Vivendo Com Jesus

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CAPÍTULO 6

Reino Feliz

Nas inolvidáveis estações primaveris, quando terminavam as pregações nas margens do lago, em Cafarnaum, e as multidões dispersavam o Amigo, Poeta e Cantor, buscava a tranquilidade do lar de Simão Pedro, vivendo as abençoadas experiências familiares.

Aqueles que O acompanhavam, na maioria ali residentes e nas suas redondezas, continuavam ao Seu lado em diálogos intérminos, exuberantes de aprendizagem e de enriquecimento de amor.

Invariavelmente, quando o plenilúnio derramava suas franjas de prata nas águas do mar-espelho, refletindo-se em lucúlio de luz, e a brisa perfumada corria nos braços do vento brando, Ele se assentava em uma das muitas pedras existentes na praia de areia marrom, e os amigos cercavam-no de carinho, quando Lhe apresentavam suas dúvidas e inquietações.

Ainda ecoavam, nos recônditos dos sentimentos daqueles amigos, o cântico incomparável das bem-aventuranças, as Suas promessas e desafios que os tomaram de surpresa.

Sempre que Ele abria a boca e falava, pérolas de sabedoria escorriam dos seus lábios em maviosos cânticos que os inebriavam.

Aquele inolvidável sermão falara sobre as bem-aventuranças, e eles não conseguiram penetrar imediatamente no seu significado transcendental. Estavam acostumados às lutas do dia a dia, à azáfama e preocupações com os impostos pesados e os recursos para a sobrevivência. Anelavam, é certo, por paz, pelo repouso despreocupado na velhice, ou pela ajuda confortável na enfermidade, mas nunca haviam pensado nas delícias do Reino dos Céus de que lhes falara...

Tiago, mais versado nas escrituras, fiel aos textos de Moisés, tampouco se preocupara antes com a vida além do corpo, sabendo somente que após a morte os bons seriam recom-pensados, enquanto os maus seriam punidos, o que lhe bastava ao entendimento.

A visão nova em torno da espiritualidade surpreendia -o, sem que pudesse entender exatamente como seriam essas recompensas propiciadas pelo Pai misericordioso.


Porque houvesse, naquele momento, um silêncio mágico, arrebentado pelas onomatopeias da Natureza e o quebrar das leves ondas na praia bordada de espuma branca, Tiago, o filho de Alfeu, perguntou-Lhe:

—Senhor, deslumbro-me com as vossas informações, embora nem sempre as compreenda, porque estão além da minha capacidade de entendimento.


Pigarreou, enquanto organizava mentalmente a questão que iria apresentar, logo prosseguindo:

—O Reino dos Céus, por exemplo, a que sempre vos referis, é um lugar especial de delícias, que se vivenciará depois da morte ou se encontra aqui na Terra onde estamos?


O Mestre compassivo sorriu suavemente, olhando com brandura o amigo quase constrangido, e respondeu:

— Todas as criaturas aspiram à felicidade, que se apresenta para cada uma delas de maneira diferente: para o enfermo é a cura, para o faminto é o pão, para o sedento é a água refrescante, para o necessitado é o socorro que o livre de preocupação, para o solitário é a companhia, sendo algo especial para cada grau de aflição ou de sofrimento. A felicidade, no entanto, não é a falta de sofrimento. Existem pessoas que não se encontram enfermas, que não têm carência de coisa alguma e, no entanto, vivem dominadas pelo mau-humor, pelo desinteresse em torno da vida, tristes e macambúzias...

Outras, no entanto, existem que sofrem dificuldades e são portadoras de enfermidades dilaceradoras, mas apesar disso, não se queixam, apresentam-se alegres e joviais, são fraternas e espalham bom ânimo.

A felicidade, portanto, independe do que se tem, sendo um estado interior de paz, que as questões de ordem material não conseguem perturbar.

Assim é o Reino dos Céus, que tem início no coração das criaturas, quando optam pelos valores do Bem, da justiça, do trabalho, do amor, da solidariedade. A mudança de atitude na vida, em relação à harmonia entre todas as coisas e seres, acalma interiormente o indivíduo, que passa a aspirar à compreensão entre todos e pelo espírito de solidariedade que deve existir nos sentimentos. Essa compreensão proporciona-lhe bem-estar interno, que se exterioriza em forma de júbilo e de saúde, mesmo que surjam doenças nesse percurso...

Aquele que assim procede, vivência, desde então, o Reino dos Céus no coração, prolongando-o para além da morte física, quando o espírito, livre das injunções penosas, muitas vezes, do corpo, se alça em direção ao Pai Amoroso.

