Coisas Deste Mundo

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Introdução

O volume que temos à mão não é, exatamente um livro. É antes, o desenho de produção, em moldes cinematográficos, de ideias de filmes versando sobre a reencarnação.

É uma tentativa pioneira, tanto no que tange ao Espiritismo, quanto a bibliografia em geral e a comunicação de massas.

Sua história?… Curiosa, quase fantástica.

Através da psicografia de Francisco Cândido Xavier, o Espírito de Cornélio Pires nos enviava um material que, aparentemente, não passava de uma série de quadros sobre a reencarnação.

Examinando-os detidamente, uma grande surpresa se apossou de nós. Uma luz vermelha se acendeu. Havia algo ali!

Com extrema habilidade e um malabarismo surpreendente de síntese, Cornélio Pires construíra as quadras de modo que, duas das primeiras linhas, relacionavam-se à CAUSA; as duas seguintes, ao EFEITO, nos parâmetros da Lei da Reencarnação.

A elaboração, — como se pode ter uma ideia, — implica um trabalho intenso por parte do autor espiritual, que desenvolve os seus temas em 143 quadras divididas em nada menos de 24 capítulos variados, todos eles no esquema palingenésico.

A surpresa não é menor, mesmo sabendo-se que Cornélio Pires, encarnado, foi um autor de sínteses sumaríssimas.. Não foi romancista; não possuía estrutura de ficcionista. Era um autor de narrativas curtas. Não obstante, dele não se pode dizer que tinha imaginação escassa. Pelo contrário! Este volume prova em seu favor.

Não foi fácil, com quatro sucintas linhas, oferecer, visualmente, os lances propostos, os flagrantes da AÇÃO, imediatamente seguidos pelos da REAÇÃO.

Mas, obviamente; era isso que o Espírito propunha.

Ele oferecia, versificada, uma espécie de sinopse do “scripf” e, a nós outros, cabia situar os personagens em suas paisagens, dar-lhes as roupas das épocas ou situações, levantar cenários para o lance a ser representado, e, finalmente, apropriar os diálogos que seriam trocados através do recurso já clássico dos “baloons”.

Em cada quadra, necessariamente, os intérpretes deviam ser vistos duas vezes: na AÇÃO e na REAÇÃO.

Em termos de comunicação de massa, a obra é urra achado.

Em cada trova, espécie de telegrama rimado, há levado à perfeição, o cuidado na objetividade da mensagem folkcomunicada, a tentativa de, sem nenhum processo de deformação, — integrá-la ao pensamento e à necessidade do leitor.

Tido hoje como “o pioneiro do folclore paulista”, denominado sociólogo e até mesmo antropologista cultural, não possuía, na realidade, formação universitária.

Leva, contudo, enorme vantagem até mesmo em relação a muitos vultos do sofisticado folclore da atualidade, donos de vários idiomas e de vastas estantes especializadas.

Encarnado tinha as virtudes indispensáveis frequência íntima com a gente do mato. Entrava nos casebres, pescava, tomava café, jogava truco, proseava, penetrando sorrateiramente na sociedade caipira, hoje em decadência, mas esplêndida de vitalidade naqueles dias.

Se fosse um elegante folclorista da atualidade, os caipiras o receberiam com hostilidade passiva, fechar-se-iam como sensitivas, escondendo do intruso o seu viver, seus hábitos e costumes.

Cornélio Pires igualava-se a eles. Era o Nhô Cornelo. O poeta era um notável observador, arguto, dotado de extraordinária memória verbal e visual, um pintor sem pincel. Enquanto caçava, dançava e proseava, ia anotando mentalmente tipos, mímica, canções e desafios, lendas, processos de cultura agrícola, costumes, festas, tradições, paisagens, superstições, as dores e alegrias dos João Matoso, das Nha Maricas, dos Zé Bino que emergem, da sua “Enciclopédia de Anedotas e Curiosidades”, na obra psicografada.

Isso prova enormemente em favor da psicografia de Francisco Cândido Xavier.

Por detrás de cada quadra, ilustrada ou não, de cada “anedota palingenésica”, há uma soma de proposições de primeira ordem, visando, ao mesmo tempo, — com recursos intelectuais e gráficos, o entretenimento e a educação do espírito.

Cornélio Pires, mais uma vez, transmite coisas simples e úteis, visando o bem-estar do homem, prevenindo-o contra as adversidades, anunciando-lhe bons tempos para.os empreendimentos.

Encarnado, o que lhe faltava em cultura e sobrava-lhe em capacidade de ver, desponta agora, pela psicografia de Francisco Cândido Xavier, propositadamente sem a erudição da Terra, — flecha de curto alcance, — em naturais advertências, inteligentes e lúcidas.

Desencarnado, o que viu e levou desta crosta, não se desfigurou. Não tem, como não teve, intenções satíricas ou mordazes; ama tão profundamente quanto amou . Compreende tanto quanto compreendeu. Mas o que se potencializou foi o seu poder de fixação da alma humana em seus tipos, sobretudo na cultura caipira, só que, no momento, sob o microscópio da reencarnação.

Já em outras situações, igualmente pela psicografia de Francisco Cândido Xavier, ele enfrentou temas da sobrevivência humana. Em “O Espírito de Cornélio Pires”, 1965, edição da FEB, — conforme apreciação do escritor, Dr. Elias Barbosa, — a sua… “tônica principal é o combate à avareza, descrevendo Cornélio, para tanto, autênticos personagens que poderiam competir com um Harpagon, de Moliere, ou um Pal Gorlot, de Balzac” . Não é um filósofo reencarnacionista, — este é um título que ele recusaria. É o folclorista da reencarnação — sem diploma.

