Somente Amor

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Capítulo XVIII

Verdade e amor


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Era ele um cristão de crença pura,

Caminhava na vida

Mostrando fé vibrante e fronte erguida,

Devoto da verdade e da bravura…


Escrevia e pregava em verbo ardente,

Vergastava costumes e preceitos,

Exigia no mundo irmãos perfeitos,

Reclamava virtude em toda gente.


Alentava, no entanto, antigo anseio,

Entretecido de carinho e luz,

Nas súplicas ao Céu, dia por dia,

Clamava e ansiosamente repetia

Em alto devaneio:

“Quero encontrar Jesus! Quero encontrar Jesus!…”


Sonhava ver e ouvir o Mestre Amigo,

Abraçá-lo, retê-lo,

Depois, testemunhar-lhe todo o zelo

Que trazia consigo

A inflamar-se de amor…


Mas ei-lo a procurar, em andanças no mundo,

Erros, falhas, defeitos, cicatrizes,

A fim de levantar o látego infecundo

Sobre os irmãos caídos e infelizes.

Páginas primorosas escrevia

Com lindas conferências de permeio,

No intuito de afastar do campo alheio

As nódoas que ele, acaso, percebia…


Tempos rolaram sobre o tempo mudo

E nada mais fazia o cristão combatente…

Entretanto,

Em matéria verbal, sabia tudo,

Tudo o que fosse amargo ou deprimente.

Em nome de Jesus, erguia a frase rara,

Qual bisturi que corta, poda e apura,

Manejava a palavra fina e rara,

Em constante censura.


Certa noite, porém, depois de muitos anos,

Viu-se fora do corpo, a pervagar…

De improviso, oh! surpresa!… viu Jesus

Que nele punha o generoso olhar.

Notava que Jesus o fitava em silêncio,

Dispondo-se, talvez, a partir sem demora,

Ele gritou: — “Senhor, abençoa-me a fé,

Espero, desde a infância, este encontro de agora…

Dize, amado Jesus, se estou certo em caminho,

Quero apenas fazer aquilo que te agrade,

Tenho feito da vida um combate sem tréguas,

Mostro os erros do mundo e defendo a verdade!…

Ao meditar em ti, vejo em franca expansão,

Os conflitos mortais que amarguram a Terra,

Paixão, intemperança, orgulho, hipocrisia

E a presença do mal trazendo a morte e a guerra!…

Irmãos dilapidando irmãos, estrada a estrada,

Convertem-me a palavra em chicote violento,

Grito, protesto, acuso e denuncio…

Explica-me, Senhor, se tenho estado atento!…”


Mas Jesus respondeu: — “Agradeço-te, irmão,

Quanto me tens doado em franqueza e rigor,

Não olvides, porém,

Que a construção do Bem,

Solicitando, embora, a base da verdade,

Nunca se elevará no apoio à Humanidade,

Sem o teto do amor…

Não deixes de amparar… Anota as leis da vida,

Esclarece, corrige, ensina, mostra, fala!…

Mas recorda: não basta apontar a ferida,

Depois de conhecê-la, é preciso tratá-la.

Volta ao mundo e prossegue,

Retifica sem fel e ajuda sem impor,

Verdade que produz é aquela que auxilia,

À maneira do Sol que acende a luz do dia

E estende a vida ao chão em dádivas de amor!…”


O amigo despertou a desfazer-se em pranto,

Inflamado de júbilo e de espanto,

Ergueu-se novamente para a vida…

Em seguida,

Descerrou a janela junto dele…

Fitando a rua em frente,

Viu homens construindo

A se esforçarem, afanosamente,

Doentes repousavam na calçada,

Pobre mãe desprezada

Passava carregando um pequeno enfermiço…

Tudo era petição de amparo e de serviço…

Não longe, uma criança sem ninguém

Começou a chorar…


Nisso, ele ouviu de novo a voz do Mestre Amado,

No íntimo do ser

Qual se estivesse ali, respirando a seu lado,

Presente a lhe dizer:

“Escuta, meu irmão

Posso falar-te aqui na paz do coração!…”

Depois, disse baixinho:

— “Se queres atingir a luz do Eterno Lar,

Eis, em teu mundo mesmo, os marcos do caminho:

— Trabalhar e servir, servir e trabalhar!…”




Maria Dolores
Francisco Cândido Xavier


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