Sabedoria do Evangelho - Volume 5

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CAPÍTULO 21

A AVAREZA EGOÍSTA

LC 12:13


13. Disse-lhe alguém da multidão: "Mestre, dize a meu irmão que divida comigo a herança".

14. Mas ele disse-lhe: "Homem, quem me constituiu árbitro ou partidor entre vós"?

15. E disse a eles: "Olhai e precatai-vos contra todo o supérfluo, porque a vida dele não está no superabundar de algo que esteja à sua disposição".

16. Então lhes narrou uma parábola, dizendo: "De certo homem rico, a terra era fértil,

17. e ele raciocinava consigo dizendo: que farei, pois não tenha onde recolher meus frutos?

18. E disse: Farei isto: derrubarei meus celeiros e construirei maiores, e aí guardarei toda a colheita e meus bens.

19. E direi à minha alma: Alma, tens muitos bens em depósito para muitos anos: repousa, come, bebe, alegra-te.

20. Mas Deus disse-lhe: "Insensato, esta noite te pedirão de volta tua alma; e as coisas que preparaste, para quem serão?"

21. Assim é o que entesoura para si, não enriquecendo para com Deus".



Lemos aqui uma parábola, provoca da pelo pedido feito a Jesus por "alguém" da multidão. Baseandose na autoridade moral e na sabedoria de Jesus, solicita-Lhe que intervenha junto ao irmão do suplicante a fim de que haja divisão da herança. A lei judaica atribuía ao primogênito dois terços da herança (DT 21:17), sendo o terço restante dividido entre os outros filhos.

O homem dirige-se ao Mestre (no sentido de "professor: didáskale): é tudo o que sabemos. Não adianta especular maiores particularidades, pois o caso parece ser citado apenas como provocador do ensino que o evangelista julgou digno de registro.

Começa o Mestre por colocar um princípio de direito; não possui oficialmente credenciais para proferir sentenças decisórias de litígios de herança. Ensina-nos, assim, a não envolver-nos em questões materiais alheias, a não ser que ocupemos cargos específicos de juiz ou partidor (funcionário da Justiça encarregado de calcular ou executar as partilhas de uma herança).

As palavras conservadas nas anotações de Lucas são de clareza absoluta e constituem lição primorosa.

Depois da negativa de intrometer-se em problema que Lhe não diz respeito, fala "a eles" (prós autoús), deixando supor que o irmão acusado estava presente, pois os conselhos a respeito da avareza egoísta destinam-se a ambos, mas com mais precisão ao que lesou o queixoso, embora as palavras em si sejam dirigidas ao irmão impetrante: "olhai e precatai-vos contra todo o supérfluo (pleonexia), porque a vida dele (do usurpador não está no superabundar de algo que esteja à sua disposição". Em outras palavras: não é o fato de possuir muito, que o fará viver mais (cfr. LC 12:25).

Depois, para não dizer frontalmente que ele pode morrer e deixar tudo, antes mesmo de gozar a herança, tem o Mestre a delicadeza de transformar a lição numa parábola, introduzindo uma personagem estranha, que ficou na abundância de bens, mas que teve repentinamente que largar tudo na própria terra donde lhe proviera a riqueza.

A conclusão é aplicação prática do "não ajunteis para vós tesouros na terra, onde a traça e a ferrugem consomem e onde os ladrões penetram e roubam, mas ajuntai para vós tesouros no céu, onde nem a traça nem a ferrugem, à psychê, isto é, ao astral (emoções) pelo intelecto personalístico.

A lição que aprendemos está exposta com clareza meridiana e serve para todos os planos: qualquer apego às coisas materiais com uso exclusivo da própria pessoa, não consegue trazer vantagens ao plano do Espírito. E isso, não apenas no nível mais elevado do Espírito, mas nem sequer ao mais baixo, do duplo etérico.


