Revista espírita — Jornal de estudos psicológicos — 1863
Versão para cópiaCapítulo VII
Janeiro - Identidade de um Espírito encarnado
Janeiro
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Estando em viagem, nosso colega, Sr. Delanne, nos transmite o
relato seguinte, sobre a evocação do Espírito de
sua esposa, viva, que ficara em Paris.
“...A 11 de dezembro último, estando em Lille, evoquei o
Espírito de minha mulher, às 11h30 da noite. Ela me disse que uma de suas
parentas casualmente havia dormido com ela. O fato deixou-me dúvidas, pois não
julgava isso possível, mas, dois dias depois, dela
recebi uma carta, confirmando a realidade. Remeto a minha conversa, embora nada encerre de particular, porque oferece uma
prova de identidade.
l. ─ Estás aí, querida amiga?
─ Sim, meu gordo.
(É seu termo favorito)
2.
─ Vês os objetos que me rodeiam?
─ Vejo-os bem. Estou feliz por estar perto
de ti. Espero que estejas bem agasalhado! (Eram 11h30; eu acabara de chegar de Arras; o quarto não tinha
aquecimento; eu estava envolvido na capa de
viagem e ainda não tinha tirado meu cachenê).
3.
─ Estás contente por ter vindo sem o corpo?
─ Sim, meu amigo. Eu te agradeço. Tenho o
corpo fluídico, o perispírito.
4.
─ És tu que me fazes escrever? Onde te postas?
─ Junto a ti. Certamente tua mão ainda tem dificuldade em mover-se.
5.
─ Estás bem adormecida?
─ Não, ainda não muito bem.
6.
─ Teu corpote retém?
─ Sim, sinto que me retém. Meu corpo está um pouco doente,
mas o Espírito não sofre.
7.
─ Durante o dia tiveste a intuição de que te
evocaria esta noite?
─ Não, contudo não posso definir o que me dizia que eu te
veria. (Neste instante tive um acesso de tosse). Tu tosses sempre, amigo;
cuida-te um pouco.
8.
─ Podes ver meu perispírito?
─ Não. Só posso distinguir o corpo
material.
9.
─ Tu te sentes mais livre e melhor do que com o
corpo?
─ Sim, porque não sofro mais. (Em carta posterior eu soube que ela efetivamente
havia estado indisposta).
10.
─ Vês Espíritos em volta de mim? ─ Não, posto o
deseje muito.
11.
─ Receias estar só em casa?
─ Adélia está comigo.
(Esta parenta jamais dorme em nossa casa; só a vemos raramente).
12.
─ Como é que Adélia está contigo? Ela dormiu contigo? ─ Sim, por acaso.
13.
─ És tu mesma que falas
comigo, cara esposa?
─ Sim, amigo. Sou
eu mesma.
14.
─ Vês bem claro aqui?
─ Sim, tudo irradia melhor que tua fraca lâmpada. (Eu não tinha senão uma vela, num quarto
grande).
15.
─ Tu te comunicas comigo
por intuição ou mecanicamente?
─ Eu atuo mais particularmente
sobre o teu cérebro, que é adequado para receber mais facilmente; contudo, ao mesmo tempo,
dirijo tua mão.
16.
─ Como podes ver que meu cérebro é apto a
receber as comunicações espíritas?
─ É pelo desenvolvimento adquirido por teus órgãos há pouco
tempo, o que prova que foi preciso... (Neste instante soa meia noite e o
Espírito para).
17.
─ Ouves o som do pêndulo?
─ Sim, mas eu continuo impressionada
com esse som inusitado. Ele é parecido com a música celeste que eu ouvi no sonho que te contei. (Com efeito,
pouco antes de minha partida ela tinha tido um sonho delicioso, no qual ouvira
uma harmonia singular. Nesse momento, tenho certeza de
que eu não pensava no sonho, que havia esquecido completamente. Assim,
não podia ser reflexo de meu pensamento, porque, como ninguém mais dele tinha
conhecimento, e na ocasião eu estava só, vi nessa revelação espontânea uma nova
prova da identidade do Espírito de minha mulher. O Espírito termina
espontaneamente a frase começada acima) ... muita força em tão pouco tempo.
