Plenitude- Série Psicológica Vol. 3

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CAPÍTULO 12

XII - Sofrimento ante a Morte

A impermanência de todas as coisas e pessoas no mundo físico é também extensiva à conjuntura do sofrimento.

A sua vigência resulta da intensidade dos fatores causais que o engendraram.

O campo de energia afetado, no caso das doenças, terminada a prova ou a expiação que depuram, recompõe-se, facultando o equilíbrio.

Não obstante, nos sofrimentos morais, quando a desarmonia é emocional, por meio do autocontrole, da oração, da meditação, das ações de beneficência, o ser mais facilmente se libera, deixando de valorizar demasiadamente as ocorrências aflitivas, considerando-as naturais no processo evolutivo, e por consequência, aceitáveis.

A aceitação do sofrimento é o passo decisivo para a liberação dele, enquanto a rebeldia produz efeito totalmente contrário.

Compreendendo-se que o corpo é uma organização delicada, sujeita a deterioramento, desgaste e transformação pelo fenômeno da morte, nele não se colocam as bases da vida, nem se fiam as realidades essenciais.

Assim, quando lhe sucedam as desconexões e os desajustes, advindo-lhes a interrupção, a morte não se transforma em motivo de desgraça, de ruína.

A preparação conveniente para enfrentar a morte faculta uma aceitação do seu fatalismo e, portanto, uma diminuição do sofrimento.

Quem, na vida material deposita todas as suas aspirações e nela vê um fim único, constatando-lhe a interrupção, o cessar de manifestações, experimenta superlativas dores morais, que se transformam em sofrimentos físicos sem lenitivo imediato.

Assim, as dores têm muito a ver com as disposições psicológicas de cada indivíduo, a maneira de encarar a vida e a sua estrutura, os acontecimentos e as suas matrizes.

A morte, por ignorância da vida, tem sido através dos milênios a causa de sofrimentos inimagináveis, desencadeadora de tragédias e de desconforto sem-fim.

Todo fenômeno biológico que se inicia, naturalmente cessa.

Tudo que nasce, no plano físico, interrompe-se, transforma-se, portanto, morre.

Não há prazo nem determinismo absoluto de tempo, dependendo de inumeráveis razões para que o ciclo que começou se encerre...

Assim, a morte é inevitável e o sofrimento que ela gera resulta somente de mé interpretação dos objetivos da vida.

O apego à forma transitória, que se decompõe, produz a perturbação emocional, dando ideia de que tudo se consumiu, nada mais restando como finalidade da existência humana.


Colocadas todas as esperanças no corpo, os fenômenos inerentes

`sua constituição perturbam quem nele se firma, produzindo o impacto desesperador.

De certo modo, a ocorrência é resultado de uma educação, uma formação cultural materialista, mesmo que sob o disfarce espiritualista.

As pessoas ligam-se a correntes religiosas sem vinculação emocional nem aprofundamento racional do seu conteúdo, e, em face desse comportamento, a morte se lhes apresenta como sendo a grande destruidora de planos, de anseios e realizações.

Por negarem-se a uma análise profunda em torno da vida, passam a existência corporal transferindo reflexões no tempo e programando, fruindo ao máximo, sob a conivente ilusão da eternidade carnal.

Quando jovens, transferem para a velhice o exame da morte quando sadios, adiam para o período das enfermidades a mesma reflexão, acreditando-se invulneráveis ao desgaste e aos fenômenos degenerativos da matéria.

Á medida que o tempo transcorre, negam-se a envelhecer, utilizando-se de expedientes cirúrgicos, ginásticos, alimentares, na vã tentativa de manter a juventude que os anos arrebatam inexoravelmente.

A luta para escamotear a realidade é tenaz, e, quando essa se apresenta vexatória, derrapam nas crises neuróticas, nas fugas pelos alcoólicos e outras drogas, tombando no suicídio.

