Parnaso de além-túmulo

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Capítulo III

Um [poeta] desconhecido


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Eu fui daquelas almas que viveram

Sem conhecer da Terra os paraísos,

Que somente a amargura dos sorrisos

Pela noite das dores conheceram


Não que eu fosse infeliz e desditoso,

Pois fui também humano entre os humanos,

E através dos meus dias, dos meus anos,

Se eu quisesse gozar, teria o gozo.


É que ao sentir no âmago do peito

A atitude do homem nessa vida,

Coração enganado, alma iludida,

Afastado do Puro e do Perfeito,


O meu ser que sonhara a Humanidade

Qual um ramo de flores perfumosas,

Viu as almas tremerem, desditosas,

Sob o peso da própria iniquidade.


E isolado nos grandes sofrimentos

De ser só, na aspereza dos caminhos,

Encontrei o prazer pelos espinhos,

Ao trilhar os carreiros dos tormentos.


Pois no mundo pequeno da minhalma,

Quando em dor me envolvia a desventura,

Eu vislumbrava a luz brilhante e pura

Que me trazia a paz, bonança e calma:


— Era a luz que me vinha da visão

De ver o Cristo-Amor, entre cansaços,

E tinha então prazer de ver meus braços

Enlaçados na cruz da provação.


O NOBRE CASTELÃO

No interior

Do esplêndido alcaçar,

Agonizava o senhor

Dos domínios extensos.

O dono do solar

Nos espasmos intensos

Da agonia,

Em torno dirigia

Um último olhar,

E viu então

O seu brasão

Invicto e glorioso,

Insculpido nas fúlgidas realezas

Do castelo formoso,

Transbordante de glórias e riquezas!


Mais alongando a vista,

Viu-lhe o feito da esplêndida conquista

Nas grandiosas searas,

Que em suas mãos avaras

Foram armas cruéis, destruidoras,

Martirizando as almas sofredoras.

Contemplou seus tesouros passageiros,

E em espasmos convulsos, derradeiros,

Opresso o coração,

Mergulhado no pranto mais profundo,

Expirou para o mundo

O nobre castelão.

A sua alma despida das grandezas,

Das terrenas, efêmeras realezas,

Bem após o transcurso de alguns anos

De triste letargia,

Foi um dia

Despertada em amargos desenganos:

Conturbado por agros dissabores,

Contemplou seu solar

Ocupado por outros moradores…

A exclamar,

Estranhou revoltado,

Que ninguém acudisse ao seu chamado.

E em atitude austera,

Tomado de energia,

De cólera severa

Já que ele era o senhor,

Reclamou os seus servos com calor

E, entretanto, nenhum lhe obedecia.

Imerso em turbação,

Somente, às vezes,

Escutava nos ditos mais soezes

Terrível maldição

Das vítimas de antanho!

E o sofrimento era tamanho

Em ser incompreendido,

Que se julgou perdido

Irremissivelmente.

Assim, constantemente,

Durante o transcorrer de muitos dias.

Conservou-se naquelas cercanias

Como presa feroz

Do sofrimento atroz.

De contínuos pesares e agonias…

Todavia,

O pobre sofredor,

No auge do amargor,

Recordou-se que havia

Um Pai Onipotente

E cheio de fervor,

Humilde penitente,

Implorou seu amor

Numa súplica em lágrimas de pena.

Sua alma sofredora

Sentiu-se então mais calma e mais serena,

Penetrada de doce claridade,

De luz confortadora,

Que provinha de alguém

Que lhe fazia

Meditar na grandeza da Verdade

E lhe dizia

Da beleza do Amor, da Luz, do Bem: —

«O que sofres, amigo, é a consequência

Da equívoca existência

Que levaste,

Já que sem piedade aniquilaste

Muitas almas e muitos corações,

Que hoje te envolvem os lúridos momentos

Em rudes sofrimentos

E estranhas maldições.


Porque ocultaste as flores formosas

Que na Terra colheste,

Flores lindas que nunca ofereceste

Às almas desditosas?

Porque não concedeste um só bocado

Do teu pão abundante

Ao pobre esfomeado?

Ocupando-te em gozo, a todo o instante,

Jamais vestiste os nus, nem consolaste

Aquele que sofria;

Desprezavas o fraco e nunca amaste

Quem de ti carecia!

A caridade,

O sentimento-luz, a flor-tesouro,

Não tiveste em teus dias de maldade

No grande sorvedouro!

Porém, o Deus de Amor

É sempre o magnânimo Senhor,

E permite que voltes aos humanos,

Para que se dissipem teus enganos

No amargor;

Voltarás,

Porém, já não terás

Efêmeras venturas,

Serás agora escravo e não senhor…

Conhecerás

As dores e amarguras,

As mágoas escabrosas

Pelas estradas rudes e espinhosas!


Abençoa o Senhor

Que te concede a dor,

Para assim compreenderes

Que os reais e legítimos prazeres

Que da vida nos vêm.

Não residem no Mal e sim no Bem.»


NESGA DE CÉU

A alma extasiada

Sobe… sobe…

Há toda uma amplidão iluminada

À sua vista…


A estrada

É uma etérea alfombra

Sem resquícios de sombra!

É o domínio da luz que ela conquista!


Vibra no ar

Dulcíssima harmonia,

Como se fora feita

De luar,

De alegria…

De alegria perfeita.


Parece um hino de amor

Dos Paganinis siderais,

A ventura, o fulgor.

Transformados em notas musicais.


Além, fulguram sóis;

Em tudo há um misto

Nunca visto

De manhãs e arrebóis.


Aos clarões dessa aurora.

A alma chora

Em êxtase profundo.


E lembra-se que sofreu,

Que amou, que padeceu.


Ao longe, muito ao longe,

O mundo

É um ponto negro que gira…


Ainda além, mais além,

A Via-Láctea transluz,

Como um éden de luz

E de amor.


Nesgas do céu, imagens de esplendor,

Cenários majestosos,

Soberbas harmonias

Nos mundos luminosos!


Seres que passam rápidos, flutuantes,

Sorridentes, radiantes,

Nos espaços sem termos, onde a vida

É a imortalidade

Anelada, querida,

De pureza, de beleza,

De perfeição e de felicidade!


Em baixo as vastidões,

Em cima, as emoções

Do Ilimitado.


Atrás a noite e as mágoas de agonia

Do passado;

E, em frente,

Um futuro esplendente

Pintalgado de rosas,

Da mais pura alegria.


Feito de éter, de sonho,

O caminho é risonho,

Recamado de flores perfumosas.


Melodia, luz, aroma!…

De repente,

Numa nesga de céu resplandecente

Assoma

Uma rútila esfera,

Como um país de doce primavera,

Intérmina de gozos!…


A alma se extasia

Na luz do Eterno Dia.

Com os pensamentos puros e radiosos,

Ora a Deus:


Recorda em prece os sofrimentos seus,

Evoca as lágrimas vertidas!

Contempla panoramas de outras vidas,

Vidas de estranha dor…


Mas cada gota amarga dos seus prantos


Agora

É um raio de aurora,

Que um a um

Vão formando uma auréola

De brilhos santos,

Que a engrinalda de luz.


Em suavíssima unção,

A pobre alma orando,

Chorando,

Nessa prece

Reconhece

A alvorada de sua redenção!




Anônimo
Francisco Cândido Xavier

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Mateus 13:14

E neles se cumpre a profecia d?Isaías, que diz: Ouvindo, ouvireis, mas não compreendereis, e, vendo, vereis, mas não percebereis.

mt 13:14
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