Pelos Caminhos de Jesus

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CAPÍTULO 3

A MAGNA CARTA

O verbo lúcido e poderoso de Jesus acabara de compor a Carta Magna da Humanidade, ao enunciar o sermão do monte no poema das bem-aventuranças. Jamais se ouvira um código das leis mais precioso e oportuno. Nunca mais se voltaria a escutar algo que se lhe equiparasse em beleza, profundidade e equilíbrio.

A música do verbo divino permanecia na acústica das almas que haviam participado da assembleia excepcional.

Tudo acontecera de surpresa, em razão da massa que afluíra àqueles sítios fronteiriços ao mar.

Podia-se, porém, sentir que o poema estava escrito nas páginas serenas da Natureza, e o Cantor aguardava apenas o momento de o entoar aos ouvidos humanos, que o registrariam na memória de todos os futuros A maioria dos assistentes, porém, enganada pelo mundo, esperava um legislador para Israel, que esgrimisse as armas da belicosidade e da dominação, exaltando as ambições da raça e protagonizando a materialização do comandante-chefe para o desencadear da revolução sanguinária...

O país esperava e queria um condutor apaixonado, capaz de estimular o ódio e fazer que se empunhassem os instrumentos da destruição, semeando a morte e erguendo, sobre os cadáveres amontoados e as cidades em ruína, o trono e a glória do poder temporal.

Os dias difíceis do novo cativeiro que o Império Romano ora impunha, deveriam ceder lugar às honras da liberdade política para o "povo eleito", que pretendia a outros povos subjugar, impondo-se de forma arbitrária e criminosa.

Anelava-se, à época, por um conquistador que se utilizasse da antiga Lei para espezinhar os adversários e projetar "os escolhidos" no rumo das estrelas e das glorificações transitórias.

Aquela, porém, era uma Carta de alforria lavrada em decretos de amor e de paz.

A suavidade dos seus artigos e parágrafos confundia-se com a energia e grandeza do conteúdo.

Ninguém jamais se atrevera a legislar com benignidade e doçura, louvando os sofredores, os deserdados, os pobres, os oprimidos, os esfaimados...

Estes herdariam a Terra, o céu, a plenitude, se se vencessem a si mesmos.

Os conquistados comuns incitavam às vitórias sobre os outros, à destruição dos demais, à luta exterior.

Este, no entanto, conclamava à supremacia do homem bom sobre o belicoso e do dominador de si mesmo em relação aos seus inimigos íntimos.

Para Ele, os adversários reais e mais perigosos viviam no imo de cada criatura e se fazia indispensável conquistá-los, transformando-os - as más tendências que eram - em servidores do bem.

Sem dúvida, a mensagem era revolucionária, de uma forma especial, então desconhecida.

Por tais razões, aquela significava o divisor de águas, separando as épocas do processo histórico para as criaturas.

Os que ouviram as regras do bem viver, alterando o conteúdo do pensamento, então vigente, saíram da montanha na condição de testemunhas do mundo novo, guardando sentimentos variados.

Havia decepção nos orgulhosos e desencanto nos ricos de paixões mesquinhas.

Predominava a revolta nas mentes que pretendiam dominar os outros, e, sem coragem de arrebanhar adeptos, para não correrem riscos, esperavam um líder que assumisse responsabilidades.

Em razão de Jesus representar o ideal dos sofredores e atrair as multidões, seria o condutor ideal para a guerra, a fim de tornar reais as profecias aguardadas, por cujo cumprimento se ansiava com carinho e quase desesperação.

Sem embargo, Ele se apresentava pacífico e pacificador.

Mais ovelha do que lobo devorador.

A Sua transparência moral desvelava-Lhe a alma pura.

O Seu discurso propunha que o cordeiro e o leão bebessem na mesma fonte e se ajudassem; que a pomba e a águia voassem juntas, confraternizando à luz do dia; que os cardos se abrissem em flor e nenhuma sombra de suspeita ou malquerença empanasse a claridade do afeto entre os homens.

Na Sua voz, felizes são os que sofrem com resignação, submissos às Leis da Vida, e não aqueles que se locupletam na miséria geral.

