Caminhos do Amor, Os

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Capítulo XIII

O amigo leal


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Falávamos de afeto e ligações humanas,

Destacando uniões formosas e ideais,

Tanto quanto anotando atitudes insanas

Que, muita vez, transpiram

De casos passionais,

Quando um amigo afável e sisudo,

Que nos seguia o estudo,

Exclamou para nós, de modo convincente:


— Tudo quanto dizeis é verdade inconteste

Sobre os entes queridos que lembrais,

Entretanto, igualmente,

Se falamos de amor, é preciso se ateste

O amor dos animais.


E como se tivesse ali, de lado,

O passado recente,

Contou, emocionado:

— Em minhas lides de engenheiro,

Fui, certa vez, designado

Para serviços na fronteira;

Levei comigo a companheira,

O pequeno filhinho, —

— um garoto de aninho, —

E o nosso velho cão policial

Que recebera, em nossa companhia,

O nome de Leal.


No trabalho incessante em que me via,

Fosse qual fosse o ambiente,

Possuía em Leal o cão valente

Que nos guardava a casa, dia a dia;

Ensinei-o a velar por nosso pequenino

E dedicou-se o cão, de tal maneira,

Que mantinha atenção, semana inteira,

Entre a porta do quarto e o berço do menino.


Morávamos, então, no agreste bravo…

Achavam-se, não longe, algumas feras;

Era o lobo e, além dele, era o jaguar,

A rondarem malocas e taperas…

Necessário, porém, agir e trabalhar,

Orientando a agrimensura.


Tinha sempre dois homens, de vigia,

Na defesa do lar,

Junto de atenciosa governanta.

Minha esposa saía

Algumas vezes para compras justas,

Usando o nosso jipe reforçado

Para atingir pequeno povoado…


O narrador fez pausa e tornou, em seguida,

Expressando-se em voz mais comovida:

— Certo dia de ação com mais ampla demora,

Voltei ao lar, mais tarde… Noite escura…

Ausentara-se a esposa e a governanta

Atendia, em conversa, um tanto lá por fora,

A diversos parentes

Que, por certo, lhe vinham à procura…

Os vigias andavam pela brenha

Buscando para nós

Alguns feixes de lenha…


Acompanhado de um amigo,

Ansioso, ouvi a voz

De meu filhinho em algazarra…

Naquele choro de pavor,

Pressentia perigo

Francamente, a gelar-me…

Em vão, tentei fazer qualquer alarme;

O companheiro me seguia,

Enquanto, em minha inquietação,

Só escutava a gritaria

Do filhinho a cortar-me o coração…


Varei a porta aberta

Da habitação que vi claramente deserta…

Foi, então, que a tremer, desorientado,

Vi o cão a correr para junto de nós;

Leal se nos mostrava, ensanguentado…

Mancando, ele gania,

Não sei se de loucura ou de agonia…


O companheiro disse a mim:

— O cão está zangado, dê-lhe o fim,

É preciso afastá-lo, sem tardança,

Deve ter atacado a indefesa criança.


Tomado de terror, atirei sobre o cão,

E, ganhando os recessos do aposento,

Vi meu filhinho salvo, aconchegado ao leito,

Sem qualquer sofrimento,

Mas um jaguar jazia, ali no chão,

Certamente abatido por Leal.

O cão, com segurança e eficiência,

Liquidara, afinal,

A fera perigosa

Que penetrara em nossa residência.


Com meu filho nos braços

Retornei à presença de meu cão;

Ansiava mostrar-lhe a nossa gratidão,

Mas Leal enviou-me um derradeiro olhar…

Sufocado de dor, nada pude falar.

No instante de morrer, no terrível revés,

Leal ainda arrastou-se com cuidado

Para beijar-me os pés!…


Calou-se o narrador,

Sob o peso cruel da própria dor.

Depois, disse a chorar:

— Neste Infinito Espaço em que habitamos,

Deve haver um lugar

Que acolha os animais,

Amigos quase humanos,

Em plena evolução, à busca de outros Planos…

Sempre aceitei os cães por nossos cireneus,

Os animais também são criaturas de Deus…


Aquela história viva,

Que ouvíramos, ali, de ânimo atento,

Fez o ponto final de nosso entendimento.

No entanto, o companheiro,

Que nos falava de Leal,

Fitava o Azul Imenso, a Pátria Universal,

E, qual se transmitisse um sublime recado

Ao próprio coração,

Clamava, consternado:

— Deus não me negará resposta à constante oração…

Hei de achar o meu cão!… Hei de achar o meu cão!…




Maria Dolores
Francisco Cândido Xavier


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