Revista espírita — Jornal de estudos psicológicos — 1858

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Capítulo XVII

Fevereiro - Isolamento dos corpos pesados

Fevereiro


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O movimento imprimido aos corpos inertes pela vontade é hoje de tal modo conhecido que seria quase pueril relatar fatos do gênero. Já o mesmo não acontece quando o movimento é acompanhado por fenômenos menos vulgares como, por exemplo, o de sua suspensão no espaço. Embora os anais do Espiritismo citem numerosos exemplos, esse fenômeno apresenta uma tal derrogação das leis da gravidade, que é naturalíssima a dúvida dos que o testemunham. Nós mesmo, nós o confessamos, por mais habituado que estejamos às coisas extraordinárias, ficamos muito contente de poder constatar-lhe a realidade.

O fato que vamos relatar repetiu-se várias vezes aos nossos olhos, em reuniões verificadas outrora em casa do Sr. B..., na Rua Lamartine, e sabemos que se produziu inúmeras vezes noutros lugares. Podemos, portanto, atestá-lo como incontestável. Eis como as coisas se passavam:

Oito ou dez pessoas, entre as quais algumas dotadas de um poder especial, embora não fossem reconhecidas como médiuns, sentavam-se em torno de uma mesa de jantar, maciça e pesada, com as mãos às suas bordas e todos unidos pela intenção e pela vontade. Depois de um tempo mais ou menos longo, de dez a quinze minutos, conforme as disposições do ambiente fossem mais o menos favoráveis, a despeito de seu peso de cem quilos, a mesa se punha em movimento; deslizava para a direita ou para a esquerda no soalho; dirigia-se para as diversas partes da sala que fossem indicadas; depois se erguia, ora num pé, ora noutro, até formar um ângulo de 45.º e balançava-se rapidamente, imitando a arfagem e o balanceio de um navio. Se em tal posição a assistência redobrasse os esforços da vontade, a mesa se levantava completamente do solo, elevava-se de dez a vinte centímetros, sustentando-se no espaço sem nenhum apoio, durante alguns segundos, depois caía com todo seu peso.

O movimento da mesa, o levantamento sobre um pé e o balanço eram produzidos mais ou menos à vontade. Ocorria com frequência e várias vezes na sessão, mesmo sem nenhum contato das mãos. A vontade bastava para que a mesa se dirigisse para o lado indicado.

O isolamento completo era mais difícil de obter, mas foi repetido muitas vezes para que se não pudesse considerá-lo como um fato excepcional. Isto não se passava na presença exclusiva de adeptos que pudessem ser inquinados de muito acessíveis à ilusão, mas à frente de vinte ou trinta pessoas, entre as quais, por vezes, algumas muito pouco simpáticas e que não deixavam de levantar a suspeita de uma secreta preparação, sem consideração para com os donos da casa, cujo caráter honesto deveria afastar qualquer suspeita de fraude e para os quais seria aliás um prazer muito singular passar algumas horas por semana a mistificar uma assembleia sem o menor proveito.

Relatamos o fato em toda a sua simplicidade, sem restrição nem exagero. Assim, não diremos que vimos a mesa volitar no espaço como uma pena, no entanto, tal como se apresenta, o fato não demonstra menos a possibilidade de isolamento dos corpos pesados sem ponto de apoio, por meio de uma força ainda desconhecida. Também não diremos que era bastante estender a mão ou fazer um sinal qualquer para que, no mesmo instante, a mesa se movesse e se elevasse como que por encanto.

Ao contrário, diremos, para sermos fiéis à verdade, que os primeiros movimentos sempre se operavam com certa lentidão, e que só gradativamente adquiriam o máximo de intensidade. O soerguimento completo só se verificava depois de alguns movimentos preparatórios, que eram como que ensaios para uma espécie de arremesso. A força atuante parecia redobrar de esforços pelo encorajamento dos assistentes, como um homem ou um cavalo que cumpre uma tarefa pesada e que é excitado por gestos e palavras. Uma vez produzido o efeito, tudo voltava à calma, e por alguns instantes nada era obtido, como se aquela mesma força tivesse necessidade de tomar fôlego.

Teremos muitas ocasiões de citar fenômenos desse gênero, quer espontâneos, quer provocados, e realizados em proporções e circunstâncias muito mais extraordinárias. Mas quando tivermos sido testemunha, relatá-los-emos sempre de modo a evitar qualquer interpretação falsa ou exagerada. Se no caso acima nos tivéssemos contentado em dizer que havíamos visto uma mesa de cem quilos elevarse ao simples contato das mãos, não há dúvida de que muita gente haveria de pensar que a mesa tinha subido até o forro e com a rapidez de um olhar. É assim que as coisas mais simples se tornam prodígios, pelas proporções emprestadas pela imaginação. Que não será quando os fatos atravessarem os séculos e passarem pela boca dos poetas! Se disséssemos que a superstição é filha da realidade, o conceito seria tomado como um paradoxo. Contudo, nada mais verdadeiro: não há superstição que não repouse sobre um fundo real. Tudo está em discernir onde uma começa e o outro acaba. O verdadeiro meio de combater as superstições não é contestá-las de maneira absoluta. No espírito de certa gente há ideias que se não desenraizam facilmente, porque sempre há fatos que podem citar em apoio de sua opinião. Ao contrário, é preciso mostrar o que há de real. Então restará apenas o exagero ridículo, ao qual o bom-senso fará justiça.


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