Nas Pegadas do Mestre

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CAPÍTULO 140

Cinzas

Quarta-Feira de cinzas - tal se denomina o início da Quaresma.

Neste dia, os fiéis às ordenanças papalinas devem comparecer ao templo a fim de receberem na teta uma cruz de cinza. Semelhante cerimônia, segundo a liturgia romana, quer dizer: "És pó, e em pó te has-de tornar. " O objeto deste símbolo é, como se vê, incutir no espírito dos simples a ideia da fragilidade do seu ser, da instabilidade da sua vida, da nenhuma importância da sua individualidade.

Cinza é pó, é "nada" que resta do que foi, mas já não é.

O homem é cinza, é pó, é nada. Não deve, portanto, ter vontade própria; não deve alimentar aspirações; não deve lutar contra as adversidades que o assediam nem contra os flagelos que o malsinam; não deve insurgir-se contra a Escolástica, embora ela venha patrocinando injustiças e sustentando inverdades; não deve revoltar-se contra os poderes estabelecidos, ainda que estes sejam imorais, corruptos e tiranos: eis, em resumo, o que quer dizer a Igreja na mística linguagem de sua liturgia.

O povo ignora tal interpretação, pois na liturgia romana como na diplomacia internacional, como em todo conúbio onde se concertam processos de exploração, as coisas apareceram com duas faces distintas; a esotérica e a exotérica; isto é, a privativa dos que exploram, e a divulgada aos que são explorados.

O ideal da Igreja é dominar o homem escravizando-lhe a razão e a consciência.

Para atingir tal “desideratum" nada melhor que apoucar-lhe o ânimo, fazendo-o descrer de si mesmo e de suas energias, considerando-se cinza que o vento espalha.

Precisamente o inverso é o objetivo da verdadeira religião, da qual Jesus se fêz o expoente. Ele disse aos seus discípulos: "Tende bom ânimo, eu venci o mundo. " Tal expressão implica virtualmente a ideia de que seus discípulos deveriam também vencer como ele venceu.


Disse mais: "Vós (seus discípulos) podeis fazer tudo que eu faço. " "Pai, quero que eles sejam um comigo, como eu já sou um contigo. "

Por essas palavras, como pela síntese da doutrina messiânica, verifica-se que o Mestre tinha em vista levantar o ânimo do homem, concitando-o à luta contra o mal, à porfia na conquista do bem, à disputa na aquisição da liberdade cada vez mais ampla e perfeita.

Jesus quer que o homem tenha fé em Deus, e também em suas próprias possibilidades. Visa a erguer a mente e o coração do homem, para redimi-lo. A Igreja aspira hoje, como sempre, a abater-lhe as energias, para o reduzir à condição de servo.

Não se pretende — na cerimônia da cinza — combater o orgulho e a vaidade humana. Se tal fosse o escopo do Romanismo, ver-se-ia certamente predominar nos costumes do seu alto clero a singeleza e a humildade, em lugar do requintado luxo, da soberba desmedida que o mesmo ostenta por toda a parte do mundo onde assenta o seu perigoso domínio.

Não somos cinza: somos seres imortais, fadados por Deus a gloriosos destinos;

somos partículas da Divindade, fomos criados à sua mesma imagem e semelhança.

É tempo de despertar, ó vós que dormis. Deus quer o homem de busto ereto e cabeça levantada fitando o Céu. Quer filhos varonis, cientes do seu valor, capazes de lutar e vencer o pecado e as servidões.

Deus não quer covardes, ânimos abatidos, frontes cabisbaixas mirando o pó da terra.

Quem tiver ouvidos de ouvir, ouça.




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