Revista espírita — Jornal de estudos psicológicos — 1859

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Capítulo LI

Agosto - O guia da senhora Mally

Agosto
1. ─ (Evocação do guia da senhora Mally).
─ Aqui estou. Isto é fácil para mim.

2. ─ Com que nome poderemos designá-lo?
─ Como quiserdes; por aquele pelo qual já me conheceis.

3. ─ Qual o motivo que o ligou à senhora Mally e a seus filhos?
─ Em primeiro lugar, antigas relações; depois, uma amizade, uma simpatia que Deus protege sempre.

4. ─ Dizem que foi a sonâmbula, senhora Dupuy, que o encaminhou à senhora Mally. É verdade?
─ Foi a sonâmbula que afirmou que eu estava junto à outra.

5. ─ Você depende dessa sonâmbula?
─ Não.

6. ─ Ela poderia afastar-vos daquela senhora?
─ Não.

7. ─ Se a sonâmbula viesse a morrer, isto teria sobre você alguma influência?
─ Nenhuma.

8. ─ Faz muito tempo que seu corpo morreu?
─ Sim, vários anos.

9. ─ O que era você em vida?
─ Um menino falecido aos oito anos.

10. ─ Como Espírito você é feliz ou infeliz?
─ Feliz. Não tenho nenhuma preocupação pessoal e não sofro senão pelos outros. É verdade que sofro muito por eles.

11. ─ Foi você que apareceu na escada à senhora Mally, sob a forma de um moço que ela supôs fosse um ladrão?
─ Não. Era um companheiro.

12. ─ E outra vez, sob a forma de um cadáver? Isso poderia impressioná-la desagradavelmente. Foi uma travessura que demonstra falta de benevolência.
─ Longe disso, em muitos casos, mas neste era para dar ideias mais corajosas à Senhora Mally. Que é que tem um cadáver de apavorante?

13. ─ Então você tem o poder de se tornar visível à vontade?
─ Sim, mas eu disse que não era eu.

14. ─ Você também não tem nada a ver com as outras manifestações materiais produzidas na casa dela?
─ Perdão! Isto sim. Foi o que eu me impus, junto a ela, como trabalho material, mas faço para ela outro trabalho muito mais útil e muito mais sério.

15. ─ Você pode tornar-se visível a todos?
─ Sim.

16. ─ Você poderia tornar-se visível aqui, a um de nós?
─ Sim, se pedirdes a Deus para que isso aconteça. Eu posso, mas não ouso fazê-lo.

17. ─ Se você não quer tornar-se visível, poderia pelo menos dar-nos uma manifestação, como por exemplo trazer qualquer coisa para cima desta mesa?
─ Certamente, mas qual seria a utilidade? Para ela é assim que eu testemunho a minha presença, mas para vós isto seria inútil, pois estamos conversando.

18. ─ O obstáculo não seria a falta de um médium, necessário para produzir essas manifestações?
─ Não, isto é um pequeno obstáculo. Não vedes frequentemente aparições súbitas a pessoas sem nenhuma mediunidade?

19. ─ Então todo mundo é apto a ver aparições espontâneas?
─ Sim, pois todo ser humano é médium.

20. ─ Entretanto, o Espírito não encontra no organismo de certas pessoas uma facilidade maior para comunicar-se?
─ Sim, mas eu vos disse ─ e vós deveis sabê-lo ─ que os Espíritos têm o poder por si mesmos. O médium nada é. Não tendes a escrita direta? É necessário médium para isso? Não, mas apenas a fé e um ardente desejo. E ainda às vezes isto se produz a despeito dos homens, isto é, sem fé e sem desejo.

21. ─ Você acha que as manifestações, como a escrita direta, por exemplo, se tornarão mais comuns do que são hoje?
─ Certamente. Como compreendeis, então, a vulgarização do Espiritismo?

22. ─ Você pode explicar-nos o que é que a filha da senhora Mally pegava na mão e comia quando estava doente?
─ Maná, uma substância criada por nós, que encerra o princípio contido no maná ordinário e a doçura do confeito.

23. ─ Essa substância é formada da mesma maneira que as roupas e os outros objetos que os Espíritos produzem por sua vontade e pela ação que exercem sobre a matéria?
─ Sim, mas os elementos são muito diferentes. Os ingredientes que formam o maná não são os mesmos que eu arranjava para criar madeira ou roupa.

24. ─ (A São Luís) Os elementos utilizados pelo Espírito para formar seu maná eram diferentes dos que ele tomava para formar outras coisas? Sempre nos disseram que há um só elemento primitivo universal, do qual os diferentes corpos são simples modificações.
─ Sim. Isto significa que esse elemento primitivo está no espaço, aqui sob uma forma, ali sob outra. É o que ele quer dizer. Ele obtém o seu maná de uma parte desse elemento, que supõe diferente, mas que é sempre o mesmo.

25. ─ A ação magnética pela qual se pode dar propriedades especiais a uma substância, como à da água, por exemplo, tem relação com a do Espírito que cria uma substância?
─ O magnetizador não emprega nada além da sua vontade. É um Espírito que o ajuda, que se encarrega de preparar o remédio.

26. ─ (Ao guia) Há tempos relatamos fatos curiosos de manifestações de um Espírito por nós designado com o nome de Duende de Bayonne. Você conhece esse Espírito?
─ Particularmente, não, mas acompanhei o que fizestes a seu respeito e foi dessa forma que tomei conhecimento dele.

27. ─ Ele é um Espírito de ordem inferior?
─ Inferior quer dizer mau? Não. Quer dizer, simplesmente: não inteiramente bom, pouco adiantado? Sim.

28. ─ Agradecemos pela bondade de ter vindo, e pelas explicações que nos deu.
─ Às vossas ordens.

OBSERVAÇÃO: Oferece-nos esta comunicação um complemento àquilo que dissemos nos dois artigos precedentes sobre a formação de certos corpos pelos Espíritos. A substância dada à criança, durante a doença, evidentemente era preparada por eles e objetivava restaurar a saúde. De onde tiraram os seus princípios? Do elemento universal, transformado para o uso desejado. O fenômeno tão estranho das propriedades transmitidas por ação magnética, problema até aqui inexplicado, e sobre o qual se divertiram os incrédulos, está agora resolvido. Com efeito, sabemos que não são apenas os Espíritos dos mortos que agem, mas que os dos vivos também têm a sua parte de ação no mundo invisível. O homem da tabaqueira dá-nos a prova disso. Que há, pois, de admirável em que a vontade de uma pessoa, agindo para o bem, possa operar uma transformação da matéria primitiva e dar-lhe determinadas propriedades? Em nossa opinião, aí está a chave de muitos efeitos supostamente sobrenaturais, dos quais teremos oportunidade de falar.

É assim que, pela observação, chegamos a perceber as coisas que fazem parte da realidade e do maravilhoso. Mas quem diz que esta teoria é verdadeira? Vá lá! Ela tem pelo menos o mérito de ser racional e de estar perfeitamente em concordância com os fatos observados. Se algum cérebro humano achar outra mais lógica do que esta dada pelos Espíritos, que sejam comparadas. Um dia talvez nos agradeçam por termos aberto o caminho ao estudo racional do Espiritismo.

Certo dia alguém nos dizia: “Eu bem que gostaria de ter um Espírito serviçal às minhas ordens, mesmo que tivesse de suportar algumas travessuras que me fizesse.”

É uma satisfação que a gente desfruta sem o perceber, porque nem todos os Espíritos que nos assistem se manifestam de maneira ostensiva, mas nem por isso deixam de estar ao nosso lado e, pelo fato de ser oculta, sua influência não é menos real.


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