1 E aconteceu que quando Jesus acabou de dar estas instruções aos seus doze discípulos, passou dali a ensinar e a pregar nas cidades deles.
2 Como João, estando no cárcere, tivesse ouvido as obras de Cristo, enviando dois de seus discípulos.
3 Lhe fez esta pergunta: Tu és o que hás de vir, ou é outro o que esperamos?
5 Os cegos vêem, os coxos andam e os leprosos limpam-se, os mortos ressurgem, aos pobres anuncia-se-lhes o Evangelho.
O Precursor termina aqui sua missão. Com sua enérgica pregação, avisara o povo de que já estava encarnado aquele que lhe ensinaria o caminho reto, que conduz ao reino de Deus.
João dera testemunho de Jesus à multidão que o tinha procurado no deserto. Agora que os homens tinham presenciado as ações nobres de Jesus e lhe tinham ouvido a palavra da Vida Eterna, mais fácil seria a João confirmar a vinda do Enviado. E manda que dois discípulos seus interroguem Jesus perante testemunhas. A resposta de Jesus é clara e positiva; não responde: eu o sou; mostra-lhes simplesmente as obras generosas que vinha realizando, como a dizer-lhes: julgai-me pelas minhas obras.
Do mesmo modo serão reconhecidos os verdadeiros seguidores de Jesus: pelas suas obras. Ao discípulo, não serão as palavras que afirmarão sua qualidade de praticante do Evangelho; suas obras é que deverão testemunhar isso. Como Jesus, o discípulo sincero não deixa atrás de si uma longa esteira de palavras sonoras, porém vagas. Deixa, sim, uma semeadura substancial de amor cristão, à qual consagrou •o espírito bem formado.
Os cegos vêem, significa que a luz espiritual foi trazida à terra. Os coxos andam, significa que foi ensinado à humanidade como caminhar para o reino de Deus. Os leprosos limpam-se, significa que os que aceitassem o Evangelho purificariam suas almas. Os surdos ouvem, significa que a palavra divina estava sendo pregada aos que nunca a tinham ouvido. Os mortos ressurgem, significa que a imortalidade da alma estava sendo revelada aos homens. Aos pobres anuncia-se-lhes o Evangelho, significa que a verdadeira riqueza são os bens espirituais que Jesus ensinava como podiam ser adquiridos. E a humanidade, antes do advento de Jesus, jazia em grande pobreza espiritual. A riqueza material não se conta por ser transitória, aqui ficando quando o espírito desencarnar. Na pátria espiritual julga-se a riqueza de uma alma pelo seu maior ou menor grau de espiritualidade que conquistou na terra.
6 E bem-aventurado aquele que rido for escandalizado em mim.
Uma vez que serão as obras que demonstrarão se alguém é ou não um aprendiz de Jesus, é necessário que aqueles que lhe aceitam os ensinamentos, se revistam a umildade e da sinceridade para praticá-los.
Os que se escandalizam de Jesus, são os que preferem as coisas profanas da terra; nesses o orgulho fala mais alto, desviando-se uns por comodismo, outros por conveniências sociais, outros para não perderem amigos, outros para não abandonarem os vícios. Muitos, do mesmo modo, não aceitam o Espiritismo, escandalizando-se dele, com o receio de serem ridicularizados pelos amigos; também porque o Espiritismo lhes profliga os vícios e exige esforço próprio de cada um de seus adeptos, muitos fogem dele.
Quem não se escandaliza de Jesus é aquele que contorna todas as dificuldades a fim de se tornar um aprendiz do Evangelho. Nesse particular, o Espiritismo oferece a todos os de boa vontade a sublime oportunidade de demonstrarem pelas suas obras sua categoria de verdadeiros aprendizes de Jesus, através do desempenho da mediunidade.
7 E logo que eles se foram, começou Jesus a falar de João às gentes: Que saístes vós a ver no deserto? uma cana agitada pelo vento?
8 Mas que saístes a ver? um homem vestido de roupas delicadas? Bem vedes que os que vestem roupas delicadas são os que assistem nos palácios dos reis.
9 Mas que saístes a ver? um profeta? Certamente, vos digo, e ainda mais do que profeta.
10 Porque este é de quem está escrito: Eis aí envio eu o meu anjo ante a tua face, que aparelhará o teu caminho diante de ti.