Todos somos originários do mundo espiritual, que é eterno, portanto, anterior a este, que serve de modelo para o corporal, para onde todos retornaremos inevitavelmente, porque a morte não interrompe a vida... Aqueles que houverem amealhado a paz e trabalhado em favor da felicidade prosseguirão habitando em região de incomparável beleza, onde não existem sofrimentos nem desencantos, não se experimentam ansiedade nem receios, porque a harmonia que o constitui enternece o coração e enriquece a mente com a imperecível luz da felicidade.

Todos os amigos estavam dominados por leve sorriso de esperança que lhes bailava nos lábios procedente dos senti-mentos de alegria, como que antevendo a região paradisíaca a que Ele se referia.

— O mundo espiritual — prosseguiu, suavemente — é constituído de júbilos e promessas de alegria, nas regiões abençoadas, porque existem igualmente lugares de sofrimentos reparadores, onde se alojam aqueles que não quiserem ou não souberem comportar-se conforme os padrões da Lei de Amor, ali expungindo os crimes e equívocos de que se fizeram responsáveis, para poderem libertar-se do Mal, que neles existe, e avançar na direção da felicidade, que não é negada a ninguém, porque o Pai é somente Amor...

A felicidade, desse modo, que constitui o Reino dos Céus na terra, não é feita dos desejos e da sofreguidão que atormentam as criaturas, mas de renúncias e de libertação das coisas que escravi-zam desde que, as posses, por mais honrosas conforme se apresentem, são temporárias e ninguém as conduz após a morte, sendo motivo de desavenças e desgraças, normalmente, entre aqueles que ficam...

Os tesouros reais, portanto, são aqueles que libertam a consciência e dulcificam o coração. Para tanto, é indispensável que se tenha uma vida interior rica de ideais e de compreensão das humanas necessidades. Quando se está dominado por essa presença — um ideal de bem servir e de muito amar — não importa onde o indivíduo se encontre, quer seja no cárcere ou na liberdade. Todos os seres humanos trazem no íntimo os elementos que constituem a plenitude, mas nem sempre sabem distinguir, em razão do embaraçoso mundo de futilidade e de coisas nenhumas, a que se atribui valor exagerado. É natural que haja interesse pela pesca, pela semeadura na terra generosa, pelo trabalho na construção, pelas atividades dos deveres sociais e humanos da vida em família e em sociedade... No entanto, deve haver igualmente preocupação pela realidade que a todos aguarda além do corpo, quando advém a morte, que é inevitável, a nobre mensageira da vida...

A felicidade não é, portanto, uma calmaria após a turbulência de acontecimentos desagradáveis e afligentes. A isso podemos chamar de repouso ou satisfação por haver-se libertado do que era causador de sofrimento.

O Reino dos Céus, desse modo, pode ser considerado o conhecimento da vida e das responsabilidades que são decorrentes, mediante a consciência do dever que deve ser retamente cumprido e das experiências que se adquirem no contato com as várias facetas em que se apresentam. Permanecendo essa condição interna, as ameaças de fora, as agressões, as perseguições, em vez de constituírem motivo de desânimo ou de dor, transformam-se em estímulo para o prosseguimento do ideal que se abraça...

Novamente silenciou ante o natural deslumbramento dos companheiros.

O cricrilar dos grilos e os murmúrios das mil vozes da noite formavam uma peculiar musicalidade que servia de fundo à Sua voz macia e doce.


Levantando-se, e ficando banhado da argêntea claridade do luar, Ele concluiu:

— Um dia, que não está muito longe, quase todos sereis chamados a viver essa inefável alegria de comunhão com o Pai em silencioso sentimento de amor e de união, quando o mundo se voltar contra vós, por minha causa, e acusando-vos da prática do Mal e da perversidade, da desobediência às suas injustas leis, vos castigarem e vos tomarem a vida física... Não temais, mantendo-vos fiéis e serenos, porque estareis em êxtase de felicidade, longe dos impositivos transitórios que eles, os perseguidores, estarão possuídos... Enquanto neles a fúria e o medo, os tormentos do ódio e do desespero estiverem acendendo o fogo da destruição, estareis em calma, refrigerados pela certeza da libertação total e do futuro gozo do Reino que vos está destinado... Alegrai-vos, então, e cantai dominados pela compaixão em relação a eles e pela expectativa do reencontro comigo e com todos aqueles que vos têm amado desde o princípio...

Silenciou, deixando que a balada suave em forma de bem-aventurança prosseguisse musicando os seus sentimentos naquele momento, felizes e confiantes...




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