Nas Pegadas do Mestre

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CAPÍTULO 16

O estribilho fatal

É muito comum ouvirmos, aqui e acolá, este estribilho: "Se eu fosse rico, bem sei o que faria: ao pé de mim jamais haveria necessitados. Mas, sou pobre, nada posso fazer. "

"Se eu tivesse instrução, se soubesse falar, discorrer com acerto e precisão, defenderia com denodo e coragem a causa do Bem e do Direito, da Verdade e da Justiça.


Mas, não tenho saber algum, vi-me impossibilitado, por isto ou por aquilo, de estudar e de me instruir; portanto, que posso fazer?"
"Se eu fosse médico, ocupar-me-ia de preferência em atender com carinho e solicitude aos enfermos pobres, esses desfavorecidos da fortuna, que vivem desprezados, e sucumbem inúmeras vezes à míngua de assistência. Mas, não sei curar, ignoro de todo a ciência de Esculápio, que hei-de fazer?"
"Se eu ocupasse posição saliente na sociedade, se tivesse prestígio perante os que governam; muitas iniquidades eu saberia evitar, muitos abusos saberia prevenir; mas não tenho influência alguma, que posso, logo, fazer?"
"Se eu dispusesse de tempo, ocupar-me-ia das coisas espirituais. Procuraria educar, desenvolver as faculdades de meu espírito. Investigaria o campo infinito do ignoto; e, de todos os conhecimentos que conquistasse, faria coparticipantes o maior número possivel de pessoas. Mas, infelizmente, não tenho tempo!"
"Se eu fosse industrial ou comerciante, tornaria os operários e caixeiros em meus interessados; mas, ai de mim! vivo lutando pela vida. "
"Se eu fosse profeta— alega ainda um derradeiro —, procederia com o máximo escrúpulo, obraria prodígios em benefício da Humanidade. "

E onde iríamos parar se continuássemos a declinar o enfadonho estribilho da condicional — "se eu fosse", "se eu tivesse"?

Porque será que todos se julgam deslocados, quando se reportam à prática do bem, ao cumprimento do dever moral? Porque não tem o rico vontade de socorrer os pobres?

Porque não se compadecem os médicos dos enfermos indigentes? E o homem culto, porque não pugna pelos ideais elevados e nobres, dando-lhes o melhor de sua inteligência e saber? E o industrial, e o comerciante prósperos, porque não interessam em seus gordos lucros os operários e auxiliares honestos e diligentes? E o profeta, porque desdenha e avilta o dom que o céu lhe outorga? Porque todos querem fazer o que não podem, e deixar de fazer o que podem? Porque não faz cada um o bem onde está, e como se acha? Porque enxergam o dever alheio, e não vêem o seu próprio dever? Porque pretendem alterar a ordem que o destino de cada um tem estabelecido? Porque lamentam com jeremiadas "o não fazer" por "não poder", quando descuram daquilo que podem e devem fazer? Porventura Deus vai julgar o homem pelo que ele deixou de fazer por não poder, ou antes o julgará por aquilo que deixou de fazer podendo fazê-lo? Que nos importa, pois, o que não podemos fazer? Antes o que nos importa, e muito, é o que podemos fazer. Portanto, antes de nos lamentarmos do que não podemos fazer, façamos, desde logo, o que podemos, seja lá o que for. E a verdade é que todos podem alguma coisa, muita coisa mesmo, desde que queiram. As lamúrias são filhas do subterfúgio, do sofisma, da má vontade, do egoísmo numa palavra.

O dever de cada um é o dever simples, é o dever imediato. Faça cada um o que pode e o que deve, no momento. Ulteriormente, à medida que lhe seja possivel, fará o mais e o melhor.

Há pais que abandonam seus lares e seus filhos, e andam pregando moral às massas. Insensatos! pretendem fazer o mais sem fazer o menos. Pretendem atingir o dever longínquo, antes de haverem cumprido o dever imediato.

Evangelizadores há que pretendem doutrinar homens e espíritos, sem curar dos seus próprios defeitos. Loucos! querem aperfeiçoar a outrem sem primeiramente se aperfeiçoarem a si mesmos. Querem dar antes de possuir.

Tal como somos e como estamos, cumpramos o dever conforme ele se nos vai apresentando na ocasião, segundo as luzes de nossa consciência, espelho fiel onde a justiça indefectível de Deus se reflete.


Abaixo os fatais estribilhos: "Se eu fosse" e "Se eu tivesse!"


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