Ao chegar o momento de a humanidade receber ensinamentos novos, encarna-se na terra um emissário do Altíssimo para trazê-los. E quando começa a desempenhar sua tarefa, forma-se em torno dele um movimento de opinião. Uns são atraídos pela curiosidade: chegam, olham, ouvem e passam indiferentes. Outros são atraídos pela dor: move-os a esperança de encontrarem alívio para seus sofrimentos. Outros vêem no mensageiro e na revelação que traz, uma coisa sem valor, como se tudo não valesse mais do que uma cana agitada pelo vento. Outros ficam desapontados por não verem nele um homem revestido das coisas vãs e transitórias da terra. E, finalmente outros há que descobrem nele muito mais do que o profeta; vêem nele o enviado de Deus, que lhes fala do que suas almas necessitavam para evoluírem; estes são os preparados para receber os ensinamentos, pelos quais ansiavam.
É o que acontece com o espiritismo. É o novo enviado do Altíssimo, que veio trazer a terra ensinamentos novos. Alguns se achegam ao Espiritismo, pensando assistirem a prodígios. Outros não lhe dão nenhuma importância.
Outros, desesperados de conseguirem a cura de seus males, procuram o Espiritismo na esperança de ficarem curados, e depois o esquecem. E por fim temos alguns poucos que sabem descobrir no Espiritismo um caminho reto para a Vida Eterna.
Tal como João Batista no início da idade evangélica, o Espiritismo é o moderno enviado de Jesus, que aparelha aos homens a estrada luminosa, que os conduzirá ao reino de Deus.
11 Na verdade vos digo que entre os nascidos de mulher não se levantou outro maior que João Batista; mas o que é menor no reino dos céus e’ maior do que ele.
É evidente que Jesus se refere aqui à grandeza espiritual da missão de João Batista. Cumpria-lhe preparar os corações para a recepção do Evangelho; es e ar a atenção do povo para a vida espiritual, facilitando a Jesus o início de seu trabalho. Enfim, João Batista arcaria com a responsabilidade de abrir para a humanidade a era evangélica. Por isso é que Jesus diz que dos nascidos de mulher, nenhum foi maior do que João Batista; isto é, não se encarnou ainda nenhum espírito com missão maior do que a de João Batista.
O respeito e a admiração que João Batista granjeou entre o povo, foram tão grandes que o consideravam como um homem quase que sobrenatural.
Jesus, conquanto justifique o amor que o povo consagrava a João Batista, adverte-o de que no mundo espiritual existiam espíritos ainda maiores, por serem mais evoluídos que João Batista.
12 E desde os dias de João Batista até agora o reino dos céus padece força e os que fazem violência são os que o arrebatam.
Aqui a violência a que Jesus se refere é a árdua luta que devemos travar para que nos libertemos da matéria e atingir a espiritualidade. Enquanto não tivermos conseguido nossa completa espiritualização, sempre teremos de nos encarnar em corpos materiais, sofrendo, por conseguinte, todas as vicissitudes a que a matéria está sujeita. E para ficarmos livres do ciclo das reencarnações, passando a viver unicamente no mundo espiritual, precisamos empregar o máximo de nossos esforços na correção de todas as imperfeições de nossa alma.
Jesus diz que o reino dos céus padece força desde os dias de João Batista, porque é por João Batista que se inicia a evangelização da humanidade. E o espírito, para se evangelizar deve lutar asperamente contra suas próprias imperfeições.
O reino dos céus aqui simboliza a paz interior, que poderemos alcançar mediante o sacrifício de nosso orgulho, de nossas vaidades e pelo desapego das coisas materiais, pela prática do mais puro amor ao próximo e das virtudes pregadas por Jesus.
13 Porque todos os profetas e a lei até João profetizaram.
João é o último profeta enviado pelo Senhor para ensinar os homens a viverem de acordo com os mandamentos divinos. De agora em diante Jesus legará o Evangelho ao mundo, como um roteiro seguro que o conduzirá a Deus. E hoje temos o Espiritismo, um profeta que está em toda parte, falando ao coração e à inteligência de todas as criaturas: aos humildes e aos letrados, aos pobres e aos ricos, aos sãos e aos doentes, espalhando ensinamentos espirituais de fácil compreensão. Fala ao coração, estimulando nele o sentimento; fala à inteligência, explicando racionalmente as leis de Deus; fala a todas as criaturas, porque não faz acepção de pessoas; e seus ensinamentos são de fácil compreensão, porque não usa dogmas, nem símbolos, não tem rituais nem fórmulas vãs nem pompas exteriores, as quais satisfazendo os sentidos, em nada contribuem para o benefício da alma.
14 E se vós o quereis bem compreender, ele mesmo é o Elias que há de vir.
Jesus aqui prega a lei da reencarnação. Reencarnou-se o espírito de Elias e com o novo corpo material chamou-se João Batista. Confirmando isto, podemos notar em João Batista a mesma rudeza, a mesma independência de palavras e atos e a mesma coragem de Elias.
