Sabedoria do Evangelho - Volume 6

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CAPÍTULO 6

O RICO E LÁZARO

LC 16:19-31


19. Certo homem era rico e se vestia de púrpura e linho finíssimo, e leviano banqueteavase todos os dias alegremente.

20. Certo mendigo, de nome Lázaro, todo em chagas, fora deitado diante do ádrio dele,

21. desejando saciar-se com o que sobrava da mesa do rico; mas até os cães vinham lamberlhe as úlceras.

22. Aconteceu, porém, morrer o mendigo e ser levado pelos espíritos ao seio de Abraão; morreu também o rico e foi sepultado.

23. No hades, estando em provação, levantou seus olhos e viu Abraão ao longe, e Lázaro em seu seio.

24. E ele chamou, dizendo: "Pai Abraão, compadece-te de mim e envia Lázaro, que mergulhe na água a ponta de seu dedo e refrigere minha língua, porque muito sofro nestas chamas".

25. Abraão, porém, respondeu: "Filho, lembra-te de que recebeste teus bens em tua vida, e igualmente Lázaro os males; agora, pois, ele foi aqui consolado, mas tu sofres;

26. e nestas regiões todas, entre nós e vós estabeleceu-se imenso abismo, de tal forma que os que querem passar daqui para vós, não podem, nem os de lá passar para nós".

27. Ele disse: "Peço-te, então, ó Pai, que o envies à casa de meu pai,

28. porque tenho cinco irmãos; de modo que os avise, para que também eles não venham a este lugar de provação".

29. Mas disse Abraão: "Eles têm Moisés e os profetas: que os ouçam".

30. Retrucou ele: "Não, Pai Abraão, mas se alguém dentre os mortos for a eles, mudarão a mente".

31. Respondeu Abraão: "Se não ouvem Moisés e os profetas, mesmo se se levante alguém dentre os mortos, não se persuadirão".



Aqui deparamos outra parábola com ensinos seguros a respeito do plano astral, como consequência imediata da vida neste plano terráqueo. Temos a impressão, por isso, de que as duas foram narradas seguidamente, pois havendo falado nas "casas" (vers.
4) "deste eon" (vers.
8) e nas "tendas do (outro) eon" (vers. 9), era interessante, e até conveniente, que o ensino prosseguisse no esclarecimento das realidades ocorrentes em uma e outra "localização" das criaturas.

Alguns "pais da igreja" julgaram tratar-se de fato verídico, como se depreende da versão copta saídica e de um escólio do grego, que dão o nome de Níneve ao rico, denominado Píneas por Prisciliano ("Tractatus" IX) e pelo pseudo-Cipriano ("De Pascha Comp. ", 17). A dedução é feita em virtude de constar o nome Lázaro, pois não é da técnica parabólica a citação de nomes próprios. No entanto, justificase o aparecimento do nome, já que não poderia mais designar-se por "o mendigo", quando este tivesse chegado à nova situação "no seio de Abraão".

Destaca o ensino, o contraste entre a grande riqueza e a extrema miserabilidade. O manto de púrpura e as túnicas de linho fino (byssos) eram a roupa normal dos grandes ricos da época. E o "banquetear-se alegremente" (euphraínô) confirma o padrão elevado de vida.

Ao lado disso, aparece o pobre, com o nome apropriado de Lázaro (diminutivo de Eleazar, que signific "Deus ajuda"). Descrito como "mendigo" (ptôchós) que, além de nada possuir, se achava coberto de chagas (eílkôménos) e permanecia deitado, sem poder movimentar-se, de tal forma que nem conseguia afastar os cães que lhe vinham lamber as úlceras.

O verbo bállô, no mais que perfeito passivo, de sentido continuativo (ebéblêto) indica que ali "fora deitado" e ali continuava sem de lá sair. E disso deduzimos que, quando ele "desejava saciar-se com a sobra da mesa do rico", ele o conseguia. Não fora assim, teria buscado outro local. Não corresponde, pois, à realidade o acréscimo da Vulgata Clementina: et nemo illi dabat ("e ninguém lho dava"), sem nenhum apoio nos códices gregos. Provavelmente foi para aí trazido da parábola do "filho pródigo" (LC 15:16). Portanto, embora não cuidado com amor, era diariamente alimentado pela criadagem do rico que, por isso, se sente encorajado a pedir de Abraão que permita que Lázaro lhe retribua os pe quenos favores prestados. Preferimos, na tradução, "o que sobrava da mesa do rico" (tõn piptóntôn apò tes trapézês tou plousíou), à precisão "as migalhas" (tõn psichíôn) que caíam, expressão que aparece em numerosos manuscritos. No entanto, os mais antigos e mais seguros omitem-na (papiro 75, Sinaítico, Vaticano, Régio, versões itálicas e coptas saídica e boaídica, e os "pais" Clemente, Adamâncio, Ambrósio e Gaudêncio).

