Da Manjedoura A Emaús

Versão para cópia
CAPÍTULO 18

O Amor em Movimento

Como Deus ungiu a Jesus de Nazaré com o Espírito Santo e com virtude; o qual andou fazendo bem, e curando a todos os oprimidos do diabo, porque Deus era com ele. (At 10:38)
Outra virtude não existe mais bela.
Vicente de Paulo (in KARDEC, 2013c, cap. XIII, it.
12) asseverou que:
A caridade é a virtude fundamental sobre que há de repousar todo o edifício das virtudes terrenas. Sem ela não existem as outras. [...]
A caridade é, em todos os mundos, a eterna âncora de salvação; é a mais pura emanação do próprio Criador; é a sua própria virtude, dada por Ele à criatura. [...]
Por tantas maneiras a caridade foi referida!
Brasílio Machado definiu-a como a capacidade que o coração tem de se pulverizar para melhor se espalhar. (SOBRINHO, 1987, p. 241.)
Alguém disse que a caridade dá o tamanho do coração; e outrem, que ela é o coração no gesto.
Nunca houve, assim, coração tão grande e gestos tão cheios do coração, como se viu em Jesus.
Mas se a estrada para o triunfo pessoal se chama caridade constante para com os outros, o primeiro passo de cada dia se chama compaixão.
A parábola do Bom Samaritano projetou com discrição o que Ele próprio trazia na alma: compaixão.

Certo samaritano atravessava a garganta rochosa do Uadi el-Kelt, na velha estrada que ligava Jerusalém a Jericó. Caminho íngreme, paisagem bizarra, o samaritano se aproximou de um homem ferido por salteadores. Chegou junto dele, viu-o e moveu-se de compaixão. Aproximou-se, cuidou de suas chagas, derramando óleo e vinho, e depois o colocou em sua própria montaria, conduzindo-o à hospedaria e dispensando-lhe cuidados. No dia seguinte, tirou dois denários e deu-os ao hospedeiro, dizendo: “Cuida muito bem deste homem, e tudo o que gastares a mais no meu regresso eu te restituirei”. (LUCAS 10:33-35.)
O samaritano moveu-se de compaixão e compôs um tratado de amor. Deteve-se pelo outro, compadeceu-se, esqueceu-se de si mesmo; cuidou, levou o outro consigo, responsabilizando-se por ele e se comprometendo a regressar.
Uma vez Jesus retirou seus apóstolos para um lugar deserto a fim de que descansassem das viagens recentes, e muitos o viram partir de barco e foram a seu encalço, formando aos poucos uma verdadeira multidão, com cerca de cinco mil homens. Conta MARCOS 6:34 que, vendo isso, Jesus “ficou tomado de compaixão por eles, pois estavam como ovelhas sem pastor” e “começou a ensinar-lhes muitas coisas”, e depois os alimentou com os pães e peixes multiplicados.
Jesus procurava educar antes de amparar o corpo. Remendo de pano novo em roupa velha repuxa a roupa e o rasgo torna-se maior; vinho novo em odres velhos estoura os odres, o vinho entorna e os odres ficam inutilizados. (MATEUS 9:16-17.) A Jesus interessava mais a regeneração da alma, para que a alma doente não voltasse a desajustar o corpo.
Por compaixão, Ele se fizera um pastor diligente e afetuoso, mesmo para as ovelhas perdidas fora da casa de Israel.
“Senhor, filho de Davi, tem compaixão de mim”, gritava a mulher siro-fenícia, a cananeia. (MATEUS 15:22-28.) Num primeiro momento, Jesus aparentou se recusar a confortá-la, mas tão só para despertar a compaixão dos apóstolos, que não se manifestou. Então, com delicadeza e afabilidade, Ele sondou os sentimentos da suplicante: “Não fica bem tirar o pão dos filhos e atirá-lo aos cachorrinhos”. Ela insistiu: “Isso é verdade, Senhor, mas também os cachorrinhos comem das migalhas que caem da mesa dos seus donos”. Ele admirou-se: “Mulher, grande é a tua fé”.
Em outra vez, um grupo de anciãos de Cafarnaum procurou Jesus para interceder em favor do servo do oficial romano do lugar. O centurião era amado, sabia distribuir com justiça as leis do império que representava, e agora sofria vendo um empregado querido, enfermo, abeirar-se da morte. Enquanto caminhava para ver o doente, outro grupo de amigos do oficial se antecipava a Jesus, com uma mensagem do centurião (LUCAS 7:6-8):
— “Senhor, não te incomodes, porque não sou digno de que entres em minha casa; nem mesmo me achei digno de ir ao teu encontro. Dize, porém, uma palavra, para que o meu criado seja curado. Pois também eu estou sob uma autoridade, e tenho soldados às minhas ordens; e a um digo ‘Vai!’ e ele vai; e a outro ‘Vem!’ e ele vem”.
Jesus admirou-se:
— “Nem mesmo em Israel encontrei tamanha fé”.
E a distância já se ouvia festivo alarido na casa do chefe da centúria. O servo estava curado.
Em sua origem etimológica, milagre vem de mirari e significa admirável, coisa extraordinária. Em sentido teológico, sugere uma derrogação das leis da natureza, por ato do poder divino; a ocorrência de um fato, produzido por Deus, fora do curso natural das coisas.
Três são os termos usados nos evangelhos para designar os milagres: dýnamis, ação poderosa; terás, prodígio; semeion, sinal.
Para a mentalidade moderna, milagre é aquilo que supera as leis da natureza. Para o homem bíblico, porém, milagre é tudo que, de acordo ou não com as leis naturais, expressa uma intervenção decisiva de Deus para beneficiar o homem, que, sozinho, não poderia obter tal benefício. É sob essa perspectiva que os evangelhos relatam os milagres. (GHIBERTI, 1986, p. 194.)

