Ante o Futuro
Versão para cópiaAna Luiza Martinez de Souza
Nascimento: 23 de junho de 1967. Desencarnação: 23 de novembro de 1985. Idade: 18 anos
Pais: Walter de Souza e Cecília Martinez de Souza. — Rua da Camélias, 162. CEP. 04048. São Paulo — SP.
Bisavó — Carmem Alabarze — Materna.
Bisavô — Antonio Gimenez — Materno — desencarnado.
Amigas — Daniela e Carla.
Amiga Espiritual — Ana — Irmã de Caridade.
COMENTÁRIOS
Apesar de estranha angústia e inquietação que me acompanhavam há mais de dois meses, jamais poderia imaginar a terrível tragédia que estava para acontecer. Ana Luiza havia saído para mais uma das inúmeras festas de aniversário que costumava ir. Não me parecia que aquela noite estivesse com sua alegria habitual.
Na volta, ao saírem da Discoteca onde se realizou a festa, ofereceu carona para três amigas e mais colegas que moravam perto de casa. Ao retornarem pela Av. Rebouças, deparou com um caminhão estacionado na contra mão. Ana Luiza assustou-se com o inesperado, perdeu o controle do veículo e chocou-se contra um poste. Levada às pressas para o Pronto Socorro do Hospital das Clínicas, apesar dos esforços para salvá-la, não resistiu aos gravíssimos ferimentos e veio a falecer.
Acredito que tudo já estava previsto pelas Leis Divinas pois, segundo me contaram seus colegas do Colégio Objetivo, naquela manhã, Ana Luiza disse a eles que sentia estranho pressentimento e comentou: “Não sei se sou eu que vou morrer ou alguém de minha família.” Algum tempo depois, revendo seus pertences, encontramos um caderninho onde ela relatava um sonho que tivera quatro meses antes da desencarnação onde dizia ter encontrado o avô (recentemente falecido) e que ele lhe falara muitas coisas das quais não se lembrava. Ana Luiza cursou o 1.° Grau, respectivamente, no Colégio N. Sra. do Rosário e depois no Instituto Sta. Amália. Fazia o 2.° grau no Colégio Objetivo e planejava fazer Faculdade de Biologia ou Farmácia.
Foi aluna da Cultura Inglesa e frequentava o curso de jazz no Círculo Militar.
Vivia integralmente sua juventude.
No seu velório compareceram inúmeros colegas e um fato que sensibilizou muito a família, foi a chegada de uma maravilhosa coroa de rosas que os próprios alunos entristecidos e chorosos enviaram como derradeira lembrança.
Apesar de nosso conhecimento da bondade e abnegação da figura admirável de Chico Xavier, naqueles primeiros dias de tanto sofrimento e desespero, que nos turvavam o raciocínio, nem pensamos em procurá-lo.
Amigos penalizados de nossa situação, além de palavras de conforto nos trouxeram também vários livros de Chico, com encorajadoras mensagens de jovens desencarnados e assim fui alimentando um íntimo desejo de, futuramente, receber uma mensagem.
Confiei, tive fé e orei. Como Jesus é misericordioso, um dia, um amigo de meu falecido pai sabendo de nossa tristeza, nos apresentou à D. Yolanda Cezar, que posteriormente nos convidou para irmos a Uberaba conhecer o Chico. Para descrever esse homem desprendido de bens materiais mas riquíssimo em virtudes, lembrei-me de uma frase que certa vez ouvi: “Aquele que acende uma luz é o primeiro a ser iluminado.”
Por isso o Chico é iluminado.
Ele faz a luz descer sobre as vidas em desatino, faz o sol brilhar de esperança para os corações aflitos, torna mais suave o caminho dos desesperados.
O nosso primeiro encontro jamais esquecerei. Conduzidos, eu e meu marido para um pequeno aposento, Chico nos recebeu e, apesar da simplicidade, senti-me num recanto do paraíso.
Ali, diante daquele homem tão puro, sentimo-nos invadidos da calma e serenidade irradiadas de sua pessoa.
