Contos e Apólogos

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Capítulo XIV

A lição do discernimento


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Finda a cena brutal, em que o povo pretendia lapidar a mulher infeliz, na praça pública, (Jo 8:1) Pedro, que seguia o Senhor, de perto, interpelou-o, zelosamente:

— Mestre, desculpando os erros das mulheres que fogem ao ministério do lar, não estaremos oferecendo apoio à devassidão? Abrir os braços no espetáculo deprimente que acabamos de ver não será proteger o pecado?

Jesus meditou, meditou… e respondeu:

— Simão, seremos sempre julgados pela medida com que julgarmos os nossos semelhantes. (Mt 7:1)

— Sim — clamou o apóstolo, irritado —, compreendo a caridade que nos deve afastar dos juízos errôneos, mas porventura conseguiremos viver sem discernir? Uma pecadora, trazida ao apedrejamento, não perturbará a tranquilidade das famílias? Não representará um quadro de lama para as crianças e para os jovens? Não será uma excitação à prática do mal?

Ante as duras interrogações, o Messias observou, sereno:

— Quem poderá examinar agora o acontecimento, em toda a extensão dele? Sabemos, acaso, quantas lágrimas terá vertido essa desventurada mulher até à queda fatal no grande infortúnio? Quem terá dado a esse pobre coração feminino o primeiro impulso para o despenhadeiro? E quem sabe, Pedro, essa desditosa irmã terá sido arrastada à loucura, atendendo a desesperadoras necessidades?

O discípulo, contudo, no propósito de exalçar a justiça, acrescentou:

— De qualquer modo, a corrigenda é inadiável imperativo. Se ela nos merece compaixão e bondade, há então, noutros setores, o culpado ou os culpados que precisamos punir. Quem terá provocado a cena desagradável a que assistimos? Geralmente, as mulheres desse naipe são reservadas e fogem à multidão… Que motivos teriam trazido essa infeliz ao clamor da praça?

Jesus sorriu, complacente, e tornou:

— Quem sabe a pobrezinha andaria à procura de assistência?

O pescador de Cafarnaum acentuou, contrariado:

— O responsável devia expiar semelhante delito. Sou contra a desordem e na gritaria que presenciamos estou convencido de que o cárcere e os açoites deveriam funcionar…

Nesse ponto do entendimento, velha mendiga que ouvia a conversação, caminhando vagarosamente, quase junto deles, exclamou para Simão, surpreendido:

— Galileu bondoso, herdeiro da fé vitoriosa de nossos pais, graças sejam dadas a Deus, nosso Poderoso Senhor! A mulher apedrejada é filha de minha irmã paralítica e cega. Moramos nas vizinhanças e vínhamos ao mercado em busca de alimento. Abeirávamo-nos daqui, quando fomos assaltadas por um rapaz que, depois de repelido por ela, em luta corpo a corpo, saiu a indicá-la ao povo para a lapidação, simplesmente porque minha infeliz sobrinha, digna de melhor sorte, não tem tido até hoje uma vida regular… Ambas estamos feridas e, com dificuldade, tornaremos para a casa… Se é possível, galileu generoso, restabelece a verdade e faze a justiça!

— E onde está o miserável? — gritou Simão, enérgico, diante do Mestre, que o seguia, bondoso.

— Ali!… Ali!… — informou a velhinha, com o júbilo de uma criança reconduzida repentinamente à alegria. E apontou uma casa de peregrinos, para onde o apóstolo se dirigiu, acompanhado de Jesus que o observava, sereno.

Por trás de antiga porta, escondia-se um homem, trêmulo de vergonha.

Pedro avançou de punhos cerrados, mas, a breves segundos, estacou, pálido e abatido.

O autor da cena triste era Efraim, filho de Jafar, pupilo de sua sogra e comensal de sua própria mesa.

Seguira o Messias com piedosa atitude, mas Pedro bem reconhecia agora que o irmão adotivo de sua mulher guardava intenção diferente.

Angustiado, em lágrimas de cólera e amargura, Simão adiantou-se para o Cristo, à maneira do menino necessitado de proteção, e bradou:

— Mestre, Mestre!… Que fazer?!…

Jesus, porém, acolheu-o amorosamente nos braços e murmurou:

— Pedro, não julguemos para não sermos julgados. Aprendamos, contudo, a discernir.


(.Humberto de Campos)


Irmão X
Francisco Cândido Xavier


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PORÉM Jesus foi para o monte das Oliveiras;

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Mateus 7:1

NÃO julgueis, para que não sejais julgados.

mt 7:1
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