Momentos de Ouro
Versão para cópiaHistória de um violino
Parei, fitando um acervo de sucata Que iria arder em fogo breve, Por um fósforo leve, Cuja chama pequena incendeia e consome, Qualquer montão de peças estragadas, Mesmo aquelas que trazem doces nomes De pessoas amadas… Dentre as centenas de objetos, Vasos, portões e móveis incompletos, Cuja destruição era o destino, Encontrei um violino Que mais me parecia Uma relíquia em agonia No resto de instrumento que ele fora… De onde procederia — Perguntei a mim mesma, altamente intrigada — Aquela peça desprezada? Sob que mão renovadora Teria sido, um dia, Perfeitamente manejada? Então, aquele traste, Em rude desconforto, Falou-me ao coração: — Não lastime a sorte que me espera. Quanto anotas no mundo, Desde o campo relvoso ao deserto infecundo, Tudo é renovação!… Eu fui um tronco verde, o mais belo de um horto, Que mais brilhava ao sol da primavera. Era visto, de longe, nos caminhos Em que passasse alguém que amasse Os pássaros e os ninhos… Minhas flores vermelhas Eram a adoração dos enxames de abelhas… Orgulhava-me, sim, de ser forte e robusto… Veio, um dia, porém, Um homem frio e armado De serrote e machado E esfacelou-me os pés, agindo a custo… Depois, tombei vencido sobre a Terra. Fui, logo após, levado, serra em serra, Em terrível viagem, Largado muito tempo ao desprezo e à secagem… Certa feita, um artesão De tato delicado, estranho e fino, Transformou-me em violino E fui vendido a um moço artista, Que me deu cordas, vida e coração… A princípio, chorei com saudades do chão Em que subia ao firmamento Na viva emanação de meu próprio perfume, Entre flores bailando, ante as flautas do vento; Recordava, a chorar, a presença das aves, Que falavam comigo em cânticos suaves, Agradecendo a Deus, cada manhã, A beleza e a alegria da alvorada Que mais nos parecia uma festa dourada, À luz do sol nascente… Mas o artista abraçou-me docemente E manejando as cordas que me dera, Fez-me sentir, por fim, o instrumento que eu era… Muita gente me ouvia, Embargada de pranto, Sem que fizesse algo para tanto… Mães que houvessem perdido algum filhinho, Ante o poder da morte, Choravam com saudade e com carinho, Pondo-se a relembrar Os sonhos de outro tempo e as canções de ninar… Muito doente em prece Pensava em Deus, onde eu me achava, Sem que eu mesmo soubesse Explicar a razão… Notando que tornava as almas que sofriam Mais consoladas e felizes, Não mais me lamentei de me haver afastado Do bosque bem amado Em que deixara as últimas raízes… Depois de muitos anos, Vi muita desventura e muita dor Transformando-se em preces ao Senhor. Vendo, enfim, que servia e consolava, O artista mais me quis, quanto mais me tocava. Até que, um dia, O moço enfermo, trêmulo e alquebrado Foi coberto num túmulo fechado… Então alguém me achou inútil para a vida E me guardou aqui num cova escondida, À espera da fogueira Em que eu possa também Encontrar minha hora derradeira… Nesse justo momento, Alguém ateou fogo ao monturo opulento… E vi outro alguém descer das imensas alturas: Um moço belo e forte Que arrancou, de improviso, A forma do instrumento à labareda e à morte… E ao colocar no braço o violino refeito Em matéria de luz, Dele extraía sons… Era um hino perfeito Que o fazia esquecer a cinza transitória Na música de vida, esperança e vitória!… Então, eu me lembrei de vós, médiuns amigos! Entregai-vos às mãos dos Artistas do Bem, Que eles façam em vós a música do Além. E, um dia, Qual se fosseis desprezados, Por trastes relegados Ao frio dos museus, Braços de amor virão Para traçar convosco o Novo Dia Que trará para os homens O Caminho de Luz da Perfeita Alegria, Entre a bênção da Paz e a proteção de Deus. |
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