Sexo e Obsessão

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CAPÍTULO 7
Ilustração tribal

Programações abençoadas


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Concluídos os trabalhos mediúnicos e afastados os membros encarnados do grupo da Instituição, rumando aos seus lares, continuamos em febril atividade espiritual junto àqueles que haviam sido atendidos, mas cuja terapia deveria ser mais acurada. Alguns seriam transferidos para nossa Esfera de ação, outros ficariam alojados nas instalações da Casa, diversos seriam liberados, a fim de elegerem o melhor caminho a seguir, respeitando-se a liberdade de escolha de cada qual. Experimentaram a claridade que deslumbra, agora seria necessário deixar-se penetrar pela luz de modo a beneficiar-se largamente dos seus recursos preciosos.

Aos primeiros minutos da madrugada, o irmão Anacleto convidou-nos, a mim e a Dilermando, para rumarmos à Casa paroquial, a fim de trazermos Mauro a reflexões através do desdobramento pelo sono, o que não foi muito difícil. O seu estado de ânimo em quebrantamento facilitou-nos o recurso especializado e, adormecido, conduzimo-lo ao recinto onde se operara a reunião mediúnica.

De imediato, seguimos o Mentor na direção do lar da Professora Eutímia, a nobre diretora do Educandário onde Mauro lecionava. A senhora permanecia acabrunhada, com a mente em torvelinho. Àquela hora, embora houvesse tomado um medicamento calmante, sem haver dito nada ao marido, evitando precipitação de conduta, não conseguia o sono reparador. Despertava assustada com frequência, recorrendo à ajuda da oração, conforme os padrões dos seus conceitos religiosos.

Enriquecida por uma família bem constituída, mãe devotada de duas crianças com idades entre 8 e 10 anos, uma linda garota e um simpático varão, o esposo era homem sério, voltado para as questões espirituais da religião que ambos professavam. Podemos afirmar que se tratava de um lar construído em bases cristãs, sem as excentricidades dos comportamentos mundanos da atualidade, onde o vazio existencial e a vulgaridade têm primazia nos relacionamentos que deveriam ser afetivos.

Adentramos pelo lar e encontramos alguns Espíritos amigos que ali também se domiciliavam, face às vinculações afetuosas com a família. Tudo transpirava paz e bem-estar, numa psicosfera de harmonia, o que é, de certo modo, bastante raro, nas famílias contemporâneas e nos seus ninhos domésticos.

O nosso Instrutor adentrou-se na alcova e, enquanto o aguardava, do lado de fora, em bom diálogo com os novos amigos, após breves minutos, trouxe, em desdobramento parcial, a digna senhora, que dormia também em Espírito, experiênciando um repouso saudável, que faria muito bem ao seu organismo vítimado pelo choque pós-traumático.

Conduzida à Entidade espírita onde deveriam ter continuidade os labores de renovação das almas, foi colocada gentilmente sobre um leito improvisado e continuou adormecida. No recanto em que nos encontrávamos, também estavam Mauro e sua genitora, a nobre senhora Martina, D. Eutímia e Jean-Michel que, de quando em quando, vivenciando uma forma de pesadelo em espírito, agitava-se.

O Mentor convidou-nos ao recolhimento pela prece, igualmente assistido pela diretora espiritual do Núcleo que nos acolhia. Havia uma psicosfera de paz e de agradecimento a Deus, em tão alto padrão que se podia sentir o vibrar dos sentimentos em festa.

Após sentida oração, o benfeitor Anacleto acercou-se da nobre mestra e convidou-a ao despertamento, enquanto nós outro fazíamos o mesmo com Mauro e Dilermando com bondade e energia despertava Jean-Michel.