Se bem quisermos ver, o Espiritismo é a religião do progresso, porque além de pregar a reencarnação da alma, acompanha o desenvolvimento da ciência, nada ensinando que não esteja de acordo com o que não possa ser explicado pelo raciocínio; enquanto outras religiões pregam dogmas absurdos, em completo desacordo com o desenvolvimento da inteligência humana, chegam a negar fatos comprovados pela ciência e vivem enclausuradas em hábitos antigos e retrógrados. Figuradamente podemos dizer que o Espiritismo é a reencarnação das religiões do passado, trazendo sob sua nova vida todo o progresso espiritual, que é dado aos homens alcançar na terra.
Poderosa alavanca do progresso humano em geral e do espírito em particular, é a reencarnação. Reencarnando-se sucessivamente, de cada vez que aqui vêm, os espíritos trazem do mundo espiritual novos e valiosos conhecimentos que aplicam no melhoramento do ambiente terreno, promovendo assim o progresso e o conforto na face do globo. E particularmente, um espírito por meio da reencarnação corrige os erros do passado, conclui o que o tempo não lhe permitiu concluir centímetro vidas anteriores e, através das lutas terrenas, liberta-se da matéria e conquista a espiritualidade.
15 O que tem ouvidos de ouvir, ouça.
Jesus veio trazer a Verdade ao Mundo. A Verdade é o conjunto das leis divinas. A revelação da Verdade é progressiva. Os ensinamentos são trazidos paulatinamente à terra e chegam os novos, sempre que os anteriores tiverem sido assimilados. A Verdade nos impele ao bem e ao Amor, por isso Jesus é a expressão mais pura da Verdade. Contudo, como a prática da Verdade reclama esforço próprio e às vezes árduo, muitos que a ouvem não querem sair de seu comodismo e se fingem surdos à sua voz.
Ainda não se disse nem se dirá a última palavra sobre a Verdade. Quanto mais marcharmos pela estrada evolutiva, tantos maiores aspectos da Verdade iremos conhecendo. E como o Espiritismo é uma religião essencialmente progressista, aceitará como novas manifestações da Verdade tudo quanto venha beneficiar a humanidade.
16 Mas a quem direi eu que é semelhante esta geração? É semelhante aos meninos, que estão sentados na praça; que, gritando aos seus iguais.
17 Dizem: Nós vos cantamos ao som da gaita e vós não bailastes; choramo-vos e não chorastes.
18 Porque veio João, que não comia nem bebia, e dizem: Ele tem demônio.
19 Veio o Filho do homem, que come e bebe e dizem: Eis aqui um homem glutão e bebedor de vinho, amigo de publicanos e de pecadores. Mas a sabedoria foi justificada por seus filhos.
Estas palavras de Jesus retratam fielmente os obstinados na incredulidade.
Para os que não querem crer, de nada valem argumentos; sempre sabem encontrar meios para justificarem sua descrença.
A sabedoria é a compreensão das leis divinas; e os filhos da sabedoria são os que as compreendem e as seguem. Justifica-se a sabedoria por seus filhos, porque os que observam os preceitos divinos, realizam em si próprios o reino dos céus.
20 Então começou a lançar em rosto às cidades, em que foram obradas tantas das suas maravilhas, que não haviam feito penitência;
21 Ai de ti Corazin, ai de ti Betsaida; que se em Tiro e em Sidônia se tivessem obrado as maravilhas que se obraram em vós, muito tempo há que elas teriam feito penitência em cilício e em cinza.
22 E eu vos digo, contudo, que haverá menos rigor para Tiro e Sidônia, que para vós outros, no dia do juízo.
23 E tu, Cafarnaum, elevar-te-ás, porventura, até o céu? hás de ser abatida até o inferno; porque se em Sodoma se tivessem feito os milagres que se fizeram em ti, talvez que eia tivesse permanecido até o dia de hoje.
24 Eu vos digo, contudo, que no dia do juízo haverá menos rigor para a terra de Sodoma que para ti.
Jesus exprobra a indiferença dos habitantes das cidades em que realizou a maior parte de seus atos e de suas pregações. Apesar de tantas provas que lhes foram fornecidas, continuavam na descrença e reincidiam nos erros. Por isso, sofreriam mais rigorosamente a ação da Justiça Divina, porque estavam agindo com conhecimento de causa. É o que acontece modernamente com muitos dos que são bafejados pelos ensinamentos e pelas provas que o Espiritismo lhes oferece. Quantos há que não chegam aos Centros Espíritas, tangidos pelo sofrimento e pelas desilusões do mundo? E depois de aliviados, consotados, fortificados, sentindo na alma mais calma e mais coragem, em lugar de abraçarem os novos ensinamentos e trilharem com segurança o caminho que lhes é apontado, afastam-se indiferentes para reincidirem nos hábitos errôneos do passado! E outros ainda, conquanto conheçam a Verdade, não se esforçam por melhorar seu comportamento. Não resta dúvida que serão julgados com mais rigor do que aqueles aos quais não foi mostrada a luz.
