Sementeira da Fraternidade

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CAPÍTULO 3

OS PROBLEMAS HUMANOS E O ESPIRITISMO

Parte 1
O homem ambicioso, aparentemente realizado no mundo dos negócios, portador de finanças equilibradas na balança dos largos investimentos econômicos, relacionado, desfrutando as amplas fatias das agradáveis rodas sociais, em torno das quais gravita confortavelmente, surpreende-se, não poucas vezes, cansado e vazio, sem se explicar as várias ocorrências íntimas que o desagradam, gerando interiormente insuportável clima de coercitivo desassossego.

 

Detentor de valiosos recursos externos, apaixonantes quão escravizadores, descobre-se malogrado por não experimentar a presença de ideais superiores capazes de o sustentar nas horas difíceis, que sempre surgem, na soledade, motivando reflexões.

 

Sem o hábito salutar do exame de consciência, normalmente afligido pelos problemas da sobrevivência orgânica e do armazenamento dos bens transitórios, desvinculou-se da experiência interior, vivendo sob a canga de ansiedades crescentes na luta pela supremacia, no jogo do poder, a pesado tributo da paz, que. de momento desconsidera, esperando reencontrá-la assim domine as extensões da posse e do destaque na comunidade onde foi colocado para servir.

 

Por tradição, sente-se vinculado a alguma denominação religiosa, mas não despertou conscientemente para a compreensão da fé, fazendo, então, do culto um compromisso negocista com a Divindade, de cujo labor espera conseguir sempre altos favores a troco de nonadas. Deus não se lhe afigura uma necessidade espiritual, vivificadora, concreta, antes um "velho amigo" obsoleto, de quem recorda apenas em situações complicadas da existência, mesmo assim para imposições arbitrárias, sem legitimidade de propósitos.

 

Conduzindo o carro do progresso e detendo a técnica que o absorve, vê-se arrastado pelo surpreendente avanço dos próprios descobrimentos, atirado a esmo, não obstante finja imprimir direção aos passos que o levam a inesperados sítios e aos resultados longamente acalentados.

 

Sonhos formosos ao se transformarem em realidade, muitas vezes fazem-se pesadelos odientos, horrendos, que constringem os que os fomentaram.

 

Labores avidamente estimulados e propósitos ardentemente defendidos, a pouco e pouco estiolam- -se, vencidos pela caudal volumosa, crescente, de novos arrebatamentos, e mesmo os mais arrojados programas, se demorados, logo jazem superados, dando lugar a formas apressadas, cujos resultados nem sempre nobres conduzem a iminentes desastres aqueles que os vitalizaram.

 

Tentativas de redução do desespero geral, que é fruto da onda crescente do desemprego — gerador de crimes que se adicionam a outros crimes em círculos viciosos que se complicam —; medidas acautelatórias à contaminação da Terra, por gérmens de fora, por acaso trazidos pelos diversos projetos dos Organismos Mundiais de pesquisa interplanetária — embora a terrível ameaça que invade os mares, os rios e os lagos em processo doloroso de envenenamento pelos detritos industriais, bem como a contínua poluição da atmosfera, cujas nuvens sombrias e tóxicas pairam sóbre as cidades populosas do mundo —; apelos insistentes de paz e discussões demoradas sobre o direito dos povos minoritários, através das visitas dos Chefes de Estado — enquanto guerras mercenárias em toda parte minam as bases da confiança geral, não obstante os pregadores da ordem —; leis de justiça social apresentadas todo dia — apesar do descalabro econômico vigente nos níveis humanos das diversas classes comunais — simplesmente atestam o malogro das atuais conquistas, com a consequente desvalorização do homem, ainda atônito e assoberbado ante a delinquência e o medo dela decorrentes, as enfermidades, as insatisfações íntimas...

 

Mas "o mundo marcha", conclamam muitos, repetindo Peletan. E marcha a duras penas sob esmagadora contribuição.