18.
─ Queres que eu evoque
meu anjo da guarda para controlar tua identidade?
Isto te aborreceria?
─ Podes fazê-lo.
19.
(Ao meu anjo da guarda) ─ É mesmo o Espírito de
minha mulher que acaba de me falar?
─ É tua esposa que te fala e está
satisfeita por te ver.
20.
(À minha mulher) ─ Viste meu anjo da guarda?
─ Sim. Ele
é resplandecente de luz. Apenas apareceu e desapareceu.
21.
─ Ele te viu?
─ Sim, olhou-me com olhos de uma celeste clemência, e eu,
confusa, prostreime. Adeus, meu gordo. Sinto-me forçada
a deixar-te.
OBSERVAÇÃO:
Se o controle se tivesse limitado à resposta do anjo da guarda, teria sido
insuficiente, pois, por sua vez, teria sido preciso controlar o anjo da guarda,
quanto à identidade, porque um Espírito enganador poderia ter
usurpado o nome. Nada há, nessa simples afirmação, que revele a sua
qualidade. Em casos semelhantes, é sempre preferível controlar por um
médium estranho que não esteja sob a mesma influência. Invocar um
Espírito para controlar outro nem sempre oferece garantia suficiente, sobretudo se se pede permissão ao
suspeito. No caso em tela, encontramos uma prova na
descrição que o Espírito faz do anjo da guarda. Um Espírito
enganador não poderia ter tomado aquele aspecto celeste. Aliás reconhece-se, em
todas as suas respostas, um caráter de veracidade que a
charlatanice não poderia simular.
SESSÃO DA NOITE SEGUINTE
22. ─ Estás aqui? ─ Sim. Vou dizer o que te preocupa: É Adélia. Então! Sim, ela dormiu realmente comigo, eu te juro.
22. ─ Estás aqui? ─ Sim. Vou dizer o que te preocupa: É Adélia. Então! Sim, ela dormiu realmente comigo, eu te juro.
23. ─
Teu corpo está melhor? ─ Sim. Não era nada.
24. ─
Hoje vês Espíritos perto de ti?
─ Ainda não vejo nada, mas pressinto
algum, pois estou inquieta por estar só.
25. ─
Ora, minha boa amiga, e talvez melhores.
─ Sim. É o que vou fazer. Dize comigo: “Meu Deus, grande e
justo, abençoainos e absolvei-nos de nossas iniquidades; perdoai aos vossos filhos
que vos amam; dignai-vos inspirar-lhes as vossas virtudes e concedei-lhes a
graça insigne de um dia serem contados entre os vossos eleitos. Que a dor
terrestre nada lhes pareça em comparação com a felicidade que reservais aos que
vos amam sinceramente. Absolvei-nos, Senhor, e prodigalizai-nos
vossos benefícios pela intercessão divina da pura e angélica Santa Maria, mãe
dos pecadores e a misericórdia encarnada”.
OBSERVAÇÕES: Esta prece, improvisada pelo Espírito, é de uma tocante simplicidade. O Sr. Delanne não conhecia o fato relativo a Adélia senão pelo que havia dito o Espírito de sua esposa, e era tal fato que lhe suscitava dúvidas. Tendo-lhe escrito a respeito, recebeu a seguinte resposta:
“...Adélia veio realmente ontem à tarde, por acaso. Convidei-a
a ficar, não por medo, do qual me rio, mas para tê-la comigo. Vês que ficou e
dormiu comigo. Fiquei perturbada estas duas últimas noites;
sentia um certo mal-estar, do qual não me dava bem conta. Era uma força invencível que me forçava a dormir. Eu estava como que aniquilada. Mas me sinto tão feliz
por ter ido ver-te!...”
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