Nas Pegadas do Mestre

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CAPÍTULO 68

Socialismo cristão

"Sentando-se Jesus em frente ao gazofilácio, observava como o povo ali deitava o dinheiro. Os ricos colocavam grandes quantias; mas, vindo uma pobre viúva, lançou duas pequenas moedas no valor de sete centavos. E chamando seus discípulos, disse-lhes: Em verdade vos digo que esta pobre viúva lançou mais no gazofilácio que todos os ofertantes, porque os ricos deram do que lhes sobrava; ela, porém, da sua pobreza deu tudo o que possuía, tudo o que tinha para seu sustento. "


(Evangelho.)

Se é certo, como disse o Mestre, que a mesquinha oferta da viúva tem mais valor que as vultosas dádivas dos ricos, porque representa maior esforço, é certo também que o trabalho dos humildes deve ser relativamente equiparado ao trabalho dos grandes.

O dinheiro tem valor puramente convencional. O que de fato representa valor real são as nossas energias quando em plena atividade. É dessas energias que surgem as cidades, as metrópoles com todas as suas expressões de progresso. Ora, energias tanto se desprendem do cérebro como dos músculos. O trabalho intelectual, por conseguinte, não vale infinitamente mais que o trabalho manual.

O operário e o jornaleiro que despendem o máximo de seu esforço no desempenho dos seus modestos labores, devem perceber uma remuneração mais ou menos equivalente àquela que percebem os intelectuais.

O arquiteto traça o plano de um edifício: o operário executa-o. Este recebe um nonada pelas energias de seus músculos, enquanto aquele outro faz jus a pingues honorários pelas energias de seu cérebro. Ambos deram o que tinham, ambos se desempenharam, valendo-se de suas respectivas aptidões. Porque, então, tamanha desigualdade na retribuição?

O advogado exige, por um simples parecer, dezenas, centenas de cruzeiros. O jornaleiro labuta de manhã à noite por vinte e cinco tostões. O médico faz-se pagar a seu talante pela cura que faz, e até pela que não faz. O operário ganha sempre pouco, e isso mesmo quando se desempenha cabalmente do mister a que se dedica. Onde a justiça?

Não são todos necessários — operários e intelectuais? Não empregam ambas as classes o mesmo processo no trabalho — despesas de energias? Que importa que uns exercitem os músculos e outros o cérebro? As mãos serão superiores aos pés? As pernas valerão menos que os braços? A cabeça é mais que o tronco? Ou não serão, antes, iguais todos os membros de nosso corpo, visto que todos são igualmente necessários e indispensáveis na harmonia do conjunto? O mesmo critério deve vigorar no que concerne aos membros da sociedade.

Caruso, deleitando com sua voz maviosa os nababos novaiorquinos, legou aos parentes colossal fortuna. O mestre-escola da roça morre e deixa a família na miséria.

Mas, dir-se-á, Caruso foi um artista. O sapateiro também o é, e muito digno. A arte de Caruso é de outra esfera mais elevada? Que importa? Uma é bela, outra é útil. O ouro é mais caro que o ferro, mas este é mais útil que aquele. A privarem-nos de um deles, seja antes do ouro, com todo o seu valor fictício, que do ferro com sua inestimável importância unilitária.

As belas artes devem ser cultivadas porque contribuem para a educação dos nossos sentimentos. As artes que não são belas, mas são necessárias, devem por sua vez merecer estima pelos proventos, benefícios e comodidades que nos proporcionam. Ao elevarmos uma, não amesquinhemos outra.

Se a vossa Justiça, disse o Mestre aos seus discípulos, não for superior à dos escribas e fariseus, não entrareis no reino de Deus.

Capital e trabalho, cérebro e músculos, que até aqui viveram em constantes atritos, tudo têm a lucrar fazendo as pazes. Sob a égide bendita do puro Cristianismo, devem-se irmanar, vivendo em perfeita harmonia como fatores que são do progresso material e moral da Humanidade. E "bem-aventurados serão aqueles que em mim (em minha doutrina) não encontrarem motivos de escândalo", preveniu o Senhor.




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