Revista espírita — Jornal de estudos psicológicos — 1859

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Capítulo XIX

Março - Diatribes

Março
Com certeza algumas pessoas esperam encontrar aqui uma resposta a certos ataques pouco comedidos à Sociedade, a nós pessoalmente e, em geral, aos partidários do Espiritismo, ataques dos quais temos sido vítimas nos últimos tempos.

Pedimos que se reportem ao nosso artigo sobre a polêmica espírita, que abriu o nosso número de novembro último, no qual fizemos a nossa profissão de fé a respeito. Poucas palavras devemos acrescentar, uma vez que não nos sobra tempo para discussões ociosas. Que aqueles que têm tempo a perder para rir de tudo, mesmo daquilo que não compreendem; para a maledicência; para a calúnia ou para as piadas, fiquem satisfeitos: não temos a pretensão de lhes criar obstáculos. A Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, composta de homens dignos por seu saber e por sua posição, tanto franceses como estrangeiros, médicos, escritores, artistas, funcionários, oficiais, negociantes, etc., recebendo diariamente as mais altas notabilidades sociais e tendo correspondência com todas as partes do mundo, está acima das pequenas intrigas do ciúme e do amor-próprio. Ela prossegue seus trabalhos na calma e no recolhimento, sem se inquietar com as piadas de mau gosto que não poupam nem mesmo as mais respeitáveis organizações.

Com referência ao Espiritismo em geral, que é uma das potências da Natureza, a zombaria virá a dobrar-se, como se dobrou de encontro a tantas outras coisas consagradas pelo tempo. Essa utopia, essa maluquice, como o classificam certas pessoas, já deu a volta ao mundo e nem mesmo todas as diatribes impedirão a sua marcha, do mesmo modo que outrora os anátemas não impediram que a Terra girasse. Deixemos, pois, que os gracejadores riam à vontade, desde que assim lhes apraz. Fá-lo-ão à custa do espírito. Se eles riem da religião, por que não haveriam de rir do Espiritismo, que é uma ciência? Esperamos que nos prestem mais serviços do que prejuízos e que nos poupem despesas de publicidade, porque não há um só de seus artigos, mais ou menos espirituosos, que não tenha produzido a venda de alguns de nossos livros e que não nos tenha proporcionado alguns assinantes. Obrigado, pois, pelo serviço que nos prestam involuntariamente. Também pouco diremos quanto ao que nos toca pessoalmente. Perdem seu tempo todos quantos nos atacam ostensiva ou disfarçadamente, se julgam que nos perturbam. Também se enganam, se pensam em nos barrar o caminho, pois nada pedimos e apenas aspiramos a tornar-nos útil, no limite das forças que Deus nos concedeu. Por mais modesta que seja a nossa posição, contentamo-nos com aquilo que para muitos seria mediocridade. Não ambicionamos posição, nem honras ou fortuna. Não desejamos o mundo nem os seus prazeres. Aquilo que não podemos ter não nos causa desgosto e o vemos com a mais completa indiferença. Isso não é compatível com nossos gostos, consequentemente não invejamos a nenhum daqueles que possuem tais vantagens, se vantagens há ─ o que a nossos olhos é um problema ─ porque os prazeres pueris deste mundo não asseguram um melhor lugar no outro, muito pelo contrário. Nossa vida é toda de trabalho e de estudo e consagramos ao trabalho até os momentos de repouso. Nisto não há nada que possa causar inveja. Como tantos outros, trazemos a nossa pedra ao edifício que se ergue; entretanto, coraríamos se disso fizéssemos um degrau para atingir fosse o que fosse. Que outros tragam mais pedras que nós! Que outros trabalhem tanto e melhor que nós e os veremos com sincera alegria. O que queremos, antes de mais nada e acima de tudo, é o triunfo da Verdade, venha de onde vier, pois não temos a pretensão de ver sozinho a luz. Se isso deve proporcionar alguma glória, o campo a todos está aberto e estenderemos a mão a todos aqueles que, neste duro curso da vida, nos seguirem lealmente, com abnegação e sem segundas intenções pessoais.

Sabíamos muito bem que, arvorando abertamente a bandeira das ideias das quais nos fizemos um dos propagadores, afrontando preconceitos, atrairíamos inimigos, sempre prontos a desferir setas envenenadas contra quem quer que erga a cabeça e se ponha em evidência. Há, porém, uma diferença entre eles e nós. Não queremos para eles o mal que nos procuram fazer, porque compreendemos a fragilidade humana e é somente nisto que a eles nos julgamos superior. O homem se avilta pela inveja, pelo ódio, pelo ciúme e por todas as paixões mesquinhas, mas eleva-se pelo esquecimento das ofensas. Eis a moral espírita. Ela vale menos que a moral das pessoas que estraçalham o próximo? Ela nos foi ditada pelos Espíritos que nos assistem. Por aí podemos julgar se eles são bons ou maus. Ela nos mostra as coisas do alto tão grandes, e as de baixo tão pequenas que apenas devemos lamentar aqueles que voluntariamente se torturam para proporcionar efêmeras satisfações ao seu amor-próprio.


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