Ainda recentemente, pelo Suplemento Literário de “O Estado de São Paulo”, o escritor Macedo Dantas perguntava: “Esse Cornélio Pires não está superado? Não era um mero contador de anedotas cuja graça a morte diluiu?”

Cornélio Pires não morreu e sua graça não se diluiu.

Se por folclore entendermos o estudo e conhecimento das tradições de um povo, expressas nas suas lendas, crenças, canções e costumes, sendo a reencarnação convicção da maioria dos brasileiros, Cornélio Pires completa e aglutina, preenchendo uma lacuna.

Sendo assim, esta obra estabelece algo de novo no inédito em que consiste: a vinculação estreita entre o Espiritismo, o folclore e a comunicação de massa em nível popular, em um tipo de transmissão de noticias e expressão de pensamento que, hoje, com muita propriedade, podemos denominar folkcomunicação, definindo-a como “o processo de intercâmbio de informações e manifestação de opiniões, ideias e atitudes da massa, através de agentes e meios ligados direta ou indiretamente ao folclore”.

Acreditamos que a obra, agora editada, graças à técnica empregada, — cenários inspirados na própria obra de Cornélio, figuras de almanaque, possa ser compreendida por olhos que não veem o cinema, por lábios de quem jamais, talvez, chegou ao quarto ano primário, sentidas pelos insensíveis às linhas e nuanças da arta dos salões e galerias.

As mensagens transmitidas por este processo comunicativo, singular, poderão produzir os mais decisivos efeitos no 5nimo e no comportamento da massa, apática às solicitações do jornalismo e da literatura ortodoxos.

Há, ainda, uma outra preocupação: demolir os terrores que, em alguns espíritos, desfiguram o processo reencarnativo. Cornélio Pires chega mesmo, por vezes, ao primor de torná-lo engraçado e pitoresco. Brincando, desmoraliza o aspecto de castigo, que a tantos aflige, modificando-o em abençoada alavanca do progresso sem fim do ser humano.

Com relação à alimentação na roça, — nesta obra há inúmeras citações, por exemplo, quanto à mandioca e à berinjela, — na obra de Cornélio Pires encarnado, a informação é tão rica e surge tão espontânea, que Antônio Cândido valeu-se do material em “Parceiros do Rio Bonito”, anotando que… “ele descreve os recursos virtuais do homem rural sem considerar a sua classe nem as possibilidades, o cardápio compatível com o momento, a situação financeira, o lugar”.

E a lição da reencarnação estará introjetada na compreensão filosófica popular.

Todo o esforço foi feito neste sentido.



Araraquara, 1977.



Wallace Leal V. Rodrigues
Francisco Cândido Xavier

Cornélio Pires: Interpretação

Cornélio Pires nasceu na cidade de Tietê, no Estado de São Paulo, em 13 de julho de 1884.

Desencarnou em Tietê, no dia 17 de fevereiro de 1958. Viveu, portanto, 74 anos.

Em 1901, aos 17 anos, mudou-se para São Paulo, onde, após uma tentativa infrutífera de participar de um vestibular para a Faculdade de Farmácia, resolveu dedicar-se à lide jornalística, onde experimentou dificuldades próprias aos iniciantes dessa carreira.

Foi nessa época que iniciou o decisivo capítulo de sua vida que o levou ao Espiritismo. Em “Coisas deste mundo”, editado em 1944, ele próprio narra o ocorrido em uma espécie de profissão de fé, a que denomina: “Porque me tornei espírita”:


“Não desejava cuidar de mim neste livro, mas tão constantes são as perguntas, por que me tornei espírita, que me resolvi a dar, neste capítulo, ligeira história de minha vida.

Caipirinha tímido, vim de Tietê para a Capital em começos de 1901. Vim morar em casa de minha tia, dona Belizaria Ribeiro, viúva do grande filólogo e polemista invicto, o gramático e romancista Júlio Ribeiro. Minha tia, que já havia criado uma ninhada de sobrinhos e parentes e não parentes, vestindo e dando livros a estudantes sem recursos, sempre achou maneira de tirar da sua pobreza de dona de pensão, o necessário para os necessitados.

Era protestante aquela santa criatura, que ficou conhecidíssima de diversas gerações de bacharéis em direito, engenheiros, professores e comerciários. Logo de início pôs-me o Evangelho nas mãos e mandou-me para a escola instalada nos fundos da Igreja Presbiteriana. Ali fui aluno daqueles belos e cultos espíritos que, na matéria, se chamaram Eduardo Carlos Pereira e Benedito Ferraz de Campos; homens que pregavam a letra do Evangelho e, com seus exemplos, o espírito vivificador.

Li os Evangelhos e, mesmo não lhes alcançando o espírito, fiquei encantado com os ensinamentos de Jesus. Quando ia a Tietê, falava a todos sobre a doutrina de Jesus e despertei o interesse de minha mãe e de minhas irmãs pelos Evangelhos.

Tais benefícios recebemos desse livro que, mesmo não crendo, ao irmos para o Espaço, para lá levamos a letra e mais fácil nos será alcançarmos o seu espírito, a sua luz; creio que, no Espaço, seremos esclarecidos com grande facilidade se já levarmos na bagagem os conhecimentos evangélicos.

Conhecedor dos Evangelhos, mais tarde, comecei a me entristecer. Cá, no meu íntimo, minha Razão não queria aceitar um Deus que criava filhos para depois dar preferência a uns, sacrificando a outros; um Deus que, sendo Amor e Piedade” criava entes fracos para depois dá-los ao Fogo Eterno. Comecei a me entristecer e grande risco corri de cair na descrença.

