Jesus no Lar

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Capítulo XL

O venenoso antagonista


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Diante da noite, refrescada de brisas cariciantes, Filipe, de mãos calejadas, falou das angústias que lhe povoavam a alma, com tanta emotividade e amargura que aflitivas notas de dor empolgaram a assembleia. E interpelado pelo respeitoso carinho de Pedro, que voltou a tanger o problema das tentações, o Mestre contou, pausadamente:

— O Senhor, Nosso Pai, precisou de pequeno grupo de servidores numa cidade revoltada e dissoluta e, para isso, localizou no centro dela uma família de cinco pessoas, pai, mãe e três filhos que o amavam e lhe honravam as leis sábias e justas.

Aí situados, os felizes colaboradores começaram por servi-lo, brilhantemente. Fundaram ativo núcleo de caridade e fé transformadora que valia por avançada sementeira de vida celeste; e tanto se salientaram na devoção e na prática da bondade que o Espírito das Trevas passou a mover-lhes guerra tenaz.

A princípio, flagelou-os com os morcegos da maledicência; todavia, os servos sinceros se uniram na tolerância e venceram.

Espalhou ao redor deles, logo após, as sombras da pobreza; contudo, os trabalhadores dedicados se congregaram no serviço incessante e superaram as dificuldades.

Em seguida, atormentou-os com as serpentes da calúnia; entretanto, os heróis desconhecidos fizeram construtivo silêncio e derrotaram o escuro perseguidor.

Depois de semelhantes ataques, o Gênio Satânico modificou as normas de ação e enviou-lhes os demônios da vaidade, que revestiram os servos fiéis do Senhor de vastas considerações sociais, como se houvessem galgado os pináculos do poder de um momento para outro; entretanto, os cooperadores previdentes se fizeram mais humildes e atribuíam toda a glória que os visitava ao Pai que está nos Céus.

Foi então que os seres escarninhos e perversos encheram-lhes a casa de preciosidades e dinheiro, de modo a entorpecer-lhes a capacidade de trabalhar; mas o conjunto amoroso, robustecido na confiança e na prece, recebia moedas e dádivas, passando-as para diante, a serviço dos desalentados e dos aflitos.

Exasperado, o Espírito das Trevas mandou-lhes, então, o Demônio da Tristeza que, muito de leve, alcançou a mente do chefe da heroica família e disse-lhe, solene:

— És um homem, não um anjo… Não te envergonhas, pois, de falar tão insistentemente no Senhor, quando conheces, de perto, as próprias imperfeições? Busca, antes de tudo, sentir a extensão de tuas fraquezas na carne!… Chora teus erros, faze penitência perante o Eterno! Clama tuas culpas, tuas culpas!…

Registando a advertência, o infeliz alarmou-se, esqueceu-se de que o homem só pode ser útil à grandeza do Pai, através do próprio trabalho na execução dos celestes desígnios e, entristecendo-se profundamente, acreditou-se culpado e criminoso para sempre, de maneira irremediável. Desde o instante em que admitiu a incapacidade de reerguimento, recusou a alimentação do corpo, deitou-se e, decorridos alguns dias, morreu de pesar.

Vendo-o desaparecer, sob compacta onda de lamentações e lágrimas, a esposa seguiu-lhe os passos, oprimida de inominável angústia, e os filhos, dentro de algumas semanas, trilharam a mesma rota.

E assim o venenoso antagonista venceu os denodados colaboradores da crença e do amor, um a um, sem necessidade de outra arma que não fosse pequena sugestão de tristeza.

Interrompeu-se a palavra do Mestre, por longos instantes, mas nenhum dos presentes ousou intervir no assunto. Sentindo, assim, que os companheiros preferiam guardar silêncio, o Divino Amigo concluiu expressivamente:

— Enquanto um homem possui recursos para trabalhar e servir com os pés, com as mãos, com o sentimento e com a inteligência, a tristeza destrutiva em torno dele não é mais que a visita ameaçadora do Gênio das Trevas em sua guerra desventurada e persistente contra a luz.




Neio Lúcio
Francisco Cândido Xavier


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