Pelos Caminhos de Jesus

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CAPÍTULO 20

O POEMA DO PERDÃO

A semente de luz espraiava-se pelas margens das cidades humildes: Cafarnaum, Betsaida, Magdala, Corazim...

Um sopro renovador alargava-se em todas as direções, atingindo as mais diversas paisagens dos corações humanos.

A palavra era proferida em canto de beleza invulgar, como dantes jamais ouvida.

O Estranho chegara e arrebatara as multidões.

Sua voz coloquial penetrava o âmago dos sentimentos qual fosse uma bênção por todos aguardada.

Cada vez que os seus lábios se abriam as palavras se convertiam em gemas de superior qualidade, em poemas de luz que despertavam as consciências para mais altas responsabilidades, para voos mais elevados...

Agora já O conheciam, porque Ele se identificara como o Messias.

Agitava-se, ao Seu redor, a massa amorfa, com o fermento das Suas Revelações.


* * *

A calúnia insaciável seguia-Lhe os passos abraçada à inveja doentia, enquanto o amor em canção de rara e profunda sabedoria, esparzia as dádivas da esperança, modificando as estruturas do comportamento humano de quantos se Lhe acercavam.


* * *

Israel seguia a Lei.

A formalística havia submetido o espírito da Mensagem de Vida, enquanto o povo sofrido padecia as constrições sociopolíticas de maior gravidade.

Os problemas de mais sérias e intricadas complexidades eram-lhe apresentados, não para que Ele os solucionasse, senão para O surpreenderem em algum ponto contrário às imposições legais.

Penetrando nas almas e conhecendo-lhes as profundidades dos sentimentos infelizes, o Senhor colocava nos devidos lugares as situações conflitantes, sem comprometer-se nem dificultar a marcha do Seu verbo de libertação.

Cada vez, no entanto, mais graves se faziam as conjunturas a Seu respeito...

Foi numa dessas ocasiões, quando a Lei de Amor, apresentada em sublime conotação, balsamizou as almas, que Ele enfrentou a multidão angustiada, conclamando todos ao irrestrito perdão das ofensas.


* * *

— Felizes são aqueles que perdoam, porquanto se liberam das paixões e adquirem a paz - Ele dissera, com indefinível entonação de voz.

A extraordinária melodia do perdão alcançou a acústica dos ouvintes, qual brisa balsâmica acarinhando a ardência das emoções.

— Quantas vezes, porém — indagou Pedro —, perdoarei ao meu próximo? Sete vezes? (Mateus 18:21-22) Havia, na interrogação do discípulo, toda uma tradição ancestral e os laivos das humanas paixões que sempre estabelecem limites nas realizações mais elevadas.

— Não apenas sete vezes, Simão, porém, setenta vezes sete vezes e não será o suficiente em relação ao ofensor que teima em nos magoar.

Quando a noite, porém, vestiu-se de astros balouçantes encravados no zimbório do Infinito, em colóquio particular com os amigos, ainda comovidos ante a revelação apresentada, Simão voltou a interrogar: — E se alguém, com quem não simpatizamos, nos ferir, por motivo nenhum, será lícito reagir, apresentando-o ao Juiz?

— Não, Pedro. Todo aquele que agride com ou sem motivo, encontra-se agredido em si mesmo.

— Isto, porém, não significaria apoiar a violência e permitir que os maus dominem os simples e humildes?

— De forma alguma. Os maus estão doentes, portadores de tormentos destruidores, no imo de si mesmos. "Revidar-lhes a ofensa é forma de aumentar-lhes a capacidade de agressão. Somente o amor ungido de abnegação consegue produzir a real transformação interior de alguém e demonstrar o valor da paz para quem a perdeu... "


— Nessa linha de raciocínio, indago — aduziu o amigo inquieto

—, e se da agressão pura e simples ele partir para tomar, nas suas mãos desvairadas, a vida de um ente querido, trucidando-a?

— Ainda aí - redarguiu, sereno, Jesus —, o perdão assume um papel preponderante, porquanto mais importante se nos apresenta o desafio do amor, quanto mais grave e difícil é a situação que nos leva a perdoar.

— Mestre - propôs ainda o companheiro com os olhos nublados de pranto —, saber que um vândalo retirou do nosso carinho, pela violência, um filho, uma esposa ou uma mãe e não revidar, não significa apoiar e legitimar o direito da força?

— Simão — redarguiu o Mestre, docemente —, o Pai estatuiu Leis das quais ninguém se evade. Não colocamos aqui a questão em termos de esquecimento à responsabilidade, nem desrespeito aos códigos legais estabelecidos. Referi-mo-nos ao revide, ao ódio, ao plano de cobrança por parte daqueles que foram atingidos pela enfermidade agressiva do próximo desvairado. "Além de eles não fugirem da consciência, que os não esquecerá no tribunal de si mesmos, cabe-nos deixar que os organismos especializados cumpram com as suas atribuições. Nós, porém, permaneceremos confiantes de que nada acontece sem que seja pela vontade do Pai. "Assim, não provoquemos a ninguém, nem a ninguém firamos. "Silenciemos as ofensas e dispensemos a misericórdia em toda parte e com todos aqueles com quem convivemos. "

— Mestre, e se, por fim, nos matarem? —, propôs o discípulo sincero com a voz sumida pela emoção.

— Viveremos, Simão — ripostou com ternura o Amigo. — Ninguém mata a vida. Prosseguiremos vivendo, tanto quanto o criminoso também viverá. "Jamais te esqueças de que a posição de vítima é sempre a melhor, a mais feliz. Quem aos outros fere, a si mesmo se fere;

quem ao próximo infelicita, a si mesmo se destrói no campo da emoção, com a diferença de que aquele que, aparentemente, é o perdedor, se amar e perdoar, estará isento de quaisquer aflições, ficando inatingido, desse modo, feliz... " Após uma pausa natural, na qual se escutavam as ânsias da Natureza em festas de onomatopeias e perfumes, o Rabi encerrou o diálogo, afirmando: — E quando eu for erguido (na cruz), atrairei todos a mim, perdoando-os até o fim.

O Cordeiro anunciava a Sua imolação no altar do sacrifício, para ensinar ao mundo, de todos os tempos, o poema do perdão das ofensas, que é o momento culminante do amor total em abrangência de abnegação sem limite.

Naqueles dias, a Sua voz cantava nas praias e arredores de Cafarnaum, Betsaida, Magdala, Corazim...

Desde então, sempre que o carro do triunfo parecer conduzir os violentos e agressivos na glória transitória dos seus êxitos, as vítimas que tombaram sob as suas armas sanguinárias farão silêncio para que eles recebam as homenagens vazias do mundo, que lhes não apagarão da consciência as reminiscências dos próprios crimes e desaires.


* * *

O poema do perdão, hoje como ontem e certamente quanto amanhã, será o hino dos Espíritos em sublimação, que o cantarão enquanto galgam o monte do calvário, de cujo acume se alarão, imolados, ao Reino do puro amor, vestindo-se de eterna paz.




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Mateus 18:21

Então Pedro, aproximando-se dele, disse: Senhor, até quantas vezes pecará meu irmão contra mim, e eu lhe perdoarei? Até sete?

mt 18:21
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João 12:32

E eu, quando for levantado da terra, todos atrairei a mim.

jo 12:32
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Mateus 18:22

Jesus lhe disse: Não te digo que até sete, mas, até setenta vezes sete.

mt 18:22
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