Lázaro, afinal, larga seu corpo chagado e é conduzido pelos espíritos protetores ao "seio de Abraão".

Mais tarde também o rico abandona o corpo nédio, que é sepultado com as honras de praxe. Aqui tamb ém a Vulgata trouxe, por paralelismo, o início do vers. 23 para o final do vers. 22, sublinhando a oposi ção entre "o pobre no seio de Abraão" e "o rico sepultado no inferno". Mas não há justificativa em nenhum original grego. Inclusive o tratamento trocado entre Abraão, que chama o rico de "filho" (tékna) e este que a ele se dirige respeitosamente como "pai", demonstra que o rico não estava no "inferno".

A crença israelita da época dizia que todos os desencarnados se localizavam num só sítio, o cheol (em grego hades, que é o termo aqui empregado), que se dividia em vários planos, pois lá se encontravam bons e maus, santos e criminosos, patriarcas e ladrões e todos se viam e podiam comunicar-se. Não era, portanto, em absoluto, a ideia de "céu" e "inferno" que posteriormente se formou em muitas seitas cristãs. A expressão "seio de Abraão", isto é, "regaço de Abraão" era o plano mais elevado, dirigido pelo patriarca fundador e "pai" de todos os israelitas. Mas não se pense que os espíritos desencarnados eram literalmente "carregados no colo", pelo velho patriarca...

Conforme vemos, a descrição feita por Jesus do mundo astral é muito mais conforme aos ensinos espiritistas que a outras teorias: o plano é o mesmo, só existindo, entre os diversos níveis, uma distância vibratória; elevada e trazendo bem-estar aos que haviam descarregado na vida física, pela catarse, todos os fluidos pesados agregados ao corpo astral; e trazendo sofrimento, por sua vibração baixa e portanto carregada de calor e queimante com o fogo purificador, aos que haviam transcorrido vida viciada no plano físico.

Permanecendo, pois, no hades, em provação (básanos, o lápis Lydius dos latinos, era uma "pedra de toque", com a qual se reconhecia o ouro. Trata-se, portanto, da "experimentação" ou provação a que são submetidos os desencarnados que necessitam purificar-se) sofria a dor da limpeza pelo fogo purificador que queima os agregados do corpo astral. É quando levanta os olhos e vê Abraão e, no círculo por ele governado, o ex-mendigo Lázaro. Lembra-se de que, na Terra, ele o favorecia com os restos de sua mesa e lhe permitia ficar deitado junto ao portão de sua casa. Suplica, então, que Abraão lhe envie Lázaro, após mergulhar o dedo na água, a fim de trazer-lhe um pouco de refrigério, pois o que mais o martiriza é a sede. Pede pouco (uma gota d’água) porque também dera pouco (as sobras apenas).

Responde Abraão a seu "filho" que sofre, explicando-lhe o mecanismo da Lei de causa e efeito. O rico recebera todas as facilidades, e delas se servira abusivamente, não cogitando de, com ela, servir generosamente.

Agora tinha que suportar a dor da limpeza, para purificar-se e evoluir. No entanto, essa fase já fora superada por Lázaro, que fizera sua purificação através da mesma dor na vida terrena. Já pronto, achava-se agora reconfortado. Ambos tinham que sofrer as mesmas operações. Mas enquanto Lázaro as suportara no corpo, o rico preferira aproveitar sua existência em gozos e prazeres, adiando a limpeza para o plano astral - Tivesse, pois, paciência.

Completando a ilustração, explica-lhe que "’em todas aquelas regiões" (en pãsi toútois) há verdadeiros abismos vibratórios entre um plano e outro, tirando qualquer possibilidade de transitar-se de um a outro: o rádio de onda longa não tem possibilidade de sintonizar a onda curta, nem vice-versa; há entre as duas frequências. verdadeiro abismo.

