Estrelas no Chão

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Capítulo XXII

Despedida como tantas


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Esta história não é minha,

É do Juquinha Avelar,

Que me pediu letra e nome,

Quando a pudesse contar.


Ele disse: — Há quem indague,

Na vida em que me aprofundo,

O que foi que vi, de perto,

Quando cheguei no “outro mundo”.


Por isso, ninguém se espante,

Nem se fira na surpresa,

Se minha fala aborrece,

Pois, converso com franqueza.


Meu grande choque, a princípio,

Foi enxergar, ao meu lado,

Meu corpo frio e sem vida,

Lembrando um tronco lascado.


Nada sabia da morte…

Sentia enorme canseira…

E o meu susto foi tão grande

Que caí numa cadeira.


Havia gente na sala,

Conversando, à revelia…

Gemi, pedindo socorro,

No entanto, ninguém me ouvia.


Vi minha velha num quarto,

Magrinha, quase esqueletos

Chorava, desconsolada,

Toda vestida de preto.


Os meus dois filhos presentes,

Antoniquinho e Cesário,

Segredavam, de um a outro,

Sobre assuntos de inventário.


Antoniquinho explicava

Que exigia toda a gleba,

Com casa e benfeitorias

Do Sítio da Jurubeba.


Mas Cesário acrescentava

Que não cederia tudo,

Que todo caso de herança

Precisa de muito estudo.


Eles dois continuavam

Fechados na discussão,

Nem se lembravam de mim,

Entre a cadeira e o caixão.


Acompanhando, de perto,

Os lances daquela briga,

Sentia arrocho no peito

E muito dor de barriga.


Notando a falta de apreço

Que vinha de minha gente,

Sofri aflição de novo,

Tornei a ficar doente.


Dona Cocota afirmava,

Sempre agarrada à mentira,

Que eu furtara muita terra

No Roçado da Traíra.


Por fim, me vi agitado,

Naquela sala de espera,

Cansado de tanto ouvir

O que era e o que não era.


Quase louco me apeguei

À força que vem da prece,

Rogava socorro ao Cristo,

Viesse de onde viesse.


Aí, um guarda surgiu,

Mostrando sinais de luz;

Entendi que era a resposta

Do meu pedido a Jesus.


Desviei minha atenção

Para as visitas, em casa,

Aí senti que a vergonha

Punha meu rosto na brasa.


Todo o assunto, em andamento

Era simples zombaria;

Cochichando, a meu respeito,

O grupo falava e ria.


O amigo Tonico Sales,

Apontando-me a carcaça,

Comentava que eu morrera

De tanto beber cachaça.


O Adão dizia que eu

Andava sempre na “chuva”,

Mas carregava nas costas

Muito choro de viúva.


O guarda puxou-me o braço

Para eu deixar o velório,

Mas eu disse ter receio

Do inferno e do purgatório.


Ele, porém, me explicou,

Alegre e calmo, sorrindo:

— Avelar, do purgatório,

Você hoje está saindo.


Então, procurei a rua

E larguei os gritos meus:

— Adeus, Terra!… Adeus, meu povo!…

Purgatório, adeus, adeus!…




Manoel Serrador
Francisco Cândido Xavier


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