Comecei a encontrar contradições nos Evangelhos… Jesus dissera que “Não viera alterar a Lei”, mas confirmá-ta, no entanto a lei mandava: — “Olho por olho, dente por dente”, — e Jesus me dizia: “Perdoa aos teus inimigos”, — a lei mandava que morresse a pedradas aqueles que fossem apanhados em adultério e Jesus dizia a Madalena: “Aquele que não tiver pecado atire a primeira pedra”, — “Alguém te condenou?” — “Ninguém, Senhor!” — “Vai, não peques mais, pois eu também não te condeno”. Contradições… contradições…

Quando os ministros me perguntavam por que não fazia minha profissão de fé, eu lhes apresentava essas objeções, eles me respondiam com sua constritora, dogmática e sofisticada Teologia e maior era a minha confusão.

É que eu estava apegado à “letra” e nem sabia que os primeiros apóstolos eram analfabetos e que as seleções dos tópicos evangélicos haviam passado por traduções e retraduções e que deles apenas devia aproveitar “doutrina” e não as palavras.

Eu acreditava num Pai de todos nós,indiferentes, ateus, católicos-romanos, protestantes, muçulmanos, maometanos, budistas e dos indígenas e dos irracionais. Eu queria um Deus que aceitasse a prece de todos, buscando a um pai, Criador de todas as coisas.

Eu queria essa religião e não encontrava e me entristecia, desorientado, fugindo, como podia, à descrença. Fora encontrar meu maior tropeço Justamente nos Evangelhos!

Que coisa dolorosa! É que a “letra” estava me matando aos poucos e logo eu seria um dos “mortos que enterram seus mortos”.

Chegou, porém, o meu dia, — graças a Deus, — o mais feliz durante minha estadia na Terra!

Para chegar, porém, a esse dia passei por interessantes peripécias.

Indo a Caxambu, — era meu motorista o Sr. José Minholo, — lá estive uns dias e eguimos para Lambari; nesta cidade o motorista, batendo a mão na testa, disse-me:

— Seu Cornélio… esqueci a bolsinha de chave de stepenei, porta e contato, na garage onde guardamos o carro em Caxambu! Liguei o motor sem perceber, com a chave sobressalente. Como vai ser agora, se estoura um pneu?

— Não há outro recurso; voltemos a Caxambu. — Realmente voltamos e nada adiantou discutir com o dono da garage: as chaves haviam desaparecido. “Que fazer?” Escrevi à Casa Muniz & Cia., mandando-lhe o número do motor e pedindo as chaves para Poços de Caldas.

Que fosse o que quisesse.

Atravessando o sul de Minas, cheguei a Poços e lá não recebi as chaves. Massada! pedindo-as para São João da Boa Vista e, lá chegando, nada de chaves… Segui para Lindoia e Serra Negra. Andando sempre muito doente, constantemente atordoado, comprei uma caixa de “Eparseno” e fui tomar a primeira injeção. Eu e o farmacêutico ficamos impressionados: três agulhas entortadas! Não penetravam e não quis mais saber de histórias… Apesar de não ser supersticioso, disse logo ao boticário:

— Desisto! Aqui tem coisa…

Prosseguindo na minha vida de judeu-errante, dias depois estava em São Carlos, para onde pedira as célebres chaves, que lá não chegaram . Nessa cidade, eu, que não visitava ninguém, senti irresistível vontade de visitar o meu amigo Lobo. Palestrávamos quando chegou um pretinho, cozinheiro, o Alfredo, e que foi muito festejado e logo me dizia o Lobo:

— Este é um médium sonâmbulo formidável. Brinquei com meu amigo:

— Cuidado que o Juqueri está lotado… Mas assustado vi o Alfredo entrar em convulsões e logo o Espírito, depois de nos saudar, disse:

— Aqui, o meu amigo da esquerda, — indicando-me, fez muito bem em não tomar as injeções; aquilo é arsênico e o meu irmão tem o fígado em péssimo estado.

E receitou-me chá de uma planta medicinal e contra a dispepsia, pele de moela de frango reduzida a pó impalpável, dizendo-me que, vivendo eu em hotéis, fácil me seria conseguir moelas.

Fiquei impressionado com o caso, pois nem ao Lobo contara o caso das injeções.

Segui viagem e, depois de muitos ziguezagues, chegamos a Novo Horizonte, sempre temendo um estouro de pneu… Assim que chegamos, tomei de minha maquinazinha fotográfica. Deu-me na fantasia mandar o José “bater” uma chapa. Outra surpresa: feita a revelação e tirada a cópia, aparece-me sobre a cabeça, firmando os pés traseiros em minha testa, vendo-se-lhe as serrilhas das pernas, uma barata! Medida a proporção do seu comprimento, seria do tamanho de meu rosto…

— Aqui tem coisa, seu Zé! Dizia eu desconfiado. Dirigimo-nos à Noroeste, sempre pedindo as chaves e as chaves não vinham.

Dias depois, paramos para almoçar no Hotel do Pires, em Pirajuí.

Ao tomarmos o carro, tivemos a incrível surpresa de encontrar a bolsinha de couro, com as chaves dentro, sobre o tapete, onde o motorista teria de por os pés!!!

— Aqui tem coisa, Zé! Continuava eu desconfiado.

Maior, porém, foi nossa surpresa quando, dali a cinco quilômetros, estourou o pneu!

— Graças a Deus temos a chave! Exultou o Zé.

Viaja daqui, viaja dali, fomos a Curitiba e, de lá, a Ponta Grossa. No hotel do Bismara, contava eu o caso da fotografia quando um senhor, ao meu lado, pediu-me para vê-la. Notei que o homem, — hoje o meu bom confrade João 5iana, — estava como que concentrado, com a fotografia na mão, quando, com voz grossa e amiga, me disse:

— É uma troça inocente… Percebendo que se tratava de um médium, pedi:

— Escreva isso nas costas da fotografia…

Tomando de um lápis, escreveu: “é uma troça inocente — Emílio”.

