Mensagem do Amor Imortal (A)

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CAPÍTULO 17

ESPADA E FOGO

Mateus 10:34-36 E Lucas 12:49-53

Sucediam-se as multidões como vagas suaves do mar, tangidas por ventos brandos, arrebentando-se nas praias do Seu amorável sentimento de amor.

Aquelas contínuas moles humanas podiam também recordar sucessivas camadas de areia que cobriam as anteriores, carreadas sob a carícia da brisa gentil da Sua afabilidade. . .

Ninguém resistia ao doce ou ao vigoroso apelo da Sua voz.

As massas aflitas multiplicavam-se prodigiosamente, surgindo de um para outro momento, sem que se percebesse a procedência, de onde vinham.

Saciadas umas, logo outras apareciam esfaimadas de pão e de amor, com sede de paz. . .

Vencidas pela desdita e pelo abandono, já não confiavam em ninguém, já não esperavam nada que lhes diminuísse o sofrimento.

Deixavam-se fustigar pelas tempestades da desolação, sem ânimo ou esperança alguma que lhes motivasse prosseguir vivendo.

Era natural, portanto que, repentinamente, fossem atraídas pelas notícias em torno do Profeta, que anunciava um novo Reino, mas, sobretudo, amparava os desfalecidos na Terra; que falava sobre Deus e confortava as criaturas que d’Ele se houveram distanciado; que exaltava o amor e amava de tal forma que convivia com eles, os miseráveis detestados e nauseabundos. . .

Assim, viam o Mestre, e O buscavam.

Desse modo, o Senhor a todos recebia, um a um, ou em grupos, orientando-os sem cessar, sem atropelo, de forma que o Seu verbo lhes acalmava o desespero e a Sua misericórdia suavizava as suas aflições.

Normalmente, atendia-os a todos de maneira geral. . .

Nascido pobre, após renunciar aos arquipélagos estelares, reunira, à sua volta, outros tantos pobres que, de maneira alguma, se tornaram mendigos ou se esconderam na miséria, trabalhadores do povo, que conviveram com o povo e que constituíam, dessa forma, a multidão a Ele atraída.

Chamara-os a todos no trabalho em que se afadigavam, acostumados que se encontravam às pelejas pelo pão e pela paz, que transformariam na busca do Reino de Deus, destituídos das ambições tormentosas e das paixões competitivas e perturbadoras do cotidiano. . .

Convivia com eles em doce igualdade, sem diminuir a Sua grandeza e elevação, participando das suas conversas e preocupações, nada obstante pairando acima das mesquinhezes que lhes eram habituais.

Logo depois, começou a participar das necessidades das massas volumosas e expressivas, compreendendo-lhes os sofrimentos, mas não se permitindo aceitar a revolta dos infelizes, o ódio dos desesperançados, as tricas da inveja e das situações deploráveis a que a grande maioria se arrojava.

No sentido oposto, compadecia-se dos ricos, dos endinheirados e não os abominava, porque lhes conhecia os escaninhos dos sentimentos em sombras onde se refugiavam as ignoradas amarguras, carentes de apoio, de amor e de compaixão.


Entre as duas faixas humanas — os pobres e os ricos materiais -

Ele enfrentava a terrível mole dos fariseus preocupados com a aparência, dominados pela soberba decorrente da posição social que desfrutavam, e dos saduceus beligerantes e materialistas, que Lhe exigiam maior soma de misericórdia e de compreensão.

As poucas vezes em que visitara Jerusalém, a orgulhosa capital de Israel, confundiam-se os odores pútridos dos esgotos abertos pelas ruas malcuidadas, que exalavam miasmas, com aqueles piores, os de natureza moral dos seus habitantes exploradores e insensíveis.

Dependente do Templo suntuoso, o ímpio Herodes, o Grande, embelezara-o, adornando-o com pórfiros preciosos, painéis de ouro maciço na sua entrada, madeiras famosas do Líbano, a fim de conquistar a simpatia dos demais corifeus da miséria moral que ali reinava, tornando-o o mais famoso do seu tempo, sem que, no entanto, possuísse qualquer convite ao recolhimento e à religiosidade.

Cambistas, negociantes de todo tipo, vendedores de animais para os holocaustos confundiam-se com os aproximadamente vinte mil sacerdotes, não incluindo os levitas, descendentes de Aarão, todos ociosos que viviam dos dízimos em gêneros, das taxas, do resgate dos primogênitos (que pagavam cinco ciclos por cabeça) e alimentavam-se com a carne dos animais sacrificados, os quais eram queimados apenas nas gorduras. . .

Os sacerdotes eram sustentados também pelas primícias dos rebanhos, das colheitas, de tudo quanto pudesse ser arrancado do povo exaurido, inclusive das rendas dos animais que eram vendidos para as perturbadoras ofertas, associando-se aos cambistas e favorecendo empréstimos com juros extorsivos, desempenhando papéis de banqueiros impiedosos.

Os interesses econômicos eram disfarçados com as obrigações religiosas impostas a todos que, inclusive, sendo judeus, vinham de distantes regiões por ocasião das festas, especialmente da Páscoa, chegando a atingir o número de três milhões de visitantes em algumas dessas ocasiões, conforme narra o historiador Flávio Josefo. . .

A religião era somente um disfarce para a exploração muito bem elaborada e para a prática de hediondos crimes que se ocultavam na desfaçatez, com que se resguardavam aqueles que deveriam dignificar o povo.