Como se estivesse no corpo físico, ao amanhecer de um dia feliz, a senhora acordou tranquila, jovial, e surpreendeu-se com o grupo que formávamos. Antes de apresentar alguma interrogação, o Mentor explicou-lhe:

– Estamos reunidos em nome de Jesus, a quem todos amamos e devemos carinhoso respeito, a fim de estudarmos o drama da manhã passada, envolvendo o nosso sacerdote Mauro. Não estranhe este acontecimento, que é mais comum do que pode parecer, em razão dos fenômenos da vida terem sua causa em programações aqui, na Esfera da realidade.

Todos estamos envolvidos pelo acontecimento infeliz, cujas consequências puderam ser diminuídas graças à intervenção da misericórdia divina.

Nesse momento, mais lúcida, D. Eutímia identificou Mauro e teve uma reação previsível de receio. O Instrutor vigilante asserenou-a, informando que tudo estava sob controle e ela não teria porque temer ou afligir-se.

Por sua vez, o jovem sacerdote não se pôde furtar ao constrangimento imposto pela consciência de culpa diante daqueles cuja confiança defraudara.


Antes que Jean-Michel pudesse intervir ou ser convidado a reflexões, o irmão Anacleto, elucidou, dirigindo-se diretamente à diretora do Educandário:

– O grave assédio de Mauro à criança constitui um crime hediondo, considerando-se os fatores e circunstâncias, os valores e compromissos que se encontram em jogo. Sem diminuir-lhe a responsabilidade pelo gravame, é justo considerarmos que o mesmo se encontra fora do equilíbrio emocional e racional, vítimado por conflitos hórridos e sob a injunção de forças desconexas do mundo espiritual inferior, que o aturdem e comandam-no mentalmente.

Açodado na libido pelo vício mental e pela ação nefasta de um perseguidor espiritual, planejava abusar da inocência da criança. Felizmente, porém, não teve tempo de consumar o infeliz programa, encontrando-se agora terrivelmente ferido no sentimento e aturdido na razão, ao considerar a gravidade daquele infame instante que o alucina.


Fez uma pausa oportuna no esclarecimento, a fim de que a senhora melhor compreendesse o que se passava, logo prosseguindo:

– Aqui nos reunimos com o objetivo de evitar maiores danos à criança ingênua, qualquer situação de prejuízo moral para a Escola, assim como para encontrarmos a melhor solução para atender também ao infrator. . . Todo erro pode ser reparado, especialmente antes que se transforme em tragédia. O nosso amigo já dilacerou os sentimentos de algumas crianças, que soube atrair ao regaço com sagacidade e astúcia, objetivando os seus fins ignóbeis. Chega o momento de ser-lhe dada uma oportunidade de reparação, através da qual se liberte igualmente do tormento que o vem assediando há muitos anos desde antes do berço, tendo-se em vista o local de onde procedeu no rumo da reencarnação. . . As heranças que trouxe embutidas nos sentimentos são odientas, e os laços que o vinculam aos sítios que habitava são vigorosos. Nada porém, que não se possa modificar ante o esforço pessoal bem direcionado e a entrega interior ao Pai Criador. Certamente, o problema a que nos estamos referindo deve tomar um rumo de segurança, para que suste futuras consequências mais lamentáveis e perversas.

Todos acompanhávamos o seu raciocínio com empatia e agrado.

A senhora Eutímia, a pouco e pouco, fixou-se nos comentários do Mentor e pareceu aliviar-se lentamente da tensão que a mantinha em aflição.


Dando prosseguimento, o sábio amigo expôs:

– A melhor solução para este momento não deverá ter um caráter punitivo ao infrator, que está doente, mas um objetivo reeducador, a fim de que, consciente da severa situação, modifique por completo a existência, dando novo rumo aos passos que devem seguir na direção da felicidade pessoal e da de todos com quem conviva. Assim, sugiro que a gentil professora entre em contato com a autoridade religiosa superior, que pode estudar a solução ideal para a ocorrência, narrando os fatos com serenidade e exigindo a transferência do sacerdote, sem comentários escabrosos, que sempre fecham a porta à solvência de quaisquer problemas. Acredito que o senhor Bispo, notificado a respeito da gravidade do comportamento do seu subalterno, saberá como encaminhar a questão a instância superior, se for o caso, ou o equacionará conforme sejam as instruções que tenha do Alto Clero.