O rico compreende a lição e conforma-se. Mas, possuidor de bons sentimentos, recorda-se de que deixou encarnados no planeta mais cinco irmãos, que moram com seu pai. E preocupa-se com o futuro estado deles. Se a dificuldade de ele receber o alívio reside na distância vibratória imensa, certamente esse empecilho não existirá entre o hades e o plano físico. Lázaro não poderia aparecer na casa de seu pai terreno para avisar a seus irmãos?

Abraão faz-lhe ver que, na Terra, seus irmãos já receberam toda a elucidação possível da parte de Mois és e dos profetas, cujas obras costumam ouvir lidas aos sábados nas sinagogas. Essa orientação é-lhes suficiente para dirigir corretamente suas vidas. Mas o rico, que desencarnara havia pouco, lembra-se bem de que também ele não dera atenção a Moisés e aos profetas: a leitura daqueles textos consistia simplesmente numa rotina tradicional, sem qualquer influência maior na prática da vida. E se algu "defunto" aparecesse causaria tamanha sensação, que certamente eles ficariam alertados e acertariam o rumo de suas existências, pois "mudariam a mente", renovando suas crenças.

Mas Abraão conhece bem a humanidade. E sabe que, mesmo depois de 2. 000 anos. ainda continuará igual: de nada adiantará o aparecimento de "fantasmas", por mais comprovado que seja: todos quase continuarão descrentes, duvidando de tudo. Não será a aparição de espíritos que os persuadirá (como até hoje ocorre). Terão que modificar-se de dentro para fora, e não com acontecimentos exteriores, por mais sensacionais que sejam.

Verificamos, pois, que o rico não é condenado pelo fato de não haver atendido ao pobre - porque, embora minimamente, ele o atendeu - mas é ensinada, apenas, através do contraste chocante de situações na terra e no plano astral, a lei de causa e efeito, que age nos dois planos (físico e astral) que são interligados e interpenetrantes.

A lição é por demais preciosa, sobretudo por vir trazer confirmação de muitas obras espiritualistas (Antonio Borgia, Francisco Cândido Xavier, Yvonne A. Pereira e muitos outros) que são recusadas pelas igrejas ortodoxas.




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Lucas 16:19

Ora, havia um homem rico, e vestia-se de púrpura e de linho finíssimo, e vivia todos os dias regalada e esplendidamente.

lc 16:19
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Lucas 16:20

Havia também um certo mendigo, chamado Lázaro, que jazia cheio de chagas à porta daquele.

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Lucas 16:21

E desejava alimentar-se com as migalhas que caíam da mesa do rico; e os próprios cães vinham lamber-lhe as chagas.

lc 16:21
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Lucas 16:22

E aconteceu que o mendigo morreu, e foi levado pelos anjos para o seio d?Abraão; e morreu também o rico, e foi sepultado.

lc 16:22
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Lucas 16:23

E no Hades, ergueu os olhos, estando em tormentos, e viu ao longe Abraão, e Lázaro no seu seio.

lc 16:23
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Lucas 16:24

E, clamando, disse: Pai Abraão, tem misericórdia de mim, e manda a Lázaro que molhe na água a ponta do seu dedo e me refresque a língua, porque estou atormentado nesta chama.

lc 16:24
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Lucas 16:25

Disse, porém, Abraão: Filho, lembra-te de que recebeste os teus bens em tua vida, e Lázaro somente males; e agora este é consolado e tu atormentado;

lc 16:25
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Lucas 16:26

E, além disso, está posto um grande abismo entre nós e vós, de sorte que os que quisessem passar daqui para vós não poderiam, nem tão pouco os de lá passar para cá.

lc 16:26
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Lucas 16:27

E disse ele: Rogo-te pois, ó pai, que o mandes a casa de meu pai.

lc 16:27
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Lucas 16:28

Pois tenho cinco irmãos; para que lhes dê testemunho, a fim de que não venham também para este lugar de tormento.

lc 16:28
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Lucas 16:29

Disse-lhe Abraão: Têm Moisés e os profetas; ouçam-nos.

lc 16:29
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Lucas 16:30

E disse ele: Não, pai Abraão; mas, se algum dos mortos fosse ter com eles, arrepender-se-iam.

lc 16:30
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Lucas 16:31

Porém Abraão lhe disse: Se não ouvem a Moisés e aos profetas, tão pouco acreditarão, ainda que algum dos mortos ressuscite.

lc 16:31
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Lucas 15:16

E desejava encher o seu estômago com as bolotas que os porcos comiam, e ninguém lhe dava nada.

lc 15:16
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