Revista espírita — Jornal de estudos psicológicos — 1858

Versão para cópia
Capítulo XCII

Novembro - Médium pintor

Novembro
Nem todos podem ser convencidos pelo mesmo gênero de manifestações espíritas, por isso foi preciso que se desenvolvessem médiuns de vários tipos. Nos Estados Unidos há os que fazem retratos de pessoas falecidas há muito tempo e que jamais haviam visto. E como a semelhança é notada imediatamente, as pessoas sensatas que o testemunham não deixam de se converter. O mais notável desses médiuns é talvez o Sr. Rogers, que já citamos (Vol. 1, pág. 239[1]), residente em Columbus, onde exercia a profissão de alfaiate. Devemos acrescentar que não possuía qualquer outra habilitação profissional.

Aos homens instruídos que têm dito e repetido, a propósito da teoria espiritualista: “Recorrer aos Espíritos não passa de hipótese; um exame atento prova que nem é a mais racional, nem a mais verossímil”, a esses, sobretudo, oferecemos a tradução que segue, abreviadamente, de um artigo publicado a 27 de julho último pelo Sr. Lafayette R. Gridley, de Attica, Indiana, para os editores do Spiritual Age, que a publicaram na íntegra na edição de 14 de agosto.

Em maio último, o Sr. E. Rogers, de Cardington - Ohio, conhecido médium pintor que faz retratos de pessoas que não mais se encontram neste mundo, veio passar alguns dias em minha casa. Durante sua rápida visita foi influenciado por um artista invisível, que deu o nome de Benjamin West. Ele pintou alguns belos retratos, em tamanho natural, assim como alguns outros de qualidade algo inferior.

Eis algumas particularidades relativas a dois desses retratos.

Foram pintados pelo dito E. Rogers, num quarto escuro, em minha casa, no curto espaço de uma hora e meia, tempo este do qual meia hora mais ou menos decorreu sem que o médium tivesse sido influenciado e que aproveitei para examinar o seu trabalho, ainda não concluído. Rogers caiu novamente em transe e terminou esses retratos.

Então, embora nenhuma indicação tivesse sido dada quanto às pessoas representadas, um dos retratos foi imediatamente reconhecido como sendo de meu avô, Elias Gridley. Minha esposa, minha irmã, a Sra. Chaney, e em seguida meu pai e minha mãe, todos foram unânimes em reconhecer a grande semelhança: é um facsímile do velho, com todas as particularidades de sua cabeleira, de sua camisa, etc.

Quanto ao outro retrato, nenhum de nós o reconheceu. Eu o pendurei no meu armazém, à vista dos transeuntes, onde ficou uma semana sem ser reconhecido. Esperávamos que alguém nos dissesse que era qualquer antigo residente de Attica. Já perdia a esperança de saber de quem seria o retrato quando uma tarde, numa sessão espírita reunida em minha casa, um Espírito manifestou-se e me deu a comunicação seguinte:

“Meu nome é Horace Gridley. Há mais de cinco anos deixei meus despojos. Morei muitos anos em Natchez, no Mississipi, onde ocupei o cargo de sheriff. Minha única filha mora lá. Eu sou primo de vosso pai. Outras informações a meu respeito podem ser obtidas dirigindo-se ao vosso tio, o Sr. Gridley, de Brownsville, no Tennessee. O retrato que tendes em vosso armazém é o meu, da época em que vivia na Terra, pouco tempo antes de passar a esta outra existência, mais elevada, melhor e mais feliz. Ele se parece comigo, pelo menos tanto quanto me foi possível retomar a fisionomia de então, pois que isto é indispensável quando nos pintam. Nós fazemos o mais que podemos para dela nos recordarmos, conforme o permitam as condições do momento. O retrato em questão não está acabado como eu o desejava. Há umas ligeiras imperfeições que o Sr. West diz provirem das condições em que se achava o médium. Apesar disso, mande o retrato para Natchez, a fim de ser examinado. Acredito que o identificarão”.

Os fatos mencionados nesta comunicação eram inteiramente ignorados por mim e por todos os habitantes das redondezas. Conquanto há muitos anos certa vez tivesse ouvido falar que meu pai tinha um parente naqueles lados do vale do Mississipi, nenhum de nós sabia o nome dele; o lugar onde tinha vivido; nem mesmo se havia morrido. Só muitos dias depois é que soube por meu pai, que morava em Delphi, a quarenta milhas daqui, qual havia sido o lugar de residência de seu primo, de quem há cerca de sessenta anos ele quase não ouvira mais falar.

Nem tínhamos pensado em pedir retratos de família. Eu apenas tinha posto em frente ao médium uma nota com os nomes de cerca de vinte antigos moradores de Attica, não mais deste mundo, de alguns dos quais desejávamos obter o retrato.