Assim, a morte tem sido responsabilizada por ocorrências que lhe não dizem respeito e devem ser creditadas à intemperança das próprias criaturas.

A morte de um ser amado, em razão disso, não deveria acarretar desespero, antes alegria, especialmente se a sua foi uma existência digna.

Deplora-se, então, não poucas vezes, a morte de uma pessoa boa e a permanência de outra má, numa espécie de desequilíbrio das leis soberanas, quando o correto é essa determinação.

O homem e a mulher de bem, porque exemplares na conduta e no pensamento, encerraram os seus compromissos o mundo físico, podendo retornar à sua origem, enquanto os endividados, os de conduta insana devem desfrutar de tempo para a sua reparação, o reequilíbrio.

O corpo, mesmo quando bafejado pela saúde, é um cárcere, e a liberação de um ser amado que volve à plenitude deverá causar alegria e não desgosto.

Se forem pessoas más que desencarnem, também a satisfação deveria permanecer, pelo fato de a mesma interromper-lhes o curso dos delitos, facultando-lhes tempo para pensar, não se comprometendo mais, nem se arruinando em demasia.

Não é assim que reagem as criaturas, na teimosia em que permanecem, negando-se a uma mudança saudável de conduta. "Não me conformo" - asseveram uns.

—"É uma desgraça". - afirmam outros. "Nunca aceitarei".

—informa a maioria, diante da morte dos seres queridos, entregando-se voluntariamente ao sofrimento.

O orgulho desmedido e a presunção pessoal são lhes os adversários mais rigorosos, que não lhes permitem raciocinar diante do que acontece com todos os seres.

Acompanham a ocorrência da morte em toda parte com as demais pessoas, porém, acreditam que não ocorrerá com eles, pelo menos, indefinidamente, na dimensão do seu capricho.

Como morte no interroga antes os interessados na vida, ao arrebatá-los, deixa surpresos os seus afetos, que se entregam às desordens emocionais e aos desnecessários sofrimentos que os arrasam.

A morte sempre produz sentimentos contraditórios naqueles que partem, como naqueloutros que ficam.

Para todos é, normalmente, uma grande surpresa, na maioria das vezes, desagradável.

Quem considerou e se preparou para o acontecimento, logo se adapta após o choque inicial, como é compreensível.

No entanto, para aquele que ao corpo delegou todos os interesses, a surpresa é substituída pelo desgosto ante o suicídio, acompanhado por injustificável revolta, que causa males insuspeitados.

O sofrimento que decorre da morte é, portanto, resultado da óptica pela qual se observam e se acompanham os mecanismos da vida.

Constituem fenômenos naturais a dor da saudade, a melancolia, a preocupação com o estado do ser que partiu, como decorrência de necessárias provações para o amor, que precisa sublimar-se pela ausência física e por todas as implicações dela decorrentes.

Como a real, a verdadeira felicidade não se pode fruir no mundo físico, dia chegará, logo mais, para vivê-la, onde não haja morte, nem separando-se para morrer, aflitiva, evitando o desespero e todo o seu séquito de agentes perturbadores. "Por ocasião da morte, tudo, a princípio, é confuso.

De algum tempo precisa a alma para entrar no conhecimento de si mesma.

Ela se acha como que aturdida, no estado de uma pessoa que despertou de profundo sono e procura orientar-se sobre a sua situação.

A lucidez das ideias e a memória do passado lhe voltam, à medida que se apaga a influência da matéria que ela acaba de abandonar, e à medida que se dissipa a espécie de névoa que lhe obscurece os pensamentos.

Muito variável é o tempo que dura a perturbação que se segue à morte.

Pode ser de algumas horas, como também de muitos meses e até de muitos anos.

Aqueles que, desde quando ainda viviam na Terra, se identificaram com o estado futuro que os aguardava, são os em que menos longa ele é, porque esses compreende imediatamente a posição em que se encontram.

("Comentários de Allan Kardec à questão nº 165 de O Livro dos Espíritos. 29ª edição, FEB)




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