Assim Dizia o Mestre

Versão para cópia
CAPÍTULO 33
Ilustração tribal

"AI DE QUEM INCENTIVAR AO PECADO A UM DESSES PEQUENINOS. " É com essas palavras que remata a conhecida cena de Jesus abençoando as crianças, cena geralmente explorada apenas para mostrar o amor que o Nazareno tinha para com essas almas inocentes.


Temas Relacionados:

Entretanto, abrem-se, por detrás dessas palavras, abismos imensos, um verdadeiro universo de mistérios, que os nossos teólogos e exegetas deixam, em geral, sem comentários.

Afirma Jesus que aquelas crianças "têm fé nele" e que, por isso, é tão grave dar-lhes incentivo para pecado.

Mas como? Algumas dessas crianças tinham fé em Jesus? De que modo, se nenhuma delas o conhecia? Se, para elas, o Nazareno era um simples rabi, como tantos outros? Que quer Jesus dizer com esse "ter fé nele"?

Evidentemente, esse "ter fé" não é um ato de fé consciente, explícito, mas sim uma atitude de fé, implícita. Esse "ter fé" é um estado da alma desses pequeninos, isto é, um estado crístico, é aquilo que, mais tarde, o escritor cristão de Cartago, Tertuliano, vazou nas conhecidas palavras sobre a "anima naturaliter christiana", a alma humana é crística por sua própria natureza. Se aquelas crianças hebreias possuíam uma atitude crística, em virtude da sua própria natureza humana, será que se achavam em estado de pecado original, como afirmam os teólogos das igrejas cristãs? De que modo se coadunava esse fides, essa atitude crística da alma, com o estado de pecado em que elas teriam sido concebidas? Nenhuma dessas crianças era "batizada"; os meninos eram circuncidados, mas a circuncisão não tirava o pecado original. E as meninas, para as quais não existia circuncisão? É evidente que todas essas crianças, que "creem em Jesus", se achavam no estado em que foram concebidas e nascidas. Se eram pecadoras por natureza e herança, como é que se achavam em estado crístico? E se os adultos são prevenidos para não lhes darem incentivo ao pecado (skándalon, em grego, isto é, "motivo de tropeço"), não faz isso supor que esses pequenos estavam ainda em estado de perfeita pureza, sem pecado?


* * *

* * *

Termina Jesus a sua cominação com as misteriosas palavras: "Porque os seus anjos contemplam, sem cessar, a face de meu Pai que está nos céus".

Que anjos são esses?

É universal na humanidade a crença em "anjos tutelares", como também em "anjos tentadores". Também a Bíblia, quer no Antigo quer no Novo Testamento, admite a existência dessas entidades invisíveis.

O vocábulo grego ángelos (em latim angelus, em português anjo) quer dizer literalmente "mensageiro", "arauto", designando entidade consciente e livre, de corpo invisível, que executa a vontade de Deus em diversos planos do cosmos;

no caso em que contrarie a vontade de Deus, é o chamado "adversário" (em grego diábolos, em latim diábolus, em hebraico satan, em português, diabo).

Se cumpre a vontade de Deus é anjo.

Há, pois, entidades invisíveis que acompanham os homens, influenciando-os para o bem ou para o mal, procurando harmonizar ou desarmonizar-lhes as vibrações. Essas entidades são como "auras" ou "sopros" que nos afetam, positiva ou negativamente, consoante a nossa receptividade pessoal.

Sendo que a essência íntima de todas as coisas é divina, e, portanto, a alma humana essencialmente divina, ou crística, existe na criança um fundamento positivo, bom, divino, mas essa atitude se acha em estado meramente potencial, como que dormente e embrionário. Em virtude dessa potencialidade latente é a alma da criança como que neutra, incolor, carta branca, podendo receber de fora influências tanto positivas como negativas; a alma infantil se acha, por assim dizer, num equilíbrio lábio, neutro, podendo ser facilmente imantada, positiva ou negativamente, desviando a agulha magnética para a direita ou para a esquerda, conforme as influências do ambiente. "Incentivar ao pecado" (skándalon) não supõe, necessariamente, palavras ou atos de pessoas presentes; pode ser feito também pela simples presença e atitude interna de pessoas internamente desarmonizadas; pode uma pessoa, quando em estado anticrístico, incentivar ao pecado uma alma infantil, ainda crística, ao ponto de lhe dificultar essa atitude de "fé", essa atitude de fidelidade ao seu Cristo interno. Seria uma espécie de envenenamento anticrístico por "indução" ou simples presença.

Esses emissários angélicos da Divindade que protegem as almas humanas, crísticas por sua natureza, se voltariam contra o homem que, temerariamente, descristificasse esse ambiente propício atraindo sobre ele as sanções inerentes à violação da sacralidade da alma.



Este texto está incorreto?