ENTRE DUAS VIDAS

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Capítulo XIII

Vera Lúcia Alves

Querida mãezinha, abrace sua filha e agradeçamos a Deus esta hora.

Apenas um bilhete, um bilhete só. É tudo o que posso agora fazer.

Chorei tanto e pedi tanto a Deus me desse esta oportunidade, que penso, querida mãezinha, que é só mesmo por Deus que consigo escrever estas palavras sustentada por amigos que me auxiliam.

Venho pedir ao seu carinho para não desejar a morte. Viva. Viva muito. Viva trabalhando para o bem dos outros. Este é o seu ideal. Progredir, estudar, servir, amparar a muitos.

Ouço os seus pensamentos, principalmente à noite quando está mais sozinha.

O pensamento é uma onda que vem até nós, onde estou, com endereço exato e, dentro de nossa cabeça se transforma em palavras como se a nossa caixa de ideias fosse um rádio.

Não guarde mágoas de ninguém.

Tia Maria Aparecida e Tio Antônio estão aqui conosco. Eles sabem que eu tinha juízo, que não abusava.

Naquele sábado, julguei que ia com o nosso caro Wilson num simples passeio, um passeio de jovens, que, depois, foi para mim o adeus ao corpo.

Não culpem o amigo leal e bom. Ele daria a própria vida para que eu não viesse como vim, atropelada por uma barranca imóvel.

O carro perdeu a direção e por mais que nos esforçássemos, nada conseguiu deter a carreira que acabou no que vimos.

Creia, mãezinha, que o seu carinho e o carinho de tia Maria Aparecida estavam comigo, como forças a me ajudarem para o refazimento.

Mas tudo foi inútil. Não admitam houvesse possibilidade de salvação para meu corpo abatido. Tudo aconteceu como devia acontecer.

Peço reconfortarem a todos os nossos e Tia Maria se incumbirá de dizer ao papai Lauro que nada existe para que estejamos a sofrer.

Mãezinha querida, cada um de nós tem um caminho. Nunca suponha que sua filha houvesse sobrevivido ao que sucedeu se estivéssemos nós três em casa.

Seu coração fez tudo por nós. Nada faltou. Se uma separação aconteceu é porque isso foi o melhor para nós.

Ajude-me com a sua resignação e com a sua fé.

Reze, mamãe. Peçamos a Deus coragem para continuarmos a viver como agora: juntas e separadas; unidas e ausentes. Isto acontece porque o mundo aqui não é o mesmo em que vivemos aí. De qualquer modo, porém, no amor nada se modifica.

Vovó Maria, que carregou a sua infância nos braços, agora me carrega igualmente.

Estou bem e vou melhorar. Mas ainda dependo de sua paciência e de suas forças.

À tia Maria Aparecida peço receber todo o meu reconhecimento. Ela foi incansável.

Mãezinha, esta letra não é minha.

Estou escrevendo às pressas, movida por energias que me amparam para não tomar tempo aqui, mas você continua sendo o meu anjo da guarda e nós nos entendemos no silêncio do coração.

Adeus, por hoje, mãezinha, querida. Perdoe-me se não pude ficar para o nosso Natal, mas agora estamos mais juntas com Jesus.

Receba um beijo de sua filhinha, sempre sua companheira e sua filha do coração.


Vera Lúcia

(Uberaba, 3 de dezembro de 1971)



Da rápida entrevista que fizemos com a genitora de Vera Lúcia, na noite de 3 de dezembro de 1971, minutos após a recepção da mensagem pelo médium Xavier, apuramos o seguinte:

Vera Lúcia Alves nasceu no dia 27 de junho de 1956 e desencarnou a 8 de outubro de 1971, em desastre automobilístico (ela e o namorado viajavam numa Kombi, sofrendo ele apenas contusões), na estrada entre São José dos Campos e Campos do Jordão, Estado de São Paulo. Estava, pois, com quinze anos e quatro meses de idade. Era filha única do Sr. Belarmino Alves Filho e de D. Eunice Marcondes Alves, cursava a terceira série ginasial, em São José dos Campos, onde morava com sua tia, D. Maria Aparecida e o avô, Sr. Lauro Marcondes.

Muito expansiva, gostava de passar as férias com sua mãe, em São Paulo.

A avó a que se refere é a Sra. Maria Antônia Martins, já desencarnada, e, ao vir a Uberaba, D. Eunice dissera somente a algumas pessoas que perdera uma filha em desastre, e nada absolutamente ao médium para que tantos detalhes surgissem, como, por exemplo, este trecho: “Tia Maria se incumbirá de dizer ao papai Lauro que nada existe para que estejamos a sofrer” — e o que inicia o próximo parágrafo: “Mãezinha querida, cada um de nós tem um caminho. Nunca suponha que sua filha houvesse sobrevivido ao que sucedeu se estivéssemos nós três em casa”.


Elias Barbosa


Vera Lúcia
Francisco Cândido Xavier


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