Dias Venturosos

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CAPÍTULO 13

Serviço e galardão

Era a despedida.

O mês de Kislev estuava. O Sol despejava dardos de luz e calor como se travasse violenta batalha com a Terra, ressecando-a, vencendo-a.

Os trigais pelos vales e na planície de Macna se erguiam, formando imenso tapete em repouso, sem o sopro agradável do vento.

O Mestre desvelara-se, há pouco, junto à fonte de Jacó, nas cercanias de Sicar, à mulher samaritana, que saíra a anuncia-lO, como profeta, a todos da cidade que a conheciam.

Penetrando-lhe a alma, o Senhor conquistara-lhe o coração, porque lhe não revolveu as feridas morais, antes balsamizou-as, confortando-a dos duros golpes sofridos durante a existência dorida.

Quem a não conhecesse não lhe imaginaria as noites indormidas, as inquietações disfarçadas com sorrisos, as humilhações experimentadas.

O tributo à felicidade terrestre é pesada canga, que junge a padecimentos inomináveis. Somente aqueles que a carregam conhecem-lhe o peso, a constrição.

Logo mais Ele estaria no Horto das Oliveiras, receberia o beijo do traidor, seguiria a sós para o martírio e a morte. . .

. . . Para a ressurreição.

Naquele momento, porém, era a despedida, era o amor que dá vida.


Kislev(1) - Dezembro/janeiro

A mulher samaritana é um símbolo de perene atualidade.

vítima, era tida como algoz pelo crime de ser mulher.

Espezinhada na sua fragilidade, era condenada por haver-se deixado seduzir. . .

Sempre tem sido assim. Os que tombam são acusados por haverem caído, como as violetas esmagadas sob as patas animais, que não deveriam estar no caminho por onde eles passam. . .

Jesus conhecia as criaturas humanas, suas grandezas e prejuízos, amando-as conforme eram e como se apresentavam.

Na sua condição de Pastor, jamais elegia as ovelhas, deixando que essas O escolhessem.


* * *

Ao espanto dos discípulos, que O surpreenderam em quase êxtase solitário, ao retornarem da cidade, onde foram para a compra de alimentos e atendimento de necessidades outras, sucedeu-se a alegria das pessoas que tomaram conhecimento da ocorrência à borda do poço.

Profundamente tocada pela magia do Nazareno belo, a mulher samaritana não se cansava de elogiá-lO, embora Ele a houvesse desnudado.

Ela agora sabia que o pecado é desgraça, é morte e que somente a virtude é bênção de vida.

Entregara-se às extravagâncias do prazer, passando de mão em mão quase sem dar-se conta, porque nunca amara, jamais vira realmente a luz e, nas sombras, todos os movimentos são sempre silhuetas confusas.

Agora não. Acabara de vislumbrar a claridade; alcan- çara outra dimensão. . .

Dialogando com aquela mulher estranha, quase detestada, por pertencer à raça da Samaria, Jesus arrebentou as algemas do separatismo, dos preconceitos, atravessando as fronteiras colocadas pelas paixões humanas.

Universalizou o seu amor, a sua Mensagem.

Que lhe importava se a adoração ao Pai se dava no monte Garizim, na Samaria, ou no Templo de Salomão, em Jerusalém?!

O importante em si mesmo é que todos adoravam a Deus, ou pareciam fazê-lo por fora, quando o correto seria no coração, nos atos de amor para com o próximo.


* * *

Os amigos, percebendo-lhe a instrospecção, sempre preocupados com o secundário em detrimento do essencial, insistiram para que Ele comesse.

Olvidados do pão do espírito, aferravam-se ao de trigo como solução única para todos os problemas.


Por isso, Ele respondeu-lhes:

– Tenho um alimento para comer, que vós não conheceis. . . Chilreavam as aves na copa das árvores, enquanto o vento morno agitava-lhes os ramos.


O trigal exuberante ondeava sob as vagas que lhe per-

passavam em lufadas quentes, contínuas.

Atônitos, os companheiros murmuravam entre si: - Acaso lhe trouxe alguém o que comer?

viviam com Ele e não O conheciam.

Falavam e ouviam, mas não O entendiam. Ele pensava no reino dos céus, enquanto eles se imantavam ao reino da Terra.


Jesus, então, elucidou-os:

– O meu alimento é fazer a vontade daquele que me enviou a realizar a sua obra.


E prosseguiu:

– Não dizeis vós que dentro de quatro meses chegará o tempo da ceifa? Pois bem. Eu vos digo: erguei os olhos e vede. Os campos estão brancos para a ceifa. . .

Ele ainda não se houvera desvelado, nem a João Batista, a ninguém, exceto à samaritana. . .

A sinfonia espraiava os seus primeiros acordes. Nunca mais cessaria a sua musicalidade ímpar.

A pauta da Natureza em festa forneceria por todo o sempre novos sons, novas melodias.

– O ceifeiro já recebe o salário - prosseguiu em doce tom - e recolhe o fruto para a vida eterna, de modo que o semeador se alegra juntamente com o ceifador. Pois nisso se verifica o ditado: Um é o que semeia e outro o que colhe. Enviei-vos a ceifar, o que vós não trabalhastes: outros trabalharam e vós aproveitai-vos do seu trabalho.

Os amigos em silêncio ouviam-nO com o coração, incapazes, no momento, de digerirem as palavras com a razão.