Pediu-nos para ver um retrato de Ana Luiza e então disse-nos:
“Que linda moça é sua filha.”
Como não pude conter meu pranto, completou:
“Não chore, ela está bem na companhia de tia Encarnación (falecida tia de minha mãe, que nem sequer conheci).
E continuou dizendo que nem sempre os caminhos de nossos entes queridos são por onde desejamos.
Na segunda noite de nossa estada em Uberaba, recebemos o melhor presente que Deus nos poderia dar. Terminados os trabalhos mediúnicos, Chico nos chamou para ler maravilhosa mensagem que nossa filha nos enviara. Foi a maior emoção da minha vida, meu pranto se confundia com aquelas palavras ansiosamente aguardadas.
Três anos se passaram. A saudade dói e lembro-me das palavras de Chico: “Eles também sentem saudades e ficam igualmente tristes quando nós ficamos.”
Leio e releio a mensagem e ela me traz grande conforto, como a aguinha fresca que rega a plantinha murcha em que, às vezes, o meu coração se transforma. Obrigada, Chico Xavier!
Somente as pessoas que também passaram por isso, sabem avaliar a dor de outros familiares e mães nas mesmas condições. Não há palavras para expressar o desânimo e a tristeza que se apodera daqueles que perderam entes queridos.
É natural que todas as famílias que passam por tão doloroso transe, procurem um conforto espiritual e a primeira lembrança é mesmo para Chico Xavier. Dirigem-se esperançosos para Uberaba e nem sempre conseguem mensagem nas primeiras vezes. Mas não se deve desesperar. Jesus não iria abandonar uma pobre mãe ansiosa por um reencontro. Mas é preciso fazer preces endereçadas a seus amados filhos para fortalecê-los espiritualmente pois, muitas vezes ainda se encontram em tratamento de recuperação.
Os Espíritos são sensíveis às lembranças dos que os amaram e ficarão felizes quando puderem se comunicar. Assim, por mais demorada que seja a espera, nada será perto da alegria e felicidade que a mensagem trará. Posso acrescentar que a mensagem é muito importante. Ela faz crescer a nossa coragem. Porém também é preciso compreender os estranhos desígnios de Deus e aceitar o que Ele nos manda, com resignação. Para melhor entender essas palavras, deixo aqui pequeno trecho extraído de singelo livrinho “PACIÊNCIA” de Emmanuel/Chico Xavier, que diz: “Algum ente amado terá perdido a existência no Plano Físico, impondo-te espessa carga de saudades e lágrimas… Entretanto, é possível que, no futuro, venhas a considerar semelhante ocorrência à feição do resultado de uma portaria celeste, liberando a criatura que partiu de pesados sofrimentos que talvez lhe atingissem a paralisação dos movimentos ou o desequilíbrio das faculdades cerebrais.”
Apesar de pertencer a uma família católica, sempre me senti atraída pelo Espiritismo. Mas somente depois de adulta, primeiro por curiosidade e depois por motivos de doença, comecei a frequentar esporadicamente Centros Espíritas.
Assim foi que quando minha filha desencarnou, eu já possuía alguma noção da Doutrina, o que depois muito me ajudou a superar o acontecido.
Não digo que por isso foi fácil suportar tamanha provação. Muito pelo contrário. Só Deus sabe o que chorei, me revoltei, blasfemei, nenhuma palavra amiga me sensibilizava. Mas por mais cruel que seja a separação, a vida prossegue e nos impele a obrigações às quais não podemos faltar. E, precisamente em pequenos momentos de serenidade, fui tomando conhecimento de várias obras psicografadas por Chico Xavier. Nelas encontrei respostas consoladoras para os muitos problemas e dúvidas que angustiavam meu amargurado coração. Assim, com esses livros e mais a mensagem de minha filha, fui encontrando forças para continuar vivendo, agora mais confiante no futuro e glorioso reencontro no Mais Alto, quando o Senhor permitir.