Facultando tempo para que pudesse ser entendido pela mestra e por todos os circunstantes, aludiu com habilidade e prudência:

– Não estamos escamoteando o erro nem agindo de forma conivente com o descalabro moral do paciente. A enfermidade necessita de tratamento e não de escarcéu, sempre do bom gosto dos insensatos. O afastamento do infrator do convívio infantil, impedindo novos contatos com vítimas em potencial, é uma terapia eficiente e de grande efeito moral. Assim, confiamos na prudência e nos bons ofícios da nossa esclarecida mestra.

Quando silenciou, a senhora tinha lágrimas nos olhos, não ocultando a surpresa e o sofrimento que tudo aquilo lhe causava. No entanto, forrada pelos sentimentos da sua fé religiosa, podia compreender que ao pecador se deve conceder a bênção da reparação, antes mesmo da punição impiedosa que não edifica, às vezes piorando e ultrajando mais o infeliz.

Levantou-se, impulsionada por um sentimento de lídima fraternidade, acercou-se de Mauro e, tomando-lhe as mãos, falou-lhe que buscaria providências cautelosas conforme as diretrizes que lhe foram oferecidas. O jovem não se pôde conter e abraçou-a com sincera fraternidade e gratidão.


Retornando ao seu lugar, a mestra permaneceu quieta, quando o Mentor deu continuidade à reunião, agora dirigindo-se a Mauro:
– Não ignoras a extensão do teu erro, e desde há muito vens tentando cicatrizar a chaga moral que te dilacera interiormente, fazendo-te decompor em espírito. Reconheces que se trata de um crime grave, no qual ocultavas as tuas aflições, justificadas pelo que a ti mesmo acontecera na infância. . . As raízes, porém, desses erros, agora sabes que estão no teu passado espiritual, assinalado pelo deboche e pelo desrespeito a outras vidas. Ninguém atinge esse patamar de miséria sem que não haja transitado pelos pântanos das paixões sórdidas e asfixiantes. Agora, no entanto, importem-nos os novos rumos que deverás imprimir à tua existência. Necessitas de tratamento especializado e de um expressivo afastamento das tuas obrigações sacerdotais, demorado estudo de ti mesmo e reeducação dos hábitos, começando pelos mentais. Os devaneios que vitalizas através das imagens que intercambias sob pseudônimo com outros doentes morais, devem ser imediatamente interrompidos, pois que eles trazem uma alta carga de sensações perturbadoras que se te fixam nos painéis da mente, mais atordoando-te, mais excitando-te. Severas medidas disciplinantes deverás impor-te, para que possas reparar as vidas dilaceradas mediante as que, futuramente, serão dignificadas. "Ao despertares terás uma nítida lembrança, quanto possivel, destes acontecimentos de que participas, de modo que um novo programa te será delineado e deverás segui-lo com os olhos postos no amanhã feliz. Somente o bem incessante te constituirá refúgio e garantia de saúde moral sob as bênçãos de Jesus, o Herói silencioso de todos os momentos. Não temas, nem te permitas novos pesadelos de horror. " Silenciando, foi interrompido pelos gritos e impropérios de JeanMichel, que indagava:

– Como? O infeliz não pagará pelos crimes perpetrados? Que justiça é essa? Onde o reto cumprimento dos deveres e das Leis? Como é possivel acobertar tanta miséria, através de artifícios piegas de compaixão e de terapias de mentira? Ele é um criminoso consciente e terá que responder publicamente pelos desvios que se tem permitido e pelo mal que vem praticando contra a pobre infância. . .

As últimas palavras não escondiam a alta dose de ironia e o conjunto não ocultava a perfídia de que se utilizava, a fim de gerar conflitos e dúvidas.