Jesus se houvera rebelado contra tanta infâmia, numa das vezes em que lá estivera, já nos Seus últimos dias, que mais açulara os ódios gratuitos dos perversos e exploradores inclementes.

Esse esbirro de César, que se acumpliciara com Roma para esmagar o povo, que o detestava, governava com mão de ferro, e, posteriormente, o seu filho Herodes Antipas, não era menos depravado e cruel. . .

Tal era a paisagem humana, triste e mórbida, na qual o poder temporal misturava-se ao falsamente espiritual para sobreviver de qualquer maneira, como lobos e chacais disputando as mesmas presas. . .

Nessa sociedade sacudida pela desordem contínua e rebeliões esmagadas com crueldade, portadora de criminalidade maldisfarçada, era o solo sáfaro, que Ele deveria joeirar, para transformá-lo em seara rica de paz e de amor. . .

Acostumados à hipocrisia, ao descrédito e à quase indiferença pelas lamentáveis condições dos poderosos, os miseráveis lutavam pela sobrevivência, cépticos, revoltados, em incontáveis multidões. . .


* * *

Quando Ele começou a reverdecer os corações com o Seu Verbo e a apresentar o Seu programa de amor, houve uma tremenda comoção social, qual se um raio que rasgasse a noite escura do oriente ao ocidente, fosse o anúncio de um mundo novo.

Os desesperados e tumultuados procuraram descobrir onde nascera a claridade e disputavam-na.

Toda a mansidão e ternura do Messias eram aplicadas para aplacar-lhes a revolta e dulcificar-lhes os sentimentos violentados.

A Canção entoada na montanha ressoava por toda parte, repetindo a promessa de paz, de justiça, de bondade.

Todos seriam saciados, socorridos, alimentados, felizes.

Não se haviam dado conta, porém, da contribuição pessoal que lhes seria exigida, do esforço transformador que lhes seria imposto.


Em plena primavera emocional que jamais seria vencida por qualquer tipo de outono, Ele surpreendeu os ouvintes e comensais do Seu amor, enunciando:

— Não penseis que vim trazer paz à terra; não vim trazer a paz, mas a espada — porquanto vim separar de seu pai o filho, de sua mãe afilha, de sua sogra a nora — e o homem terá por inimigos os de sua própria casa.


A surpresa ainda não alcançara o clímax, quando Ele afirmou:

—Vim para lançar fogo à Terra; e que é o que desejo, senão que ele se acenda? — Tenho que ser batizado com um batismo e quanto me sinto desejoso de que se cumpra?. . .

O Senhor da brandura e das mercês, certamente não se tornaria um guerreiro infeliz, um guia belicoso, um vassalo da loucura. . .

Viera sim, separar a verdade da impostura, dividir as famílias nas quais se Lhe vinculariam uns membros enquanto outros O detestariam.

Lançava para o futuro a advertência que se teria de eleger Deus a Mamom, o dever ao engodo, a aceitação ou a negação ao crime e ao vício. . .

O fogo purificador da verdade seria ateado, a fim de que o campo semeado e tomado pelo escalracho, tivesse que ser liberado da erva má que, atada em feixes, seria queimada para salvar o bom grão. . .

O agressivo da linguagem forte era real. Tratava-se de uma decisão difícil, de uma definição de rumos.

Com Ele ou contra Ele, nunca em postura de conveniência.

A união das almas viria da separação das diferenças de anseios e de cuidados.

A permuta das afeições transitórias seria por aquelas de eterna duração.

Os Seus padeceriam para permanecer dignos, perderiam em um momento, a fim de possuírem o Reino de venturas depois.

A grande separação se encarregaria da plena identificação, defluente da espada que decepa o mal e do fogo que purifica o ser das misérias morais.

As multidões ainda sucedem-se ansiosas. . .

Os modernos Templos da eterna Jerusalém religiosa do mundo, faustosos, entupidos de coisas preciosas e vazios de Deus, negociam da mesma forma que o antigo, o que foi destruído e não mais reconstruído, no alto da colina, dita sagrada, e a espada permanece erguida para separar o trigo do joio, a fim de que este, também reunido em molhos seja queimado, e suas cinzas tornadas adubos para futuras searas de abundância.

Espada e fogo!


Salvador-BA, em 26. 11. 2007.


AMÉLIA RODRIGUES




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Mateus 10:34

Não cuideis que vim trazer a paz à terra; não vim trazer paz, mas espada;

mt 10:34
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Mateus 10:35

Porque eu vim pôr em dissensão o homem contra seu pai, e a filha contra sua mãe, e a nora contra sua sogra;

mt 10:35
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Mateus 10:36

E assim os inimigos do homem serão os seus familiares.

mt 10:36
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Lucas 12:49

Vim lançar fogo na terra, e que mais quero, se já está aceso?

lc 12:49
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Lucas 12:50

Importa, porém, que seja batizado com um certo batismo: e como me angustio até que venha a cumprir-se!

lc 12:50
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Lucas 12:51

Cuidais vós que vim trazer paz à terra? Não, vos digo, mas antes dissensão;

lc 12:51
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Lucas 12:52

Porque daqui em diante estarão cinco divididos numa casa: três contra dois, e dois contra três.

lc 12:52
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Lucas 12:53

O pai estará dividido contra o filho, e o filho contra o pai; a mãe contra a filha, e a filha contra a mãe; a sogra contra sua nora, e a nora contra sua sogra.

lc 12:53
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