Mensagem do Amor Imortal (A)

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CAPÍTULO 20

ALVÍSSARAS DE LUZ EM NOITE ESCURA

O atropelo dos acontecimentos terríveis dos últimos dias foi superior às forças daqueles homens simples e sonhadores.

O mestre convivera com eles, por quase três anos, instruindo-os, exemplificando o amor, advertindo-os sobre o que viria depois em forma de padecimentos, mas eles, ingênuos e vítimas do terrível atavismo judeu sobre o Messias poderoso, esperavam que as ocorrências se dessem de forma diferente.

Não estavam preparados interiormente para tudo quanto sucedera.

A entrada triunfal em Jerusalém levara-os ao êxtase, significando-lhes o começo do Reino de Deus com os aparatos terrenos. . .

Aguardavam que, a partir de então, as alegrias iriam compensar as lutas travadas com os fariseus e sacerdotes, assim como em relação a todos aqueles que se haviam levantado contra eles.

Esperavam que o Triunfador logo anunciasse o Seu plano de governo.

Estavam, pois, expectantes, a respeito das glórias terrestres. . .

Ele informara que poderia derrubar o Templo e reconstruí-lo em apenas três dias.

E certo que o dissera, porém, simbolicamente, em se referindo a outro templo. Não O haviam entendido, realmente.

Intoxicados pela tradição multimilenar, a Boa-nova não os conseguia modificar mentalmente, em razão de adaptarem todos os ensinamentos às antigas ambições israelitas. . .

Fora, de chofre, que os insucessos se acumularam até a consumação da tragédia na cruz.

A lembrança da horripilante noite daquela quinta-fei¬ra, quando Ele solicitara a Pedro, Tiago e João que orassem, no Horto das Oliveiras, porque se aproximava o momento de dor, enquanto Ele velaria, não lhes saía do cérebro.

Aqueles amigos estúrdios foram vencidos pelo sono, e mesmo despertados por Ele, voltaram a mergulhar na inconsciência, enquanto Ele, antevendo os próximos episódios de angústias e aflições, transpirava suor e sangue.

Depois, como esquecer a prisão vergonhosa, naquele lugar em sombras, entregue aos inimigos por Judas, Seu amigo, com um beijo de perfídia, logo depois a atitude de Pedro decepando a orelha de Malcus e sendo repreendido?. . .

Estranha loucura tomara-os a todos, levando-os a fugir dali, sem mesmo terem para onde ir.

O que aconteceu em seguida, jamais poderia ser imaginado.

Viram-nO empurrado pelos legionários e desocupados da odienta Jerusalém, aquela ralé perversa e detestada por todos, sendo levado para um e para outro julgador inclemente e venal, até o instante em que foi condenado à morte para júbilo da turbamulta.

Fora estarrecedora a disputa, quando Pilatos propusera libertar Barrabás, o malfeitor, ou Ele, o benfeitor, havendo sido eleito o perverso, em detrimento dAquele que era o Libertador.

(. . .) E era a Páscoa!

A Sua morte infamante, caracterizada pelas inenarráveis humilhações, a Sua fortaleza e fragilidade, causaram- -lhes pavor, perturbação indescritível.

Pensavam: - Como Ele se deixara matar? Por que não fulminara os infames julgadores, ou simplesmente não se libertara da cruz?

Onde estava Deus, que não salvara o Seu Filho, que somente O honrara?

Tudo que Ele dissera, belo e comovedor, agora parecia remoto na memória do coração daqueles que conviveram ao Seu lado.

Diversas vezes Ele anunciara que viera para o sacrifício, mas aquele era demasiado.

Chegaram a duvidar da Sua missão, e pensaram que foram ludibriados.

O medo unira-os e recolhera-os no lugar da última ceia.

As sombras adensavam-se, cada vez mais apavorantes.

—E se os infames, agora investissem contra eles, despreparados e medrosos? - Temiam, ansiosos.

Esperavam que as angústias e as ameaças diminuíssem, a fim de voltarem à Galileia, onde estariam em segurança, que, no entanto, nunca mais seria a mesma, depois d’Ele. . .

José de Arimateia, que simpatizava com Ele, solicitou a Pilatos o cadáver de Jesus.

Não tivera coragem de ir à reunião do Sinédrio por medo de autodenunciar-se.

Agora, quando tudo estava consumado, queria oferecer-lhe sepultamento digno, o que é muito importante para um judeu.

