Há Flores no Caminho

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CAPÍTULO 4

Jesus e paciência

As opiniões desencontradas aturdiam os mais afervorados companheiros da Mensagem Renovadora.

Comentava-se quanto à necessidade de a revolução cristã triunfar, derrubando a Casa Senhorial de César e distendendo suas forças por toda a parte, tornando Israel a soberana, conforme os anúncios antigos.

Ferviam as paixões entusiasmando os sentimentos e perturbando as mentes.

Em todo lugar, pessoas que se criam credenciadas transformavam-se em informantes insensatos, gerando embaraços injustificáveis para o ministério do amor. . .

Enquanto a frivolidade desenfreada se encarregava de conduzir nimbos precursores de tempestades, o Rabi prosseguia impertérrito na ensementação da Mensagem no solo dos corações.

Transitando pelas estradas ou nas praias formosas, entre crepúsculos ardentes e apaixonados, Sua misericórdia distendia as mãos do auxílio e do esclarecimento sem que Ele se deixasse impressionar pelo tumulto em crescimento ameaçador.

A Galileia bucólica e simples fascinava-Lhe a alma sensível.

As pessoas modestas e afáveis cujos problemas se resumiam às questões da sobrevivência, ofereciam ao Rabi a alegria de diminui-lhes as preocupações.

A Judeia, no entanto, áspera e adusta se repletava de problemas e dificuldades entre as tricas farisaicas e as conjunturas infelizes da política insensata e avara.

Peregrinando pelas terras verdes dos galileus, Seu verbo iluminado cantara o Sermão da montanha e as Suas lições se fizeram repassadas de meiguice quanto de esperança.

Ali levantara moribundos e mantivera viva a chama do amor, no país dos sentimentos humildes, favorecendo-os com o alento em torno de um amanhã ditoso.

Todavia, na difícil região dos judeus, não obstante o Seu amor incansável, as ciladas armavam problemas e a astúcia elaborava sofismas com que se pretendia surpreendê-lO em algum equívoco diante dos dispositivos do Estatuto Legal. . .

Continuando fiel ao programa que o Pai Lhe traçara, Ele se fizera o apoio e a segurança dos fracos, a resistência dos tíbios, à medida que a mensagem refulgia nas paisagens ermas dos que haviam tombado na descrença.

Após o atendimento da multidão sempre ávida e necessitada, enquanto a terra ardia, ao cair do velário da noite, Simão buscou-O inquieto, certa vez, não ocultando as apreensões. . .

A ressurreição de Lázaro levantara os ânimos contra Ele e a promessa de que demoliría o Templo e o reergueria em três dias havia chocado os que buscavam motivo para a perseguição.


Em estado de espírito inquieto, o velho amigo acercou-se do Rabi sereno sob gentil pérgula arrebentada em flores e foi direto ao assunto:

— Senhor, como proceder diante das ameaças que nos chegam, levando-nos a receios justificáveis quanto ao futuro do Evangelho?

— Tendo paciência, Simão — respondeu, tranquilo, Jesus.

— Devemos, então, aguardar a agressão, sem tomarmos qualquer iniciativa? — voltou a inquirir o amigo.

— Sim — elucidou o Mestre. — Edificando a paciência em nós mesmos, não nos cumpre assumir outra atitude senão aguardar. A paciência dar-nos-á inspiração e força para agir com discernimento e sem precipitação.

— Mas, Senhor — arguiu o companheiro que sobremostrava surda irritação, — não seria lícito que se instalasse o reino de Deus de imediato e a revolução que pregas tivesse início? Talvez, quando se tomem providências, seja tarde demais, não Te parece?


Jesus fitou o Céu de turquesa cravejado de círios estelares e sem perder a serenidade esclareceu:

— Com paciência conseguiremos provar a excelência da nossa luta.

Os lutadores do mundo são desesperados, passam em atroada ensurdecedora, destroem e ameaçam, semeando ódios e lutas sem qualquer razão. A paciência prova o homem e comprova-lhe os valores ante as vicissitudes que deve superar.

— Não duvido, — anuiu o pescador, acrescentando — parece-me que a resistência pacífica levar-nos-á à queda, destruindo as aspirações superiores que acalentamos. Como agir ante os que nos provocam ao combate urgente?

— Atuando com paciência.

— Se as circunstâncias nos parecem favoráveis e postergamos, não estaremos adiando indefinidamente o compromisso?

Perpassavam pelos ares perfumados nos cenários formosos as bênçãos divinas, enquanto as onomatopeias murmuravam uma sinfonia acalentadora em derredor.


Relanceando o olhar pela noite em triunfo o Rabi contestou:

— O Sol incansável devora a noite cada manhã, enquanto ela, paciente, retorna, diminuindo o calor do dia, mil vezes, sem cansaço.

— Será lícito, então, não reagir nunca — insistiu Pedro, — mesmo que confortados pela razão, estejamos a ponto de não suportar mais?

— Sem dúvida, Pedro. A paciência harmoniza e reconforta, porquanto o Pai não tem pressa e prossegue trabalhando até hoje, enquanto eu também trabalho.

Com paciência a agressão passa, a dificuldade muda de lugar, o problema se resolve, o sofrimento se transfere, as incompreensões se aclaram, as lutas se pacificam e o amor triunfa.