Apenas como curiosidade, gostaria de comentar algo que me fez acreditar sinceramente na veracidade da Doutrina Espírita. Foram sonhos maravilhosos e significativos que tive com minha filha logo após sua desencarnação. Nestes sonhos encontrava-me sempre em cidades de ruas limpíssimas, com prédios magníficos de altas janelas e grandes portões dourados, ornados de formosos arabescos. Em redor, belíssimas flores. Via minha filha em amplo quarto, deitada numa cama coberta por lençol tão leve que parecia feito de nuvens. Estava sendo atendida por bondoso médico de aparência nobre e vestido em roupas alvas, que lhe oferecia pequena refeição. Em sonho posterior, vi minha filha novamente, já com aparência melhor, na sala de minha casa. E diante do meu espanto, disse-me: “Mamãe, eu nasci de novo! Estou até frequentando uma escola.”
É interessante notar que na época destes sonhos (um a dois meses após a morte), ainda não havia lido os livros de Chico que os amigos haviam me trazido. Somente depois de cinco meses, em Uberaba, por ocasião da mensagem, várias senhoras me indicaram os livros “Cidade no Além” e” Nosso Lar”, onde se explica como vivem milhares de seres que já se desvencilharam do corpo físico. Ao lê-los notei grande semelhança com o conteúdo dos sonhos.
MENSAGEM
Querido papai Walter e querida mãezinha Cecília, peço a Jesus nos abençoe.
Estou procurando escrever sem pressa no intuito de lhes trazer minhas notícias com a possível segurança.
Sei quanto dói em nossa casa o que me aconteceu, e creiam que as nossas lágrimas se confundem, no mesmo gosto amargo de saudade e sofrimento. Graças a Deus, tenho encontrado proteção e assistência que me sustentam neste reinício da vida. Conquanto ainda um tanto atordoada e sem haver perdido o trauma que me ficou do acidente, sinto-me algo mais encorajada para fortalecê-los.
Compreendo as dificuldades para falar de um mundo para outro, porque estou informada de que habito em outras dimensões vibratórias. Não defino o que seja isso, mas reconheço que não estou mais aí, em companhia dos pais queridos que eu sempre amei tanto.
Lembro-me. Estávamos buscando um ensejo para auxiliar na festinha a que havíamos comparecido, um meio de nos recolher à simpatia dos amigos que nos quisessem a companhia.
Coloquei-me à disposição dos que estivessem desejosos de regressar à casa, quando a Daniela e a Carla se declararam desejosas de aproveitar a chance para o retorno.
Ambas trouxeram ainda dois meninos, quase adolescentes, dos quais não guardei os nomes na memória. Passamos a comentários sobre fim-de-semana destacando os problemas dos estudos, e surpreendia-me com o interesse dos rapazinhos ansiosos por mostrarem o próprio adiantamento.
O carro seguia em marcha natural e havia em nós todos o melhor bom humor. Não havia excesso de qualquer natureza. Tudo normal. De quando em quando uma frase nos fazia rir, desinibindo-nos na viagem, na qual nos aproximávamos uns dos outros.
Em dado momento, uma carreta com velocidade superior à permitida, segundo o meu modo de entender, passou por nós e notei que um pique fora feito à feição de pequeno choque que nos compeliu a perder o controle do volante que, ao invés de obedecer-nos, passou a senhorear os movimentos do veículo, causando-nos a todos grande susto. Entretanto, esforcei-me ao máximo de minhas possibilidades para governar a condução que parecia zombar de minhas forças. Amedrontada com a situação, impunha a possível serenidade a mim mesma. No entanto, o conflito com o poste inesperado nos fez estremecer.
O carro desgovernado nos sacudiu com tremenda violência e, embora me dispusesse a ser útil às companheiras e aos amigos de cujos nomes não me recordo, senti que meu crânio recebera uma pancada, deixando-me completamente desorientada. Não só desorientada. Vi-me inconsciente com absoluta incapacidade para estender qualquer auxílio aos que me compartilhavam da companhia.
