Doutrina-escola

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Capítulo VIII

Na trilha de Allan Kardec

Estudando a vida espiritual, além do túmulo, Allan Kardec, o eminente Codificador da Nova Revelação, apresenta em “O Livro dos Espíritos” algumas definições que será oportuno examinar, a fim de que nós outros, tarefeiros encarnados e desencarnados do Espiritismo, estejamos vigilantes nas responsabilidades que o Plano Superior nos conferiu.


Na pergunta 226, () indaga o apóstolo da Codificação:

— “Poder-se-á dizer que são errantes todos os Espíritos que não estão encarnados?

E os seus elevados mentores responderam:

— “Sim, com relação aos que devam reencarnar. Não são errantes, porém, os Espíritos puros, os que chegaram à perfeição. Esses se encontram em seu estado definitivo.”

Segundo é fácil deduzir, “Espíritos errantes”, na elucidação, não significa Espíritos vagabundos, desocupados, inertes, mas sim sem residência fixa, qual ocorre com todos nós, de vez que, de conformidade com a palavra dos instrutores de Allan Kardec, somente não são considerados “errantes” aqueles “que chegaram à perfeição”, da qual, todos nós, a generalidade das criaturas terrestres, ainda nos achamos imensamente distantes.


Na pergunta 227, () inquire o grande servidor da Verdade:

— “De que modo se instruem os Espíritos errantes? Certo não o fazem do mesmo modo que nós outros?

E o esclarecimento veio, preciso:

— “Estudam e procuram meios de elevar-se. Veem, observam o que ocorre nos lugares aonde vão; ouvem os discursos dos homens doutos e os conselhos dos Espíritos mais elevados e tudo isso lhes incute ideias que antes não tinham.”

A resposta é segura. Os “Espíritos errantes”, isto é, nós outros, os viajores em demanda da perfeição suprema, inclusive a maioria das almas reencarnadas que permanecem na curta romagem do berço ao túmulo e que ainda voltarão muitas vezes ao educandário da carne, encontramos oportunidades de estudo e meios de elevação.

Ora, quem diz “estudo e elevação” refere-se a esforço e trabalho, disciplina e progresso. Assim é que tanto na experiência física quanto na experiência espiritual, propriamente consideradas, nós, os viajores da senda evolutiva, não nos achamos órfãos da organização que nos define os méritos e os deméritos.

Compreender-se-á, então, logicamente, que civilização e autoridade, agrupamento e ordem, escola e dignificação, hospital e penitenciária, embora diferenciados na expressão, escalonam-se e vigem para nós, os milhões de encarnados e desencarnados que vivemos ainda tão longe do acrisolamento absoluto.


Na Pergunta 229, () interroga o Codificador:

— “Por que, deixando a Terra, não deixam aí os Espíritos todas as más paixões, uma vez que lhes reconhecem os inconvenientes?

E os orientadores aduziram:

— “Vês nesse mundo pessoas excessivamente invejosas. Imaginas que, mal o deixam, perdem esse defeito? Acompanha os que da Terra partem, sobretudo os que alimentaram paixões bem acentuadas, uma espécie de atmosfera que os envolve, conservando-lhes o que têm de mau, por não se achar o Espírito inteiramente desprendido da matéria. Só por momentos ele entrevê a verdade, que assim lhe aparece como que para mostrar-lhe o bom caminho.”

A elucidação não deixa dúvidas. Carregamos para além do sepulcro a sombra das ações deploráveis em que nos envolvemos, por efeito das paixões que acalentamos no próprio ser.

Somos prisioneiros das imagens infelizes a que nos afeiçoamos, quando na extensão do mal aos outros e a nós mesmos, imagens essas que se imobilizam, temporariamente, em nossa vida mental, detendo-nos nas grades do remorso e do arrependimento, até que atendamos à expiação necessária.

Em tais condições, a visão das verdades divinas surge em nossa consciência, tão somente à maneira de relâmpago nas trevas que nós mesmos criamos, descerrando-nos o caminho regenerador que nos compete aceitar e seguir.

A morte física, como é racional, não nos subtrai, de improviso, dos íntimos refolhos do Espírito, as consequências dos erros nefastos a que nos precipitamos, de vez que os pensamentos oriundos das faltas cometidas nos entrançam a alma às imposições do resgate.


Na pergunta 230, () consulta o notável missionário:

— “Na erraticidade, o Espírito progride?

E os Benfeitores informam:

— “Pode melhorar-se muito, tais sejam a vontade e o desejo que tenha de consegui-lo. Todavia, na existência corporal é que põe em prática as ideias que adquiriu.”

Outra vez reconhecemos os veneráveis mensageiros interessados em destacar a necessidade de serviço e educação, além-túmulo, aclarando, ainda, que todos nós, “os viajores da evolução”, despendemos muitos séculos adquirindo ensinamentos na 5ida Espiritual e aplicando-os na Esfera física, de modo a assimilarmos com segurança, a golpes de trabalho no campo do tempo, os valores da perfeição.


Ainda na Pergunta 232, () Kardec argui, meticuloso:

— “Podem os Espíritos errantes ir a todos os mundos?

E a explicação veio clara:

— “Conforme. Pelo simples fato de haver deixado o corpo, o Espírito não se acha completamente desprendido da matéria e continua a pertencer ao mundo onde acabou de viver, ou a outro do mesmo grau, a menos que, durante a vida, se tenha elevado, o que, aliás, constitui o objetivo para que devem tender seus esforços, pois, do contrário, não se aperfeiçoaria. Pode, no entanto, ir a alguns mundos superiores, mas na qualidade de estrangeiro. A bem dizer, consegue apenas entrevê-los, donde lhe nasce o desejo de melhorar-se para ser digno da felicidade de que gozam os que os habitam, para ser digno também de habitá-los mais tarde.”

A resposta é tão brilhantemente positiva que não requisita comentários. Vale, todavia, dizer que, muitas vezes, em desencarnando a alma do veículo de sangue e ossos, não se liberta mentalmente da experiência a que ainda se prende na vida terrestre, em torno da qual gravita por tempo indeterminado.


Ninguém acredite, pois, que o túmulo seja depósito de asas destinadas à elevação de quem não procurou elevar-se durante a passagem pelo seio da Humanidade.

Ascensão pede leveza.

Triunfo verdadeiro reclama heroísmo e glória.

Sublimação exige amor e sabedoria.

Felicidade não dispensa equilíbrio.

O preço da perfeição é trabalho contínuo de engrandecimento da alma.

Ninguém espere, assim, depois da morte, repouso e bem-aventuranças que não soube conquistar por si mesmo.

Serviço e hierarquia, aprendizado e aprimoramento são imperativos a que não conseguiremos fugir, tanto do berço para o túmulo quanto do túmulo para o berço, se desejamos marchar para a Vida Superior…

E enunciando semelhante realidade, não estamos fazendo mais que acompanhar a trilha de Allan Kardec, nas lições que o apóstolo admirável entesourou, em nosso benefício, há cem anos.




recebida em 1957, no 1º Centenário de lançamento de “O Livro dos Espíritos”)



André Luiz
Francisco Cândido Xavier


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