Seria o meu Emílio de Menezes?

E, antes que perguntasse, respondeu-me: “Sim, sou quem estás pensando”.

Tendo o médium me dito que julgava que esse Espírito estivesse em melhor situação, fiquei aflito e penalizado, sem, então, saber a maneira de auxiliá-lo, mas o Espírito logo me confortou dizendo-me:

— Sempre o velho coração amigo… Não te preocupes comigo, pois estando mal aqui, estou um milhão de vezes melhor que vocês aí…

Regressamos a Curitiba e ali me esperava outro fato. Fui apresentado ao Hugo Marçal e subimos ao meu quarto no Braz Hotel. Logo que entramos, Hugo ficou tomado por um Espírito, de surpresa, e, empunhando um lápis, abriu meu bloco e escreveu de diante para trás, assinando.

Fui ao espelho e, oh! maravilha! Dizia o bilhete: “Amigo Cornélio, abraços e beijos: eu não te beijaria nem por um conto de réis. Emílio”.

Ora, eu nem tempo tivera para contar o caso de Ponta Grossa. Lembrei-me logo de conferir as assinaturas: perfeitamente idênticas!

Recebi também, nessa mesma ocasião, uma mensagem assinada por O. B. recomendando-me: “Leia, estude, medite e ore”. E então, pela primeira vez, comprei livros espíritas. “No Invisível” foi a primeira escolha, mas ao ver “O Livro dos Espíritos”, de Allan Kardec, eu, que temia até tocar num livro que trouxesse na capa esse nome, abri-lhe a esmo uma página e li: “É preferível recusar 99 verdades a aceitar uma só mistificação”. Que me dizem?!!! Pois os espíritas concordam que podem ser mistificados?! E eu, que tanto combatia o Espiritismo, perdi o medo e comprei “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, “O Livro dos Médiuns”… Depois não houve mãos a medir… Li as obras de Léon Denis e de Bozzano. Era a sede da Verdade que eu queria saciar de uma vez, mas… Tive então a felicidade de, em Uberlândia, entrar em contacto com Bezerra de Menezes que, logo de início, me aconselhou: — Calma, meu amigo… Calma… Chegaste à Fonte da Água Viva, mas toma-a aos poucos… Cuidado, muito cuidado com o fanatismo; ele é mil vezes pior que a descrença. Porém, lá muito dentro de mim: continuava, como um espinho doloroso, o caso das contradições dos Evangelhos; mas antes que o interpelasse, disse-me Bezerra:

— Onde estão as contradições nos Evangelhos? Fiquei chocado pelo inesperado da pergunta e citei os casos.

— E Jesus não alterou um til da Lei de Deus! Disse-me .

— Como assim?

E ele me respondeu com outra pergunta e todo o meu espírito se iluminou na justa compreensão:

— Qual é a “Lei de Deus”, meu amigo?

— Os dez mandamentos…

— E Jesus alterou um só deles?

— Não…

— Então não confundas a Lei de Deus com as leis que estão na Bíblia e que eram leis dos homens para homens, de grande atraso e profunda ignorância. Seus autores aparentes eram médiuns a ditar leis de acordo com a época, local e necessidades de cada povo.

Continuando nossa conversa, tão franca e elucidativa, disse-lhe:

— O que me apavora no Espiritismo é aquela passagem: “Pode o Espírito do Mal transformar-se em um anjo de luz para seduzir”… ()

— Mas, veja também a passagem que diz: “Pelo fruto conhecerás a árvore; se o fruto é bom, boa será a árvore, pois más árvores não podem produzir bom fruto”. (Mt 7:18) E, para isso, foi que João, o Evangelista, recomendou: “Aprendei a conhecer os Espíritos que são de Deus”. (1Jo 4:1) Aí mesmo, na Terra, vocês, com um pouco de argúcia, não distinguem logo um mistificador de um homem de bem? Ele mistificará uma vez, mas não duas, se estiverem atentos. Quanto à prevenção contra os de cá: “oração e vigilância”. (Mt 26:41) E saiba que os “curiosos e fúteis” são as vítimas escolhidas pelos enganadores.

Assim foi que, recebendo claras instruções, me tornei espírita, dos menorzinhos e dos mais ignorantes”.


Segundo Joffre Martins Veiga, em “A Vida Pitoresca de Cornélio Pires”, o jornalista Amadeu Amaral, primo do folclorista; recomendou-lhe ao deixar “O Comércio de São Paulo”:

— Seja bom, Cornélio… Acrescentando o biógrafo: — Conselho que o grande humorista sempre seguiu.

O mesmo escritor comenta: “Ninguém amou tanto sua gente como Cornélio Pires; ninguém se preocupou tanto com seus semelhantes como esse homem que foi, antes de tudo, um bom.

Cornélio fruiu da amizade e do apreço do poeta Martins Fontes que, a respeito do mesmo, escreveu: “É um puro bandeirante, um artista incansável, enobrecedor da Pátria e enriquecedor da língua”.

Foi a conselho do jornalista Amadeu Amaral que resolveu tornar-se escritor regionalista, destacando-se, então, como um dos maiores divulgadores do folclore brasileiro.

No ano de 1910 lançou a lume “Musa caipira”; livro que foi saudado pela crítica; por seu conteúdo tipicamente brasileiro, pois Cornélio Pires “soube mergulhar no coração de sua gente e de lá trazer, para a literatura, toda a riqueza da alma simples e boa do caboclo”.