Exigir-se muito e desculpar as imperfeições noutrem constituíam fundamento novo para construir a paz pessoal e, depois, a geral.

Para Ele o pior escravo é aquele que se enclausura nas paixões, nos vícios, de que depende em cárcere escuro. O homem que pensa, ama e sonha livremente, nunca sofre escravidão, mesmo quando as injunções políticas e guerreiras lhe cerceiam os movimentos e lhe diminuem os direitos...

Outros, porém, os sofredores e tímidos, os padecentes e amargurados tiveram lenidas todas as suas dores e agora se deixavam penetrar pelo sentido extraordinário de cada um dos enunciados da surpreendente legislação. Ela constituía uma surpresa e se baseava na total inversão dos valores vigentes e aceitos.

Abriam-se as sombras da ignorância e brilhavam as claridades do conhecimento, demonstrando a ancianidade do ser espiritual, reemboscado no corpo, a fim de reparar os erros, recuperar os valores malbaratados, crescer no rumo do Bem.

Os pensamentos exarados projetavam luz nas incógnitas do comportamento humano, abençoando o sofrimento e lamentando os fomentadores da miséria, do infortúnio, do desespero...

A fome de verdade, a sede de justiça, a carência de amor, a necessidade de paz sempre foram marcas do processo de evolução, presentes no cerne da alma dos homens através dos tempos.

Ali, na paisagem ridente de Cafarnaum, do alto do monte fronteiro ao mar azul, refletindo a majestade do zimbório transparente, iniciava-se a Era da verdadeira libertação, que assinalaria a História, abrindo-lhe espaço para todas as épocas do futuro.

O Líder era poeta...

Seu verso era musical e sua palavra modulava a canção da vida eterna.

As anteriores haviam sido vozes extremadas pela ambição guerreira e argentária. Fomentando as conquistas das coisas e dos espaços, de terras e ruínas calcinadas, alienavam os vitoriosos que tombavam, mais tarde, vitimados pela morte, na loucura do poder, sobre os vencidos silenciosos.

Com Ele não havia morte, sempre vida em triunfo.

A Sua era a batalha sem trégua para a conquista da glória sem fim.

Não padecem os homens somente a fome de verdade, mas, também, a de pão e de dignidade; não apenas a sede de justiça, porém, igualmente, a de água potável, a de fraternidade e a de apoio; não tanto a carência de amor, todavia, a de amizade e a de compreensão; não só a necessidade de paz política lavrada com audácia nos gabinetes de luxo, por criaturas atormentadas que firmam acordos externos sob restrições e conflitos íntimos, no entanto, além disso, aquela que se irradia dos sentimentos elevados, fruto de uma consciência tranquila, que resulta de um comportamento ordeiro e digno.

(...) Estes são os herdeiros da terra do coração, no país da sua imortalidade.

Todos disputavam a permanência no corpo frágil e putrescível;

Ele, porém, vinha propor a libertação plena, que começa na harmonia do pensamento com o coração pacificado, e, não obstante, quaisquer circunstâncias juguladoras que surgissem por fora, haveria plenitude interior.

Impressa nas páginas sublimes do tempo passado-presente-futuro, a Constituição ideal permanece como legítimo código de liberdade, de direitos, de deveres e de paz sob a inspiração permanente do amor, que é a linha mestra desta Carta de alforria para a Humanidade.

Ela bastaria para nortear cada homem e todos os homens; cada povo e todos os povos.

A sua simplicidade, na síntese perfeita do seu conteúdo, abordando os elementos essenciais para a vida, constitui o máximo para o respeito à criatura, ao que lhe compete realizar e receber.

Legislação de amor e de justiça, é o código de honra baseado nas leis naturais da Criação.

A pessoa humana aí se engrandece e exalta, assumindo a real posição de filha de Deus.

As bem-aventuranças ainda permanecem desafiadoras, aguardando ser meditadas, para que, vividas, conduzam da Terra o homem, lutador e sofrido, na direção excelsa do "Reino dos Céus", que, no entanto, já tem início hoje, aqui e agora, no mundo transitório por onde se deambula.




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