Sem perder a serenidade que lhe era habitual, o Mentor respondeu-lhe com bondade e energia:

– Surpreendo-me com as tuas palavras, porquanto, se considerarmos a questão do crime no caso em discussão, o responsável não é somente aquele que transita no corpo físico, mas também o nosso astuto amigo, que sabe imprecar e proclamar a necessidade de justiça. A qual justiça te referes? Àquela da cidade do deboche, do paul da depravação, onde os seres humanos se tornaram escravos das próprias abjeções? Com que autoridade reclamas justiça, tu que tens sido o execrando comparsa do exausto hospedeiro das tuas vis sensações? Acreditas que os teus sofismas perturbem a claridade do nosso raciocínio? Enganas-te, porquanto, antes das conjecturas aqui apresentadas, estamos habituados a lidar com vítimas e algozes, com psicopatas aferrados ao sexo em desalinho, desde o período em que nos encontrávamos na Terra. . . Logo mais, será o momento de dialogarmos contigo, e por enquanto silencia e ouve. . .

A atitude imediata, enérgica e clara, assumida pelo Orientador, fez o perturbador aquietar-se embaraçado.

O nobre Anacleto deixara claro que, desde os dias do corpo físico, no mundo, se houvera dedicado à sexologia, de cuja tarefa se desincumbira com elevada folha de serviços prestados aos enfermos e a outros portadores de distúrbio na área genésica. Por isso mesmo, prosseguia afeiçoado ao mister de atendimento aos infelizes que tombaram nas paixões mais grosseiras do sexo enfermo, havendo sido designado por Estância Superior para a tarefa na qual nos encontrávamos investidos.


Dando prosseguimento às instruções, volveu a dona Eutímia e explicou:

– Face à magnitude do evento infeliz, é de bom alvitre que, no primeiro momento, a dedicada diretora elucide ao esposo a ocorrência e com ele busque um contato com Sua Eminência, o senhor Bispo, pondo-o a par de tudo, de modo que se possam tomar providências sem as escabrosas contribuições da mídia que se compraz no lixo das misérias humanas. É certo que há uma outra mídia honesta, que narra os fatos conforme acontecem, divulgando-os e esclarecendo as pessoas, o que nem sempre acontece com a correção que seria necessária, antes exaltando o mal, sem o erradicar ou apresentar saudáveis soluções para o mesmo.


Porque silenciasse, como percebendo que a nobre senhora teria algumas interrogações, o Mentor aquietou-se por um pouco, facultando que dona Eutímia inquirisse:

– Perante as Leis de Deus, um sacerdote que jura ser fiel à verdade, trabalhar pelo bem da comunidade, ser pastor de ovelhas que se lhe entregam confiantes, e defrauda o compromisso através de conduta execrável, ficará impune? Não são pecados mortais os atos infames que o padre Mauro vem praticando com insistência? E as suas vítimas como ficarão?


Com a mesma sinceridade, o Benfeitor respondeu:

– Ninguém foge das Leis de Deus que vigem em toda parte e que estão escritas na consciência de todos nós. O nosso irmão não fugirá de si mesmo, das cenas escabrosas que se permitiu, do remorso que o dominará por largo período. Isso porém, somente sucederá mais tarde, quando, desperto e disposto ao resgate, começar o período de refazimento. A punição divina ao pecado mortal nunca se faz de maneira destrutiva do pecador, mas de forma que o edifique, convidando-o a reparar todos os danos perpetrados, mediante ações dignificantes e restauradoras do equilíbrio. Por isso mesmo, é-nos a todos muito difícil o julgamento correto, por desconhecimento das causas profundas e a modesta percepção do todo no acontecimento, que somente a Consciência Cósmica penetra. Mas ninguém se libera da culpa sem padecer-lhe os efeitos danosos e cruéis. . .