Por volta de 1914, deixou Cornélio Pires a imprensa e passou a dar espetáculos públicos, com seus números inconfundíveis, percorrendo o interior paulista e também vários Estados brasileiros. Nessas atividades encontrou sua consagração, alcançando o ano de 1946 com o seu já famoso “Teatro Ambulante Gratuito Cornélio Pires”; percorrendo cidades e se consagrando na opinião pública. Foi, como se costuma dizer, um integrador, sempre se notabilizando pela brasilidade e pelo amor ao sertão, como seus ancestrais, vindos de velhos troncos piratininganos.

Alguns anos antes da sua desencarnação, voltou para Tietê, onde comprou, nas imediações da cidade, uma chácara na qual, em três alqueires e meio, fundou a “Granja de Jesus”, com o objetivo de agasalhar e educar menores até 18 anos, tendo desencarnado antes da conclusão da obra.

Poeta, escritor, editor, conferencista, radialista, professor de ginástica, despachante e rábula em Botucatu, deixou numerosos discos, produziu o filme sonoro “Vamos Passear”; focalizando cenas do folclore paulista, este em 1934. Fez outro filme precursor, “Brasil Pitoresco”, em 1923. Fundou a revista “O Saci”, com Voltolino. Foi um pioneiro no tocante à gravação de pios de passarinhos, com dois discos; ajudou a fundar a “Associação Cristã de Moços”.

Três meses antes de desencarnar, pressentindo que os dias lhe estavam contados, Cornélio Pires tomou de uma folha de papel e escreveu sua última vontade, verdadeiro testamento de um homem caridoso, que sempre se preocupou com o bem-estar do próximo:

“Em qualquer tempo em que eu deixe este corpo, — que tanto me serviu para minha estada na Terra, para me “consertar” um pouco, — desejo que ele seja sepultado descalço e de pijama. Não por vaidade, mas para que se aproveitem, — alguns pobres, — das roupas e calçados que usei. Nisto não há caridade. Como não posso usá-los, os dou…”


Alguns críticos julgam que, em Cornélio Pires, o folclorista, era bem melhor do que o poeta, o humorista, o contista, valorizados mais pelos elementos folclórico do que o estético. Mas, já Silvio Romero detectava aquilo que a sua produção psicografada leva à ênfase: … “o gênero que cultiva é, muito ao contrário do que geralmente se pensa: de grandes dificuldades”.


É esse o homem que, anualmente, os tieteenses homenageiam, através da “Semaria Cornélio Pires”.


BIBLIOGRAFIA


“Musa Caipira”, 1910; “Versos”, 1912; “Versos 5elhos”, 1912; “Cenas e Paisagens de Minha Terra”, 1912; “Monturo”, 1915; “Quem Conta um Conto”, 1919; “Conversas ao pé do fogo”, 1921; “Cenas e paisagens da Minha Terra” (Musa Caipira), 1921; “Estrambóticas Aventuras de Joaquim Bentinho, o Queima Campo”, 1925; “Tragédia Cabocla”, 1926; “Patacoadas”, 1926; “Seleta Caipira”, 1927; “Almanaque do Saci”, 1927; “Mixórdia”, 1927; “Meu Samburá”, 1928; “Sambas e Cateretês”, 1932; “Tarrafadas”, 1932; “Chorando e Rindo”, 1933; “De roupa Nova…”, 1933; “Só rindo”, 1934; “Tá no Bocó”, 1935; “Quem conta um conto e Outros Contos” (Coisas do passado), 1934; “Enciclopédia de Anedotas e Curiosidades”, 1945; “Coisas do Outro Mundo”, 1944; “Onde estás, ó morte?”, 1947; estas duas últimas obras encerram exclusivamente assuntos espíritas.


DO ALÉM TÚMULO


Pela atividade mediúnica de Francisco Cândido Xavier e de Waldo Vieira, expressando-se nos gêneros mais difíceis — o soneto e a trova, — vem se revelando um autêntico mestre.

“Antologia dos imortais”, 1963; “Trovadores do Além”, 1965; “Poetas redivivos”, 1969; “O espírito de Cornélio Pires”, 1965; “Retratos da vida”, “Conversa firme” e “Baú de casos”, 1977.



Araraquara, 1977.



Wallace Leal V. Rodrigues
Francisco Cândido Xavier

Coisas deste mundo


Temas Relacionados:

Tonico viveu na farra,

bebendo pinga aos canecos,

hoje é homem renascido

de fígado em pandarecos.


Tatão perseguiu Quinquim

Até matá-lo a facão;

Mas Quinquim hoje nasceu

Como filho de Tatão


Tião pisou Josefina

Faleceu zombando dela…

Hoje, é um menino enjeitado

Que Josefina tutela.


Rita matou o velho tio

Com pancadas no monjolo,

Hoje ele é neto que Rita

Acaricia no colo.


Que razões do amor em Nira,

Se o filho nem procura?

Ele é o homem do passado

Que ela induziu à loucura.


Observa o que semeias,

Se o amor ou luz, ódio ou paz.

Tudo que damos à vida

A vida pega e nos traz.


Furtava ouro e diamantes

O ourives Joaquim Cazuza…

Renascido, hoje trabalha

Em forno de ferro guza.


Marina expulsou a sogra

Por causa de uma tijela;

A pobre morreu na chuva

Mas agora é filha dela.


No esporte, o conde arrasava

Com qualquer antagonista…

Morreu e voltou à Terra…

É um médico ortopedista.


Suicidaram-se por Jonas

Dila e Duca de Morais…

Renasceram filhas dele,

Meninas excepicionais.


Para livrar-se da gula,

Pediu Juquinha Garrido

Vida nova em corpo novo

De estômago enfraquecido.


Por que Joaquim tanto apoia

A filha que o não releva?!…

Ela é a mulher que ele mesmo

Um dia, atirou na treva…


João vai nasceu… mas nas culpas

Que lhe amargam na lembrança,

Roga um problema nervoso

Que lhe guarde a temperança


Leonor enganou Fimfim

Que morreu de raiva e dor,

Mas Fimfim tornou à Terra…

Hoje é filho de Leonor.


