Nas Pegadas do Mestre

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CAPÍTULO 100

A religião de Jesus

O Batista estava no cárcere à mercê de Herodes, o tetrarca. Rumores confusos pairavam em torno do prometido Messias que já se achava na Terra. Alguns diziam: É ele em verdade o Cristo das profecias; outros, porém, afirmavam o contrário.

O Profeta dos desertos que o havia batizado nas águas do Jordão, e, nesse momento, ouvia a voz do Céu testificar sua origem divina, sabia perfeitamente que Jesus era o Cristo.

Prevendo, como profeta, o fim que lhe estava reservado, tratou de encaminhar seus discípulos para Aquele de quem não se julgava digno de atar as correias das sandálias.


Enviou, então, a Jesus dois deles que costumavam visitá-lo na prisão, dizendo-lhes: "Ide a Jesus, e perguntai-lhe: És tu mesmo o Cristo esperado?"

Partiram os emissários em demanda do Filho de Deus; e, encontrando-o, disseramlhe tal como lhes fora recomendado.


O Mestre, antes de lhes responder, curou inúmeros enfermos de várias moléstias, aliviou muitos flagelados por maus espíritos, e, em seguida, disse-lhes: "Contai a João tudo que vistes e ouvistes: os cegos vêem, os surdos ouvem, os paralíticos locomovemse livremente, os leprosos ficam limpos, os mortos ressuscitam, e aos pobres anuncia-selhes o Evangelho; e bem-aventurado é aquele que em mim não achar motivo de tropeço. "

E assim se deu a conhecer o enviado do Céu. Se tal característico distingue o Cristo, tal característico deve distinguir a sua Igreja. O Cristianismo, portanto, é a religião do amor objetivada na solidariedade humana.

É notório haver Jesus encartado no número das maravilhas da sua religião o anunciar-se o Evangelho aos pobres. Por tal devemos compreender, não as prédicas, as teorias anunciadas com mais ou menos habilidade dos púlpitos e das tribunas, mas o conceder-se aos humildes e bem-estar, as regalias e o conforto a que eles têm direito, abolindo-se os privilégios odiosos que vêm, através de todos os tempos, cavando abismos de separação entre as classes sociais.

Anunciar, pois, o Evangelho aos pobres significa assisti-los em suas necessidades morais e materiais, atendê-los em suas justas aspirações, contribuindo para melhorar a situação angustiosa em que eles, por vezes, se encontram: significa amá-los como a nós próprios, fazendo por eles o que queremos para nós mesmos, testemunhando assim a nossa solidariedade em atos de justiça e de misericórdia, conforme o exemplo de JesusCristo.

A religião do Filho de Deus é aquela que se levanta sobre as bases desta tríade bendita: Amor, Igualdade, Liberdade. Para ela o mundo caminha, embora assim não pareça: e bem-aventurados aqueles que nessa fé não encontram motivo de escândalo.

Julgamento macabro Assim se deve denominar o júri a que se reporta a seguinte notícia:

"Jerônimo Nailor, processado por crime de estelionato, está preso na Casa de Detenção, do Rio; e, achando-se gravemente doente, impossibilitado de se locomover pediu ao juiz, Dr. Vaz Pinto Coelho, que procedesse ao julgamento na própria detenção, no que foi atendido. “Anteontem, às 13 horas, na sombria enfermaria daquele presídio, deram entrada o juiz, Dr. Vaz Pinto Coelho, o procurador da República, Dr. Buarque Pinto Guimarães, o advogado Dr. Pinto Lima, e o escrivão Cunha Pinto.


"Estes senhores acercaram de um leito, onde um homem esquálido, de olhos esbugalhados, agonizava. . . “Vinham esses representantes da lei fazer o julgamento do moribundo, o réu Jerônimo Nailor, acusado de haver, em Novembro de 1911, abonado uma firma falsa para receber no Tesouro a quantia de 6:000

$000 que pertencia ao Padre Giacomo Cocole.

"O procurador da República leu o libelo, fêz a acusação; o advogado da defesa, Dr.

Pinto Lima, defendeu o acusado, e pediu ao juiz a sua absolvição.

"Os espectadores dessa cena eram presidiários e doentes, que, de faces encovadas e de olhos fundos, mal se erguiam do leito, curiosos.


"O réu era indiferente a tudo o que se passava e estertorava já, quando, seguido pelos olhares doentios dos correcionais, o juiz, o procurador, o advogado e o escrivão desapareceram pelo portão da enfermaria. "

Eis como se demonstra a indefectibilidade da justiça humana. Julga-se um moribundo que estertora no catre de um calabouço, e abrem-se de par em par as portas palacianas para os biltres de toda a espécie, responsáveis pela ruína da sociedade.


Ademais, como houve o padre Giacomo de Cocole os 6:000

$000 que deram lugar à prisão do culpado? Naturalmente é o produto de missas pelas almas do purgatório. Ora, como se ousa punir Jerônimo Nailor por crime de estelionato, quando o padre, queixoso, praticou também o estelionato, iludindo a boa fé de dezenas de incautos capazes de suporem que com dinheiro se obtêm passaportes para o Céu?


Bem disse Jesus aos seus discípulos: "Se a vossa justiça não for superior à dos escribas e fariseus, de maneira alguma entrareis no reino dos Céus. "


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