25 Naquele tempo, respondendo Jesus, disse: Graças te dou a ti, Pai, Senhor do céu e da terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e entendidos e as revelaste aos pequeninos.
Sábios e entendidos, aqui, simbolizam os que querem aproximar-se de Deus com a fria ciência da terra, que lhes enche o coração de orgulho.
Incapazes de abrigar em seu íntimo a fé, falta-lhes a intuição sublime que lhes concederia a sabedoria. Atentos aos fenômenos superficiais, perdem precioso tempo em discussões inúteis e terminam por negar o que não quiseram compreender.
Deus não esconde as coisas aos sábios e aos entendidos; é o orgulho que não os deixa vê-las. Ao passo que os pequeninos, isto é, os despidos de orgulho e de presunção, iluminados pela fé pura que lhes concede segura intuição, assimilam facilmente as lições divinas e fazem delas caminho para a felicidade espiritual.
26 Assim é, Pai, porque assim foi de teu agrado.
Jesus deposita suas esperanças em Deus; ele sabia que o Pai deu a seus filhos as leis evolutivas pelas quais todos se aperfeiçoarão. Nosso espírito sai bruto do seio e Deus, como é bruto o diamante encontrado no seio da terra.
Inúmeros processos de lapidação transformam o diamante escuro e sem forma numa gota de luz. Da mesma maneira, nossa alma será burilada através das reencarnações até brilhar esplendorosamente.
Jesus se conforma com a incompreensão da época, porque tinha certeza de que seus ensinamentos jamais se perderiam. No caminho do progresso, o que a alma não aceita hoje, aceitará no futuro.
27 Todas as coisas me foram entregues por meu Pai. E ninguém conhece o Filho senão o Pai, nem alguém conhece o Pai senão o Filho, e a quem o Filho o quiser revelar.
Jesus é o Supremo Orientador da coletividade terrena; Deus lhe confiou a terra e o destino dos seus habitantes. Somente Jesus conhecia Deus e o tornou conhecido dos homens. Antes da vinda de Jesus ao mundo, não conhecíamos o Pai Celestial. De um lado tínhamos o feroz e sanguinário Deus de Moisés; e do outro lado, o politeísmo pagão. Jesus veio e aboliu o Deus de Moisés e os milhares de deuses do paganismo, revelando-nos o Pai extremoso, o Deus bom, que trata carinhosamente de todos os seus filhos, quer sejam culpados ou justos, quer sejam bons ou rebeldes.
28 Vinde a mim todos os que andais em trabalho e vos achais carregados e eu vos aliviarei.
Os que andam em trabalhos no mundo, somos todos nós que aqui estamos a saldar os débitos das vidas passadas e ainda carregados das ilusões terrenas. Encontraremos alívio em Jesus, porque sua consoladora doutrina nos enche de resignação, de calma e de paciência ante os rudes embates da vida e nos livra do peso das ilusões, demonstrando-nos que a verdadeira felicidade não consiste na posse transitória dos bens da terra; e sim nos bens imperecíveis do espírito.
Quando o rigor das expiações nos tocarem e estivermos prestes a vacilar ante as provas; quando o castelo de nossas ilusões ruirem, deixando o vazio em nossos corações; quando até daqueles que mais amamos recebermos a repulsa e a ingratidão; quando virmos fenecer as flores da esperança que plantamos nas margens do caminho de nossas existências, não busquemos no mundo um consolo que o mundo não nos pode dar. Procuremos o consolo na doutrina de Jesus e estejamos certos de que o acharemos.
29 Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração; e achareis descanso para vossas almas.
30 — Porque o meu jugo é suave e o meu peso, leve.
Quão suave é o jugo de Jesus e quão pesado é o jugo da terra! O jugo de Jesus é a humildade, a fraternidade, o perdão, o amor, a resignação, a calma, a paciência e a confiança em Deus; é a paz e a bondade; é a certeza de uma vida eterna, vivida em perene alegria no seio de nosso Pai celestial; é o doce descanso de nossas almas, que pela fé e pelas boas obras, subirão aos planos divinos.
E o jugo da terra é o ódio e a vingança; o desespero e a revolta; a descrença, o egoísmo, o orgulho, a ambição e a concupiscência. O jugo terreno prende em séculos de sofrimentos expiatórios os que não se esforçarem por se livrarem dele.
Demonstrando-nos a realidade da vida além-túmulo e ensinando-nos e concitando-nos a praticar os preceitos de Jesus, o Espiritismo é uma poderosa força, que muito nos ajudará a libertarmo-nos do jugo terreno e fará com que facilmente aceitemos o suave e leve jugo de Jesus.