Liberando-se da intriga,

Temendo queda outra vez,

Téo espera regressar

Na provação da surdez.


Numa contenda de afeto,

João se matou por cirila…

Reencarnado, é o filho enfermo

Que não a deixa tranquila.


Tintina fez tantas lutas,

Tantos delitos no lar…

Agora quer novo corpo

Que não possa procriar.


Dois problemas!… dois suicídios,

O de Lana e Juvenal…

Voltaram… ela, idiota,

Ele, doente mental.


Empreços, enfermidades,

Obstáculos, no fundo,

São recursos de defesa

Que nos amparam no mundo.


Que ódio entre filho e mãe!…

Que havia entre Juca e Sara?

Ela fora, noutro tempo,

A esposa que o renegara.


Eis a história de tinta :

Aborto e criança morta.

Hoje ela quer renascer,

Toda gente fecha a porta.


Com sentimentos alheios

Não brinques, mesmo de leve…

Tanto no amor quanto em tudo,

Cada qual paga o que deve.


Na grande escola da vida,

Erro nenhum passa em vão;

Deus tem por mestra e vigia

Alei da reencarnação.


Prejudicou tanta gente

O construtor João Teixeira…

Vive agora noutro corpo

Servindo numa pedreira.


Nhô Tico matou o genro,

Achou que se fosse embora,

Mas o genro nasceu dele,

É o caçula que ele adora.


Quem despreza a lei do bem

Não foge ao próprio dever,

Torna apenas mais difícil

O que se deve fazer.


Tonho morreu na garrafa.

Não trabalhava, dormia…

Morreu e nasceu de novo

Sofrendo paralisia.


Renasceu Téo que vivia

De tomar a terra alheia…

Tem agora o ganha-pão,

Suando na pá de areia.


Morreu Tonico de Souza,

Vivia a caluniar…

Reencarnado, grita, grita,

Mas não consegue falar.


Leonel, vendendo tecidos,

Morreu de tanra ambição…

Encontrei-o reencarnado

Na lavoura de algodão.


Por causa de terra e nota,

Líliu matou Braúna,

Mas nasceu de Liliu

Para toda a fortuna.


Xandoca morreu no ódio

De Maricota do esteio.

Hoje Xandoca é a filhinha

Que se amamenta ao seio.


Aceita com paciência

crise, golpe, provação…

O sofrimento é remédio,

Bendita a reencarnação.


Faleceu Nico, no prato,

Comia até à loucura…

Noutro corpo sofre agora

Azia que não tem cura.


Foi-se Joana em cocaína,

Só procurava esquecer.

Agora nasceu doente

para acordar no dever.


Cansado de muitos erros,

Na cultura com vanglória,

Simão quer nova existência

Com defeito de memória.


Morreu Tônico Sampaio,

Só de calúnia vivia…

Hoje tem lábio rachado,

Esmolando cirurgia.


Antônio temendo excessos

Com que já foi a loucura,

Implora um corpo doente

Sempre ativo, mas sem cura.


Finou-se Joana Pacheco.

Viveu tão só de pesar…

Renasceu e vive em luta,

Sem tempo de se queixar.


Nas plagas do sofrimento.

Vejo esta regra concisa

Cada qual tem seu problema

No resgate que precisa


Recordo Aninha Pachola…

Morreu ricaça e sovina.

Hoje, achei-a reencarnada,

Mendigando numa esquina.


Morreu Nico, o matador;

Cobrava caro os balanços.

Pediu novo berço à Terra

E traz um corpo sem braços.


Júlio inventando calúnias,

Deixou muita gente pasma…

Mora hoje noutro corpo,

Sofrendo acessos se asma…


Dodélia acabou com os pais

Para luxar a capricho.

Revive agora na terra

Virando lata de lixo.


Braz morreu… Fez muitos crimes,

Usando intriga e boato…

Renascido, é um surdo-mudo,

Numa cabana do mato.


Agradece o sofrimento,

Alma cansada e ferida.

A dor na reencarnação

É benção de Deus na vida.


Finou-se Juca Pacheco,

Sovina como ninguém…

Renascido, luta e sofre

Mas não ajunta vintém.


Dançando, Gina criou

Muita dor, muito revés…

Em breve, reencarnará

Com reumatismo nos pés.


Lili deu filhos à fossa,

Cultivava esse costume.

Hoje, nasceu enjeitada

Num curral cheio de estrume.


Nino, ao piano, fez crimes

Por músicas e votos vãos…

Mas hoje roga outro corpo

Com atrofia das mãos.


Quantos delitos de amor!

Finou-se a bela Iracema.

Ela agora quer voltar

Na provação do eczema.


Joaquim orador de prol,

Punha lama e fogo em tudo.

Retornará para a Terra.

Hoje, porém, quer ser mudo.


Enfermidade na vida

Por mais triste, mais atroz,

Muita vez, é só recurso

Para guardar-nos de nós.


Morre u Lino que furtava

nos gêneros que vendia;

agora tornou à Terra,

sofrendo com padaria.


Por ódio trocando, Antônia

Matou Lina do Lagarto…

Hoje, elas são mãe e filha

Doentes no mesmo quarto.


Deus nos dá, vida por vida,

Um curso de cada vez.

Presente é sempre o retrato

Daquilo que já se fez.


Astolfo escreveu maus livros

Endoidando a multidão,

Do além, retornou ao mundo

Nas teias da obsessão.


Morreu Léo Cintra, o escritor.

Era uma pena cruel.

Noutro corpo, é servidor

Em fábrica de papel.