O que a teologia interpretou como derrogação das leis naturais foi apenas uma gama de fenômenos cujas leis eram ignoradas.
Considerou Allan Kardec (2013e, cap. XIII, it. 14):
[...] dos fatos reputados como milagrosos, ocorridos antes do advento do Espiritismo e que ainda no presente ocorrem, a maior parte, senão todos, encontram explicação nas novas leis que ele veio revelar. Esses fatos, portanto, se compreendem, embora sob outro nome, na ordem dos fenômenos espíritas e, como tais, nada têm de sobrenatural. [...]
Num sábado de outubro, tempo da Festa dos Tabernáculos em Jerusalém, os apóstolos avistaram um nado-cego (cego de nascença) assentado em uma das portas do Templo, com sua tigela de madeira para a mendicância. E perguntaram:
— “Rabi, quem pecou, ele ou seus pais, para que nascesse cego?” (JOÃO 9:2.)
Jesus respondeu que nem Ele pecou (do grego amartia — desvio), nem seus pais. Não se tratava de uma punição, em face do binômio pecado-castigo.
E acrescentou:
— “Mas é para que nele sejam manifestadas as obras de Deus”.
As mais prestigiadas traduções empregam “para que”. A doença, acima de tudo, tem finalidade; não ocorre simplesmente para ligar o presente ao passado, num resgate alicerçado em culpa pretérita; acontece para se levar a uma meta, no campo do aprendizado e do crescimento pessoal. Aquela cegueira era para manifestar as obras de Deus.
A cegueira pode ser uma expiação. Emmanuel informou que “artistas que se aviltaram, arrastando emoções alheias às monstruosidades da sombra, invocam a internação na cegueira física”. (XAVIER, 2013g, cap. 26, p. 62.)
Naquele caso, porém, o sacrifício do nado-cego significava oportunidade de aprendizagem preciosa, pois, muitas vezes, a cegueira é a melhor terapia para que se estabeleça a visão espiritual, quando já se padece da cegueira espiritual por orgulho e presunção. Ao lado disso, sua cura, por Jesus, serviria para exaltar a luminosa comunhão do Cristo com o Altíssimo.
Jesus, compadecido, cuspiu na terra, fez lama com a saliva e aplicou- a sobre os olhos do cego, ordenando que ele fosse se lavar na piscina de Siloé. Ele foi e voltou enxergando. (JOÃO 9:6-7.)
Não houve derrogação das leis naturais.
Uma substância conhecida dos meios iniciáticos desde épocas remotas operou a recuperação orgânica.
Ao cuspir no pó e formar com isso aquela singular pomada, um agente terapêutico foi inoculado na lama, o fluido.
Fluido: termo genérico usado para exprimir a característica das substâncias que correm ou se expandem à maneira de um líquido ou gás; fluente. Há fluidos materiais ponderáveis (como os líquidos) e imponderáveis (como os caloríficos e luminosos). Mas também há fluidos imateriais, espirituais, de variadas qualidades, que modelam a realidade invisível, o plano espiritual. Condensados no corpo espiritual do indivíduo, esses fluidos podem fornecer princípios reparadores ao corpo.
Allan Kardec (2013e, cap. XIV, it.
31) explicou que o Espírito, encarnado ou desencarnado, pode ser um agente propulsor que infiltra num corpo deteriorado uma parte da substância do seu envoltório fluídico:
[...] A cura se opera mediante a substituição de uma molécula malsã por uma molécula sã. O poder curativo estará, pois, na razão direta da pureza da substância inoculada; mas, depende também da energia da vontade que, quanto maior for, tanto mais abundante emissão fluídica provocará e tanto maior força de penetração dará ao fluido. [...]
Ademais, sentimentos e pensamentos constroem linhas de força de harmonia ou desarmonia, repercutindo vibratoriamente nos tecidos orgânicos. A maioria das moléstias físicas procede da alma, seja como linhas de força expiatórias criadas em inúmeras existências, seja como linhas de força com raízes na existência em andamento. (XAVIER, 2013i, cap. 157.)
Por vezes, a ação dos fluidos é lenta e exige continuidade para que se produzam os resultados almejados; por outras, é rápida, porque o agente doador é dotado de fluidos mais puros e de mais acentuada força na vontade. As curas que utilizam os fluidos como agentes terapêuticos só se diferenciam entre si pela intensidade e rapidez do processo, variando conforme o doador e o grau de perturbação vibratória em que vive o paciente, pois a recepção e a assimilação dos fluidos dependem de fatores cármicos.
Jesus é Espírito puro, a mais elevada potência psíquica que a humanidade conheceu. Daí imaginar-se a pureza de seus fluidos e o poder de sua vontade. Em poucos momentos, à ação deles, um leproso se recuperava de seu estigma, e paralíticos recobravam os movimentos.
Ele manipulava suas energias perispirituais de variadas maneiras: ora só estendia as mãos sobre o doente, ora tocava nele, ou se deixava tocar. No surdo-mudo pôs sua saliva na língua do paciente. (MARCOS 7:33.) Em certos casos, utilizou a palavra como veículo para fazer vibrar e direcionar seus fluidos. Quanto ao servo do centurião, dirigiu a ação pelo pensamento, ou determinou que algum Espírito integrante de sua falange providenciasse a restauração do enfermo.
Com o nado-cego, Jesus preocupou-se com duas medidas, quais sejam, formar o emplasto de lodo com que envolveu seus olhos e enviá-lo para se lavar nas águas da piscina de Siloé, ali próxima.