Interrompeu a explicação por um pouco, a fim de nos permitir assimilar o seu conteúdo profundo, e continuou:
– Pelo que nos é dado perceber, a renovação de Mauro já começou, a partir do instante em que se deu conta da própria loucura. Por sua vez, a Misericórdia do Pai em nome de Sua Justiça, facultar-lhe-á um longo período de isolamento, possivelmente em uma Clínica onde se irá reajustar aos padrões de comportamento saudável, inspirando-o a cuidar de crianças enfermas, portadoras de alienações mentais e distúrbios nervosos, assim resguardando- se da prática de atos indecorosos, assistindo-as, socorrendo-as, amando-as, sendo repudiado, maltratado, agredido. . . As Entidades perversas que as obsidiarem, sabendo do passado do então futuro devotado benfeitor, agirão agressivamente tentando desanimá-lo, provocando-o para que se afaste do bem-fazer e tombe novamente nos escuros abismos da loucura. . . Nesses momentos porém, luzirá o amor do Pai inspirando-o a prosseguir, e sua mãezinha desencarnada, que o vem ajudando a sair do fosso, ser-lhe-á o anjo da guarda, insistindo pela sua renovação e felicidade. Igualmente não faltarão outros socorros, porque o bem é a coroa da vida e jamais segue a sós, sem amparo na retaguarda e com atração na vanguarda. "As criancinhas danificadas emocionalmente receberão igualmente o melhor conforto moral e espiritual, ao invés de, após o escândalo, receber polpudas indenizações, expostas ao ridículo, aos conflitos públicos e ao escárnio daqueles mesmos que aplaudem as eclosões das cenas estúpidas e escabrosas. Aprisioná-lo em um cárcere infecto, colocá-lo entre bandidos outros que poderão assassiná-lo como vem ocorrendo no mundo, de maneira alguma fará deter a eclosão de episódios de pedofilia que se multiplicam em razão do deboche que desgoverna as criaturas. Antes estimularão outros enfermos a serem mais hábeis, a investirem mais no turismo sexual, em grande voga, que rende fortunas incalculáveis aos seus exploradores e aos veículos de informação que os divulgam com dubiedade, sem o caráter sério de deter o fluxo destruidor. " Novamente fez pausa. Adentrando-se pelo futuro na programação que trazia em mente sob os auspícios de venerandos Mensageiros da Luz, concluiu:

– Chegará o dia em que a perversidade desaparecerá da Terra e a escabrosidade das almas será substituída pela compaixão e pelos sentimentos de amor com respeito pela vida. Nesse dia, que certamente não será imediato, as ocorrências abomináveis estarão nas páginas da História como pertencentes ao período de brutalidade e primitivismo da criatura humana, qual ocorre com inúmeros fenômenos do passado. . . Até chegar esse momento, a todos nos cabem as atitudes de ajuda e de compreensão, de energia e de bondade, reeducando os calcetas e atendendo às vítimas, de forma que o equilíbrio moral predomine nos arraiais da sociedade terrestre. "Nosso irmão enfermo transitará um longo percurso de recuperação e de reconquista de si mesmo. Ajudemo-lo, antes que o destruamos, considerando que a vida são bênçãos e que todo aquele que estiver sem pecado atire-lhe a primeira pedra. " Todos nos encontrávamos emocionados. A lógica, a temperança, a sabedoria do Benfeitor levavam-nos a reflexões interiores muito profundas, quando analisamos o que fizéramos e como nos encontrávamos ante o infinito de possibilidades edificantes que nos aguardavam.

D. Eutímia anuiu completamente, apresentando-se serena e quase feliz.

Nesse momento, o Benfeitor dirigiu-se a Jean-Michel que se apresentava aturdido ante o que acabara de ouvir. Desde quando perdera o discernimento e tombara no abismo do ódio, da perversão moral e da criminalidade, não tivera ensejo de reflexionar em torno da vida e da sua grandeza, dos objetivos essenciais ao crescimento para Deus, que é inevitável.

Dava-se conta, nesse momento, do engodo que se permitia e da ilusão que buscara transformar em realidade eterna, ludibriando os Códigos Divinos.