Nicodemos, que também tivera contato com Ele e O estimava, evitou participar do Seu julgamento, para não ter problema de consciência, no entanto, agora não corria nenhum risco, porque Ele estava morto. . .

As criaturas humanas sempre avaliarão, diante de determinadas decisões, primeiramente os interesses e os perigos, optando pela atitude covarde da abstenção, da ausência, tornando-se, mesmo sem o desejarem, cúmplices do crime que poderiam evitar. Pelo menos, diminuir o número dos seus adeptos na odiosidade. . .

Pairavam no ar as aflições sem nome.

A cidade assassina - não eram poucas as vítimas da lei romana através da crucificação - estava tumultuada, e os seus governantes ignóbeis e imprevisíveis aplicavam a justiça odienta de Roma.

O Monte da Caveira sempre exibia cruzes com corpos apodrecidos, semidevorados por chacais e outras feras durante a noite, e abutres, durante o dia.

A cidade empoeirada e terrivelmente fétida recebia os ares pútridos do Gólgota.

A sepultura nova recebeu-Lhe o corpo, envolto em linho e ataduras, com os perfumes, áloe e mirra, oferecidos por Nicodemos.

Embora fosse dia, a noite moral apavorante que dos discípulos se apossara, dominava-lhes as mentes e os corações.

Ao terceiro dia, as quatro mulheres, Maria de Magdala, Maria de Betânia, Salomé e Joana de Cusa foram ao sepulcro. . .

A saudade d’Ele era-lhes insuportável e o pulsar dos seus sentimentos assustava-as. . .

A madrugada ainda não vencera as trevas dominantes, quando se acercaram da sepultura e viram a imensa pedra removida, deixando aberta a entrada.


Temeram adentrar-se. E pensaram, angustiadas:

-Quem a teria movido? Com qual interesse haviam feito aquilo?


Trêmulas, à medida que a claridade do dia em vitória de luz lhes facilitava a visão, mais se acercaram e, ao entrarem, foram surpreendidas pela presença de um ser luminoso de roupagem alvinitente, ante o sepulcro vazio, que lhes indagou:

— Por que buscais o Vivo entre os mortos? Ele não vos disse que voltaria ao terceiro dia? Eis que cumpriu a promessa. Ide e anunciai-O aos vossos companheiros.

Elas saíram emocionadas, geladas de medo e de alegria, e voltaram à cidade, ansiosas, quase a correr.


Maria de Magdala, aturdida, ficou na retaguarda, quando viu alguém, que supôs ser o jardineiro e o interrogou:

— Para onde levaram o meu Senhor?


Ele voltou-se, e ela, deslumbrada, ouviu-O chamá-la docemente, como sempre o fazia:

-Maria!

-Rabboni!


Correu a abraçá-lo, mas Ele a deteve:

— Não me toques, pois que ainda não subi ao Pai.

Havia descido ao Sheol, em grego Hades, na tradição Inferno ou regiões infelizes, para resgatar Judas, o atormentado que apressara os acontecimentos e fugira pelo suicídio horrendo. . .

O Amor fora em busca do infeliz traidor e o guiaria através dos séculos em expiações redentoras até o momento da sublimação na roupagem de Joana d’Arc. . .

As mulheres chegaram ao reduto em que eles se encontravam e narraram o que lhes acontecera, mas não foram acreditadas.

Era bom demais para ser verdade, naquele momento truanesco.

Fora sua imaginação, em que as mulheres são muito férteis, haviam redarguido os amigos.

(. . .) E quando Maria de Magdala afirmou tê-lO visto, foi ridicularizada e olhada com ressentimento, pois que não fora ela a obsessa dominada pelas forças do Mal?!

Pedro constatara com João, que o túmulo se encontrava deserto, vazio, com o lenço que Lhe sustentara o queixo ao lado e o tecido de linho que O envolvera, amarfanhado no lajedo ao fundo.


Tudo continuava em névoas, até que, após a refeição, quando restava apenas um peixe assado, Ele apareceu, jubiloso, para espanto dos que se encontravam presentes, e para demonstrar que não era um fantasma comum, perguntou-lhes:

— Que tendes aqui para se comer?

E assentou-se à mesa, comeu com eles, anunciando- -lhes o próximo encontro na Galileia.

A noite horrenda começou a ser devorada pelas alvíssaras da inapagável luz da imortalidade em triunfo.

Nunca mais haveria trevas iguais. . . . Somente a perene Luz da Vida.


Salvador-BA, em 09. 01. 2008.


AMÉLIA RODRIGUES




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