Na base do fenômeno permaneceu a ação dos fluidos; o método de aplicá-los é que se modificou. A lama de saliva e terra, por si só, não continha qualquer virtude curativa, mas estava impregnada de fluidos puríssimos, concentrados no emplasto úmido, em face da natural aptidão da água para fixar os fluidos, servindo o pó para aderir a umidade aos olhos do cego. Ou seja, a lama foi reservatório para os fluidos do Cristo.
Já a ida à piscina de Siloé gerou o efeito de potencializar a fé do paciente. Aquela piscina era famosa desde os tempos de Isaías, que lhe elogiou as águas, supostamente milagrosas. Os doentes banhavam-se nela, esperançosos de refazimento e cura. A fé é uma virtude e, também, uma força atrativa, gerando uma propriedade aspirante, assimiladora. Por essa razão, Jesus salientava frequentemente: “se tiveres fé”, ou “a tua fé te salvou”.
A compaixão é poderoso catalizador da vontade e da sublimação dos fluidos.
Jesus, com sua compaixão, é a união entre o sofrimento e a irrupção da Misericórida divina.
Em sua visita a Nazaré, durante o ministério, Ele selecionou um texto de Isaías para leitura na sinagoga (LUCAS 4:18-19):
O Espírito do Senhor está sobre mim, porque ele me ungiu para evangelizar os pobres; enviou-me para proclamar a remissão aos presos e aos cegos a recuperação da vista, para restituir a liberdade aos oprimidos e para proclamar um ano de graça ao Senhor.
Evangelizar era a maior expressão de sua compaixão. Evangelizar para facultar o perdão, a visão espiritual, a liberdade e o amor a Deus. Sobretudo porque era das feridas morais originadas da ausência dessas substâncias imunológicas que os parasitas mais destrutivos provocavam as infecções mais desestruturadoras: o orgulho, o egoísmo, o ódio e o vício.
A obsessão, como patologia mental de causa extrínseca, naqueles dias como na atualidade, era síndrome de repercussões alarmantes.
Allan Kardec (2013b, cap. XXIII, it.
237) definiu a obsessão como “o domínio que alguns Espíritos logram adquirir sobre certas pessoas”.
O Codificador classificou o processo obsessivo em três estágios, conforme os efeitos e a intensidade do constrangimento negativo.
A obsessão pode ser catalogada como simples se o obsedado tem consciência do constrangimento, notando a fonte intrusa e perturbadora. Numa fase além, se o obsessor já abrigou a sugestão perniciosa na emoção e no pensamento do obsedado, fazendo dela um comando hipnótico para driblar o senso crítico do paciente, levando-o à alienação, tem-se a obsessão por fascinação. Se o apoderamento se completa, já se constrangendo o obsedado a tomar atitudes e assumir condutas ao governo do obsessor, manifesta-se o último estágio, a obsessão por subjugação.
Por outras palavras, a obsessão simples se verifica por meio da sugestão; a fascinação tem como instrumento a indução; a coação é o mecanismo da subjugação.
Com razão, Emmanuel (in XAVIER, 2013h, cap. 18, p.
65) afirmou que “a vida de Jesus, na Terra, foi uma batalha constante e silenciosa contra obsessões, obsidiados e obsessores”.
Herodes, associado a entidades espirituais criminosas, mandou matar as crianças belemitas.
Espíritos ardilosos e mistificadores supuseram poder tentá-lo, no deserto.
Alguns familiares o hostilizavam publicamente, chamando-o de louco, influenciados pelos inimigos espirituais da causa.
Maria de Magdala foi curada de obsessão cruel, manipulada por sete usurpadores do plasma sexual.
Pedro sofria de obsessão periódica, como demonstraram os episódios da estrada de Cesareia e do Cenáculo, do Getsêmani e do pátio do palácio de Anás.
Judas vivia perigosa fascinação, enceguecido pela ambição.
Caifás se consumia em paranoia por efeito de suas afinidades espirituais.
Pilatos tinha crises de medo. O ato de lavar as mãos repetiu-se alucinador, como tentativa de autoliberação. Fixada a neurose de culpa, com o sangue de Jesus “nas mãos”, que representava todas as suas vítimas, dominado por remorsos e amarguras, ele praticou suicídio, após ser “banido para Viena, nas Gálias” (XAVIER, 2013f, Pt. 1, cap. X, p. 168),
jogando-se em queda numa “cratera profunda de um vulcão extinto” (FRANCO, 1988, p. 200).
Sacerdotes, escribas, fariseus e saduceus sentiram-se autorizados, pelos inimigos da verdade, a acusá-lo, injuriá-lo e tramar sua morte.
No Pretório, a multidão preferiu Barrabás.
Entidades galhofeiras e vulgares assumiram as agressões dos soldados romanos, esbofeteando-o, cuspindo-lhe e ferindo-o como forma de extravasar toda ojeriza ao que é bom, belo e sublime.
Na cruz, Giestas17 foi a voz dos mentores das trevas, que vieram, ao final, açoitá-lo com o sarcasmo, supondo poderem esfriar-lhe o amor.
Em todas as horas, Ele respondeu com a compaixão, ora a expressar- se como advertência enérgica, fluidos curadores, ensinos iluminativos, ora como orações.
Aos que desejavam a libertação do jugo opressor das mentes enfermas, Ele os socorreu; aos que se compraziam no tormentoso conúbio, respeitou-lhes a escolha, mas sempre lhes deixando no coração um sopro renovador, para abreviar-lhes a doença.
A base da obsessão é a mentossíntese, isto é, simbiose das mentes, pela troca de fluidos mentais multiformes. E porque Jesus possuía percepção profunda, conhecendo o melhor momento de abordar os padecentes, sua ação desobsessiva era breve e eficaz.
Na sinagoga de Cafarnaum, um obsidiado por um “espírito impuro” gritou (MARCOS 1:24-27):
— “Que queres de nós, Jesus Nazareno? [...] Sei quem tu és: o Santo de Deus!”
Jesus o repreendeu, ordenando a liberação do enfermo. O “espírito impuro” agitou-se, gritou e saiu.
Surpreendidos, os presentes perguntaram:

— “Que é isto? Um novo ensinamento com autoridade! Até mesmo aos espíritos impuros dá ordens, e eles lhe obedecem!”
O geraseno subjugado por pertinaz obsessão, que vivia entre os sepulcros, com restos de cordas atados nos pulsos e tornozelos, das tentativas de se prendê-lo, quando viu Jesus exclamou (MARCOS 5:7-9):
— “Que queres de mim, Jesus, filho do Deus altíssimo? Conjuro-te por Deus que não me atormentes!”
Jesus perguntou-lhe o nome e obteve a resposta antológica:
— “Legião é o meu nome, porque somos muitos”.
A psiquiatria contemporânea diagnosticaria o evento como síndrome de personalidades múltiplas, causada por dissociação ou fragmentação da individualidade; uma organização anormal do psiquismo, gerando sistemas de personalidades independentes na mesma pessoa.
Joanna de Ângelis, a nobre benfeitora espiritual, reconheceu que muitos desejos não realizados podem estacionar nas camadas do subconsciente como do inconsciente e interferir na conduta dos indivíduos. Recordou que muitos traumas relacionados a esses desejos podem se exteriorizar na consciência em processo conflituoso. Destacou, todavia, que existem outros componentes para a compreensão das personificações parasitárias ou múltiplas, “qual a interferência dos Espíritos desencarnados através dos processos mediúnicos, alguns deles vigorosos, que produzem estados obsessivos”, e as reminiscências de existências passadas, identificadas com experiências fortes, não diluídas no inconsciente, e que “continuam ressumando desses profundos alicerces e depósitos, assumindo controle sobre o Eu atual”. (FRANCO, 1999, p. 135.)
No caso do geraseno, ou gadareno, tratava-se de uma síndrome obsessiva com diversos participantes, ou um condomínio espiritual de mentes ociosas e atormentadas.
Após a descida do Tabor, um pai aflito aguardava Jesus em Cafarnaum (LUCAS 9:38-39):