Escutei os gritos da Daniela e da companheira, mas, a esse tempo, um pesado torpor se me impusera à cabeça, qual se eu recebesse algum processo de anestesia sobre os meus próprios pensamentos.
Não adiantava qualquer reação de minha parte para socorrer alguém, porque eu mesma porejando sangue necessitava de mãos amigas que me restituíssem o discernimento. O meu sofrimento foi enorme, porque enfrentava um problema para mim até então desconhecido. Perdi toda a noção de minha própria identidade. E fui apanhada para seguir numa ambulância a caminho do hospital. Entretanto, de hospitalização não tenho a mínima lembrança. Acordei, acredito que muito depois do acidente, velada por duas religiosas, sendo que uma delas, a que se deu a conhecer por Irmã Ana, tem sido para mim uma enfermeira maternal.
Compreendi que me achava em lugar diferente, depois de muito esforço para não gritar pelos pais queridos e por nossa Adriana, porque me achava possuída de estranha alucinação. Desse estado mental de anormalidade inconteste saí muito pouco a pouco, de vez que eu não queria ter paciência com medida alguma tendente a devolver-me à vida habitual. Dessa condição estou regressando gradativamente e espero em Jesus refazer-me integralmente para as minhas vivências comuns.
Querido papai Walter, muito grata por ter vindo até aqui com a mãezinha Cecília. A sua estrutura mental, querido papai, é a nossa esperança, porque a mamãe ainda sofre os remanescentes do choque que me abateu de modo indefinível.
Dezoito anos! Eu não esperava perder a vida física com a qual me comprazia à feição de qualquer menina e moça de minha idade. Com as preces que tenho recebido da mamãe e da vovó Carmem, estou melhorando para retomar-me tal qual sou. Penso que o desligamento do corpo físico para as pessoas jovens, deve ser uma erradicação do corpo espiritual em condições muito verdes da árvore em que se formou, e que vem a ser a Vida Espiritual. Tenho visto pessoas que chegam até nós, depois de atingir grande maturidade, demonstrando na própria apresentação as desinibições que não nos caracterizam a nós outros, os que chegamos de improviso.
Sinceramente não sei como será o meu amanhã, no entanto, estou confiante no amparo de Jesus que a ninguém abandona.
Ignoro ainda qual tenha sido o destino dos que estavam no carro em minha companhia, no entanto, em oração busco entregá-los a Deus estejam como estiverem.
Papai Walter, peço-lhe muita calma e paciência com a mãezinha Cecília, porque a mamãe ficou super-sensibilizada com o que sucedeu e, no íntimo, ainda sofre muito.
Não estou revoltada, mas, por vezes, no Instituto de tratamento em que fui acolhida, pergunto a mim própria o porquê de tudo o que nos sucedeu.
Nos meses últimos, isto é, de março para cá, tenho sido visitada por um benfeitor que se me dá a conhecer como sendo o meu bisavô Antônio. Não tenho qualquer lembrança dele, conquanto a palavra dele seja a de um tutor compreensivo e respeitável. Se mamãe ou o senhor mesmo se recordarem dele, me enviarão pensamentos confirmativos, porque talvez a querida vovó Carmem nos possa informar.
Ainda choro muito, mas tenho boas recapitulações das preces de minha mãe Cecília nos meus tempos de criança e isso me faz grande bem, porque repito as orações que aprendi com a fé viva de uma criança.
Querido papai Walter e querida mãezinha Cecília, beijem a querida irmãzinha Adriana por mim. Não tenho forças para continuar porque a reconstituição mental do desastre, na faixa de lembranças que me ficou, ainda me exige grande esforço e a Irmã Ana, a minha protetora, não julga conveniente que eu me aprofunde nas recordações de minudências da provação que experimentamos.
Perdoem-me pela inabilidade com que me conduzi no carro em desequilíbrio. Sei que os queridos pais me desculpam e fico tranquila quanto a isso.
Querido papai Walter e querida mamãe Cecília, recebam com a nossa Adriana, muitos beijos de saudade e carinho da filha que os adora.
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