Quase atoleimado, ouviu o irmão Anacleto falar-lhe:

– Quanto a ti, irmão querido, o amanhã sorri mil dádivas de felicidade.

Chegou o momento de te libertares também da canga odienta do sofrimento bestial, que em nada te ajuda, antes mais te alucina. Da situação de vítima da hediondez, te tornaste comparsa e fomentador de novas misérias contra a Humanidade. Hipnotizado pelo prazer selvagem, já perdeste o rumo dos teus nefandos objetivos, que eram de perseguição, tombando nas malhas da rede de misérias que teceste, tornando-te vítima de ti mesmo e dos teus planos diabólicos. Agora despertas para vida nova, para novos compromissos. Ouve: Jesus te chama para a felicidade e não te podes negar ao ensejo especial.

Renascerás na carne, oportunamente, chagado e aflito, com os estigmas que cravaste nos tecidos sutis do Espírito, através do teu corpo intermediário, hoje deformado e em dilacerações. Já imprimiste no teu futuro, uma infância limitada por anomalias mentais e físicas de vária natureza, na qual te demorarás por mais ou menos uma dezena de anos tormentosos, visitado, vez que outra, pelos teus companheiros do antro de depravação, que te explorarão as energias, mais afligindo-te. . . "Nesse exílio libertador terás como benfeitor e companheiro, pela senda de espinhos, o nosso Mauro que te recolherá na Casa da Caridade que erguerá oportunamente em distante recanto do Brasil, em cuja oportunidade vos amareis, ajudando-vos reciprocamente. . . Confia em Deus, que é teu Pai como o é nosso, e liberta-te de ti mesmo, desse comportamento infeliz que te desnaturou. Quanto possivel estaremos contigo e outros benfeitores nunca se te apartarão, ajudando-te na desincumbência do dever".

O infeliz encolheu-se como se desejasse ocultar as formas degeneradas e prorrompeu em pranto volumoso, desesperador, quase convulsionando.


Foi então, que Mauro, reassumindo a personalidade de Madame X, a antiga dama lasciva e pervertida nos dias do império napoleônico levantou-se e, telementalizada pelo guia Anacleto, abraçou o sofredor, dizendo-lhe em lágrimas:

– Ajuda-me com o teu perdão, a fim de que eu te possa ajudar com a minha compaixão, e juntos possamos reabilitar-nos de todo o mal que fizemos através do bem que possamos fazer. Somos duas aves feridas que tememos voar, receando o tombo no abismo. Deus nos dará forças, ajudar-nos-á a recuperar nossas plumas, para que planemos acima do pantanal que nos retém afogando-nos. Perdoa-me, por Deus! Eu estava louca e venho continuando em alucinação. . .

Não pôde prosseguir, porque o verbo ficou estrangulado na garganta túrgida. O abraço, porém, que a sua vítima não pôde evitar, naquele momento selava compromissos de acerbas dores para o futuro, todavia, abria a via redentora de libertação.


Tartamudeando, o Espírito infeliz redarguiu:

– Que Deus nos perdoe a ambos, desditosos que somos!


Cessados esses momentos de forte emoção, o irmão Anacleto concluiu:

– Retornai aos vossos corpos e recordai-vos deste abençoado sonho no país da Realidade, dando-vos oportunidades para a conquista da paz.

Tomado de profundo sentimento de gratidão, o nobre Benfeitor orou, exteriorizando aos Céus o reconhecimento profundo de todos nós.

De imediato, os participantes do encontro espiritual foram reconduzidos aos seus lares, à exceção de Jean-Michel, que seria deslocado para outro lugar, onde seria preparado para a futura reencarnação, mediante a qual daria início a uma nova etapa da sua vida.

A noite, que estivera recamada de estrelas cravadas no seu dossel de sombras, cedia lugar levemente ao rosto da manhã que lhe colocava as primeiras claridades do dia, como a anunciar novos programas de bênçãos para muitas vidas.







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