— “Mestre, rogo-te que venhas ver o meu filho, porque é meu filho único. Eis que um espírito o toma e subitamente grita, sacode-o com violência e o faz espumar; é com grande dificuldade que o abandona, deixando-o dilacerado”.
Jesus, fazendo a anamnese do paciente, interrogou ao pai sobre o surgimento das crises e foi informado que elas vinham da infância.
— “E muitas vezes o atira ao fogo ou na água para fazê-lo morrer”. (MARCOS 9:22.)
O fato poderia ser explicado por um dos capítulos da neuropatologia, a epilepsia.
A medicina do século XX ofereceu variadas explicações à epilepsia: desde tumores até causas traumáticas, genéticas, endócrinas, tóxicas, emocionais.
Além dessas origens, a crise epileptiforme pode representar o sintoma de um transtorno espiritual, podendo ser o efeito de pavores inspirados por lembranças culposas de outras existências; clichês macabros impressos na mente e que ressurgem do inconsciente passado; medos induzidos pelas antigas vítimas e agora vingadores sedentos etc.
Bezerra de Menezes (in FRANCO, 1985, p.
104) ofereceu lúcida distinção:
Indubitavelmente há processos perniciosos de obsessão, que fazem lembrar crises epilépticas, tal a similitude da manifestação. [...] o hóspede perturbador exterioriza a personalidade de forma característica, através da psicofonia atormentada, diferindo da epilepsia genuína. Nesta, após a convulsão vem a coma; naquela, à crise sucede o transe, no qual o obsessor, nosso infeliz irmão perseguidor, se manifesta.
O relato evangélico sugere que o quadro enfermiço do menino possuía natureza mista, o que ocorre na maioria dos casos. Tinha causa orgânica, que se revelou nos primeiros anos daquela existência. Tinha causa obsessiva, imposta pela vítima do passado que, enlouquecida de ressentimento, formou um quadro psicótico de vingança e se investiu da posição de cobrador, complicando a enfermidade do menino. O pai havia observado que, após a crise, o algoz espiritual dificilmente o deixava.
Jesus interveio no processo de dominação, diluindo com seus fluidos a nuvem de energias mórbidas que encharcava o sistema nervoso do menino, corrigindo ao mesmo tempo o transtorno neurológico.
Para se ter uma ideia do quanto se afadigou Jesus no socorro aos enfermos de toda sorte, excetuados os capítulos do Evangelho de Marcos relacionados à paixão, as descrições dos “milagres” ocupam 47% de seu texto. E, naturalmente, os evangelhos reconstituíram apenas uma parcela de tudo o que Ele fez.
Jesus inaugurou uma era nova para o amor na Terra, o tempo da caridade — o amor em movimento, incessante.
Para isso, Ele veio dos continentes celestes: para compartilhar a dor, para que a dor ganhasse significado e dimensão além da sensação.
O homem caído da parábola fez do samaritano um anjo.
Estaria aí a resposta ao enigma? Por que Deus tolerou a dor, entre os efeitos da liberdade do homem?
Talvez o grande papel da dor seja despertar o anjo nos caídos, quando por seus olhos relampagueia o fulgor inesquecível da gratidão; ou acordar o anjo nos benfeitores, cujos corações se embargam de compaixão.
Como pode ser fecunda a dor! Como é sempre fecunda a caridade!
17 Nota do autor: Nome do malfeitor suspenso na cruz, ao lado de Jesus, que o insultou, dizendo: “Não és tu o Cristo? Salva-te a ti mesmo e a nós” (LUCAS 23:39), assim identificado pelo Espírito Amélia Rodrigues. (FRANCO, 2000, p. 149.)



