…


Um cálice de aniz, em dado instante,

Tornava a maioria mais falante;

Ele, sóbrio, porém, só bebia água pura,

Água simples usada sem mistura…

Tarde, voltava ele, a passo lento,

Não desejava ver o filho amado,

Em tresloucado movimento.


Nunca bebera alcoólicos e adendos,

Entretanto, os vizinhos

Para ele inventaram

Casos injuriosos e escarninhos.

O filho já tratava o pai por beberrão

Na base de calúnia e palavrão.


Certa manhã, o moço orgulhoso e excitado,

Vara o quarto do pai, a fim de repreendê-lo…

Ele está debruçado

Sobre mesa pequena,

A revelar enorme desmazelo.


Grita-lhe o filho irado:

— Chega, velho infeliz,

Estou certo de tudo o que se diz,

Já conheço esta cena:

Bêbado até agora!…

Vou removê-lo sem demora,

Não mais o quero aqui,

Nada posso fazer, nem respondo por si…

More onde quiser, com qualquer companhia,

Nas espeluncas da periferia.


Arranje, agora mesmo, a sua mala e suma!…

A minha tolerância está no fim,

Não quero vê-lo, em parte alguma,

Afaste-se de mim…

De hoje em diante, fuja de meu lado,

Não mais aceito um pai embriagado…

Levante-se, converse, venho ouvi-lo

Na nova condição de bêbado de asilo!…


No entanto, o interpelado

Continuava debruçado

Sobre mesa pequena…


Arremessa-lhe o moço uma palavra obscena…

Logo após, ostentando falso brio,

Toca no genitor

E vê que ele se encontra enrijecido e frio…

Só então o rapaz sob espanto indizível

Desfere um grito horrível…


Chorando em desespero e desconforto,

O filho descobriu que o pai estava morto.




Maria Dolores
Francisco Cândido Xavier


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