 

O moderno historiador Will Durant, após valioso estudo da Civilização, no qual investiu toda uma preciosa existência dedicada à observação, ao cotejo dos fatos, ao exame das ocorrências que mudaram muitas vezes o curso dos acontecimentos da Humanidade, dando um balanço ‘final nas suas pesquisas concluiu, num quase lamento, que o homem nada ou quase nada aprendeu com as lições da História. Repetem-se monotonamente os fastos e as tragédias, retornando os mesmos quadros motivadores de semelhantes glórias e calamidades, sem que as experiências transatas sirvam de roteiro e orientação aos novos cometimentos, ensinando a cada atualidade o aprendizado da anterior. Crimes contra os direitos alheios e a própria Sociedade se sucedem insistentes, crueis, fazendo que as conquistas da cultura e os ensinos resultantes dos sucessos históricos se transformem em inexpressivas páginas de museu, inadequadas ao exame de cada ciclo histórico.

 

O materialismo, nas suas expressões multifaces, surge e ressurge cada dia disseminando. . a anarquia, encorajando a desordem e a corrupção dos costumes, em conspiração constante contra a paz do homem que, no entanto, se deixa conduzir por fuga psicológica aos estados de entorpecimento da razão e do sentimento.

 

Quando, porém, a mecânica materialista conseguiu enxugar qualquer "lágrima nascida do coração"?

 

Apliquem-no os seus defensores na ferida de quem chora um ente querido que morreu, no ouvido de quem padece injustiça, no sentimento de quem sofre ao lado de um filhinho enfermo ou vitimado por uma anomalia teratológica, no coração de quem ama sem ser correspondido, na reflexão amarga de quem sofreu um desastre que o levou à imobilização ou à cegueira e espere lobrigar conforto, lenir! Apresentem-se os campeões da paz, da fraternidade, do amor, abraçados ao materialismo simultaneamente não belicosos, não envenenados, defendendo uma área sem provocar ódios e guerras noutra!

 

De Demócrito e Epicuro a Lord Bacon, a Hobbes, Holback, Diderot e Lock, aos modernos dialéticos e mecanicistas há vários pegos, porém os mesmos métodos. Renhidos combates, estruturando novas formas de cinismo em cada estágio, concitam, de um lado, a revolução técnica, e, doutro, estabelecem a destruição ética com a consequente desvalorização do homem.

 

De Epicuro e Jean Paul Sartre, a Herbert Marcuse, o ideal utilitarista, hedonista, transitou para o abastardamento dos sentidos com o inevitável desgoverno da inteligência amesquinhada pelos novos valores da "rebeldia", do "protesto" das técnicas atuais do autocídio selvagem, assustador.

 

No entanto, os conceitos de Sócrates e Platão, repetindo as necessidades dos direitos humanos, mesmo que a alto preço, profligam os frios dirigentes de Penitenciárias e Hospitais, Educandários e Oficinas que lhes jazem nas mãos condutoras da impiedade social, essa estimuladora da hedionda promiscuidade postulados filosóficos e éticos dos dias da Revolução Francesa, que se fêz o marco significativo para as liberdades humanas, perfeitamehte aceitas pelos governos não arbitrários espalhados por todo o mundo, e que, apesar disso, compactuam com aqueles tiranos...

 

Naqueles dias, os de após 1789, consoante informava Lamartine, Marat mandava matar, enquanto fingia ler o Evangelho "que estava sempre aberto sóbre a sua mesa", dizendo ver em Jesus o revolucionário por excelência, a quem procurava imitar. E foi o monstro do terror, enquanto Jesus é p herói da paz e o príncipe do amor...

 

À semelhança de Marat, antes ou depois, muitos pseudos-teístas, filiados a este ou àquele ramo da fé, vincularam-se ao cometimento espiritual na forma, desde que o conteúdo das suas existências sempre permaneceu agnóstico, ateísta.

 

Guerreiros ou políticos que estabeleceram as linhas do poder e da força fixaram-semais na gangorra terrena do que nos alicerces espiritualistas, vivendo na ginástica materialista com que supunham gozar a Terra e depois possuir o Céu. Ludibriaram- -se, ludibriando...