Leolino viveu de caça

e só de caça se foi…

Encontrei-o renascido,

Curtindo couro de boi.


O médico Limundo

Largou diploma e dever

Renascido, tem doença

Que ninguém sabe entender.


Maricota suicidou-se

Por causa de Anísio Prado,

Mas hoje é a filhinha dele

de cérebro retardado.


Abençoa o sofrimento

A que a Terra te destina…

A dor na reencarnação

É benção da luz divina.


Por Zina, matou-se João…

Um carro fê-lo aos pedaços…

Hoje ele é o filho doente

Que Zina beija nos braços.


Marina fez três abortos

Dizendo temer feiura…

Morreu e voltou à Terra

Encarnada à loucura.


Manoel seduziu Perlícia,

Deixando-a em tombos loucos…

Ela morreu e voltou:

É a filha que o mata aos poucos.


Nini prometeu ser mãe

De desafetos passados…

Recusou, mas vive agora,

Num pouso de alienados.


Por Téo, Nana largou Juca

Que se matou pela ingrata,

E Juca à voltou ela,

É o filho que a desacata.


Anésia pôs fogo à choça

Assassinando o marido.

Morreu e nasceu de novo

De corpo todo ferido


Joaquim arrasou Simão

Para tomar-lhe Ana 5era

Mas Simão tornou a ele

É o filho que o não tolera.


Matou-se Quirino Sanches

Por pequenino pesar…

Voltou morrendo ao nascer

Para aprender a lutar.


Tesouro maior da vida

É a mente tranquila e sã.

Erro que a gente faz hoje

A vida acerta amanhã.


Gina extraía crianças,

Matando-as nágua fervente…

Renasceu de pele em fogo,

Chorando constantemente.


Morreu Gil… Feriu a muitos

Para ter mansão no morro.

Renasceu servindo nela

Para tratar do cachorro.


Quanto aborto acumulado

Da parteira Dona Eva!…

Hoje, morta, ela vagueia

Ouvindo choro na treva.


João odiava Gilberto,

Gilberto odiava João.

Morreram e renasceram,

Dois gêmeos em provação


Antonio abusou da dança

E atormentou muitos lares,

Presentemente nasceu

Sofrendo dos calcanhares.


Finou-se Juca Veludo;

Só viu mal a vida inteira…

Agora pediu aos céus

Reencarnação em cegueira.


Revi Armênio, o escritor…

Vivia na camoeca,

Reencarnado, é o zelador

De antiga biblioteca.


Morreu avarenta e inútil

A ricaça Rosabela;

Voltou à terra empregada

No antigo palácio dela.


Finou-se Nélia, a enfermeira,

Que agia no mal…

Reencontrei-a trabalhando

Em limpeza de hospital.


Caso esquisito!… Um guerreiro

Da antiguidade esquecida

É hoje um cirurgião

Que ampara e reforma a vida.


Lembro Zico, advogado…

Só brigava e confundia…

Morreu e voltou à terra,

Sofrendo hidrocefalia.


A ninguém batas nem firas,

Que o tempo vai como vem…

E, usando suposto mal,

A vida refaz o bem.


Obrigação para hoje,

Seja atendida de vez,

Que a vida espera amanhã

Aquilo que não se fez.


Morreu o agrônomo Prates.

Trocou profissão por nota.

Agora, em outra existência,

Zela animais de uma grota.


Sertório abusou de Joana

E assassinou-a tranquilo…

Ela hoje é a filha dele

Com ganas de destruí-lo.


José, retendo dinheiro,

Largou o filho à matroca…

Morreu e voltou… Mas hoje,

Só ganha em vender pipoca.


Mutilações sobre a Terra,

Certas angústias marcadas…

São refúgios contra os erros

De nossas vidas passadas.


Foi-se João, sábio isolado,

A que ninguém tinha acesso.

Hoje, nasceu entre os índios

Para ajudar o progresso.


Pessoas que noutro tempo

Plantavam difamação,

Formam agora famílias

No enredo da obsessão.


Libório, por sovinice,

Enterrou prata no chão…

Hoje luta noutra vida

Caçando tesouro em vão.


Totônio fez quatro mortes

Na mata do Moacir…

Quer renascer, mas sem braços,

Com medo de reincidir.


Ninita arruinou a casa,

Morreu nova, ingrata e bela.

Hoje é menina enjeitada

na família que era dela.


Por voz linda, quantos crimes

Em Maricota Cerqueira!…

Hoje quer nova existência

Em que viva na cegueira.


Trabalho, dificuldade?

Não te lastimes em vão,

O céu nos dissolve os erros

Na luz da reencarnação.


Recebe dificuldade

Com fé serena e inteiriça

Sofrimento em qualquer parte,

É socorro da justiça.


Foi-se Gina, a professora…

Tinha nojo de ensinar;

Mas renasceu… é a porteira

De humilde grupo escolar.


Pedimos o dom da dor

Que ninguém acolhe em vão

Por guia da própria vida,

No rumo da perfeição.


Lindolfo atado a ciúme

Suicidou-se por Joaninha,

Mas voltou de corpo inerte,

Quer andar mas não caminha.


Dois grupos que assassinavam

Com fogo em carros na estrada,

Faleceram noutro corpo

Numa loja incendiada.


Cicínia usou de serpente

E liquidou com José,

Agora, morreu menina

De um simples bicho de pé.


Desastres, calamidades,

Dos quais a lei não se priva,

Constituem pagamento

Em provação coletiva.


O engenheiro Juca Pontes

Quis formatura e nada…

Morreu e voltou à terra,

Nascendo numa calçada.


Por Zena, João matou Nico

E desposou-se depois…

Mas Nico voltou a eles,

É o caçula deles dois.


Dino, escultor primoroso,

Nada fez que sabia…

Hoje, só mede tijolo,

Num recanto de olaria.


