Nas Pegadas do Mestre

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CAPÍTULO 28

Justiça e misericórdia

A justiça de Deus é a expressão de sua misericórdia. A misericórdia de Deus é a expressão de sua justiça.

Insensato aquele que pretendesse apegar-se a um destes atributos, menosprezando o outro. Em Deus, justiça e misericórdia são elementos que se confundem num todo indissolúvel.

O Filho Pródigo, da parábola, foi recebido caridosamente pelo pai, que festejou seu regresso, promovendo um grande banquete. Mas, não importará num ato de justiça aquele procedimento do pai? Certamente, que sim. O moço estava arrependido após haver suportado, com resignação, as consequências de seus desvarios. Demandava o lar que outrora abandonara. Estava regenerado; havia compreendido e confessara a grandeza de sua culpa. Logo, a atitude do pai, recebendo-o amoravelmente em seus braços, foi um ato de justiça expresso através da sua misericórdia.

Se o pai deixasse de agir precisamente como agiu, não seria justo, porque seria cruel. Sendo, pois, misericordioso, foi também justo. Se, de outra sorte, impedisse de qualquer forma que o Filho Pródigo sofresse o efeito natural de seus pecados, não seria misericordioso, porque seria injusto.

O objeto da justiça é a misericórdia; o objeto da misericórdia é a justiça: — eis uma grande verdade, por mais paradoxal que, à primeira vista, pareça.

A justiça de Deus tem por fim regenerar o pecador, e, de fato, regenera-o. A lei imutável da causalidade, fazendo fatalmente racair as consequências do mal sobre quem o pratica, acaba incompatibilizando o culpado com a culpa. O pecador convencer-se-á, após amargas experiências, de que toda dor que o fere, e acerbamente o punge, já no físico, já no moral, é fruto de seus atos, é efeito de causas por ele mesmo criadas. Daí o horror que o pecado virá causar-lhe inevitavelmente.

Imaginemos, agora, se Deus houvesse organizado suas leis de modo que somente a misericórdia se exercesse. Qual seria o resultado? O pecado perpetuar-se-ia; e, com isso, o homem jamais se elevaria acima dos vícios e das paixões, tornando-se o eterno escravo destas; jamais poderia ascender na senda do progresso, permanecendo cristalizado na animalidade, que é a vida das sensações. Se tal fora o destino reservado por Deus ao homem, não seria isso a implícita negação de sua misericórdia?

Que benefício poderá haver em evitar a dor, privando ao mesmo tempo o homem da conquista do seu maior bem — a liberdade, o triunfo do espírito sobre a matéria?

Que benefício recebem dos pais esses filhos aos quais tudo foi permitido na época perigosa do desabrochar das paixões? Os pais que assim procedem contribuem para a ruína dos filhos, ao passo que muito bem lhes poderiam ter feito se à misericórdia aliassem a justiça. Deus é pai, disse Jesus, o Filho Dileto. Mas, é pai cujo caráter é perfeito. Ele quer o bem dos seus filhos, e sabe querê-lo inteligentemente. Por isso é justo, e, ao mesmo tempo, misericordioso. Sua justiça não compromete sua misericórdia, e sua misericórdia não compromete sua justiça.




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