Diretrizes Para o Êxito

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CAPÍTULO 29

O DESERTO

Em face da balbúrdia que estruge voluptuosa em toda parte, o ser humano movimenta-se aturdido, sem rumo.

A sensibilidade emocional aguçada, em decorrência da ansiedade como da frustração, torna-o insatisfeito, atormentado, paranoide com tendência esquizoide que o vergasta, infelicitando-o.

Os apelos incessantes para as extravagâncias e os apetites sexuais desorganizam-no interiormente, fazendo-o sentir-se incompleto, mesmo quando tudo, aparentemente, encontra-se com aspecto compensador.

Ocorre que o Espírito é o ser fundamental e não o corpo, ao qual se imanta pela necessidade de evolução, permanecendo escravo, quando jovem, pelo que gostaria de fruir e, quando idoso, lamentando o que não desfrutou.

Essa dificuldade de entender o objetivo real da vida proporciona-lhe um comportamento paradoxal, pois que, podendo conquistar a liberdade, demora-se na escravidão espontânea, vivenciar a felicidade, fixa-se nos tormentos, conseguir o bem-estar pleno, detém-se na insegurança do que já dispõe.

Cada um vive exteriormente as paisagens íntimas que cultiva.

Apegando-se aos valores relativos do mundo, alegra-se e aflige-se, conquista e perde, demorandose em vicissitudes desnorteantes.

A cada momento faz-se-lhe mais urgente a introspecção, a análise cuidadosa das aspirações, bem como dos projetos de vida.

No passado, e ainda em alguns lugares no presente, homens e mulheres necessitados de paz têm buscado o silêncio em monastérios de reclusão, em eremitérios especiais, nos montes isolados, nos desertos...

A fim de refundir o ânimo e a capacidade do povo judeu, longamente escravizado pelos egípcios, nele despertando sentimentos novos, Moisés levou-o ao deserto por quarenta anos, a fim de que tivesse tempo de avaliar a própria situação.

Embora os rudes embates experimentados, criou uma cultura rígida e fiel aos postulados abraçados, que vem atravessando os milênios, sem perda do objetivo anelado.

O príncipe Sidartha Gautama, anelando pela paz, após haver experimentado o poder, a dissolução e o ócio, procurou técnicas de recolhimento sem o conseguir, até que, no deserto, adquiriu a iluminação.

Jesus, ensinando esquecimento de si mesmo, ante a imperiosa necessidade de prosseguir Uno com Deus, buscou o deserto onde jejuou por quarenta dias e quarenta noites.

Saulo de Tarso, após o encontro revolucionário com Jesus, foi para o deserto a fim de meditar, amadurecendo os conceitos novos que lhe chegaram, de modo que não lhe diminuísse o ânimo nem o devotamento, quando se resolveu por dedicar-se ao ministério de iluminação.

O deserto, facultando a solidão, o silêncio, induz o Espírito a reflexão, especialmente se buscado para essa finalidade.

Hodiernamente, o deserto pode ser considerado como a viagem de interiorização, na busca da realidade que se é.

A mente, autoanalisando-se, percebe quais as necessidades verdadeiras e aquelas secundárias que são distrações, mediante a busca do poder e do prazer, facultando-se eleger as melhores diretrizes para conseguir a superação do sofrimento, o encontro com Deus, que no mundo agitado faz-se quase impossível de o conseguir.

Nessa região inexplorada e desértica da alma, o Espírito refrigera-se na esperança, renovando a coragem para enfrentar as refregas do cotidiano, sem os atropelos injustificáveis nem os recuos proporcionados pelo desânimo.

O grande silêncio, ao qual não está acostumado, invade-o, dando-lhe uma sensação de segurança e de paz, enquanto a mente desperta para o exame de si mesma, diluindo os vapores tóxicos do imediatismo, pensando no futuro irisado de bênçãos.

Ali não há lugar para conflitos, logo passam os primeiros períodos de recolhimento, quando então as ambições acalmam-se, e no seu lugar permanecem o equilíbrio e a alegria.

Em face da transitoriedade de tudo quanto é terreno, diante do permanente onde a vida se desenvolve, as questões fundamentais assomam e passam a direcionar a razão e a emoção, propiciando bem-estar, fortalecimento e harmonia.

Mesmo no convívio com as demais pessoas que se encontram em turbulência, as conquistas hauridas no deserto mais se fortalecem, estimulando ao prosseguimento das afirmações internas que agora brotam em exuberância.

A paz irradia-se do coração, e a mente encontra-se aberta às propostas do amor e da caridade, como até antes ainda não havia ocorrido.

Sem a aprendizagem na quietação da alma, nessa noite escura que o silêncio clareia de luzes formosas, o amor como a caridade são apressados, assinalados pelos interesses do ego, facilmente alteráveis, conforme o humor de cada momento.

A saturação, o vazio existencial, o cansaço, assomam com frequência porque a ação é feita de entusiasmo sem reflexão e de audácia sem sabedoria.

Conta-se que São Bernardo, certo dia, sentindo-se agitado, diante dos muitos afazeres, enquanto transitava de um para outro lado, deteve-se e refletiu: Bernardo, para onde estás correndo, se somente um destino é o correto, Jesus?!

De imediato, asserenou-se, passando a resolver todas as questões em clima de alegria e de bom humor, sem pressa nem tormento.

Quando se está afadigado na busca de diferentes objetivos, superficiais uns e desnecessários outros, a vida transcorre agitada, o tempo sem tempo faz-se um tormento, retirando os benefícios da luta.

Por isso, torna-se necessária a ida ao deserto, a fim de conseguir-se os tesouros que proporcionam soluções adequadas e respostas próprias a todas as questões afligentes da existência.

É natural que o ser humano procure viver de maneira compatível com a época e as circunstâncias sociais em que se encontra.

Todavia, é lhe um desafio a eleição de conduta em torno da sua realidade espiritual, que não deve ser ignorada ou, quando identificada, não ser postergada.

O deserto faz parte da existência humana.

Não são poucos os indivíduos que nele se precipitam, infelizmente, nas regiões inóspitas do sentimento, vazias de realidade, abandonadas pelas aspirações superiores da vida.

É o abismo da alma, ao qual se atiram aqueles que perdem os objetivos imediatistas, que desfalecem nos combates por falta de confiança em novas batalhas, que se entregam ao medo, a frustração ou se deixam consumir pela revolta, pelo ódio, pelo ressentimento...

Nessa área de difícil saída, estorcegam aqueles que se descuidaram de si mesmos e rumaram pelos caminhos sem saída apresentados pela ilusão.

Quando buscado conscientemente, para meditar, orar, descobrir-se, o deserto refloresce em uma primavera intérmina sob os cuidados de Jesus.




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