 

As doutrinas de investigação psíquica do passado e do presente, convidadas imperiosamente ao estudo dos fenômenos paratoormais, têm-se permitido parte-pm, realizando as investigações firmadas mais na negação da imortalidade do que na probabilidade, ou mesmo na dúvida, comprazendo-se em negar por sistema como se tal atitude fora para os experimentadores a ideal, a que melhor condiz com o seu estado interior perfeitamente concorde com a aspiração do aniquilamento da consciência ante a morte e a destruição total da vida face à desencarnação. A dúvida, todavia, que é mecanismo seguro para investigar na busca da verdade, sequer é considerada por eles, embora o reiterar, reincidir dos fatos embaraçantes ante as explicações simplistas ou complexas do cepticismo vigente nas escolas de pesquisas modernas.

 

Na terapia médica, quando falham os métodos e a influência espiritista soluciona o problema, apela- -se para a sugestão ou a coincidência; no medi unismo evidente reporta-se à alucinação ou fala-se de fenômeno psi; nos fatos inequívocos das materializações, das desmaterializações e das levitações, engendra-se explicação mirabolante, absurda quão fantástica, não provada e imaginosa; ante os gênios precoces e as crianças que em lucidez recordam o passado, tenta-se o fortuito conúbio de genes portadores de altas cargas da hereditariedade psicológica, bem como da telepatia inconsciente; tace as visões e audições transcendentais, recorre-se à histeria, e sejam quais sejam os meios probantes da imortalidade, a tendência negativa os recusa a priori, contanto que os abençoados informes do Mundo Espiritual padeçam o sarcasmo e a zombaria das falsas elites intelectuais, que, no entanto, não poucas vezes, aderem aos preconceitos feiticistas com que se distraem, adiando a fundamental questão da renovação íntima, intransferível, necessária.

 

Conspiração sistemática, é uma reação aos antigos postulados dogmáticos do passado em que a fé cega, ingênua e imposta, dominava absurda, renteando a. ignorância, em inconcebível campeonato da insensatez com a imprudência irresponsável.

 

Fala-se muito na necessidade da razão. O medicamento da razão sobre a ferida da irrisão presunçosa, porém, tem causado não menores males no organismo humano e social. Multiplicam-se os problemas, crescem as dificuldades, ágigantam-se as expressões do egoísmo selvagem, sem que as conquistas do momento possam diminuir ou obstar a onda de horror, que de todos os lados irrompe devastadora.

 

Crescem os problemas do indivíduo, do relacionamento, das estruturas sociais, das comunidades, dos povos dominados por pressões internas e externas alucinantes...

 

Enquanto, porém, o homem não se voltar para o exame imparcial e vigoroso das necessidades interiores, oferecendo campo favorável às investigações dos intrincados problemas do espírito, ver-se-á aturdido no caos das próprias realizações. Em não se voltando para as conquistas íntimas, mediante o auto-conhecimento, do que decorrerá o perfeito equilíbrio entre desejos e emoções, anseios e possibilidades, com o consequente domínio das expressões inferiores do instinto, transitará do conforto exterior aos crimes nefandos, destruindo ou se destruindo, em aguerrida perturbação irreversivel. Não investindo na alma, cedo se desorganiza e desgasta sob os violentos estigmas da própria animosidade.

 

O conhecimento dos postulados espíritas, que elucidam as causas da vida e da problemática humana, funciona como lição libertadora e terapia eficiente sóbre a ignorância, clarificando-a, e a enfermidade moral, curando-a, a fim de facultar segurança como entusiasmo no ingente empreendimento da consubstanciação da felicidade pessoal, e, pois, coletiva.

 

Perfeitamente compatível com a moral evangélica, a que foi vivida pelo Cristo, a moral espírita é salutar medicamento e preventivo para as intrincadas doenças da mente, do corpo e do sentimento, já que não poucas afecções procedem das distonias íntimas do ser, procedentes, portanto, do espírito inquieto e desajustado, em regime de prova ou expiação no casulo carnal.

 

Ao homem, e sómente a ele, pois, compete a manutenção dos problemas agoniantes do momento, perseverando ou não na teimosia ou na vacuidade, quando o túmulo vazio; por onde transitaram os mortos, se transforma em porta-voz dos informes éticos e reveladores da Imortalidade, através da mediunidade confortadora de que o Espiritismo se faz o lídimo Conaolador para atender à aturdida Humanidade e conduzi-la aos seguros redutos do progresso real e da paz legitima.

 

Vianna de Carvalho

 


Vianna de Carvalho
Divaldo Pereira Franco


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