Acima, está sendo listado apenas o item do capítulo 18.
Para visualizar o capítulo 18 completo, clique no botão abaixo:

Ver 18 Capítulo Completo
Este texto está incorreto?

Veja mais em...

Lucas 10:33

Mas um samaritano, que ia de viagem, chegou ao pé dele, e, vendo-o, moveu-se de íntima compaixão;

lc 10:33
Detalhes Capítulo Completo Perícope Completa

Marcos 6:34

E Jesus, saindo, viu uma grande multidão, e teve compaixão deles, porque eram como ovelhas que não têm pastor; e começou a ensinar-lhes muitas coisas.

mc 6:34
Detalhes Capítulo Completo Perícope Completa

Mateus 9:16

Ninguém deita remendo de pano novo em vestido velho, porque semelhante remendo rompe o vestido, e faz-se maior a rotura.

mt 9:16
Detalhes Capítulo Completo Perícope Completa

Mateus 15:22

E eis que uma mulher cananeia, que saíra daquelas cercanias, clamou, dizendo: Senhor, Filho de Davi, tem misericórdia de mim, que minha filha está miseravelmente endemoninhada.

mt 15:22
Detalhes Capítulo Completo Perícope Completa

Lucas 7:6

E foi Jesus com eles; mas, quando já estava perto da casa, enviou-lhe o centurião uns amigos, dizendo-lhe: Senhor, não te incomodes, porque não sou digno de que entres debaixo do meu telhado;

lc 7:6
Detalhes Capítulo Completo Perícope Completa

João 9:2

E os seus discípulos lhe perguntaram, dizendo: Rabi, quem pecou, este ou seus pais, para que nascesse cego?

jo 9:2
Detalhes Capítulo Completo Perícope Completa

João 9:6

Tendo dito isto, cuspiu na terra, e com a saliva fez lodo, e untou com o lodo os olhos do cego.

jo 9:6
Detalhes Capítulo Completo Perícope Completa

Marcos 7:33

E, tirando-o à parte de entre a multidão, meteu-lhe os dedos nos ouvidos; e, cuspindo, tocou-lhe na língua.

mc 7:33
Detalhes Capítulo Completo Perícope Completa

Lucas 4:18

O Espírito do Senhor é sobre mim, pois que me ungiu para evangelizar os pobres, enviou-me a curar os quebrantados do coração,

lc 4:18
Detalhes Capítulo Completo Perícope Completa

Marcos 1:24

Ah! que temos contigo, Jesus nazareno? Vieste destruir-nos? Bem sei quem és: o Santo de Deus.

mc 1:24
Detalhes Capítulo Completo Perícope Completa

Marcos 5:7

E, clamando com grande voz, disse: Que tenho eu contigo, Jesus, Filho do Deus Altíssimo? conjuro-te por Deus que não me atormentes.

mc 5:7
Detalhes Capítulo Completo Perícope Completa

Lucas 9:38

E eis que um homem da multidão clamou, dizendo, Mestre, peço-te que olhes para meu filho, porque é o único que eu tenho.

lc 9:38
Detalhes Capítulo Completo Perícope Completa

Marcos 9:22

E muitas vezes o tem lançado no fogo, e na água, para o destruir; mas, se tu podes fazer alguma coisa, tem compaixão de nós, e ajuda-nos.

mc 9:22
Detalhes Capítulo Completo Perícope Completa

Lucas 23:39

E um dos malfeitores que estavam pendurados blasfemava dele, dizendo: Se tu és o Cristo, salva-te a ti mesmo, e a nós.

lc 23:39
Detalhes Capítulo Completo Perícope Completa