Somente Amor
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Solidão e amor
Certo amigo de Cristo Buscou a solidão, no pressuposto De consagrar-se ao Mestre inteiramente… A concentrar-se nisto, Dizia achar, na Terra, um campo irreverente, Que o situava sempre em extremo desgosto; Considerava a multidão Por massa preguiçosa em movimento vão, Queria meditar sozinho e atento Sem barulhos quaisquer, sem qualquer elemento Que lhe pusesse em risco a paz que planejara. Ei-lo, assim, na paisagem doce e rara Que ele mesmo formara, dia a dia: A choça acolhedora, em perene harmonia, A plantação florindo O chão tratado e lindo E as águas marulhosas Da fonte que nutria os gerânios e as rosas… Tudo ali era a paz da vida pura e mansa… E ele, o aspirante à luz Do contato supremo com Jesus, Parecia, na essência, uma criança, Que pensava no Céu, de momento a momento, Sem qualquer sofrimento Que lhe pudesse vir Das forças antagônicas do mundo; E, solitário, em êxtase profundo, Aguardava o porvir. De quando a quando, Fosse regando as plantas prediletas Ou simplesmente contemplando, Na mística alegria dos ascetas, A luz do entardecer, Dizia em prece calma: — “Agradeço, Senhor, a santa solidão, Na qual te posso dar toda a minhalma, Todo o meu coração!… Graças a Ti, Jesus, já não mais compartilho Das discussões hostis com que o mundo te nega, Sei que te espero em paz sem qualquer empecilho Da Humanidade, às vezes, triste e cega… Louvado sejas, meu Senhor, Por me haveres doado, Este sítio feliz, onde vivo isolado, Para aguardar-te a vinda, em meu imenso amor!…” Meses correram, velozmente, E o discípulo a sós, piedoso e crente, Louvava a solidão e os Céus, todos os dias, Esperando o Messias. Numa noite, porém, friorenta e escura, Quando fitava os astros A penderem da Altura, Viu que uma luz de longe, A esgueirar-se de rastros, Vinha ao encontro dele e, de repente, Eis que a luz a crescer, inopinadamente, Toma a forma de um homem que ele fita Com ternura infinita… Ajoelha-se e chora de emoção, Reconhecendo o Mestre Nazareno, A pousar nele o olhar belo e sereno, Renovando-lhe a paz do coração… Mostrando-se em viagem, O Cristo lhe sorri como que de passagem, Mas sem se interromper, prossegue, além… Levanta-se o aprendiz e corre-lhe no encalço, Depois, grita, feliz: — “Encontrar-te, Senhor, é tudo quanto eu quis… Fica, porém, comigo alguns instantes, São tuas estas flores repousantes, Abençoa estes sítios em que penso No teu amor imenso, Este lugar é teu!…” Jesus, deteve-se um momento E, após abençoá-lo, esclareceu: — “Agradeço-te, irmão, Tudo quanto me dás ao coração, As preces de louvor Que me endereças, cada dia, E o perfume de paz e de alegria Que me ofertas Em teu jardim de amor Nestas plagas desertas… Desejo-te ao remanso, Refazimento à fé, reconforto ao descanso; No entanto, para mim, Enquanto houver na Terra algum sinal de pranto, Não posso demorar-me em teu jardim. O trabalho do amor é meu clima e meu lar, Ignoro se escutas A alma da Humanidade em pavorosas lutas. Ouço os gritos de dor dos corações caídos, As petições amargas, os gemidos De mães desesperadas, Os apelos dos grandes infelizes, Peregrinos de todas as estradas Entre aflições e crises; O choro das crianças sem ninguém, Os doentes largados ao vazio De espírito cansado e coração sombrio, Ante as visões do Além A tristeza e a revolta dos ateus, Irmãos infortunados Que se afastam de Deus… Tenho comigo a paz do Reino Excelso, Mas de todos os lados Ouço o imenso clamor Dos que rogam aos Céus Consolação e fé, auxílio, luz e amor… Amo a todos, porém Devo permanecer com quem se aflige e chora À distância do bem!…” Dito isso, o Senhor pôs-se em caminho Mas o devoto, em novo pensamento, Deixou a solidão em que vivia Tão deslumbrado quanto desatento. E, de novo, entre as grandes multidões Erguia e consolava corações, Às vezes, insultado, injuriado e aflito Mas procurando em todos A presença do amor soberano e infinito; Varando lodo e sombra, muito embora, Seguia com Jesus, hora por hora, Construindo o porvir… E, elegendo no amor, a vida, o sonho e o lar, Começou a esquecer-se e passou a servir, Sem nada perguntar, Sem nada mais pedir. |
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