É necessário, na colheita, agradecer às mãos que antes semearam.

Quem agora chega, que abençoe o trabalho daquele que antes aqui esteve e preparou-lhe o caminho.


Todos os indivíduos no mundo têm um papel a desempenhar, sempre importante. Enquanto a escala de valores classifica-os qualitativamente, o amor iguala-os em sig-

nificado. Tanto é nobre aquele que desmata a gleba, quanto o que a enriquece de sementes, ou aqueloutro que lhe recolhe os grãos.

Não é fundamental saber quem veio antes e menos é identificar aquele que virá depois.

Sucedem-se as gerações e, à semelhança das águas que passam sob uma ponte, é provável que retornem como chuva enriquecedora, porém não importa sabê-lo por enquanto.

A samaritana colheu dos lábios de Jesus o que não houvera plantado, libertando-se das licenças morais perturbadoras, readquirindo a identidade perdida.

Por sua vez, os discípulos ceifavam a gleba plantada pelos profetas que os anteciparam, por aqueles que se sacrificaram antes que eles chegassem. . .

Assim é a vida e são assim os acontecimentos, tudo se encadeando em harmonia.

No trigal verdejante a derramar-se pelas encostas e planícies, sorriam coloridas as papoulas amarelas, vermelhas, as tulipas silvestres, enquanto os líquenes ressecavam-se ao Sol dardejante.

A moldura da tela, na qual Jesus desenharia o poema de amor, estava pronta, e o Artista começava a executar a sua obra. . .


* * *

Sensibilizados, os samaritanos vieram pedir-lhe para que ficasse um pouco com eles, após ouvirem a mulher testemunhar a seu favor.

Compadecido, o Mestre aquiesceu, ali ficando por dois dias, que passaram céleres. A alegria, o bem-estar passam rápidos, em outra dimensão do tempo.

À sombra do arvoredo, falou-lhes do reino de Deus e os enriqueceu de esperanças, confortando-os e amparando os combalidos, que receberam cargas novas de energia vitalizadora.

Sob o céu recamado de estrelas lucilantes, explicou-lhes o significado da vida terrestre, esclarecendo-os quanto às necessidades da evolução e da transitoriedade do corpo carnal.

Sua voz aquietou-os, e mesmo as criancinhas buscaram-lhe o regaço, nEle se refugiando. Ele, porém, não ficou apenas nas palavras. Era necessário agir, para que todos vissem e cressem no seu poder. E assim o fez.

Ao terceiro dia, quando se dispôs a prosseguir na marcha, estava cercado de carinho e amor.

Enfermos, que se recuperaram; loucos, recém-saídos da furna da perturbação; leprosos, que ficaram limpos; e endemoninhados, que recobraram a sanidade mental, agradeceram-lhe o obséquio da estada entre eles, asseverando que jamais O esqueceriam.

As ansiedades iniciais estavam substituídas pela paz interior.

Como a memória do mundo físico é de limitado prazo, certamente O olvidariam. . .


Mas, à mulher abençoada pela sua revelação, a uma só voz os patrícios afirmaram:

– Já não é por causa das tuas palavras que acreditamos; nós próprios ouvimos e sabemos que Ele é realmente o Salvador do mundo.

Os campos gargalhavam tons verdes e rubros à luz do Sol nascente.

Amanhecia, e as nuvens escuras adornavam-se de ouro. . .

A estrada escarpada e áspera serpenteava e perdia-se nas dobras dos montes altaneiros.

Ele e os amigos teriam que seguir adiante, a Jerusalém. . .


João 4:31-42




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João 4:31

E entretanto os seus discípulos lhe rogaram, dizendo: Rabi, come.

jo 4:31
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João 4:32

Porém ele lhes disse: Uma comida tenho para comer, que vós não conheceis.

jo 4:32
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João 4:33

Então os discípulos diziam uns aos outros: Trouxe-lhe porventura alguém de comer?

jo 4:33
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João 4:34

Jesus disse-lhes: A minha comida é fazer a vontade daquele que me enviou, e realizar a sua obra.

jo 4:34
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João 4:35

Não dizeis vós que ainda há quatro meses até que venha a ceifa? Eis que eu vos digo: Levantai os vossos olhos, e vede as terras, que já estão brancas para a ceifa.

jo 4:35
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João 4:36

E o que ceifa recebe galardão, e ajunta fruto para a vida eterna; para que, assim o que semeia como o que ceifa, ambos se regozijem.

jo 4:36
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João 4:37

Porque nisto é verdadeiro o ditado, que um é o que semeia, e outro o que ceifa.

jo 4:37
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João 4:38

Eu vos enviei a ceifar onde vós não trabalhastes; outros trabalharam, e vós entrastes no seu trabalho.

jo 4:38
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João 4:39

E muitos dos samaritanos daquela cidade creram nele, pela palavra da mulher, que testificou: Disse-me tudo quanto tenho feito.

jo 4:39
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João 4:40

Indo pois ter com ele os samaritanos, rogaram-lhe que ficasse com eles; e ficou ali dois dias.

jo 4:40
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João 4:41

E muitos mais creram nele, por causa da sua palavra.

jo 4:41
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João 4:42

E diziam à mulher: já não é pelo teu dito que nós cremos; porque nós mesmos o temos ouvido, e sabemos que este é verdadeiramente o Cristo, o Salvador do mundo.

jo 4:42
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