Além da Morte

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CAPÍTULO 31

ANOTAÇÕES VALIOSAS

Vivamente impressionada com o admirável fenômeno de que acabara de participar, não pude sopitar o desejo de aprender, e logo, na primeira oportunidade, indaguei da irmã Zélia:

— Em referência ao trabalho socorrista, recordar-se-á o médium, do acontecido? E a jovem Ângela, guardará ela lembranças que lhe felicitem o Espírito?


Sempre generosa, a Benfeitora esclareceu:

— Certamente. Entretanto, as lembranças serão diversas, O médium, pelo fato de conviver mais com os problemas espirituais, saberá que esteve em trabalho de auxílio, conservando vagamente, na memória, as cenas, embora não muito bem delineadas. Angela, todavia, terá a recordação de um pesadelo apavorante, despertando assustada, em pranto e profundamente triste. Mas estará assistida pela Infinita Misericórdia do Céu, que a todos ajuda, indistintamente.

Era muito lógico o esclarecimento.

A este tempo, afastamo-nos da sala.

A noite serena parecia invadida pelo canto da Imortalidade, interpretada nos seus mistérios e segredos.

Os ensinamentos recolhidos conduziam-me a meditações em torno da mediunidade. Infelizmente não conduzia comigo uma bagagem intelectual que me facultasse penetrar as sutilezas dos novos ensinamentos. Modesta dona de casa, Deus sempre se me afigurou como Pai Misericordioso. Amei-O com a inocência de alma simples que não vive sobrecarregada de indagações inquietantes. O Espiritismo ensinou-me a amá-lO como Pai Sapiente, e agora, ante as lições recebidas, lamentava a estreiteza do meu entendimento, que me impossibilitava a retenção de tão valiosos ensinamentos.


Notando-me o cenho carregado, a cuidadosa preceptora indagou-me dos motivos de preocupação, e, quando cientificada, esclareceu, com renovada bondade:

— Não há motivo para se deixar abater. Recordemos que evolução é programa de eternidade. A vida física é degrau de ascensão que nenhum de nós desprezará. Todavia, convém lembrar que, cessada a fase reencarnacionista, a alma continua crescendo em amor e conhecimento, fora das vibrações da Terra, noutros redutos evolutivos.


E depois de algum silêncio:

— Evoluímos por etapas. Numa encarnação adquirimos a coroa da cultura, noutra a palma do amor. Raros conseguem adquirir sabedoria e bondade, cultura do cérebro e cultura do amor, de uma só vez. O mergulho na carne condensa vibrações que passam a sintonizar com o clima mental de outras vibrações resultantes de vidas pregressas, junto a outros seres, o que, de certo modo, nos dificulta a sublimação libertadora. Sem desdenhar a cultura, faz a alma um alto negócio quando desenvolve o sentimento, lapidando o caráter no buril da dor. Enquanto que nem sempre são felizes aqueles que muito desenvolvem o cérebro, sem cuidarem do sentimento.


Prosseguindo, aduziu, animadora:

— Se é verdade que o amor tudo pode, a alma menos culta, porém boa, encontra campo espiritual para retornar ao conhecimento recolhido em etapas passadas e na memória, o que não se dá com a cultura sem bondade. O homem sábio, sem amor, pode tornar-se um monstro. Desencarnado, notará o cérebro cultivado e, portador de coração vazio, terá uma grande jornada de recomeço pela senda estreita do sofrimento, sem o conhecimento, nas expiações purificadoras.


E bem humorada, concluiu:

—Se me dado fosse escolher, para a próxima jornada ao mundo, as armas de progresso no jardim da cultura intelectual e do sentimento amoroso, consoante os ensinos do Mestre, muito feliz me daria por escolher o ensejo de amar e sofrer, aprendendo no livro do auxílio a interpretação dos enigmas da vida.

Um banho benéfico de paz lavou-me o coração. Tudo se me afigurava compreensível e um alento renovado convidava-me a novo rumo pela estrada da evolução. Pude compreender, por mim mesma, que, embora não pudesse hoje digerir intelectivamente o aprendizado recolhido, em ocasião oportuna, guiada pela luz da razão esclarecida, poderia retornar à meditação do assunto, tirando-o do material guardado nos arquivos mentais.

Caminhávamos pela rua. A madrugada enluarada é, sem dúvida alguma, uma bênção da grande mãe Natureza para o homem terreno.

As vibrações de harmonia e serenidade desciam nos raios prateados e refrigeravam a Terra, envolvendo-a em paz.

A avenida deserta e silenciosa alongava-se. Raros noctívagos provocavam ruídos. Com menor densidade mental, que o sono anestesiado, a noite acolhia visitantes de outras Esferas. Era a hora do socorro intensivo, das intercessões, das assistências, do afeto que nunca esquece. Grupos de entidades desencarnadas surgiam, repentinamente, desaparecendo adiante, em algazarra desenfreada. Semelhavamse a nuvem densa em desabalada correria.

Outros grupos passavam ligeiros, pardacentos, "úmidos", com as ligações perispirituais apresentando semblante enfermiço e apavorante. Eram Espíritos viciados e inquietos, afinados a cômpares, em demanda dos antros de perversão e animalidade.

A Benfeitora, que seguia comigo, conduziu-me àbeira-mar e, ante o céu estrelado e o abismo líquido quase aos nossos pés, convidou-me à meditação silenciosa e ao repouso.

Findo o prazo, retornamos felizes e saudosos...

Os dias de comunhão espiritual, contigo, minha filha, e com os irmãos da Fé, recordavam-me o tempo da estação na carne. Ali estivera na estância terrena, vendo com a alma o jardim de nossa felicidade, onde temos de aprimorar-nos. Experimentara inexcedíveis alegrias no trabalho do intercâmbio, na sessão de evangelismo em torno da figura insuperável de Jesus Cristo; vivera as promessas do Lar, no entanto, o dever convidava ao prolongamento da luta, no abençoado reduto em que me agasalhava.

O tempo passava cheio de obrigações que me favoreciam o estudo pelo exemplo e a iluminação íntima pelo trabalho. Era indispensável recuperar as horas desperdiçadas na inutilidade e na ignorância.




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