Após a Tempestade
Versão para cópiaSUICÍDIO
Ato de extremada rebeldia, reação do orgulho desmedido, vingança de alto porte que busca destruir-se ante a impossibilidade de a outrem aniquilar, o suicídio revela o estágio de brutalidade moral em que se demora a criatura humana...
Por um minuto apenas, a revolta atira o ser no dédalo do desvario, conseguindo um tentame de desdita que se alonga por decênios lúridos de amarguras e infortúnios indescritíveis.
Por uma interpretação precipitada, o amor-próprio ferido arroja o homem que se deseja livrar de um problema no poço sem fundo de mais inditosas conjunturas, de que somente a peso de demorados remorsos e agonias consegue vencer...
Sob a constrição de injustificável ciúme, a criatura desforça-se da vida, naufragando em águas encrespadas que a afogamsem a acalmar, de cuja asfixia incessante e tormentosa não logra liberar-se...
Em nome da dignidade atirada por terra se arroja a pessoa geniosa na covarde fuga pela estrada- -semfim da cavilosa ilusão, em que carpe, inconsolável, o choro do arrependimento tardio...
Evitando a enfermidade de alongada presença que conduzirá à morte, o impaciente antecipa o momento da libertação e através desse gesto se escraviza por tempo infindável ao desespero e à dor que o afligiam, agravados pela soma dos novos infortúnios infligidos à existência que lhe não compete exterminar...
Temendo o sofrimento o suicida impõe-se maior soma de aflições, no pressuposto de que o ato de cobardia encetado seria sancionado pelo apagar da consciência e pelo sono do nada...
... No fundo de todas as razões predisponentes para o autocídio, excetuando-se as profundas neuroses e psicoses de perseguição, as maníaco-depressivas — que procedem de antigas fugas espetaculares à vida e que o Espírito traz nos refolhos do ser como predisposições à repetição da falência moral — se encontra o orgulho tentando, pela violência, solucionar questões que somente a ação contínua no bem e a sistemática confiança em Deus podem regularizar com a indispensável eficiência.
Condicionado para os triunfos de fora, não se arma o homem para as conquistas interiores, mediante cujas realizações se imunizaria para as dificuldades naturais da luta com que se encontra comprometido em prol da própria ascensão.
Mudam-se as circunstâncias, alteram-se os componentes, variamas condições por piores que se apresentem mediante o concurso do tempo.
À desdita sobrepõe-se a ventura, ao desaire a alegria, ao infortúnio resignado a esperança quando se sabe converter os espinhos e pedrouços da estrada em flores e bênçãos.
O homem está fadado à ventura e à plenitude espiritual.
Não sendo autor da vida, inobstante se faça o usufrutuário nem sempre responsável, é-lhe vedada a permissão de aniquilá-la.
Rompe-lhe, pelo impulso irrefletivo, a manifestação física, jamais, porém, destrói as engrenagens profundas que lhe acionam a exteriorização orgânica.
Toda investida negativa se converte em sobrecarga que deve conduzir o infrator do código de equilíbrio, que vige em todo lugar.
Alguns que se dizemreligiosos, mas, desassisados, costumam asseverar, irrefletidos, que preferem adiar o resgate, mesmo que sejam constrangidos ulteriormente a imposições mais graves... Incapazes, no entanto, de suportarem o mínimo, se atribuempossibilidades de, após a falência, arcarem com responsabilidades e encargos maiores. Presunção vã e justificativa enganosa para desertarem do dever!
A si mesmos iludem os que debandam dos compromissos para com a vida.
Não morrerão.
Ninguém se destrói ante a morte.
Províncias de infortúnio, regiões de sombras enxameiam emambos os lados da vida. Da mesma forma prosseguem além-da-morte os estados de consciência ultrajada, de mente rebelada, de coração vencido...
Em considerando a problemática das graves quão imprevisíveis desgraças decorrentes do suicídio, convémexaminemos, também, a larga faixa dos autocidas indiretos, daqueles que precipitam a hora da desencarnação, mediante os processos mais variados.
São, também, suicidas, os sexólatras inveterados, os viciados deste ou daquele teor, os que ingerem altas cargas de tensão, os que se envenenam com o ódio e se desgastam com as paixões deletérias, os glutões e ociosos, os que cultivam o pessimismo e as enfermidades imaginárias...
A vida é um poema de amor e beleza esperando por nós.
Uma gota d’água transparente, uma nervura de folha, uma partícula de adubo, uma pétala perfumada, uma semente fértil, um raio de sol, o piscar de uma estrela são desafios à imaginação, à inteligência, à contemplação, à meditação, ao amor! ...
Há, sem dúvida, agravantes e atenuantes, no exame do suicídio...
Todavia, seja qual for o motivo, a circunstância para o crime de retirada da vida, tal não consegue outro resultado senão o de atirar o delituoso ao encontro da vida estuante, em circunstância análoga àquela da qual pensou evadir-se, com os agravantes que não esperava defrontar...
Expungem, sim, na Erraticidade, em inenarráveis condições, os gravames da decisão funesta, e, na Terra, quando retornam, em cruentas expiações, os que defraudam a sagrada concessão divina, que é o corpo plasmado para a glória e a elevação do espírito.
Espera pelo amanhã, quando o teu dia se te apresente sombrio e apavorante.
Aguarda um pouco mais, quando tudo te empurrar ao desespero.
A Divindade possui soluções que desconheces para todos os enigmas e recursos que te escapam, a fim de elucidar e dirimir equívocos e dificuldades.
Ama a vida e vive com amo r — embora constrangido muitas vezes à incompreensão, sob umclima de martírio e sobre um solo de cardos...
Recupera hoje o desperdício de ontem sem pensares, jamais, na atitude simplista do suicídio, que é a mais complexa e infeliz de todas as coisas que podem ocorrer ao homem.
Se te parecerem insuportáveis as dores, lembra-te de Jesus, na suprema humilhação da Cruz, todavia, confiando em Deus, e de Maria, Sua Mãe, em total angústia, fitando o filho traído, aparentemente abandonado, de alma também trespassada pela dor semnome, por meio de cuja confiança integral se converteu em exemplo insuperável de resignação e paciência, na sua inquestionável fé em Deus, tornando-se a Mãe Santíssima da Humanidade toda.
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