* * *

Quando afirmamos (vol.
4) que os Evangelhos fazem clara distinção das sete divisões no homem (três superiores da individualidade e quatro inferiores da personagem encarnada) não estávamos enganados, embora tivéssemos afirmado coisa inteiramente nova e original. Aqui encontramos inesperadamente plena confirmação, de precisão filosófica e linguística, em palavras que o evangelista atribui a Jesus. Salienta que de nada adianta, para a evolução, qualquer satisfação dada à personagem encarnada, e isso é feito com quatro verbos, na ordem exata do menos ao mais:

1. º - REPOUSA (anapaúou) que exprime o desejo da preguiça, que deixa imóveis os corpos densos de todo o soma, referindo-se ao corpo físico;

2. º - COME (pháge) dirigindo-se às sensações, que se comprazem, sobretudo, no bem-estar da fartura alimentar, na gula, que locupleta e leva ao sono;

3. º - BEBE (píe) que diz respeito às emoções, excitadas e descontroladas pelo álcool, referindo-se ao corpo astral;

4. º - ALEGRA-TE (euphraínou, derivado de phrên, intelecto) que fala da alegria despreocupada de quem não pensa em nada sério, mas vive a gargalhar de piadas e anedotas vulgares.

Essas quatro operações da personagem são citadas como ordens dadas à psyché, isto é, ao astral (emoções) pelo intelecto personalístico.

E a observação do Eu Profundo é iniciada com o vocativo que se dirige exatamente ao intelecto, acusandoo de "falta de senso", áphrôn (também derivado de phrên) isto é "insensato" ou "demente".

A conclusão da parábola é uma comparação entre a personagem terrena e a Individualidade espiritual: as maiores surpresas estão reservadas àqueles que entesouram para a personagem, não enriquecendo (ploutôn, particípio presente) para o Espírito.

De toda a oposição do ensino transparece, pelo final, que o mal não consiste em enriquecer, mas em entesourar, isto é, guardar a riqueza improdutiva, sem que faça a prosperidade da comunidade em que vive; o mal reside em não produzir, em guardar nas arcas egoisticamente, reservando para si, sem trazer benefícios à sociedade.

O aviso não ataca propriamente a riqueza em si, mas a avareza e a ambição egoística. Também não condena a posse do que é necessário à vida na terra, mas sim do que é supérfluo (pleonexía). A criatura pode e deve, se tem capacidade, fazer multiplicar sua fortuna, desde que dela faça partícipe uma parte da humanidade, com indústria, comércio, agricultura, arquitetura, etc., produzindo bens e dando sustento ao maior número de famílias, através de salários condignos de seus empregados ou operários.

O mal é entesourar as riquezas em museus e fechar as bibliotecas à consulta pública, mas jamais construir uma fábrica que beneficie a população, assim como, na parte intelectual, é saber egoisticamente, sem ensinar e publicar o que se sabe.

No decurso da história humana, se encontramos ascetas e místicos que nada possuem de seu, não conhecemos nenhum iniciado que viva só para si: de modo geral sabem agir de modo a progredir para ajudar sempre seus semelhantes, da maneira que mais se adapte ao tipo de seu "raio" (1).

(1) Só a titulo de exemplo: Salomão (1. º), Pitágoras (2. º), Platão (3. º), Da Vinci (4. º), Roger Bacon (5. º), João Evangelista (6. º), Máximo de Éfeso (7. º). Nunca se ouviu falar que qualquer deles "passasse privações" por falta de dinheiro, que eles sempre utilizaram em benefício da humanidade, cada um dentro das características de seu "raio".




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Deuteronômio 21:17

Mas ao filho da aborrecida reconhecerá por primogênito, dando-lhe dobrada porção de tudo quanto tiver: porquanto aquele é o princípio da sua força; o direito da primogenitura seu é.

dt 21:17
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Lucas 12:13

E disse-lhe um da multidão: Mestre, dize a meu irmão que reparta comigo a herança.

lc 12:13
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Lucas 12:25

E qual de vós, sendo solícito, pode acrescentar um côvado à sua estatura?

lc 12:25
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