A paciência é bênção de Deus pelo caminho por onde avançamos.

Confiemos e esperemos. A paciência nos dará a palma da paz a benefício de nós mesmos.

Silenciou o Rabi, enquanto o relógio do tempo continuava a trajetória da Eternidade.

Dias após ter entrado em triunfo em Jerusalém, paciente, Ele provou o fel da traição, da amargura, da soledade, e, na Cruz, com paciência, alcançou a plenitude da vitória como Herói Invencível de todos os tempos, esperando por nós.


* * *

Relâmpago fulgurante em noite escura, a palavra do Mestre cindia a noite demorada que tombava sobre Israel, desde há cinco séculos.

O eco da mensagem, doce e enérgica, se espraiava desde as planuras do Esdrelon até aos altiplanos do Hermon. . .

Aqueles que Lhe escutavam o verbo, renovavam-se e a nobre cantilena das Suas palavras prosseguia repercutindo no ádito das almas, sendo transferida de boca a ouvido, assinalando o início da comunicação elevada pelo impregnar do amor.

Aqueles dias, naquelas circunstâncias, jamais se fariam repetir e o conteúdo das Suas palavras nunca mais seria ouvido da forma como foi enunciado e vivido. . .

A multidão já se houvera dispersado, permanecendo as estrelas coruscantes pontilhando o velário da noite com os seus focos reluzentes.

Sopravam as brisas trazidas pelas aragens do mar, amenizando a paisagem do dia que fora ardente. . .

As criaturas atendidas, que haviam encontrado diretriz, trouxeram novos candidatos ao Amigo Divino, que não cessava de os socorrer.

Após a estafante jornada das horas passadas, o Rabi afastou-se para uma parte solitária da praia e mergulhou em profundo cismar.

O silêncio, que se fazia interrompido pelas onomatopeias da Natureza, tornara-se moldura viva na qual a figura do Mestre se destacava, irradiando diamantina claridade.

Sem que fosse percebida, uma mulher acercou-se de Jesus, e, após fazer-se notar por Ele, desculpou-se da imprudência de perturbá-lO.


Sem mais delongas O interrogou:

— Sei que tu vens de Deus e posso perceber-Te a grandeza que me fascina e emociona. . . Tenho sede de amor e me encontro corroída pela vérmina da animalidade. Tenho amado e não logrei a honra de fruir o amor. A vida, desde há muitos anos, em que fui dilapidada nos meus sentimentos de mulher, nega-me o que venho procurando: a paz, que parece fugir de mim, onde quer que eu me encontre. "Que fazer, Senhor, para viver a felicidade?" Havia na voz da estranha notas características de melancolia e de sofrimento demorado que as palavras não conseguiam exteriorizar.


O Mestre relanceou o olhar transparente pela paisagem aureolada de paz, e indagou-lhe por sua vez:
— Que vês em derredor? Examina a terra arrebentando-se em flores, frutos e verdor; o rio cantante, enriquecendo as margens de vida; o húmus discreto renovando o subsolo e os astros fulgurando ao longe. . . Em tudo, a ordem, o amor, a transparência da misericórdia do Pai, ensinando equilíbrio e vida. "O que parece caos transforma-se em bênção, o que aparenta transtorno se converte em paz, porque em tudo vige a sabedoria do Criador. "Não relaciones dores nem apresentes mágoas. "Levanta o olhar para cima e avança para o futuro. " A criatura, surpreendida pela resposta amorosa, volveu à interrogação:

— Compreendo, sim, a grandeza da divina criação, não obstante delinqui, e, do meu delito, nasceu-me um filho, que no momento constitui-me motivo de inquietação e desespero. . .


Sem permitir-lhe alongar-se, o Senhor prosseguiu, imperturbável:

— A mulher é sempre mãe. "A relva que cresce sobre os escombros oculta as suas deformidades e disfarça as suas imperfeições, modificando a erma expressão dos destroços. "Abençoada pela maternidade, que é sempre dádiva do Pai, honrando a vida, um filho, em qualquer circunstância, é uma estrela engastada na carne, com a oportunidade de espalhar claridade pelo caminho. "Enquanto houver crianças e mães, na Terra, o amor divino estará cantando esperanças para a Humanidade. "Não há filho do pecado nem do delito, pois que todos eles são dádivas da vida à vida. "Esquece as circunstâncias da chegada do querubim que te bate à porta do sentimento, e levanta-te com ele, avançando no rumo do infinito dos astros. " Uma imensa serenidade vestia a Natureza.

A mulher-mãe, emocionada, procurou os olhos de Jesus por entre a visão nublada de lágrimas e fundiu-se na luminosidade que deles fluía dúlcida e pura.

Levantou-se em discreta reverência e preparou-se para sair.

Não saberia dizer se O ouviu falar ou se O escutou na acústica da alma.

— Vai, filha, e ama. "A maternidade é a mais elevada concessão de Nosso Pai, demonstrando que o mal jamais triunfará no mundo; porque enquanto houver um coração, um sentimento maternal, na Terra, o amor ateará o fogo purificador e a esperança de felicidade jamais se fanará. . . " No longe do tempo, ecoariam os conceitos do Filho de Maria, a Mãe por Excelência, sustentando a mulher no ministério da maternidade por todo o sempre.




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