Assim, penso que as pessoas sensatas admitirão que nem o retrato, nem a comunicação de Horace Gridley possam ser resultado de uma transmissão de nosso pensamento ao médium. Aliás, é sabido que o Sr. Rogers jamais conheceu qualquer dos homens cujo retrato pintou e dos quais provavelmente jamais ouvira falar, porque é inglês nato; veio para a América há dez anos e jamais viajou para o Sul além de Cincinnati, ao passo que Horace Gridley, ao que eu saiba, nunca andou para o Norte além de Memphis, no Tennessee, nos últimos trinta e cinco anos de vida terrena. Ignoro que algum dia tenha visitado a Inglaterra, entretanto, isto poderia ter ocorrido antes do nascimento de Rogers, pois ele não tem mais que vinte e oito a trinta anos. Quanto a meu avô, falecido há cerca de dezenove anos, jamais saiu dos Estados Unidos e seu retrato jamais fora feito de qualquer maneira.

Depois que recebi a comunicação acima transcrita, escrevi ao Sr. Gridley, de Brownsville. Sua resposta veio confirmar quanto havíamos ouvido através da comunicação do Espírito. Consegui ainda o nome do único rebento de Horace Gridley, que é a Sra. L. M. Patterson, ainda residente em Natchez, onde seu pai morou muitos anos. Ele faleceu, na opinião de meu tio, há cerca de seis anos, em Houston, no Texas.

Então escrevi à Sra. Patterson, minha prima recém descoberta, e lhe mandei uma cópia daguerreotipada do retrato que, segundo nos diziam, era de seu pai. Na carta ao meu tio de Brownsville eu nada disse relativamente ao principal objetivo de minhas pesquisas, como nada disse à Sra. Patterson: nem a razão de lhe enviar o retrato, nem como o havia obtido, nem quem era a pessoa que o mesmo representava. Apenas perguntei a minha prima se nele reconhecia alguém. Respondeu-me que ao certo não poderia dizer de quem era o retrato, mas me assegurava de que era parecido com seu pai, na época de sua morte. Depois eu lhe escrevi que nós o havíamos também tomado como se fosse de seu pai, sem lhe dizer, entretanto, como o havíamos obtido. A resposta de minha prima dizia, em suma, que na cópia remetida todos haviam reconhecido seu pai, antes que eu lhe tivesse dito quem o retrato representava. Entretanto, ficou muito surpreendida de que eu tivesse um retrato de seu pai, quando ela mesma não tinha nenhum e seu pai nunca lhe havia dito que algum dia tivesse mandado fazer seu próprio retrato, fosse por quem fosse. Ela pensava que não existisse nenhum e ficou muito satisfeita com a minha remessa, sobretudo por causa de seus filhos, que tinham grande veneração pela memória do avô.

Então eu lhe mandei o retrato original, autorizando-a a ficar com ele, caso lhe agradasse, mas não lhe disse como o havia obtido. São estas as principais passagens de sua resposta:

“Recebi sua carta e o retrato de meu pai, que permite fique comigo, se for bastante semelhante. Na verdade, é muito parecido, e como jamais tive outro dele, fico com este, já que o permite, e o aceito muito reconhecida, embora me pareça que meu pai fosse mais bonito, quando gozava de saúde”.

Antes da recepção das duas últimas cartas da Sra. Patterson, quis o acaso que o Sr. Hedges, atualmente de Delphi, mas antigo morador de Natchez, e o Sr. Ewing, recém vindo de Vicksbourg, no Mississipi, vissem o retrato em questão e o reconhecessem como sendo de Horace Gridley, com quem ambos tinham tido relações.

Acho que estes fatos são muito significativos para serem mantidos no silêncio e julguei-me na obrigação de revelá-los, a fim de se lhes dar publicidade. Assegurovos que escrevendo este artigo, tive todo o cuidado com a absoluta correção”.

NOTA: Já conhecemos os médiuns desenhistas. Além dos admiráveis desenhos dos quais demos um espécime, mas que representam coisas cuja exatidão é impossível verificar, vimos médiuns absolutamente estranhos a essa arte executarem sob nossas vistas esboços facilmente reconhecíveis de pessoas falecidas que eles não haviam conhecido. Mas daí a um retrato acabado, de acordo com todas as regras, vai muita distância. Esta faculdade se liga a um fenômeno muito curioso, do qual somos testemunha neste momento. A ele nos reportaremos proximamente.



[1] Vol. I, pág. 239 do “Spiritualist” de Nova Orleans.



Acima, está sendo listado apenas o item do capítulo 92.
Para visualizar o capítulo 92 completo, clique no botão abaixo:

Ver 92 Capítulo Completo
Este texto está incorreto?