Inimigo do passa

Perseguia Gabriela.

No ajuste das próprias contas

Ele agora é filho dela.


Cocota matou o sogro

Com veneno em berinjela,

Mas o sogro renasceu…

É um filho nos braços dela.


Tanto odiou crio ao Nei.

Até que o matou a tiro…

Loucura!… Nei regressou…

É o filho do próprio Ciro.


Paulinho matou Marcelo

E suicidou-se por Lia…

Renasceu… É filho dela

Que sofre esquizofrenia.


Quis ser pai de obsessores

Que o feriam sem cessar…

Teve Antonio o que pedia:

Um sanatório no lar.


O delito não compensa

As culpas persistirão

Até que a vida as apague

Na lei da reencarnação.


A dívida, como seja,

Mesmo se longo passado,

Enquanto não resolvida

Mora sempre ao nosso lado.


Morreu Diva… Quatro abortos!…

À preguiça andava entregue.

Renasceu e quer ter filhos,

Sonha, sofre e não consegue.


Por orgulho fez sinhana

Muitos caminhos errados…

No além, pede novo corpo

Com nervos destrambelhados.


Tininha fez quatro abortos

Sem propósito e sem causa

E os filhos que não nasceram

Hoje a perseguem sem pausa.


Para guardar-se se faltas

Praticadas na injustiça,

Roga nova armênio vida nova

Que lhe dê mente enfermiça.


Aborto nas leis da vida

É dívida que se atrasa…

Feliz de quem paga contas

Por dentro da própria casa.


Tião tratava a mãezinha

A chutes e bofetadas…

Hoje anseia renascer

Num corpo se mãos mirradas.


Renasceu Juca… Vivia

De tomar a terra alheia.

Agora ganha somente

Suando na pá de areia.


Não creias que Deus te honra

Com teus créditos e dons

Para que entendas e sirvas

Somente aos justos e bons.


A imponente dona Joana

Finada em paixão e treva,

Pediu corpo e vida humilde

No mato da Genoveva.


Honrar as obrigações

Mesmo em luta, anos inteiros,

Sem deixar as próprias cargas

Nos ombros dos companheiros.


Quem fez os pires em guerrear?

Foi Nhô Bem de Monsaraz

Que vai reencarnar dos Pires,

A fim de fazer a paz.


Evitar em qualquer tempo

Este desastre comum:

Contentar-se em criticar

Sem prestar auxílio algum.


Rixas não servem nem mesmo

Nas pessoas mais tranquilas…

Quem as provoca responde

Pelo dever de extingui-las.


De gênios perdido em furto,

O irmão Quelidônio Alpaca

Do além quer voltar à Terra,

Sofrendo cabeça fraca.


As multidões que estimulam

Assalto e crime na Terra

Costumam desencarnar

Em ocorrências de guerra.


Legenda aos serviços do bem

Aos de agora e aos que virão:

Nunca se faça a mistura

De esclerose e tradição.


Pessoas que envenenam

De alma sarcástica e fria

Pediram morte conjunta

Num surto de epidemia.


Não faças aos semelhantes

Seja o que for, onde estejas,

Que, em se tratando de ti,

Não aprovas, nem desejas.


Corsário de eras

Rogaram ao reencarnar

Para morrerem unidos

Em acidente de mar.


Em seis vidas, suicidou-se

O amigo Arsênio Faria…

Ele agora quer nascer

Na prova da idiotia.


Impera em todo universo

Este princípio comum

A justiça é lei da vida

Por dentro de cada um.


Escultor, vivia inerte,

Cultivando falcatrua…

Vive hoje noutra forma

Trabalhando pisos da rua.


Se são filha e mãe porque

Tantas rixas as consomem?

Noutra vida se arrasaram,

Disputando o mesmo homem.


Escrevia apedrejando…

Assim morreu Hélio Lins.

Encontrei-o noutro corpo

Trazendo pedras nos rins.


Nhô Nilo para beber

Não via meio nem fins…

Morreu e nasceu de novo

Com sofrimento dos rins.


Dois enganos no caminho

De consequência fatais:

Ser surdo às dores alheias,

Enclausurar-se demais.


Liberdade faz o gesto,

Consequência vem após.

O perdão nasce da vida,

A punição vem de nós.


Por bela fez muitos crimes

Amélia da Conceição,

Hoje roga corpo enfermo

Em que se arraste no chão.


Morreu Leonel que furtava

De toda pobre viúva…

Encontrei-o reencarnado:

Mendigo atirado à chuva.


Manoel liquidou Joaquina…

Por ela foi perdoado.

Mas hoje, a fim de punir-se

Quer renascer mutilado.


Finou-se atolado em pinga

O ricaço Vidigal.

Renasceu… Hoje é um doente

Zelando um canavial.


Téo matou-se por ciúme

De Maria do sossego…

Mas voltou… É filho dela,

Aprendendo desapego.


Três homens foram ao crime

Por causa de Florisbela…

Noutra vida, todos três

São agora filhos dela.


Largando-se de uma torre,

Suicidou-se Amaro Luna…

Noutro corpo, vive inerte

Com problemas de coluna.


Há na justiça dos céus

Esta nota que é sublime:

— “Receba cada culpado

A luta em que se redima”.




Cornélio Pires
Francisco Cândido Xavier

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Não pode a árvore boa dar maus frutos; nem a árvore má dar frutos bons.

mt 7:18
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AMADOS, não creiais a todo o espírito, mas provai se os espíritos são de Deus; porque já muitos falsos profetas se têm levantado no mundo.

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Mateus 26:41

Vigiai e orai, para que não entreis em tentação: na verdade, o espírito está pronto, mas a carne é fraca.

mt 26:41
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